Acórdão nº 2394/11.3TBVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelHELENA MELO
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães: I - Relatório AA… intentou acção declarativa de condenação, com processo comum ordinário, contra BB, Unipessoal, Ldª.

Em síntese, alegou que, como promitente-comprador, celebrou com a R., na qualidade de promitente-vendedora, um contrato-promessa de compra e venda de um imóvel propriedade desta, tendo-lhe entregue a quantia de € 57.000,00 a título de sinal. Porque a R. incumpriu definitivamente o acordo, não tendo até hoje celebrado o contrato definitivo, pede que se declare resolvido o contrato-promessa e a R. condenada a restituir-lhe o dobro do sinal entregue, mais juros; subsidiariamente, pede que se declare resolvida o contrato-promessa e, bem assim, a condenação da R. a restituir-lhe o sinal entregue, mais juros.

Contestou a R., impugnando os factos descritos na p.i. e afirmando que nem todos os promitentes-compradores lhe comunicaram o agendamento do dia, hora e local para a celebração do contrato definitivo, além de que a não outorga desse contrato definitivo foi acordada entre todos os contraentes em virtude do imóvel objecto da promessa ter sido entretanto expropriado.

O A. replicou, mantendo a versão adiantada na p.i.

Procedeu-se a julgamento e a final foi proferida sentença que julgou a acção procedente e, em consequência: a) declarou resolvido o contrato-promessa indicado no ponto 2 dos Factos desta decisão; b) condenou a R. a pagar ao A. a quantia de € 114.000,00 (cento e catorze mil euros (€ 57.000,00 x 2), acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento, à taxa de 4% (Portaria 291/03, de 8Abr).

A R. não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, onde formulou as seguintes conclusões: 1ª- A folhas 108, entre outros quesitos na base instrutória existe o quesito 3º, no qual se pergunta: Em 14 de Novembro de 2009, o Autor entregou ainda à sociedade Ré, em numerário, a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia de 35.000,00€ (trinta e cinco mil euros)? 2ª- É que, a Ré na sua contestação, alegou que esse dinheiro foi emprestado pelo A. a … Viana, a título individual, tendo-se por isso celebrado entre ele e o A. um comodato.

  1. - Para prova do facto descrito no quesito 3º da B.I., o A. não juntou documentos, oferendo apenas uma testemunha … Sousa, irmão do A., atendendo a que todas as outras nada sabiam acerca do facto.

  2. - O depoimento desta testemunha encontra-se gravado no sistema digital desde o Nº:00:00:01 ao 01:09:18, conforme consta a folhas 154.

  3. - No essencial, a propósito deste facto, tal testemunha declarou que tal importância foi entregue pelo A. seu irmão a título de sinal.

  4. - Ora este depoimento, só por si, e à falta de outras provas não se mostra suficiente para responder afirmativamente ao quesito 3º e negativamente ao quesito 19º.

  5. - Depois de feita a análise crítica deste único meio de prova, a resposta ao quesito 3º, devia ter sido a seguinte: “Não provado”.

  6. - Isto é, esses 35.000,00€ não fazem parte de qualquer sinal ou pagamento de preço constante da compra e venda descrita nos autos.

  7. - É que, segundo reza o contrato promessa, cada um dos quatro promitentes compradores, por conta do preço global, teria que pagar a proporção de 42.500,00€ (170.000,00€:4=42.500,00€).

  8. - Ora, pelas contas do A., com aqueles 35.000,00€ mais 22.000,00€ (20.000,00€+2.000,00€) já entregues, só os seus pagamentos ascenderiam a 57.000,00€.

  9. - Ou seja, o A. já tinha pago tudo o que lhe competia e ainda sobravam 14.500,00€ (57.000,00€-42.500,00€).

  10. - Não vem provado nos autos, salvo melhor opinião, e com todo o respeito, porque razão o A. tinha que entregar a mais 14.500,00€.

    13- Feita a análise crítica de tudo quanto resulta nos autos, salvo o devido respeito, ao responder ao quesito 3º da B.I., a resposta deveria ter sido: “Não Provado”.

  11. - Os factos vertidos nos quesitos 3º e 19º são os concretos factos que a recorrente considera incorrectamente julgados, por falta de outros meios probatórios além da testemunha.

  12. - O A. vem alegar que entregou a título de sinais à Ré, a quantia de 57.000,00€, e porque a Ré não cumpriu o contrato promessa, pede a sua resolução e restituição do dobro do sinal e juros.

  13. - Ora, verifica-se dos autos que a Ré como promitente vendedora e mais quatro compradores, onde se inclui o A., celebraram o contrato promessa dos autos, relativo ao artigo … rústico de Vila Nova de Anha, pelo preço global de 170.000,00€, a pagar da forma nele estipulada.

  14. - Mais se estipulou nesse contrato que a escritura pública de compra e venda, seria celebrada, salvo caso de força maior, dentro dos próximos 90 dias a contar da data do contrato, a designar pelos segundos outorgantes, neste caso os quatro promitentes compradores.

  15. - Ora, ao contrário do exarado na douta sentença recorrida, o comportamento da Ré não configura um verdadeiro incumprimento definitivo.

  16. - No nosso entender, e a propósito do que se alegou quanto à matéria de facto, só poderá estar assente que a Ré recebeu do A. a título e sinal 22.000,00€.

