Acórdão nº 5/13.1GBAVV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Outubro de 2015
Magistrado Responsável | ALCINA MARIA DA COSTA RIBEIRO |
Data da Resolução | 19 de Outubro de 2015 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, os Juízes que compõem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO 1 - Por sentença proferida em 16 de Março de 2015, foi o arguido, Carlos A., condenado pela prática de: 1) um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203º, nº 1 e 204º, nº1, al. e) do Código Penal, na pena de 11 meses de prisão; b) um crime de burla previsto e punido pelo artigo 217º, nº 1, do Código Penal e c) um crime de falsificação de documento, previsto e punido pelo artigo 256, nº 1, al. c) e nº 3, do Código Penal, na pena de 1 ano e 8 meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 2 anos e 1 mês de prisão- 2 - Inconformado com esta condenação, impugna-a o Arguido, com as conclusões que se transcrevem: 1. DA PROVA PRODUZIDA NÃO SE PODERÁ DAR COMO PROVADO TER O ARGUIDO PRATICADO QUALQUER CRIME DE FURTO, MUITO MENOS QUALIFICADO, SENDO QUE TAL COMO FUNDAMENTADO NA SENTENÇA, O PERCURSO PERCORRIDO PELO TRIBUNAL SE ALICERÇA EXCLUSIVAMENTE NAS MERAS SUSPEITAS DA SUA EX-MULHER E EM EXERCICIOS DE PROGNOSES DE NORMALIDADE QUE ULTRAPASSAM AS MARGENS DE ERRO, DÚVIDAS E INCERTEZAS EM PROC. PENAL PERMITIDAS E TOLERADAS, SUSPEITAS ESSAS DE QUE ELE POSSUA CHAVE DA CAIXA DE CORREIO MAS AINDA QUE TAL NÃO SE VERIFIQUE TAL CAIXA PERMITE A RETIRADA DA CORRESPONDÊNCIA DO SEU INTERIOR COM A MÃO. DEVENDO SER ABSOLVIDO DE TAL CRIME DE FURTO; 2. E, AINDA QUE TIVESSE OCORRIDO QUALQUER CRIME DE FURTO, SEMPRE A CONSUMAÇÃO E CONDENAÇÃO PELO CRIME DE BURLA ABARCARIA TODOS OS RESTANTES ACTOS PREPARATÓRIOS, INCLUINDO A APOSIÇÃO DO NOME DA DESTINATÁRIA E SEU NO VALE, NÃO PODENDO O ARGUIDO TAMBÉM SER PUNIDO POR CRIME DE FURTO E FALSIFICAÇÃO, DOS QUAIS SEMPRE TERIA DE SER ABSOLVIDO; 3. NO CASO, NÃO PODE O ARGUIDO SER PUNIDO SIMULTANEMANTE PELO CRIME DE BURLA E FALSIFICAÇÃO, POIS TRATANDO-SE DE VALE POSTAL O ARGUIDO PARA BURLAR TEVE NECESSÁRIAMENTE DE FALSIFICAR O DOCUMENTO, OU ENTÃO AO FALSIFICAR ESTAVA JÁ A BURLAR, SER CONDENADO POR AMBOS SIGNIFICA ESTAR A SER DUPLAMENTE SANCIONADO PELA MESMA ACTUAÇÃO (EMPREGAR ARTIFICIO PARA OBTER PROVEITO); 4.ATENTAS AS CIRCUNSTÂNCIAS CONCRETAS DE ANTERIOR COMUNHÃO PATRIMONIAL COM A QUEIXOSA, NÃO SE MOSTRA DEMASIADO ELEVADO O GRAU DE NECESSIDADE DE PREVENÇÃO SOCIAL PELOS FACTOS IMPUTADOS; 5.DEVERÁ VALORAR-SE POSITIVAMENTE A PROVA RELATIVA Á SITUAÇÃO PESSOAL DO ARGUIDO CONTIDA NOS PONTOS 1.20 E 1.21 E CONSIDERAR-SE QUE SE MANTÊM INALTERADOS OS PRESSUPOSTOS QUE LEVARAM O TRIBUNAL QUE PROFERIU A SENTENÇA DE 24/11/2014, ALUDIDA NO PONTO 1.35 DA FUNDAMENTAÇÃO, A SUSPENDER A EXECUÇÃO DA CONDENAÇÃO EM PRISÃO SUBORDINADA A REGIME DE