Acórdão nº 3820/15.8T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Data da Resolução04 de Abril de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM OS JUÍZES DA 2.ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – Relatório No processo especial de revitalização em que é Requerente C, foi aprovado e homologado, por sentença, o plano de revitalização da sociedade requerente.

Inconformado veio o credor J, recorrer formulando as seguintes conclusões: 1. O recorrente solicitou a não homologação do plano de revitalização aprovado nos presentes autos com fundamento na situação menos favorável a que ficará sujeito com a homologação daquele, bem como na violação do princípio da igualdade de credores previsto no artigo 194.° do CIRE e na violação do princípio constitucional de protecção do salário previsto no artigo 59.° da CRP.

  1. O plano de revitalização homologado nos presentes autos prevê o pagamento de apenas 80% dos créditos laborais, incluindo o do recorrente, em 96 prestações mensais, com um período de carência de 12 meses a iniciar após o trânsito em julgado da sentença homologatória do mesmo, com perdão total dos juros vencidos e pagamento dos vincendos à taxa de 1% ao ano, e sem a constituição de quaisquer garantias patrimoniais para o caso de incumprimento.

  2. Com a homologação do plano de revitalização ficará o recorrente, e demais credores laborais, sujeito ao recebimento de apenas 80% do seu crédito em 96 prestações mensais, tendo de esperar pelo menos nove anos para que o mesmo seja integralmente liquidado.

  3. Ao contrário, e sem a homologação do plano, passar-se-á à imediata liquidação do património da devedora, única garantia patrimonial do crédito do recorrente e dos demais credores laborais daquela, 5. tendo aquele direito a ser pago na sua totalidade, preferencialmente, e de uma só vez, pelo produto obtido com a venda dos bens da devedora, atento o privilégio mobiliário geral e imobiliário especial previsto no artigo 333.° do Código do Trabalho.

  4. Nos termos do disposto no n.° 3 do artigo 59.° da Constituição da República Portuguesa, os salários gozam de privilégios especiais.

  5. O direito à retribuição do trabalho está intimamente relacionado com o direito a uma vida digna e, como tal, mais do que uma natureza patrimonial, tem uma natureza alimentar, essencial à vida e à subsistência pessoal do trabalhador.

  6. O direito à protecção do salário é um direito constitucional, incluído entre os direitos fundamentais dos trabalhadores, 9. pelo que não pode vir a devedora restringir o mesmo, impondo ao recorrente, e aos demais credores laborais, o pagamento de apenas 80% dos respectivos créditos.

  7. Sem a homologação do plano apresentado receberá o recorrente, bem como os demais credores laborais da devedora, o pagamento da totalidade do seu crédito.

  8. O crédito do recorrente, assim como o dos demais credores laborais da devedora, é detentor de privilégio mobiliário geral e imobiliário especial, nos termos do disposto no artigo 333.0 do Código do Trabalho.

  9. Sem a homologação do plano de revitalização apresentado passar-se-á à liquidação do património da devedora, única garantia patrimonial do crédito do recorrente, tendo este direito a ser pago preferencialmente, e na sua totalidade, pelo produto da venda dos bens da devedora.

  10. Com a homologação do plano de revitalização apresentado ficará o recorrente numa situação de incerteza quanto ao pagamento do seu crédito.

  11. Apesar do plano de revitalização prever a satisfação do crédito do recorrente tal não significa, nem garante, que o mesmo venha a ser efectiva e integralmente satisfeito, e mesmo que o seja será apenas no correspondente a 80% do valor do mesmo.

  12. A única finalidade dos presentes autos é protelar o pagamento aos credores, incluindo ao recorrente ganhando a devedora tempo para dispor livremente do seu património.

  13. Com a homologação do plano de revitalização poderá a devedora dispor do seu património como bem lhe apetecer, nomeadamente procedendo à sua alienação, não ficando o mesmo apreendido para garantia de pagamento dos credores daquela.

  14. Aliás, o plano de revitalização apresentado nos autos prevê a dação em cumprimento do imóvel onde está localizada a sua sede para pagamento da totalidade do crédito do credor Banif.

  15. O crédito do recorrente goza de privilégio imobiliário especial sobre o imóvel onde está a devedora tem a sua sede, imóvel esse que no entanto vai ser dado como pagamento a um credor não privilegiado.

  16. Com a homologação do plano de revitalização apresentado ficará o recorrente, e os demais credores laborais da devedora, sem a possibilidade de vir a obter a satisfação do respectivo crédito através do produto da venda do imóvel sobre o qual detém privilégio imobiliário especial.

  17. Se o plano de revitalização não vier a ser cumprido nada garante ao recorrente que a devedora continue a ser detentora de património suficiente para garantia do pagamento do seu crédito.

  18. Sem a homologação do plano de revitalização o recorrente terá a certeza do recebimento do seu crédito, já que o mesmo estará garantido pelo património da devedora, sendo pago pelo produto da venda do mesmo.

  19. Sem a homologação do plano de revitalização o recorrente obterá o pagamento da totalidade do seu crédito de uma só vez, sem estar sujeito à morosidade e incerteza do decorrer de vários anos para efectivo e integral pagamento daquele.

  20. Sem a homologação do plano de revitalização o recorrente obterá o pagamento efectivo da totalidade do seu crédito, não estando sujeito a qualquer redução do mesmo nem à instauração de outro processo especial de revitalização por parte da devedora.

  21. A situação do recorrente ao abrigo do plano de revitalização é manifestamente menos favorável do que a que ocorreria na ausência de qualquer plano.

  22. O plano de revitalização homologado nos presentes autos trata de modo diferenciado os vários credores privilegiados, prevendo para os credores Fazenda Nacional e Autoridade Tributária e Aduaneira o pagamento da totalidade dos respectivos créditos, sem qualquer redução ou período de carência, bem como a constituição de garantias idóneas e suficientes para satisfação dos mesmos em caso de incumprimento do plano.

  23. Tanto o crédito do recorrente como os da Segurança Social e da Autoridade Tributária e Aduaneira são créditos privilegiados, pelo que deveriam gozar do mesmo tratamento e dos mesmos benefícios.

  24. A natureza pública dos créditos da Segurança Social e da Autoridade Tributária e Aduaneira não pode constituir razão objectiva para o tratamento diferenciado entre os vários credores privilegiados.

  25. Os créditos laborais, apesar de serem de origem privada, gozam de tutela constitucional, consagrada no n.° 3 do artigo 59.° da Constituição da República Portuguesa.

  26. Os créditos laborais, intimamente relacionados com o direito a uma vida digna, têm natureza alimentar, essencial à vida e à subsistência pessoal do trabalhador.

  27. O instituto do Fundo de Garantia Salarial, além de não substituir a devedora no pagamento do crédito do recorrente, apenas garante a antecipação do pagamento dos créditos vencidos nos seis meses que antecedem a data de início do processo especial de revitalização, e até ao limite máximo de seis meses de retribuição.

  28. O plano de revitalização apresentado nos autos prevê o pagamento de 100% dos créditos comuns das...

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