Acórdão nº 4732/07.4TBBCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Fevereiro de 2015
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 19 de Fevereiro de 2015 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os Juízes na 2ª Secção CÍVEL Do Tribunal da Relação de Guimarães * 1. Relatório.
M.. e I.., casados, residentes em Chavão, Barcelos, intentaram acção declarativa de condenação, sob a forma de processo Ordinário, contra A.. e mulher, M.., residentes em Grimancelos, Barcelos, e V.., M.., residentes em Grimancelos, pedindo que sejam os RR condenados a : a) reconhecer que os AA. são os proprietários de prédio que identificam no artº 1º da petição, e com configuração e limites que assinalam em concreta planta; b) rectificar a descrição dos prédios dos RR. no que tange a confrontações do lado norte, de forma a que fique a constar localizarem-se eles na freguesia de Chavão; c) restituir aos AA. a posse de parcela de terreno que identificam e que integra o respectivo prédio, devendo os RR absterem-se de perturbar a mesma ou o direito de propriedade dos AA. sobre a mesma; d) indemnizar os AA. em quantia não inferior a 2.200 Euros, bem como em montante mensal de 100 Euros até efectiva entrega da parcela referida em c); e) indemnizar os AA em danos morais a quantificar em liquidação de sentença.
Para tanto , alegaram os AA. , em síntese, que : - São os proprietários e possuidores de prédio que identificam na petição, o qual integra concreta faixa de terreno, sendo que este última sempre foi usufruída pelos AA e ante possuidores, dela se servindo para entrar e sair da sua propriedade; - Sucede que, sendo os RR os proprietários de prédio que confronta com o dos AA, vêem utilizando pelo menos desde meados de 2005 e abusivamente a referida faixa de terreno, tendo inclusive nela iniciado a construção de um muro, o que fizeram com a intenção de se apoderarem da referida parcela de terreno; - Ora, em razão do comportamento dos RR, outra alternativa não resta aos AA, senão recorrer aos tribunais, e com o desiderato de conseguirem a restituição da parcela de terreno referida, devendo os RR. ser condenados a absterem-se de qualquer acto de turbação da posse e/ou propriedade dos AA.
1.1.- Os RR, após citação, contestaram todos, essencialmente por impugnação motivada, e deduziram ainda pedido reconvencional, peticionando a condenação dos AA a reconhecer que a parcela de terreno em disputa constitui o leito de um caminho público, ou seja , não integra o prédio dos AA.
1.2.- Seguindo-se a Réplica, foi dispensada a realização da audiência preliminar e elaborado o despacho saneador, tabelar, tendo-se ainda fixado a matéria de facto ( assente e controvertida ) e não tendo qualquer das referidas peças sido objecto de reclamações.
1.3.- Finalmente, realizada que foi a audiência de discussão e julgamento [ que teve inicio a 13/11/2013 ], veio a 17/12/2013 a proferir-se a decisão sobre a matéria de facto , e , conclusos os autos para o efeito, proferiu o tribunal a quo a competente sentença, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor : “ (…) DECISÃO Pelo exposto, decide-se julgar : a) a acção totalmente improcedente, por não provada, pelo que se absolvem os RR. do peticionado; b) a reconvenção totalmente procedente, por provada, pelo que se declara que o caminho a que se alude em AA) a JJ) é do domínio público, condenando-se, ainda, os AA. / reconvindos no seu reconhecimento; c) Condenam-se AA./reconvindos nas custas da acção e da reconvenção.
Registe e notifique.
Barcelos, 24/06/2014.” 1.4.- Porque inconformados com a sentença proferida, da mesma interpuseram então os AA a competente apelação, tendo nela aduzido as seguintes conclusões :
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Os Apelantes/Autores não concordam ainda com a improcedência total da acção e da procedência do pedido reconvencional que declarou que a parcela de terreno, objecto de discussão, constitui o leito de um caminho público e que os condenou a reconhecer a natureza pública do referido caminho.
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Os AA. não concordam com a decisão do tribunal "a quo" que entende que os mesmos não lograram fazer prova dos limites do seu prédio, assim como não provaram que o caminho em causa nos presentes autos fazia parte integrante do mesmo.
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Existe omissão de pronúncia quanto à não especificação, extensão e características da dominialidade pública do caminho em discussão.
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Não consta da sentença qual é o limite do caminho público, pelo que é nula tal sentença nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 668° do C.P.Civil.
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Salvo o devido e merecido respeito, entendem os Autores que tal pedido de declaração de que o caminho em discussão é público não deveria proceder.
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Salvo ainda, o devido respeito pela posição sufragada na douta sentença ora em crise, entende-se que a mesma padece ainda de outros vícios, porquanto, para além de proceder a um incorrecto julgamento da matéria de facto, e ao mesmo tempo não extrair de forma correcta as consequências jurídicas da matéria de facto apurada no decurso da audiência de julgamento, padece de falta de fundamentação e não conhece de questões essenciais que devia conhecer.