PROVA ASSENTE NUM PLANO INDIVIDUAL DE REINSERÇÃO SOCIAL, SENDO QUE DESDE ENTÃO INTERIORIZOU O ARGUIDO A ILICITUDE DA SUA ACTUAÇÃO ATÉ TAL DATA, CUMPRINDO ESCRUPOLOSAMENTE O PLANO DE REINSERÇÃO SOCIAL AÍ DETERMINADO, PELO QUE SE DEVERÃO CONSIDERAR VERIFICADOS OS REQUISITOS ADEQUADOS Á SUSPENSÃO DA PENA, AINDA QUE TAMBÉM SUBORDINADA A INJUNÇÕES DANDO-SE OPORTUNIDADE AO ARGUIDO DE PROSSEGUIR A SUA RESSOCIALIZAÇÃO EM LIBERDADE JUNTO DA SUA FAMÍLIA; 6. ASSIM, ATENDENDO Á PERSONALIDADE DO ARGUIDO, Às CONDIÇÕES DA SUA VIDA COM A COMPANHEIRA E FILHO MENOR DE AMBOS, AO FACTO DE SE ENCONTRAR A MEIO DE UM PLANO DE REINSERÇÃO SOCIAL QUE SE MOSTRA ESTAR A CUMPRIR A SUA FINALIDADE, TRAÇADO NO ÂMBITO DA ALUDIDA SENTENÇA, APLICAR AGORA PRISÃO EFECTIVA SERIA DESBARATAR TODO E QUALQUER EFEITO ÚTIL DO MESMO; 7.ATENTE-SE QUE OS FACTOS PELOS QUAIS AGORA VEM ACUSADO SE CIRCUNSCREVEM A MOMENTO ANTERIOR ÁQUELA SENTENÇA NO ÂMBITO DA QUAL SE MOSTRA EM VIGOR E A SER CUMPRIDO PELO ARGUIDO PLANO DE REINSERÇÃO SOCIAL; 8. AS CIRCUNSTÂNCIAS DA PRÁTICA DO CRIME (RELACIONAMENTO CONJUGAL E PATRIMONIAL RECENTEMENTE CESSADO) NÃO INSPIRA ELEVADA CENSURABILIDADE OU NECESSIDADE DE PACIFICAÇÃO SOCIAL, PELO QUE SE DEVE CONSIDERAR QUE TAL CIRCUNSTANCIALISMO PERMITE E ACONSELHA A SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA DE PRISÃO; 9. Á SUA CONDUTA EXEMPLAR CUMPRIDORA DO PLANO DE REINSERÇÃO SOCIAL TRAÇADO EM MOMENTO POSTERIOR Á FACTUALIDADE PELA QUAL AGORA É JULGADO ACONSELHA A QUE SE MANTENHAM OS PRESSUPOSTOS INERENTES Á REINSERÇÃO SOCIAL EM LIBERDADE QUE SE ENCONTRAM A SURTIR EFEITOS, MOSTRANDO-SE INJUSTO QUE SEJA O ARGUIDO IMPEDIDO DE PROSSEGUIR COM ESTE.
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ENTENDEU O TRIBUNAL, E BEM, DAR AO ARGUIDO ATRAVES DA SUSPENSÃO DA PENA DE PRISÃO N,AQUELA SENTENÇA UMA OPORTUNIDADE DE SE INTEGRAR E INSERIR NA SOCIEDADE NÃO SE NOS AFIGURANDO JUSTO QUE JULGADO AGORA, POR FACTOS POUCO GRAVOSOS, LEVADOS A CABO EM MOMENTO ANTERIOR A TAL OPORTUNIDADE, LHE SEJA AGORA PELA PRATICA DESTES DEITADO TUDO A PERDER, COM A NÃO SUSPENSÃO DA PENA, A FIM DE LHE PERMITIR CONTINUAR PERCURSO DE INSERÇÃO E INTERIORIZAÇÃO DA CENSURABILIDAE DOS SEUS ACTOS ANTERIORES QUE SE MOSTRAM A SURTIR EFEITO.
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A EXECUÇÃO DE PENA DE PRISÃO CONSTITUI A ÚLTIMA RATIO DA POLÍTICA CRIMINAL, E SALVO MELHOR OPINIÃO, MOSTRA-SE, NO CASO CONCRETO, FAVORÁVEL AOS FINS DA PENAS A SUSPENSÃO DA PENA DE PRISÃO QUE SEJA FIXADA AO ARGUIDO, AINDA QUE SUJEITA A INJUNÇÕES, REGRAS OU TRABALHO EM FAVOR DA COMUNIDADE AO QUAL EXPRESSA SUA CONCORDÂNCIA E ASSENTIMENTO; 12. SEM PRESCINDIR 13- FACE Á POUCA GRAVIDADE DOS FACTOS, SEMPRE AS PENAS A QUE O ARGUIDO FOI CONDENADO SE MOSTRAM EXAGERADAS, DEVENDO SER FIXADAS PRÓXIMO DO MÍNIMO DA MOLDURA PENAL, SEMPRE SUSPENSA».
