Acórdão nº 924/13.5TBVVD-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelHELENA MELO
Data da Resolução15 de Janeiro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães: I - Relatório A... CRL, credora reclamante nos autos em que é insolvente M..., notificada da sentença de graduação de créditos, não se conformando com a mesma veio interpor recurso.

A sentença recorrida (rectificada por despacho de fls 244) homologou a lista de créditos reconhecidos elaborada pela sra. administradora da insolvência e graduou os créditos reclamados, no que ao presente recurso interessa, sobre a insolvente do seguinte modo: “Considerando os princípios atrás expostos procede-se ao pagamento dos créditos, através do produto da massa insolvente, pela seguinte forma: 1) Quanto aos bens imóveis descritos sob as verbas n.ºs 1 a 7 do auto de apreensão: 1.º- dar-se-á pagamento ao crédito da Segurança Social, na parte relevada como privilegiada, no montante de € 4.510,11; 2º- dar-se-á pagamento aos créditos de M...e P..., tidos como privilegiados; 3º - dar-se-á pagamento ao crédito da Caixa ... CRL, na parte correspondente à garantia por hipoteca, no valor de € 153.174,14; 4º- do remanescente, dar-se-á pagamento os créditos comuns; 5º do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados.” A apelante apresentou as seguintes conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida em 05/03/2014, apenas na parte referente à graduação e pagamento dos créditos de que goza de garantia real.

  1. Salvo o devido respeito por melhor opinião, considera a Recorrente que da análise dos elementos constantes dos presentes autos, impunha-se decisão diversa, por parte do Tribunal a quo sobre a graduação dos créditos reconhecidos, mormente salvaguardando-se expressamente a posição da aqui Recorrente (credora garantida).

  2. Todavia, e porque a questão aqui em discussão, poderá ser facilmente resolvida por meio de Reforma, por recurso ao expediente previsto no nº1 do artigo 614º e no nº 2 do artigo 616º do CPC, importará, antes de mais, formular requerimento nesse sentido, passando, num segundo momento, à apreciação das questões que levaram à interposição do presente recurso.

  3. No caso em apreço, existe um manifesto lapso, na medida em que a sentença se refere à entidade “Caixa Geral ...” quando, claramente, o crédito ali referenciado, na parte correspondente à garantia por hipoteca, no valor de 153.174,14€, corresponde ao crédito da ora recorrente Caixa ...CRL.

  4. Tratando-se, como efectivamente se trata de evidente lapso, solicita a Recorrente que seja proferido despacho, nos termos do nº1 do artigo 614º do CPC, corrigindo o manifesto lapso existente na sentença de graduação de créditos e, em consequência, passando a constar a designação da recorrente em vez da Caixa Geral ....

  5. Acresce que também só por lapso se concebe que a decisão em crise, reconhecendo o crédito da reclamante como garantido, deixe de o graduar em primeiro lugar, em detrimento da Segurança Social e dos Trabalhadores (assim por esta ordem).

  6. Tratando-se, como efectivamente se trata, de outro evidente lapso ou erro, solicita a Recorrente que seja proferido despacho, nos termos do nº 2 do artigo 616º do CPC, corrigindo tal lapso ou erro na sentença de graduação de créditos e, em consequência, que o crédito hipotecário reclamado pela recorrente seja graduado em primeiro lugar.

    Caso assim não se entenda, mas sem prescindir, 8. Na sua fundamentação a sentença recorrida não faz qualquer referência sobre quais dos imóveis apreendidos nos autos sobre os quais considerou como tendo sido local de trabalho dos trabalhadores M... e P....

  7. Determinando a lei como pressuposto exigível para o reconhecimento dessa qualidade (crédito privilegiado), impunha-se que esta questão tivesse sido alegada, provada e decidida, o que não aconteceu ou, a ter acontecido, não resulta da decisão.

  8. A falta de especificação dos fundamentos de direito e de facto justificativos da decisão é causa de nulidade da sentença, nos termos do disposto no artigo 615º nº 1 alínea b) do Código de Processo Civil, o que expressamente se invoca para todos os efeitos legais.

