Acórdão nº 1449/11.9TJVNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelISABEL ROCHA
Data da Resolução08 de Outubro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes da 1.ª secção do Tribunal da Relação de Guimarães.

RELATÓRIO AA…, identificado nos autos, instaurou a presente acção contra Companhia de Seguros BB…, S.A, Associação Desportiva CC e Associação de Futebol de DD, Instituição de Utilidade Pública, filiada na Federação Portuguesa de Futebol, Pessoa Colectiva, pedindo: a condenação da primeira Ré seguradora, a pagar ao Autora título de indemnização, pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, a quantia de 15.501,00€, acrescida dos juros de mora a contar desde a citação, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento; a condenação das segunda e terceira Ré, caso se entenda que existe litisconsórcio e/ou que as II e III Rés são responsáveis ou co-responsáveis, por si e/ou juntamente com a I Ré, pelas consequências do sinistro; Serem as II e III Rés condenadas, sem prejuízo do pedido em I, a pagar ao A., a título solidário, a indemnização, pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, na quantia de 15.501,00€, acrescida dos juros de mora a contar desde a citação, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento,tudo nos termos e com os fundamentos constantes da petição inicial, que aqui se dão por reproduzidos.

Contestaram as Rés concluindo pela sua absolvição do pedido, impugnando parcialmente os factos articulados pelo A., defendendo-se ainda as Rés Associação Desportiva CC e Associação de Futebol de DD, por excepção, invocando a sua ilegitimidade passiva.

Respondeu o A. concluindo como na petição inicial.

Foi proferido despacho saneador que, depois de afirmar a validade e regularidade da instância, e de julgar improcedente a invocada excepção da ilegitimidade passiva, dispensou a organização da matéria de facto assente e a elaboração da base instrutória.

Realizada a audiência de julgamento, foram proferidas a decisão sobre a matéria de facto e a sentença, decidindo-se, a final, “a) absolver-se a 3ª. Ré Associação de Futebol de DD do pedido.

  1. Condenar-se a 2ª. Ré Associação Desportiva CC, a pagar ao A. a quantia global de € 7.301,90, acrescida dos respectivos juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento; c) Condenar-se a Ré Companhia de Seguros BB, SA.“Companhia de Seguros EE, S. A.” a pagar ao A., solidariamente com a 2ª. Ré, a quantia de €801,90, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento, já que as demais quantias referidas em b) não se mostrem abrangidos nos limites e condições constantes da respectiva apólice.

  2. Absolverem-se as 2ª. e 3ª. Rés do demais peticionado.

    Inconformados, o Autor e a Ré Associação Desportiva CCapelaram da sentença, Das alegações de recurso do Autor extraíram-se as seguintes conclusões: 1 Salvo o devido respeito por melhor opinião, o recorrente não pode deixar de discordar do enquadramento jurídico dada pela douta sentença, devendo-se extrair das normas jurídicas aplicáveis, in casu, interpretação diversa, nomeadamente quanto à consequência que da deriva.

    2 Face à matéria de facto considerada provada, não subsistem dúvidas de que o acidente e causa correspondeu a um acidente desportivo, inerente à actividade desportiva do recorrente enquanto futebolista amador da II Ré, causando danos que “… foram consequência directa sobrevieram exclusivamente em consequência do acidente supra descrito…”, actividade sujeita ao seguro desportivo obrigatório, previsto no Decreto-Lei n.º 10/2009, de 12 de Janeiro, e à data dos factos, regulado pelo Decreto-Lei n.º 146/93, de 26 de Abril.

    3 Face à natureza obrigatória e imperativa deste tipo de contrato, não podem admitir-se as limitações constantes da douta sentença nas coberturas abrangidas, mormente, incapacidade permanente parcial, danos não patrimoniais e incapacidade temporária, prejudicando-se, de forma flagrante, a vítima do acidente, in casu, o apelante.

    4 O art.º 4º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 146/93, de 26 de Abril estabelece as coberturas mínimas abrangidas pelo seguro desportivo de grupo, pelo que, como se refere no douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 8 de Setembro de 2009 (processo n.º 165/06.8TBGVA.C1), disponível em www.dgsi.pt, “sendo obrigatória, no mínimo, a cobertura da invalidez permanente parcial, essa obrigação se refere a toda e qualquer incapacidade permanente parcial (IPP), e não só à que seja igual ou supere os 10% de incapacidade.” 5 Por conseguinte, qualquer cláusula contratual inserta no texto de um contrato que limite a cobertura de uma incapacidade permanente parcial igual ou superior a 10%, como sucede no presente caso, é ferida de nulidade, nos termos do disposto no art.º 294º do Código Civil, por se tratar de um negócio celebrado contra disposição legal de carácter imperativo, que não pode ser afastado pelas partes, nem mesmo ao abrigo do princípio da liberdade contratual ínsito no art.º 405º do Código Civil.

