Acórdão nº 640/11.2TBCMN-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelHEITOR GON
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: Processo 640/11.2TBCMN-C.G1.

I – RELATÓRIO.

  1. “AA, S.A.”, por apenso aos autos de insolvência de “BB S.A.”, impugna a resolução em benefício da massa do contrato-promessa que as duas sociedades celebraram em 10.01.2010, pedindo a declaração da nulidade do acto de resolução praticado pelo Administrador, quer por se tratar da prática dum acto legalmente impossível quer por falta de fundamentação, ou a sua revogação, pela não verificação dos fundamentos alegados pelo AI. na carta de resolução.

    Em síntese, alega que o contrato-promessa já se encontrava resolvido por sentença transitada em julgado, no processo 3946/10.4Tbgdm do 1.º Juízo do TJ de Gondomar (por via da qual os prédios se mantiveram na titularidade da promitente-vendedora e a insolvente foi condenada a pagar à A. o valor do sinal em dobro) e os prédios apreendidos para a massa insolvente, daí ser nulo e ineficaz. E que a carta de resolução apenas contém conclusões, omitindo os factos em que assenta a “dissimulação” do negócio, o prejuízo para os credores, a má-fé da autora e a relação especial entre as duas sociedades.

  2. A Massa Insolvente contestou, alegando no essencial e em síntese que o contrato-promessa foi celebrado dentro do período de dois anos anteriores ao início do processo de insolvência, que se tratou dum negócio simulado, na realidade gratuito, com intuito de prejudicar os credores, e que à data a impugnante sabia que insolvência estava iminente, concluindo pela validade da resolução nos termos dos artigos 120º e 121º, nº1-b, do CIRE.

  3. Após exarado despacho de selecção da matéria de facto, prosseguiram os autos até julgamento, culminando com a prolação da sentença de mérito, que nos termos das disposições legais dos artigos 120.º, nº 3 e 121.º nº 1-c) do CIRE, julgou improcedente a impugnação do ato de resolução, mantendo-se a plena validade e eficácia do ato de resolução em benefício da massa insolvente, com as demais consequências legais.

    II. A autora interpôs recurso, concluindo: A. "O AI fundamentou o ato de resolução no disposto nos artigos 120º nºs 1, 2, 4 e 5 al) b e 121º al) b) do CIRE, alegando essencialmente: a) tratar-se de um contrato gratuito "dissimulado" inexistindo movimento financeiro nas contas bancárias da insolvente; b) a má-fé da Autora, que conhecia, aquando do negócio que a promitente vendedora se encontrava em situação de insolvência ou de insolvência iminente; c) que a ora A. conhecia que, com o negócio, prejudicava terceiros, o qual punha em causa a satisfação dos credores da insolvência; d) haver ou ter havido relação especial, de grupo ou de domínio, entre as duas sociedades (Autora e insolvente); D. E a Exma. Sra. Juiz a quo acaba por concluir que "a resolução em benefício da massa, operada pelo AI é eficaz, pois que se verifica a previsão do artigo 120º nº3 do CIRE, por força da remissão para o disposto na alínea c) do artigo 121º nº1 do mesmo diploma, ainda que o AI assim não tenha interpretado a subsunção de tais factos à alínea c) do nº1, os factos verificam-se no caso, com diversa fundamentação" - fls 20 da sentença proferida.

    E. A declaração de resolução, efectuada pelo Administrador da Insolvência, deve indicar os concretos fundamentos invocados para legitimar o exercício desse direito potestativo, não podendo a deficiência de fundamentação da declaração de resolução ser suprida na contestação da respectiva acção de impugnação (Ac.S.T.J. de 17-9-2009, Proc. 307/09.1YFLSB, em www.dgsi.pt).

    F. Admitir esse suprimento, traduzir-se-ia na introdução de factualidade nova, em momento posterior ao exercício desse direito e que, por isso, não foi utilizada para fundamentar aquela declaração de resolução.

    G. Por igualdade de raciocínio se dirá que não poderá a Exma. Sra. Juiz julgar a resolução procedente com fundamentação distinta da constante na carta resolutiva, como foi claramente o caso.