  17. - Acontece que, só cerca de três anos depois, é que, apenas dois compradores solicitaram a marcação dessa escritura para 25 de Fevereiro de 2010.

  18. - Tal facto denota que, os compradores consideravam esse negócio já falido, tendo-se desinteressado do mesmo.

  19. - A marcação e solicitação dessa escritura, apenas pelo A. e outro comprador, desacompanhada dos outros dois, é ilegítima e de nenhum efeito jurídico.

  20. - A Ré, não era obrigada a comparecer no Cartório Notarial na data designada apenas por esses dois compradores, pois assim estava impossibilitada de poder cumprir plenamente o contrato prometido.

  21. - Por isso, não podia nem devia comparecer, nem enviar quaisquer documentos para essa escritura.

  22. - A venda a José Neiva apenas se concretizou numa parte desse imóvel dado que a outra parte foi declarada para utilidade pública e por isso objecto de um processo de expropriação há muito tempo anunciado, conforme resulta abundantemente dos documentos juntos a estes autos e à providência cautelar.

  23. - Também por esta séria e grave razão, a Ré nunca poderia cumprir com o A. e com os restantes compradores.

  24. - Essa expropriação surge muito tempo depois do contrato promessa, e colocou a Ré na impossibilidade de cumprir.

  25. - Essa escritura teria de ser agendada pelo conjunto dos quatro compradores, conforme resulta do contrato.

  26. - Salvo o devido respeito, o A. e seu irmão, agiram dessa forma, sozinhos, com a nítida intenção de colocar a Ré em mora e incumprimento do contrato, o que não se aceita.

  27. - Os promitentes compradores, incluindo o A., se tivessem interesse real na compra desse imóvel, tinham marcado em conjunto essa escritura dentro do prazo limite absoluto de 90 dias.

  28. - Como nunca o fizeram, foram eles que deram mostras expressas de não terem interesse na compra do imóvel.

  29. - Daí que, dada factualidade apurada, nunca o A. poderia reclamar o dobro do sinal.

  30. - Por isso, tem todo o relevo a escritura não ter sido marcada nesses 90 dias.

  31. - Não é legítimo dois compradores três anos depois surpreenderem a Ré com essa marcação.

  32. - Tal marcação é abusiva atentando contra todos os princípios, os bons costumes, e o que é de senso comum.

  33. - Aquele prazo de 90 dias, tinha natureza de prazo limite absoluto.

  34. - Assume enorme relevo o facto de a escritura não ter sido marcada pelo conjunto dos quatro compradores.

  35. - Pois é essa a previsão do contrato.

  36. - Do mesmo modo a expropriação sempre inviabilizou o cumprimento do contrato na sua íntegra.

  37. - Por isso, a Ré não se colocou, por culpa sua em situação de mora ou incumprimento definitivo.

  38. - Todos os compradores, incluindo o A., viraram as costas à Ré, demonstrando ostensivamente não terem cumprido o contrato no prazo estipulado.

  39. - Por tudo o exposto, a Ré não entrou em mora ou em incumprimento definitivo culposo, pelo que não pode ser condenada a entregar o sinal em dobro.

  40. - Ao decidir em contrário, e salvo o devido respeito, o Meritíssimo Juiz a quo, violou por erro de interpretação e aplicação, as disposições contidas nos artigos 410º, 442º, 808º, 799º, 804º, 805º, e 441º do Código Civil.

    Termos em que, deve dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, substituindo-a por outra, que condene apenas a Ré a pagar o dito sinal em singelo, com o que se fará inteira JUSTIÇA.

    A parte contrária contra-alegou, tendo apresentado as seguintes conclusões: I – Questão prévia: Do efeito do recurso 1. A Recorrente “BB, Lda.” interpôs o presente recurso, atribuindo-lhe, erroneamente, efeito suspensivo, quando, tal como decorre do disposto no artigo 647.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, a apelação tem efeito meramente devolutivo, excepto nos casos previstos no seu n.º 2, os quais não se verificam no âmbito dos presentes autos e a Recorrente não requereu que a apelação tenha efeito suspensivo, designadamente invocando nos autos qualquer prejuízo e não se ofereceu para prestar caução (n.º 4 do citado artigo), sendo certo que apenas podia e devia fazê-lo em sede e momento próprio, ou seja, ao interpor o recurso, e não o fez, pelo que ao presente recurso não lhe poderá ser fixado outro efeito senão o meramente devolutivo – cfr. artigo 647.º, n.º 4 do Código Processo Civil.

    II – Das contra-alegações 2. O presente recurso de apelação foi interposto da douta sentença proferida pelo Mm.º Juiz “a quo”, a fls..dos autos, que julgou totalmente procedente, por provada, a presente acção e, em consequência, declarou resolvido o contrato de promessa celebrado em 26/03/2007 (identificado no ponto 2 da douta decisão em análise) e condenou a Recorrente a pagar ao Autor, aqui Recorrido, a quantia de €114.000,00 (cento e catorze mil euros = €57.000,00 x 2), acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento, à taxa de 4% (portaria 291/03, de 08 de Abril), sendo certo que ao decidir como decidiu, o Mm.º Juiz “a quo” fez uma correcta interpretação dos factos e adequada aplicação do...

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