    6 A primazia do regime imperativo legal implica a integração automática do seu regime no clausulado do contrato (primazia da ideia de conservação do negócio), o que determina o afastamento da limitação inadmissível da cobertura apenas aos graus de invalidez permanente superiores a 10%.

    7 No que respeita aos danos morais ou danos não patrimoniais – como os qualificou o A. –, refira-se que a inexistência de uma cláusula que os preveja expressamente no contrato de seguro não permite concluir, sem mais, pela sua exclusão, porquanto, o contrato, ao nã qualificar a natureza do dano indemnizável não exclui que o dano a cobrir seja de natureza não patrimonial, nem o citado DL 146/93, no seu art.º 4.º n.º 1, al. a) contém qualquer restrição aos danos patrimoniais resultantes do sinistro, nem o diploma, no seu todo, estipula qualquer exclusão de danos não patrimoniais.

    8 A inexistência de uma cláusula, num contrato referido à obrigação de segurar emergente do DL 146/93, que contenha uma expressa exclusão da cobertura de danos não patrimoniais, deve ser entendida, de acordo com a regra dúbio contra stipulatorum, própria da interpretação de um contrato de seguro, abrangendo o conteúdo indemnizatório mais amplo e, consequentemente, como cobertura deste tipo de danos.

    9 A argumentação aqui expendida vale igualmente quanto à obrigação de pagamento da indemnização a título de incapacidade temporária absoluta (vide ponto 33 dos factos provados), a cargo da seguradora, I Ré: é irrelevante que o contrato não preveja essa cobertura, atento o regime imperativo decorrente do DL 146/93, não resulta qualquer exclusão do ressarcimento de tais danos do teor do texto da alínea a) do n.º 1 do art.º 4º, montante esse que, conforme alegado na petição inicial, tendo como referência, o valor próximo do salário mínimo nacional, ascende a € 1.700,00.

    10 A douta sentença, violou, entre outros, e além das disposições citadas, o regime jurídico imperativo previsto no DL 146/93, de 26 de Abril, aplicável in casu, nomeadamente o seu art.º 4º, resultando, da sua aplicação, e por força da existência do contrato de seguro celebrado entre as I e III RR., a responsabilidade da I Ré, seguradora, em primeira linha, a pagar ao A., aqui apelante, as importâncias fixadas na douta sentença a título de danos patrimoniais, no valor de € 5.000,00 – aqui se incluindo a IPP e ITA, que deverá fixar-se em € 1.700,00 –, despesas de deslocação para tratamentos, no montante de € 801,90, e danos não patrimoniais, no valor de € 1500,00, acrescida dos respectivos juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento.

    11 Sem prescindir, caso se entenda que a cláusula de exclusão de indemnização no caso de incapacidade permanente parcial inferior a 10% é válida, o que se concebe apenas por mera cautela, sempre se dirá que a III Ré, Associação de Futebol de Braga, nunca poderia ser desresponsabilizada pois, por força do disposto no art.º 10º do referido DL n.º 146/93, a III Ré, porque permitiu a inscrição de agente desportivo que não ficou abrangido por seguro desportivo obrigatório no que respeita a incapacidades permanentes iguais ou inferiores a 10%, deve responder “nos mesmos termos em que responderia a empresa seguradora caso houvesse seguro”, ou seja, nunca poderia ser afastada a responsabilidade da III Ré, por força da inobservância do dever de contratar legalmente imposto, respondendo como se fosse a seguradora pelo sinistro em causa.

    Termos em que, sempre com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, revogando-se a sentença recorrida, e consequentemente ser a I Ré condenada em conformidade com o alegado, e subsidiariamente, caso se entenda que as limitações às coberturas são válidas, as II e III RR.

    Por sua vez, a Ré Associação Desportiva Ninense conclui as suas alegações nos seguintes termos: 1. Em face da matéria de facto dada como provada tem a aqui recorrente como certoque, no caso em apreço, se impunha e impõe de forma manifesta a condenação da RéSeguradora e, por conseguinte, a absolvição da aqui apelante, por força da referidatransferência de responsabilidade com a celebração do contrato de seguro obrigatório.

    1. À data do referido acidente, o Autor, atleta da aqui recorrente, estava abrangido porum Seguro de Acidentes Pessoais de Futebol Amador, cuja responsabilidade por danoscausados ao Autor foi transferida para a “Companhia de Seguros Tranquilidade, S.A.”, queaceitou essa transferência de responsabilidade (cfr. itens 57 e 58 dos factos provados).

    2. Está aqui em causa um contrato de seguro previsto e regulado pelo DL n.º 146/93, de26 de Abril, de natureza obrigatória para todos os agentes desportivos inscritos emfederações dotadas de utilidade pública...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT