Acórdão nº 254/12.0TUGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelALDA MARTINS
Data da Resolução24 de Setembro de 2015
EmissorTribunal da Relação de Guimarães
  1. Relatório A…, patrocinado pelo Ministério Público, intentou acção declarativa de condenação, com processo especial emergente de acidente de trabalho, contra … - Companhia de Seguros, S.p.A., alegando, em síntese, ter sofrido um acidente de viação quando se deslocava da sua residência para as instalações da empregadora e em resultado do qual sofreu incapacidade para o trabalho, quer temporária quer permanente, sendo esta superior à fixada na perícia singular, tendo suportado despesas nas deslocações a tribunal. A empregadora havia celebrado com a R. seguradora um contrato de seguro de acidentes de trabalho relativamente a si e em função da totalidade da sua retribuição.

    Termina, pedindo a condenação da R. a pagar-lhe: - a pensão que vier a ser fixada na sequência da perícia por junta médica; - a indemnização no valor de € 4.041,48; - a despesa com transportes no valor de € 17; - e os juros de mora.

    A R. contestou, negando a caracterização do acidente como sendo de trabalho, por ter ocorrido em situação de suspensão do contrato de trabalho por doença natural do trabalhador e após uma interrupção do trajecto entre a casa do mesmo e as instalações da empregadora, na sequência dum desvio motivado por razões pessoais.

    Concluiu, pedindo a improcedência da acção.

    O Instituto de Solidariedade e Segurança Social – Centro Distrital do Porto, I.P. veio deduzir contra a R. um pedido de reembolso da quantia de € 1.555,64, paga ao A. a título de subsídio de doença no período de 26/11/2011 a 31/12/2011, em que este esteve incapacitado por causa do acidente de trabalho a que se reportam estes autos. Mais pediu que tal quantia seja acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efectivo pagamento.

    Foi proferido despacho saneador, com fixação dos factos assentes e dos controvertidos.

    Realizou-se a audiência de julgamento, após o que pela Mma. Juíza foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, julgo a presente acção provada e procedente nos termos sobreditos e, em consequência: I – Condeno a ré, “… - Companhia de Seguros, SpA”, a pagar ao autor, A…: - o capital de remição da pensão anual vitalícia de € 404,15 com início no dia 13/3/2012; - a indemnização no valor de € 2.485,84 (já deduzido o valor do subsídio de doença que o autor recebera da Segurança Social); - a despesa de transportes no valor de € 17; - e os juros de mora, à taxa legal, sobre todas essas quantias pecuniárias.

    II – Condeno a ré, “… - Companhia de Seguros, SpA”, a reembolsar o Instituto da Segurança Social – Centro Distrital do Porto, I.P. da quantia de € 1.555,64 que este pagou ao autor/sinistrado a título de subsídio de doença e prestações compensatórias de subsídio de Natal durante um período de incapacidade temporária que resultou deste sinistro, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação até efectivo pagamento.

    Custas a cargo da ré.» A R., inconformada, interpôs recurso da sentença e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões: «I. A expressão “que seria relevante para a reunião aludida em 1º” incluída na resposta ao quesito 5º da base instrutória constitui matéria não factual e meramente conclusiva que, como tal, deverá ser dada como não escrita. Caso assim não se entenda, e não revestindo a mesma o carácter de facto meramente acessório ou instrumental, e não tendo sido alegada por nenhuma das partes, não poderia ter sido dada como provada pelo tribunal recorrido devendo, nessa medida, ser agora dada como não escrita.

    1. Encontrando-se o sinistrado de baixa médica há mais de um mês, estava suspenso o seu contrato de trabalho com a empregadora, e, como tal, todos os deveres inerentes ao mesmo que implicassem a efectiva prestação de trabalho, ou seja, os deveres de assiduidade, diligência ou obediência.

    2. A participação numa reunião na sede da empresa terá sempre de ser considerada como efectiva prestação de trabalho, pelo que não estava o autor/sinistrado obrigado a comparecer na mesma, pese embora convocado pela sua entidade patronal para o efeito, assistindo-lhe, face às circunstâncias, o direito de se recusar a comparecer.

    3. Tendo optado por apresentar-se na mesma, fê-lo por sua livre e espontânea vontade, e não por qualquer ordem – à qual não devia obediência – assumindo, assim, os riscos inerentes a essa comparência e deslocação, pelo que o acidente aqui em causa não poderá ser considerado como acidente de trabalho desde logo por ausência dos requisitos essenciais ao mesmo, nomeadamente a ocorrência no tempo de trabalho e a existência de poder de direcção ou interesse económico por parte do empregador, o que tudo se requer seja aqui reconhecido.

    4. Por necessidades atendíveis do trabalhador nos termos do art. 9º, nº 3 da Lei 98/2009, de 4 de Setembro, deverão entender-se não todas as necessidades do trabalhador, mas apenas aquelas que sejam imprescindíveis e prementes, que não possam ser realizadas noutra altura ou por outra forma, sob pena de qualquer necessidade vir a ser considerada atendível para este efeito.

    5. Pedro Romano Martinez afirma que “se o trabalhador se afasta diariamente o caminho ideal para ir levar os filhos à escola ou, no cumprimento de uma missão fora da empresa, se desvia do trajecto ideal para almoçar num restaurante da sua predilecção, não se pode considerar que a situação seja abrangida pelo conceito de percurso normal.” (Direito do Trabalho, Almedina, 3ª edição, p.831).

    6. Posição esta corroborada pelo Supremo Tribunal de Justiça nos acórdãos de 04.11.1998 relativo a um trabalhador que efectua um desvio no seu trajecto normal e habitual para ir a casa de um tio entregar um convite de casamento, e de 05.08.2011 em acidente ocorrido quando o trabalhador, interrompendo a sua actividade laboral, com prévia autorização da entidade patronal, se ausenta do local de trabalho para ir buscar o filho ao infantário sofrendo, nesse percurso um acidente (ambos os acórdãos citados se encontram disponíveis em www.dgsi.pt).

    7. Neste caso concreto, a deslocação do trabalhador ao hospital não constitui necessidade premente ou imprescindível – o que tudo não foi, de resto, em momento algum alegado pelo sinistrado -, podendo o sinistrado ter obtido a informação pretendida por outra via ou em outra ocasião, não sendo imperioso que o fizesse nestas circunstâncias de tempo e lugar, sendo que nem mesmo resultou provado, até porque não alegado, a relevância de tal informação para a entidade patronal do sinistrado ou para a reunião a ter lugar.

    8. ...

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