Acórdão nº 126/10.2TBPCR-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 20 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução20 de Abril de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: AA.

Recorrido: BB.

Tribunal Judicial de Valença – Juízo Local de Competência Genérica.

BB veio, ao abrigo do disposto no artigo 840.º do CPC, protestar pela reivindicação do imóvel penhorado na execução e cuja venda esteve agendada para o passado dia 30 de Setembro, sendo que para tanto alegou que, por sentença proferida nos autos que neste Tribunal correm termos sob n.º 91/13.4TBPCR em 25.05.2016, já transitada em julgado, se declarou ser ela a proprietária do supra referido bem, mais tendo sido ordenado o cancelamento de quaisquer registos operados com base na escritura pública de justificação notarial de posse que a requerente ali impugnou.

Alega ainda que na dita sentença foi declarado que a requerente é proprietária do imóvel penhorado há não menos de 22 anos, ou seja, bem antes do registo de hipoteca voluntária constituída a favor da exequente, o que sucedeu e, 29.04.2008.

Conclui pedindo, ao abrigo daquela norma, que se lavre termo de protesto e que, devendo ser cancelada a penhora do imóvel, seja dada sem efeito a venda deste último.

Pronunciou-se a exequente AA (ref.ª 1226131) alegando que a questão em apreço já foi decidida no sentido de que a decisão a proferir na supra identificada acção declarativa em nada interfere com a que se discute nestes autos de execução, já que mesmo sendo ela favorável à requerente não decorre que a hipoteca constituída – antes de registada aquela acção – sobre o imóvel penhorado seja dada sem efeito e que, bem assim, seja determinado o levantamento da penhora, tanto mais que a exequente nem sequer é parte naquele processo.

Conclui pugnando pelo indeferimento da pretensão formulada.

Foi proferida decisão que, tendo considerado não serem os executados os legítimos proprietários do imóvel apreendido nos autos, determinou o levantamento da penhora que sobre ele incide.

Inconformado com tal decisão, apela o Autor, e, pugnando pela respectiva revogação, formula nas suas alegações as seguintes conclusões: 1 - Estamos no âmbito de um processo executivo, no qual a BB é executada, portanto, parte no processo.

2 - A exequente deu à execução uma escritura de mútuo com hipoteca, celebrada em 10/04/2008 entre a exequente e os executados CC (entretanto falecido) e mulher DD.

3 - A exequente sempre actuou de boa-fé, com base no registo do acto de aquisição e na presunção de certeza e fidedignidade que do mesmo dimana.

4 - À data do mútuo com hipoteca, a aquisição deste imóvel já se encontrava registada a favor dos mutuários/executados CC e DD desde há pelo menos seis anos, situação registral que faz supor, para além do mais, uma estabilidade que não pode ser ignorada perante olhares de terceiros, como é o caso da exequente.

5 - Já antes, concretamente no ano de 2002, o mesmo prédio havia sido dado de hipoteca à exequente, para garantia de um outro financiamento, como decore da certidão dos ónus e encargos junta com a petição de execução.

6 - Nesta sequência, este prédio foi penhorado na presente execução. 7 - No início da execução, a BB, filha dos executados veio a ser habilitada como executada nesta execução, na sequência do falecimento do executado CC em 06/11/2009, por decisão proferida em 03/05/2012 no apenso nº 126/10.2TBPCR-A.

8 - Desta decisão, a BB foi notificada em 04/05/2012 e só em 04/01/2013 a habilitada/executada BB veio deduzir Oposição à Execução e à Penhora (cfr. apenso nº 126/10.2TBPCR-B).

9 - Na oposição à execução, a executada BB alegava, entre outras coisas, que era dona do imóvel hipotecado.

10 - Esta oposição foi contestada pela exequente, que pugnou pela titularidade do bem pertencente aos executados seus pais.

11 - Designada data para a audiência final para o dia 23/10/2013, por requerimento apresentado em 18/10/2013, a oponente BB veio a desistir da instância (à qual a exequente não se opôs), desistência essa que foi homologada por decisão de 21/10/2013.

12 - A oposição à execução intentada pela BB é um meio processual suficiente para dirimir a titularidade do imóvel e ali fazer convencer a exequente e o Tribunal, tanto mais que continha todos os factos para que o tribunal pudesse decidir sobre a questão ou questões por ela suscitada. 13 - Desistindo, como desistiu, da oposição, a executada/oponente desistiu de discutir com a exequente a titularidade do imóvel de que se arrogava, abandonando um campo em que a exequente tinha a possibilidade de esgrimir os seus argumentos e contraditar a sua versão, para o Tribunal poder decidir.

14 - A consequência desta desistência é a total e absoluta ineficácia em relação à exequente da decisão invocada no despacho recorrido (decisão proferida em 25.05.2016 nos autos de acção nº 91/13.4TBPCR).

15 - E não se diga que se trata de um assunto alheio à exequente, porquanto também estava em causa um contrato de mútuo reconhecido pela BB e a hipoteca de um imóvel (portanto, um ónus, um encargo) cujo direito de propriedade pedia que lhe fosse reconhecida.

