Acórdão nº 43/14.7T8VRL-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução09 de Julho de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrentes: AA e BB; Recorrido: CC; Tribunal Judicial de Vila Real, Instância Local – Secção Cível, 2º Juízo. Nos presentes autos, a CC instaurou procedimento cautelar especificado de arresto contra AA e BB para garantia do crédito global de € 12.225,95 (doze mil, duzentos, vinte e cinco euros, noventa e cinco cêntimos).

Para tanto, alegou, em síntese, que por contrato de concessão de exploração, outorgado em 28/11/2011, cedeu aos requeridos a exploração do estabelecimento de snack-bar das Ciências Agrárias, sito no Campus da CC, em Vila Real, tendo tal contrato sido rescindido em 07/07/2013, quando se encontrava em dívida o montante de € 11.625,95, a título de rendas vencidas até aquela data, bem como o montante de € 600,00, correspondente a um forno disponibilizado aos requeridos, que entretanto desapareceu.

Alegou ainda que não é conhecida qualquer actividade aos requeridos, para além de lhe serem conhecidas outras responsabilidades, existindo o receio de que retirem os bens existentes no estabelecimento, os quais são de fácil dissipação, frustrando-se assim a satisfação do crédito da requerente.

Deste modo, conclui pelo decretamento da providência solicitada a fls. 9, relativamente ao estabelecimento de Snack-Bar das Ciências Agrárias, sito no Campus da CC., Vila Real.

Produzida a prova apresentada pela requerente, a fls. 27-32 foi proferida sentença, na qual se decidiu decretar a providência solicitada a fls. 9.

Notificados os requeridos, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 366º, nº 6 e 372º, do C.P.C., apenas veio a requerida deduzir oposição (fls. 71-81), na qual invocou a incompetência deste Tribunal em razão da matéria, para além de ter pugnado pela inverificação dos pressupostos para ser decretado o arresto peticionado, e, consequentemente, concluiu pelo levantamento da providência determinada a fls. 27-32.

Foi proferido sentença em que, após se concluir pela improcedência da invocada excepção da incompetência material e responder à matéria de facto controvertida, se decidiu julgar “totalmente procedentes os presentes autos de procedimento cautelar especificado de arresto instaurados por CC contra AA e BB, e, consequentemente, decide-se: a) Manter o decidido a fls. 27-32; b) Julgar improcedente a oposição oferecida pela requerida AA, a fls. 71-81; c) Condenar a requerida AA no pagamento das custas processuais - cfr. artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do C.P.C.”.

Inconformado com tal decisão, apela o Autor, e, pugnando pela respectiva revogação, formula nas suas alegações as seguintes conclusões: 1 - Nos termos do artigo 154.º, n.º 1 do Código de Processo Civil e do artigo 205.º da Constituição da Republica Portuguesa, as decisões proferidos pelo Tribunal que versem sobre pedidos controvertidos ou alguma dúvida são sempre fundamentadas.

2 - O Tribunal a quo limita-se a fazer vagas referências às normas invocadas pela Requerida em sede de Oposição, não fundamentando devidamente a sua posição, nomeadamente quanto à competência material do Tribunal a quo, concluindo, apesar disso, pela sua não verificação.

Assim, 3 – A douta Sentença proferido pelo Tribunal a quo é nula por falta de fundamentação, nos termos e com os efeitos da al. b), do n.º 1, do artigo 615.º do PC.

Acresce que, 4 – A Requerida, ora Recorrente, alegou em sede de Oposição que a retirada dos objectos sobre os quais recai o presente Arresto, havia sido acordada com a Requerente, contudo, a Sentença ora em crise, não se pronuncia quanto a tal facto, assim como não se pronuncia quanto ao facto de ter sido agendada pela Requerente a data para se levar a cabo tal tarefa.

Deste modo, 5 – Salvo melhor entendimento, nos termos da al. d), do n.º 1, do artigo 615.º do CPC, a Sentença padece de uma nulidade, por falta de pronúncia quanto a todos os factos e questões carreadas para os autos.

Sem prescindir, 6 – Ainda que fazendo uso de uma fundamentação vaga, o Tribunal a quo declarou improcedente a invocada excepção dilatória de incompetência absoluta.

7 – Não podemos concordar com tal decisão.

Semão vejamos, 8 - Como foi alegado pela Requerida, ora Recorrente, em sede de Oposição, os presentes autos deviam ter dado entrada junto do Tribunal Administrativo territorialmente competente e não junto deste douto Tribunal.

De facto, 9 - Nos termos do n.º 3, do artigo 212.º, da Constituição da República Portuguesa, “compete aos tribunais administrativo e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais” - também artigo 1°, n° 1, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n° 13/2002, de 19 de Fevereiro.