    H. Como é sabido, a resolução de actos prejudiciais à massa insolvente pode ser impugnada pela contraparte no negócio resolvido, mediante acção a propor contra a massa insolvente, no prazo de seis meses, sob pena de caducidade, acção que correrá por apenso ao processo de insolvência.

    I. E salvo o reiterado respeito, não pode a aqui recorrente ter impugnado os factos e fundamentos constantes na carta e posteriormente ver a sua impugnação ser julgada improcedente por fundamentação diversa da constante na carta objeto da impugnação.

    J. A resolução só pode ser julgada eficaz pelos factos constantes da carta, sob pena de estarem a ser violados princípios constitucionalmente consagrados, como o princípio do contraditório e princípio da estabilidade jurídica.

    K. Com efeito, para poder exercer tal direito de impugnação, o impugnante tem de conhecer previamente quais são os factos fundamentais que contra ele são invocados.

    L. O AI alegou que o contrato objeto de resolução se tratava de um contrato gratuito, dissimulado inexistindo movimento financeiro nas contas bancárias da insolvente.

    M. No entanto foi dado como provado que a Autora, aqui recorrente, efetivamente pagou o sinal contratado no valor de 1.075.000,00€, veja-se os factos provados nºs 6 e 20 que constam da sentença.

    N. porquanto, é falso estarmos perante um negócio dissimulado gratuito.

    O. O AI alegou ainda que havia relação especial, de grupo ou de domínio, entre as duas sociedades.

    P. No entanto foi dado como provado que os órgãos sociais de um e outra sociedade, nomeadamente a administração, são totalmente distintos, sendo o administrador da aqui recorrente pessoa estranha à sociedade insolvente. (veja-se os factos provados com os nºs 7, 8 e 9).

    Q. Tendo inclusivamente a este propósito sido dado como não provado que nenhuma das duas sociedades foi criada com capital de que qualquer delas fosse direta ou indiretamente a única titular, que nenhuma das sociedades tem na outra participação maioritária de capital ou mais de metade dos votos ou qualquer direito ou possibilidade de designar órgãos de administração ou de fiscalizaçãoou que a Autora e a insolvente partilharam sede no mesmo local. (veja-se factos não provados a), b) e c)).

    R. porquanto, é falso que a sociedade aqui recorrente seja pessoa especialmente relacionada com a sociedade recorrida/insolvente, nos termos e para os efeitos do artigo 49.º, n.º 2 do CIRE.

    S. Alegou ainda o Sr. AI que, com o negócio em causa, a Autora/recorrente sabia que prejudicava terceiros, o qual punha em causa a satisfação dos credores da insolvência.

    T. Sucede que, na sentença ora em recurso, não só não é reconhecido que da celebração do contrato promessa tenha resultado qualquer prejuízo para os credores, como é inclusivamente mencionado pela Exma. Sra. Juiz a quo que se se tivesse celebrado o contrato prometido, a contrapartida do negócio pudesse ter sido "(...) apreendida nos autos ou empregue noutros bens suscetíveis de apreensão nos autos, ou pudesse proporcionar um aumento do activo, já que a BB com a concretização do negócio prometido obteria o montante correspondente ao valor do negócio, que no caso correspondia a 1.300.000,00€." - fls 18 da sentença proferida.

    U. donde, nem o Sr. AI logrou demonstrar e provar o requisito da prejudicialidade do ato objeto de resolução como ainda a Mm. Sra. Dra. Juiz deu como não provado o requisito da prejudicialidade.

    V. Por fim, alegou ainda o AI que a Autora/recorrente conhecia a situação de insolvência ou insolvência iminente da ora insolvente à data da celebração do negócio.

    W. Porém, certo é que, uma vez mais, o Sr. AI não logrou demonstrar nem provar o requisito da má fé.

    X. Na verdade, não obstante o ato jurídico objeto de resolução se ter realizado dentro do período de suspeição (4 anos), certo é que a recorrida para beneficiar da presunção da má fé, prevista e estatuído no n.º 4 do artigo 120.º do CIRE, carecia de ter demonstrado e provado a existência de uma especial...

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