3 – O Ministério Público, em primeira instância, respondeu ao recurso do arguido, pugnando pela manutenção do decidido 4 - O Digno Procurador-Geral Adjunto, no parecer que antecede, pronuncia-se pela improcedência do recurso.
5 - Admitido o recurso na forma e com o efeito devidos, subiram os autos a esta Relação onde, depois de colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II – MATÉRIA A DECIDIR 1. Impugnação da decisão da matéria de facto; 2. Qualificação jurídico-penal dos factos; 3. Concurso dos crimes de furto, burla e falsificação; 4. Dosimetria das penas parcelares; 5. Suspensão da execução da pena de prisão III – A SENTENÇA RECORRIDA 1.
Factos Provados A primeira instância deu como provados os seguintes factos: 1.1. – Nos últimos dias do mês de Agosto de 2012, a hora não concretamente determinada, o arguido deslocou-se à residência de Maria E., com quem foi casado, sita em Monte…, com o propósito de ali se apoderar de vales postais que se encontrassem no interior da caixa do correio.
1.2. – O arguido já não residia na residência da Maria E. desde 2010, encontrando-se divorciados desde 6 de Dezembro de 2011.
1.3. – Não obstante estes factos, o certo é que mantinha ilegitimamente na sua posse uma chave da supra citada caixa do correio.
1.4. – Porque esta estava fechada à chave, o arguido para a sua abertura utilizou a chave supra indicada, e retirou do seu interior o vale de correio n.º 265579, no montante de €246,38 (duzentos e quarenta e seis euros e trinta e oito cêntimos), endereçado a Maria E., fazendo do mesmo coisa sua.
1.5. – Na posse do vale de correio assim obtido, o arguido propôs-se obter a quantia naquele constante, que sabia não lhe ser devida.
1.6. – Para o efeito, no verso do vale postal, o arguido escreveu o nome da sua destinatária, Maria E. e no espaço destinado ao segundo titular assinou o seu nome, e escreveu o seu número de bilhete de identidade, o que fez com o desconhecimento e contra a vontade daquela, por forma a fazer crer que a destinatária do vale de correio em questão havia autorizado o arguido a proceder ao levantamento da quantia nele titulada.
1.7. – Com o vale assim preenchido, nos primeiros dias do mês de Setembro de 2012, o arguido deslocou-se ao estabelecimento comercial de comércio a retalho, “Mercearia…”, sito em A…, Arcos de Valdevez, que também funciona como posto de correio dos CTT, Correios de Portugal, S.A..
1.8. – Ali, o arguido exibiu a Maria M, que o atendeu, o vale postal com vale de correio n.º 265579, criando nesta a convicção de que ele era o seu legítimo portador.
1.9. – Com efeito, por forma a melhor convencer ao citada Maria M. da sua legitimidade, o arguido exibiu perante aquela o Bilhete de Identidade de que era titular.
1.10. – Assim, e na convicção de que o arguido era efectivamente o legítimo portador daquele vale de correio, a referida Maria M. entregou ao arguido a quantia de € 246,38 (duzentos e quarenta e seis euros e trinta e oito cêntimos). 1.11. – Pela forma supra descrita, o arguido apoderou-se da quantia de €246,38 (duzentos e quarenta e seis euros e trinta e oito cêntimos), causando à destinatária do vale de correio em questão o inerente prejuízo.
1.12. – O arguido bem sabia que o aludido vale de correio lhe não pertencia e que ao dele se apoderar, fazendo-o seu, actuava contra a vontade da sua legítima dona, e que para a abertura do caixa onde o mesmo se encontrava utilizou uma chave que, naquela ocasião, não lhe era permitido possuir.
1.13. – O arguido Carlos A. ao apor no vale de correio referido o nome “Maria E.”, quis fazer constar, dele, como fez, uma assinatura que sabia não ser sua.
1.14. – Mais sabia que ao assiná-lo e preenchê-lo pela forma descrita, colocava em crise a confiança e a credibilidade que tais títulos merecem no tráfego comercial e que a sua conduta era idónea a que terceiros o reputassem como adequado meio de pagamento ou saque, como viria a suceder.
1.15. – Auferiu um benefício pecuniário de €246,38 (duzentos e quarenta e seis euros e trinta e oito cêntimos), a que sabia não ter direito, causando a Maria E. um prejuízo de montante equivalente.
1.16. – Pelo modo supra descrito, o arguido pretendeu e conseguiu que Maria M., a exercer funções por conta dos CTT, Correios de Portugal, S.A., acreditasse que o vale de correio em causa tinha sido emitido pela sua legitima proprietária e, por isso, aceitasse pagar o montante nele titulado, o que nunca teria feito caso soubesse que o mesmo era utilizado contra a vontade da sua dona.
1.17. – Acresce que, com a actuação descrita, o arguido causou um prejuízo ao Estado - para este o prejuízo referente à credibilidade e fé pública de que os...
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