  9. Não obstante o crédito da reclamante, ora recorrente, estar garantido por hipoteca, reconhecido pela senhora Administradora, sobre os imóveis identificados nas verbas nº 1 a 7 do auto de apreensão até ao montante máximo assegurado de 153.174,14€, o Tribunal a quo consignou, no tocante ao pagamento pelo produto da venda daqueles imóveis, que fosse satisfeito em 1º lugar o crédito privilegiado da Segurança Social; em 2º lugar os créditos privilegiados dos trabalhadores e só depois o crédito da ora recorrente, o que se não pode aceitar.

  10. Cremos que é pacífico afirmar que o crédito da Recorrente, na parte relativa a 153.174,14€, cabe na previsão da alínea a), do nº 4 do artigo 47º do CIRE.

  11. Previsão legal onde se definem os créditos "garantidos" e "privilegiados" como sendo "os créditos que beneficiem, respectivamente, de garantias reais, incluindo os privilégios creditórios especiais, e de privilégios creditórios gerais sobre bens integrantes da massa insolvente, até ao montante correspondente ao valor dos bens objecto das garantias ou dos privilégios gerais, tendo em conta as eventuais onerações prevalecentes".

  12. Cumpre, então, relembrar que nos termos do artigo 686º, nº 1, do Código Civil: “a hipoteca confere ao credor o direito de ser papo pelo valor de certas coisas imóveis, ou equiparadas, pertencentes ao devedor ou a terceiro com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo".

  13. Por seu turno, os créditos reclamados pelo Instituto da Segurança Social beneficiam de privilégio imobiliário geral decorrente do disposto no artigo 205º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, onde o legislador consagrou que: "Os créditos da segurança social por contribuições, quotizações e respectivos juros de mora gozam de privilégio imobiliário sobre os bens imóveis existentes no património do contribuinte à data da instauração do processo executivo, graduando-se logo após os créditos referidos no artigo 748º do Código Civil'.

  14. Estando o crédito da Recorrente garantido por hipoteca, impunha-se ao Tribunal o dever de graduá-lo à frente do crédito privilegiado da Segurança Social, na senda do disposto no n.º1, do artigo 749º do CC.

  15. Ao não graduar o crédito da Recorrente, nos moldes indicados, o Tribunal a quo agiu, pois, ao arrepio do disposto no nº 1 do artigo 749º do CC, do n.º1 do artigo 686º do CC e da alínea a), do nº 4 do artigo 47º do CIRE, devendo, por isso, ser substituída a decisão recorrida por decisão que gradue o crédito da Recorrente à frente do crédito da Segurança Social.

  16. E o mesmo se diga no que se refere aos créditos de M...e P..., uma vez que não foi cumprido o ónus de alegação e prova, que sobre aqueles credores impendia, quanto imóvel ou imóveis afectos ao exercício da actividade da insolvente e nos quais os referidos credores prestavam a sua actividade.

  17. Neste particular, importa salientar que o legislador empregou o verbo no presente (presta), não deixando quaisquer dúvidas de que o trabalhador tem forçosamente que estar ao serviço do empregador na data da declaração de insolvência do mesmo.

  18. O privilégio imobiliário especial só pode ser reconhecido ao trabalhador que preste a sua actividade no imóvel do empregador, à data da declaração de insolvência do mesmo.

  19. Este privilégio exige claramente dois requisitos: um, que o trabalhador esteja a exercer funções à data da insolvência; dois, que exerça essas funções no imóvel do empregador.

  20. E não sendo cumprido tal ónus, não poderão beneficiar de privilégio imobiliário especial, sobre todos os imóveis da insolvente, como foi decidido na Sentença de que se recorre.

  21. Pois que, manifestamente, tal não é o alcance que o legislador pretendeu atribuir ao conceito de “local do exercício de actividade”, sob pena de nos conduzir aos mais total e completo absurdo.

  22. ...

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