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O Tribunal "a quo" não fez uma correcta apreciação da prova e dos factos provados, violando o dever de analisar de forma crítica toda a prova produzida a que está obrigado conforme o disposto no artº 607°, nº 4 do CPC.
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O Tribunal não se debruçou sobre a maior parte da prova produzida, designadamente os documentos juntos, escrituras, descrições prediais, plantas de toponímia e fotografias do local.
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Baseou a sua decisão num documento, uma declaração emitida pela Junta de Freguesia de Grimancelos, a qual atesta que o caminho sofreu uma intervenção de obras públicas numa extensão de aproximadamente seis metros.
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A sentença não reconhece, nem se debruça sobre o possível erro na declaração do Presidente da Junta de Grimancelos e que a ser verdade dá um desfecho completamente diferente à questão.
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Do mesmo modo que não se pronuncia sobre o possível erro existente na Planta de Toponímia da freguesia de Chavão L) A inspecção judicial ao local foi feita de forma deficiente e não permitiu ao Tribunal percepcionar a configuração do local.
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O meritíssimo juiz a quo e, com todo o devido respeito, deveria ter percorrido todo o caminho que se discute nos autos e, assim constatar que o mesmo não desemboca em nenhuma estrada municipal, conforme ficou provado.
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Não podem os Apelantes concordar com a posição do Sr. Juiz recorrido em desconsiderar em absoluto os depoimentos das testemunhas arroladas pelos AA., tanto que as justificações aduzidas para o efeito (o decurso do tempo e a possível confusão por ele provocada) não são minimamente aceitáveis.
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Os depoimentos dessas testemunhas arroladas pelos AA. revelaram-se isentos, coerentes e espontâneos e para além de se basearem nas mais válidas e sólidas razões de ciência, foram prestadas de forma clara, firme, serena e desinteressada, em termos de deverem merecer toda a credibilidade.
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Bem diferentes foram os depoimentos de duas testemunhas arroladas pelos RR. e que foram valoradas pelo Mmº Juiz a quo, desde logo porque são familiares dos RR., depuseram de forma também muito menos isenta, segura e coerente.
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Além de que pelo repentismo e coincidência de muitas das suas respostas, justificam muitas e as mais sérias dúvidas quanto à sua verdade e isenção podendo até admitir-se terem resultado de uma preparação e concertação prévias.
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De tal matéria de facto apurada, resulta de forma clara e inequívoca que os AA. são donos e legítimos proprietários de um prédio urbano sito na Rua da Aldeia Nova, da freguesia de Chavão, concelho de Barcelos, que confronta a norte com J.., a sul com caminho de servidão, a nascente com caminho vicinal e a poente com M.., inscrito na matriz predial rústica da freguesia de Chavão sob o artigo...
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Tal prédio adveio à posse dos AA. por o terem comprado a J.., por escritura pública de compra e venda, realizada em 5 de Abril de 1984, no qual se localiza um leito de um caminho que sempre foi utilizado pelos AA. e pelos proprietários vizinhos dos dois prédios encravados.
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Mais ficou provado que os AA. detêm e usufruem deste prédio há mais de 40 anos, por si e ante possuidores, sem interrupção temporal, nele fazendo obras de construção, conservação e melhoramentos, sem oposição de quem quer que seja, sem lesar interesses e direitos de outrem e com conhecimento dos Réus, com ânimo de quem exerce direitos próprios, no próprio nome e na convicção de fazer seu tal prédio, à vista de toda a gente, por forma a que tais actos possam ser conhecidos de todos.
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Ficou ainda provado que os Réus nunca tiveram direito de passagem sobre o prédio dos AA. para acederem ao seu prédio e que a entrada para o prédio dos RR. faz-se e sempre se fez por um caminho público que, passa a nascente do prédio dos AA.
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Consultada a escritura de aquisição do terreno dos RR, verifica-se que no que toca às confrontações do lado sul a propriedade confinava com A.. e nunca com caminho (público ou privado).
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A testemunha A.. afirma peremptoriamente que existia um caminho de servidão a favor dos dois prédios rústicos, que esse caminho não confrontava com a propriedade dos Réus e que só desde a construção da habitação do A. é que foi estabelecido um novo traçado para o direito de passagem para os dois prédios encravados.
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Se o A. não tivesse a convicção de que o caminho é de servidão por que razão e com que poder iria o A. alterar o traçado de um caminho público? Sem a Junta de Freguesia intervir? Y) Esta testemunha, que não é familiar de nenhuma das partes, passou grande parte da sua juventude nesse local teve conhecimento directo e ocular das características do prédio, tendo prestado um depoimento baseado em intervenção e conhecimento directo das situações sobre que versou.
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Ficou amplamente provado também através deste testemunho que o muro que actualmente delimita o caminho em discussão foi construído pelo A. marido uma vez que o seu prédio, e só a determinado momento, tem uma inclinação.
A
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Num prédio localizado a oeste do prédio dos AA., propriedade do pai da A. mulher, existiu um paiol, explorado pela família dos AA. e, portanto, é natural...
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