16 - Mas ainda que se considere que a BB, como habilitada, não assume a figura de executada, sempre teria de ser considerada um terceiro para efeitos de legitimidade de intentar os respectivos embargos.

17 - Os embargos de terceiro são um meio especial limitado à defesa da posse ofendida por diligência judicialmente ordenada, designadamente a penhora... visando neutralizar um acto judicialmente ordenado com a virtualidade de ofender o direito patrimonial do impetrante.

18 - A BB, enquanto terceiro, também deveria ter usado deste meio para convencer a exequente e o Tribunal da justeza da sua posição.

19 - Não o tendo feito, não o poderia exercitar fora do âmbito desta execução, em termos de poder vincular a exequente, quanto mais que esta não foi tida nem achada na acção de que o Tribunal se sustenta para proferir o despacho em crise.

20 - O direito da BB encontrava-se, assim precludido, quando veio suscitar a questão ao abrigo do disposto no artº 840º do CPC.

21 - Contrariamente ao sustentado pelo Tribunal “a quo”, é imprescindível que a exequente tivesse sido parte na acção, por ter um interesse directo no seu desfecho.

22 - Dificilmente se percebe que o Tribunal entenda que “a improcedência da acção salvaguardaria a possibilidade da exequente ser ressarcida do seu crédito pelo valor do bem hipotecado” e depois, deduza ou conclua contraditoriamente que apenas os justificantes, aqui executados, tinham interesse directo em contradizer...

23 - O Tribunal não pode esquecer que a garantia hipotecária foi celebrada com os executados com base e no pressuposto da existência de um registo de aquisição do imóvel por usucapião, registo esse lavrado mais de seis anos após esse registo, um registo imaculado nunca antes posto em causa por quem quer que fosse.

24 - Como se sabe, a usucapião é um meio legítimo de adquirir a propriedade de imóveis e, portanto, à luz de qualquer cidadão normal, não era expectável que alguém colocasse esses factos em causa.

25 - Ora, uma acção, seja de reivindicação ou de apreciação negativa, deve ser intentada, antes ou depois de efectuada a venda, mas sempre contra quem promove a penhora ou a diligência ofensiva da posse, no caso a exequente, aqui recorrente.

26 - A exequente, nomeando o bem à penhora, é que provocou a diligência contra a qual o proprietário se propõe reagir por meio da acção de reivindicação.

27 - A necessidade de intervenção da exequente e a sua legitimidade passiva para qualquer acção em que se discuta a titularidade dos bens penhorados, nomeadamente para a acção de reivindicação, é básica e manifesta, pois só assim pode constituir e formar caso julgado em relação ao exequente.

28 - De resto, a executada BB não reivindicou a titularidade do imóvel, como a lei exige (840º do CPC), limitando-se a solicitar que o Tribunal declarasse que os executados seus pais, não são os donos do imóvel penhorado.

29 - A decisão proferida na acção nº 91/13.4TBPCR é inoponível à exequente, enquanto credora hipotecária, por não ter sido parte nesta demandada, tanto mais que não há notícia de que haja sido intentada a acção a que se refere o artº 840º, nº 2 do CPC.

30 - Ao longo do processo executivo, o Tribunal tomou posições diferentes daquela que agora caucionou.

31 - Algumas vezes a BB invocou a propriedade do imóvel hipotecado para travar a execução ou a venda ou a suspensão dos embargos de executado.

32 - Em todos as decisões proferidas - em 19/07/2013, no apenso de oposição à execução, em 09/03/2016 e em 31/03/2016 nesta execução, o Tribunal foi claro que a decisão a proferir naquela identificada acção ordinária em nada interfere com a questão que se discute nestes autos.

33 - Todas essas decisões transitaram em julgado, pois a executada BB jamais reagiu contra estes despachos e foi assim que os autos e execução se foram desenvolvendo.

34 - A clareza dessas decisões e abordagem feita pelo Tribunal à posição da exequente, como credora hipotecária, não deixou quaisquer dúvidas sobre o carácter inócuo e inoperante de uma decisão a sair da referida acção nº 91/13, a qual nunca poderia afectar quem nem sequer é parte naquela acção ordinária.

35 - A posição e a boa-fé da exequente, que sempre se mostrou evidente, estavam, assim, em salvaguarda, por força dessas decisões judiciais.

36 - Ao longo de todo este tempo estabeleceu-se o “caso julgado formal”, com força obrigatória dentro deste processo, quanto à questão em apreço (artº 620º do CPC).

37 - O despacho recorrido também ofende o caso julgado ora invocado.

38 - A hipoteca, o negócio jurídico constitutivo da hipoteca, é um acto sujeito a registo.

39 - Ao invocar uma doação verbal do imóvel feita pelos seus pais (em 1993, em 1991...), a BB admite que eles eram os seus anteriores donos.

40 - Se a escritura de justificação levada a efeito pelos pais da BB ocorreu em 08 de Janeiro de 2002, tal significa que consideravam que pelo menos desde 1982 (ou seja, 20 anos antes) eram já dele donos...

41 - Saliente-se...

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