Acórdão nº 79/14.8TAEPS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Outubro de 2015
Magistrado Responsável | MANUELA PAUP |
Data da Resolução | 19 de Outubro de 2015 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam em conferência na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães: I) Relatório Vem o arguido José C.
interpor recurso da decisão proferida nos autos de processo abreviado com o número acima identificado que correram termos pela Instância Local de Esposende, comarca de Braga, e pela qual foi condenado, pela prática de um crime de difamação agravado, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 180º nº 1 e 184º por referência ao artigo 132º nº 2 alínea l), todos do Código Penal.
Para tanto alega o que consta da sua motivação a qual sintetiza nas conclusões seguintes: (transcrição) «I - Da matéria de facto dada como provada e com relevância para a decisão final resulta que o arguido/recorrente dirigiu um requerimento ao Juiz titular de um processo em que era parte principal (arguido) que, na sequência de uma multa aplicada às suas testemunhas de defesa que faltaram à audiência de julgamento, pediu absolvição daquelas do seu pagamento, por considerar que" Por lapso ou falta de profissionalismo" da ofendida não foram devidamente feitas notificações.
II - No contexto em que a expressão "Por lapso ou falta de profissionalismo" foi utilizada, não reveste cariz difamatório nem objectivamente ofensiva, o que se repercute ao nível do elemento subjectivo, bem como da ilicitude.
III - A conduta do arguido/recorrente, analisada à luz do contexto em que foi proferida - formulada no âmbito de um requerimento/pedido dirigido ao tribunal -, muito embora possa ser considerada como indelicada ou acintosa para a senhora oficial de justiça (ofendida), não tem o propósito nem é apta a vexá-Ia ou humilhá-Ia; IV- Trata-se de uma crítica objectiva, devendo esta entender-se como valoração e censura crítica, enquanto se refere, exclusivamente, às funções da ofendida, não se dirigindo directamente à sua pessoa, não a atingindo a sua honra e consideração pessoal, com tal sem dignidade penal.
v - Ao afirmar que "Por lapso ou falta de profissionalismo", o arguido/recorrente expressou uma ideia de alternância, admitindo em primeiro lugar a possibilidade da existência de um "lapso", o que exclui a "forma inequívoca , . . em insinuar que a ofendida .. , evidencia falta da profissionalismo.." (sentença pág. 9)', Ou seja, VI - Aquela afirmação não é suficiente para abalar moralmente a ofendida, nem prejudica a sua liberdade de determinação, pelo que não se encontrando preenchida, objectivamente, a previsão dos artºs 180º, n° 1, e 184º, do Código Penal, deveria o Mª Juiz a quo ao aplicar aquelas normas excluir a sua punibilidade, absolvendo o arguido.
Por outro lado, VI - Tal expressão foi formulada, num manifesto e claro exercício ao direito de reclamação do serviço público efectuado pela ofendida, de um modo formal, mediante requerimento dirigido ao Juiz do processo, entidade com poder/dever funcional de atender e decidir as petições dos intervenientes processuais; VII - O arguido/recorrente agiu, assim, no exercício de um direito, nos termos previstos no art. 31.°, nº1, al. b}, do Código Penal, pelo que a expressão "Por lapso ou falta de profissionalismo" da ofendida, não tem a virtualidade objectiva de ofender a sua honra e consideração pessoal, não preenchendo os elementos típicos do crime de difamação.
VIII - A conduta do arguido/recorrente é atípica, para efeitos do disposto no art. 180º do Código Penal, porquanto o mesmo actuou no exercício de um direito de liberdade de expressão, de crítica e de reclamação.
IX - Assim sendo, ° tribunal a quo errou na aplicação do direito, uma vez que a factual idade provada não integra a prática do crime de difamação pelo qual foi o arguido I recorrente condenado, devendo por isso absolver o arguido. » A este recurso respondeu o Ministério Público junto do Tribunal recorrido pugnando pela manutenção da decisão proferida.
Neste Tribunal da Relação a Digna Procuradora Geral Adjunta emitiu o seu parecer no sentido da procedência do recurso.
Cumprido o preceituado no artigo 417º do Código de Processo Penal nada veio a ser acrescentado no processo.
Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos a conferência.
Nada obsta ao conhecimento do mérito.
II) - Fundamentação Tem o seguinte teor a decisão recorrida: (transcrição) 1. A ofendida Sandra R. é oficial de justiça desde 1998.
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À data dos factos sob discussão exercia funções como escrivã auxiliar do extinto 2º Juízo, do Tribunal Judicial da comarca de Esposende.
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Em Setembro de 2013, no extinto Tribunal e Juízo, corria termos, sob o nº367/12.8TAEPS, um processo-crime em que era arguido o, aqui, arguido José C..
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No dia 25 desse mesmo mês estava agendada audiência de julgamento nesse processo, competindo à ofendida acompanhar a diligência.
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Assim, efectuou a chamada, tendo constatado que estavam presentes todas as pessoas convocadas para o acto – demandante, defensora oficiosa do arguido, testemunhas de acusação e de defesa e o próprio arguido.
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Face ao facto de ter sido determinado o adiamento da audiência de julgamento e agendada para sua realização o dia 04 de Novembro de 2013, a ofendida comunicou essa mesma situação a todos os presentes.
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No dia 04 de Novembro de 2013 todos compareceram à audiência de julgamento, incluindo o arguido, excepto as testemunhas de defesa.
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No dia 05 de Março de 2014 a ofendida tomou conhecimento de que o arguido José P. havia apresentado um requerimento, no dia 25 de Fevereiro de 2014, junto a fls.481, daquele processo-crime, com o seguinte teor: (…) Tendo conhecimento da multa que foi aplicada às testemunhas, Nuno S., Cândida . e Belmira G., por estes não comparecerem na audiência marcada, para o dia 04-11-2013. No dia 25-09-2013, todas as testemunhas estiveram presentes, nessa mesma data não foi ninguém notificado, de nova data para audiência, nem pessoalmente, nem pelo correio. Depois de consultado o processo, constatei que no dia 25-09-2013, a Srª Auxiliar de Justiça que estava presente foi, Srª Sandra A.. Por lapso ou falta de profissionalismo, deste Auxiliar de Justiça não fez as notificações, e assim foi aplicada a multa, a pessoa que se disponibilizam a ajudar o Tribunal na descoberta da verdade. Já à um ano atrás, num outro processo, esta Srª Auxiliar de Justiça, Sandra A., cometeu o mesmo erro, por lapso não notificou, uma testemunha que era importante para a realização da audiência. Como tenho vindo a consultar outros processos, e tenho conhecimento da falta de profissionalismo, por parte de alguns Auxiliares de Justiça e que assim tem levado á condenação de inocentes. Por esta razão peço que estas testemunhas sejam absolvidas, da multa que lhe foi aplicada (…).
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O arguido agiu de forma livre, deliberada e conscientemente, com o propósito, concretizado, de atingir a ofendida Sandra R. na sua dignidade e idoneidade profissional, enquanto oficial de justiça, bem sabendo que ao fazê-lo do modo constante do requerimento que apresentou no Processo nº367/12.8TAEPS, a fls.481, publicitava o conteúdo desse requerimento que subscreveu, dando dele conhecimento a outros oficiais de justiça, magistrados e terceiros que entrassem em contacto com o identificado processo-crime, pondo, assim, em causa o cumprimento das suas funções.
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Sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.
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O arguido foi já condenado: a) em 07 de Dezembro de 2007, por sentença transitada em julgado em 09 de Janeiro de 2008, pela prática, em 02 de Fevereiro de 2006, de um crime de maus tratos a cônjuge...
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