10 - O ETAF contém no n.º 1 do seu artigo 4.º um elenco das matérias que, em concreto, se consideram ser da competência dos Tribunais Administrativos.

11 - E com efeito, é ao abrigo das normas específicas insertas nas alíneas b), e) e f) do n.º 1 daquele artigo 4.º do ETAF que devem ser resolvidas as questões da delimitação da competência dos Tribunais Administrativos no que respeita a acções relativas a contratos sempre que se esteja perante situação por elas abrangida.

Posto isto, 12 - A alínea e) do n.º 1 do artigo 4.º do ETAF atribui aos Tribunais Administrativos a competência para as “questões relativas à validade de actos pré-contratuais e à interpretação, validade e execução de contratos a respeito dos quais haja lei específica que os submeta, ou que admita que sejam submetidos, a um procedimento précontratual regulado por normas de direito público.” 13 – É justamente nesta linha de pensamento que se insere a transcrita disposição do ETAF que abstrai da natureza das normas que materialmente regulam o contrato, colocando-o na órbita dos tribunais administrativos desde que a lei preveja a possibilidade da sua submissão a um procedimento pré-contratual de direito público.

O acento tónico indiciador da natureza administrativa da relação jurídica é aqui colocado, não no conteúdo do contrato nem na qualidade das partes, mas nas regras de procedimento pré-contratuais potencialmente aplicáveis.

Cfr. Acórdão do Tribunal de Conflitos de 11-03-2010, Proc. 028/09, in www.dgsi.pt.

14 - No mesmo sentido vai o Acórdão do Tribunal de conflitos de 19/12/2012, processo 020/12: “Nesta previsão legal [alínea e), do n.º 1, do artigo 4.º do ETAF] cabem não só os contratos administrativos que vinham previstos no artigo 178° do Código de Procedimento Administrativo, mas todos os contratos públicos, na acepção constante do artigo 1°, n° 2, do Código dos Contratos Públicos. Ora, sendo os contratos públicos todos aqueles que, independentemente da sua designação e natureza, sejam celebrados pelas entidades adjudicantes referidas no Código dos Contratos Públicos, bom de ver que tal categoria legal abarca contratos de direito privado.” Como aludem Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Volume I, Almedina 2004, p. 48, “A opção tomada nesta alínea e), que constitui a grande revolução do Código na matéria, traduziu-se na adição a jurisdição dos tribunais administrativos do conhecimento dos litígios relativos a contratos precedidos ou precedíveis de um procedimento administrativo de adjudicação, independentemente da qualidade das partes nele intervenientes — de intervir aí uma ou duas pessoas colectivas de direito público ou apenas particulares — e independentemente de, pela sua natureza e regime (ou seja, pela disciplina da própria relação contratual), eles serem contratos administrativos ou contratos de direito privado (civil, comercial, etc).” Ora, 15 – Nos termos do n.º 1, do artigo 4.º, dos Estatutos da CC, aprovados e publicados em anexo ao Despacho Normativo n.º 22/2012, publicado na 2.ª Série do Diário da República, de 22 de Outubro de 2012, a UTAD é uma Pessoa Colectiva de Direito Publico, sendo que, por força dos artigos 29.º e 30.º do referido Diploma, os Serviços de Acção Social da CC, são serviços de apoio técnico e administrativo permanente da CC, dispondo de autonomia administrativa e financeira, pelo que, fazem parte integrante da CC que, repete-se, é uma Pessoa Colectiva de Direito Publico.

16 – Nos termos do disposto no artigo 16.º do Código dos Contratos Públicos (CCP), aprovado pelo DL 18/2008, de 29 de Janeiro existe lei específica que submeta o contrato em causa nos presentes autos, ou que admita que seja submetido, a um procedimento pré-contratual regulado por normas de direito público.

Pelo que, 17 - Por força do disposto na al. e), do n.º 1, do artigo 4.º do ETAF e, bem assim, do artigo 16.º do CCP, estamos perante um contrato, em que uma das partes é uma pessoa colectiva de direito público e que pode/deve ser submetido a um procedimento précontratual regulado por normas de direito público, pelo que, deve ver as questões relativas à sua interpretação, validade e execução submetidas à jurisdição administrativa.

Deste modo, 18 – E ao contrário do decidido na douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo, existe uma lei específica que submete o contrato em causa nos autos a um procedimento pré-contratual regulado por normas de Direito Público, pelo que estejamos perante um diferendo onde se mostra preenchida a al. e), do n.º 1, do artigo 4.º do ETAF, cabendo...

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