Acórdão nº 1399/13.9TBCBT-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Novembro de 2015
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 05 de Novembro de 2015 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I – Relatório; Recorrente: Companhia de Seguros AA… SA; Recorrida: BB…; ***** Nos autos acção declarativa em processo ordinário que BB intentou contra Companhia de Seguros AA SA, veio esta interpor o presente recurso de apelação, por não se conformar com o despacho judicial que determinou a realização de segunda perícia no IML - Gabinete Médico-legal de Guimarães - por um único perito, mas distinto do que realizou a 1ª perícia.
Nas suas alegações, conclui da seguinte forma: I- A perícia colegial requerida nos presentes autos, apesar de se médica, não é de clínica médico-legal e forense; II- Não há, no caso, qualquer interesse de ordem pública (ou até de saúde pública, como é o caso das autópsias) que imponha a intervenção exclusiva do INML na realização do exame pericial pedido pelas partes num processo em que se discutem direitos disponíveis; III- Assim, considera a Ré que não é aplicável ao exame solicitado o disposto na Lei 45/2004.
IV- O nº 3 do artigo 21º da Lei 45/2004 prevê a inaplicabilidade do nº 1 desse mesmo preceito “aos exames em que outros normativos legais determinem disposição diferente”; V- O artigo 468º n.º 1 alínea b) do NCPC estabelece que “A perícia é realizada por mais de um perito, até ao número de três, funcionando em moldes colegiais ou interdisciplinares:..b) quando alguma das partes, nos requerimentos previstos no artigo 475º e no nº 1 do artigo 476.º requerer a realização de perícia colegial”, cabendo, nesse caso, ao tribunal iniciar um perito e a cada uma das partes outro (cfr artigo 468º n.º 2 do mesmo diploma); VI- As normas da alínea b) do n.º 1 e do nº 2 do artigo 468º do Código de Processo Civil, constituem um dos “normativos legais” a que alude o n.º 3 do artigo 21º da Lei 45/2004 e que determinam disposição diferente ao princípio geral da intervenção nas perícias de apenas um só perito.
VII- É, precisamente, por força dessa ressalva que que a perícia médica a realização no âmbito de um acidente de trabalho, prevista no artigo 138º do CPT, continua a ser realizada em moldes colegiais, com dois peritos indicados pelas partes e um outro pelo tribunal (cfr 139º n.º 5); de facto, existe uma norma que prevê regime distinto ao da Lei 45/2004 - a do artigo 138º do CPT -, como ocorre nas perícias em direito civil por força dos artigos 468º n.º 1 alínea b) e nº 2.
VIII- Será, pois, no disposto no artigo 21º n.º 3 da Lei 45/2004, de 19 de Agosto, conjugado com as normas dos artigos 468º n.º 1 alínea b) e nº 2 do NCPC, que se encontrará fundamento para a admissão da perícia em moldes colegais, sendo um dos peritos indicados pelo tribunal (ou GML) e os dois restantes por cada uma das partes.
IX- Para que não seja totalmente desprovida de sentido a regra do n.º 3 do artigo 21º da Lei 45/2004, o disposto no n.º 4 desse artigo deverá ter a sua aplicação restringida às situações em que o Tribunal, oficiosamente, ordene oficiosamente a realização da perícia em moldes colegiais (sem que as partes o tenham requerido).
X- E mesmo que essa norma se aplicasse à situação em análise, sempre a mesma teria sido tacitamente revogada pelo disposto no artigo 468º n.º 1 alínea b) do NCPC.
XI- A realização da perícia em moldes colegais mostra-se, no caso, imprescindível, pelas vantagens que acarreta na descoberta da verdade material; XII- A unanimidade dos três peritos (um deles indicado pelo GML) quanto a uma determinada conclusão desse relatório pericial, ressalvando, claro, as situações de erro técnico (muito menos provável de ocorrer com a intervenção de três peritos), constituiria uma absoluta certeza por parte do Tribunal de que a situação médica a examinar foi bem avaliada e não oferece qualquer dúvida, nem mesmo para a parte quem, eventualmente, pudesse ser menos favorecida com tal conclusão.
XIII- Mesmo nas situações em que essa unanimidade não se verificasse, a intervenção de três peritos seria útil para que o Juiz, na qualidade de perito dos peritos, se pudesse aperceber das diferentes perspectivas que a mesma situação médica pode merecer, podendo formar a sua convicção de uma forma mais sustentada ou até aprofundar as matérias em que se verificasse essa divergência, de forma a apreciar a eventual justificação para a ausência de unanimidade nas respostas.
XIV- A eventual discordância de um perito quanto às conclusões obtidas pelos demais, se fundada em razões sólidas, seria decisiva para que o Tribunal pudesse evitar uma decisão baseada em pressupostos inexactos.
XV- Do mesmo passo, a presença e discussão entre os peritos, no decurso do próprio exame, dessas eventuais diferenças de perspectiva poderia ser suficiente para evitar conclusões erradas e ser conducente à pretendida unanimidade.
XVI- De um perícia singular levada a efeito no IML não pode resultar qualquer divergência, nem o Tribunal poderá aperceber-se das diferentes perspectivas para a mesma realidade, com o inerente prejuízo para a boa decisão da causa e para as partes, a quem é imposta uma determinada conclusão, muitas vezes subjectiva, do perito, sem que surja qualquer voz dissonante que alertem para o seu eventual desacerto.
XVII- Sejam quais forem as regras processuais em vigor em cada momento, nunca será propósito do legislador impor ao Tribunal o julgamento dos factos com base numa perspectiva forçadamente limitada ou insuficiente da realidade relevante.
XVIII- Bem pelo contrário, o objectivo último do legislador é o de garantir uma solução justa para o litígio, mediante o apuramento, o tanto mais detalhado quanto possível, dos factos em análise.
XIX- Estando ao alcance do Tribunal ordenar uma diligência que garantirá essa maior amplitude na análise e, portanto, propiciará uma mais acertada constatação e avaliação dos factos médicos carecidos de prova, não vemos como possível que se possa rejeitar a sua realização nos moldes propostos.
XX- Atendendo ao relevante contributo que a discussão da questão médica a apurar por três peritos poderia trazer ao processo, será se...
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