Acórdão nº 38/17.9GAMNG-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelAUSENDA GON
Data da Resolução24 de Abril de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Penal, do Tribunal da Relação de Guimarães: Nos autos de inquérito nº 38/17.9GAMNG do Juízo de Competência Genérica de Monção, da Comarca de Viana do Castelo, o arguido I. R.

, de nacionalidade Espanhola, foi submetido a primeiro interrogatório judicial, tendo sido proferido pela Sra. Juíza que presidiu ao acto o seguinte despacho (sic): (…) Indiciam fortemente os autos que: 1. No dia 01 de fevereiro de 2017, cerca das 13h:45m, o arguido I. R. circulava na Avenida da Galiza, da U.f. de Mazedo e Cortes, do concelho de Monção, ao volante do veículo automóvel ligeiro misto, da marca Citrõen, da marca Berlingo, com a matrícula ..-..-...

  1. Ao se aperceber que, no seu encalço, mas em sentido contrário, seguia uma viatura da Polícia Nacional Espanhola, o arguido despistou-se, acabando por embater naquela mesma viatura, ficando ambas imobilizadas no local.

  2. Na sequência da busca, devidamente autorizada pelo arguido, efetuada à sua viatura foram encontrados e apreendidos, dissimulados no interior das portas do veículo id.° em 1 e num fundo falso por baixo dos bancos dianteiros do mesmo, vários pedaços (bolotas) de produto estupefaciente acondicionados em película aderente, com peso aproximado de 94,270 kg. ».

  3. Submetido a Teste Rápido (MMC), o produto apreendido ao arguido apresentou um resultado positivo para a substância de Cannabis Resina (Haxixe), com peso aproximado de 94,270kg.

  4. Ao arguido foram ainda encontrados, na sua posse, um telemóvel com o n.°…… munido com o respetivo cartão SIM e a quantia de €110 (cento e dez euros) em notas.

  5. O arguido conhecia a natureza e as características das substância estupefaciente suprareferida, não ignorando que a respetiva compra, detenção, transporte, venda e / ou cedência a terceiros lhe estava legalmente vedada, pois que não se encontrava autorizado para o efeito.

  6. Agiu deliberada, livre e conscientemente, muito embora conhecesse o carácter proibido da sua conduta.

  7. O arguido não tem antecedentes criminais.

    *Elementos do processo que indiciam os factos imputados, resultam das diligências de inquérito realizadas até ao momento e dos consequentes elementos probatórios que foram comunicados integralmente ao arguido e supra elencados, nomeadamente: -Auto de inquirição de testemunha a fls. 17; -Auto de inquirição de testemunha a fis. 19; -Auto de notícia de fls. 2 e 3, -Auto de teste rápido, de fls. 4, -Auto de busca e apreensão de fis. 15, - Auto de apreensão de fls. 5, -Participação de acidente de viação de fls. 21 e 22, -Registos fotográficos de fis. 23 a 40, -CRCdefls.46.

    Dos elementos probatórios constantes dos autos supra elencados, indicia-se fortemente a prática, pelo arguido, de um crime de tráfico de estupefaciente, p. e p. pelo artigo 21º, n.° 1 do Decreto-lei n.° 15/93 de 22 de janeiro, punível com pena de prisão de 4 a 12 anos.

    O arguido remeteu-se ao silêncio, mas dos autos resulta que o mesmo se fazia transportar num veículo, no qual de forma dissimulada se encontrava acondicionados 94,270Kg de Cannabis Resina (Haxixe). Tal produto encontrava-se dividido em bolotas. Para estes factos basta atentarmos, no auto de notícia, nos autos de apreensão, na participação do acidente e no teste rápido, donde estes factos resultam corroborados.

    A isto acresce que a polícia espanhola já vinha no seu encalce, acabando este por ter um acidente com a mesma (depoimentos).

    Desconhecem-se quaisquer circunstâncias de vida do arguido, sendo certo que dos autos resulta que o intuito do arguido seria obter contrapartida económica mediante a prática dos factos acima referidos, pois que atenta a quantidade de haxixe que transportava nunca se poderia destinar apenas ao consumo ou até mesmo a uma actividade pequena.

    Não obstante a inexistência de antecedentes criminais conhecidos teremos de levar em consideração a natureza e as circunstâncias do crime atendendo sobretudo ao seu modo de execução e a facilidade demostrada pelo arguido, em deslocar-se entre Portugal e Espanha.

    Em face do exposto e porque o ilícito em causa reveste-se de elevada gravidade, impõe-se a aplicação ao arguido de uma medida cautelar.

    As medidas de coacção e de garantia patrimonial são meios processuais de limitação da liberdade pessoal ou patrimonial dos arguidos pelo que assumem natureza excepcional e estão taxativamente previstas na lei.

    Por conseguinte, nenhuma medida de coacção à excepção do Termo de Identidade e Residência previsto no artigo 196.° do Código de Processo Penal, pode ser aplicada se em concreto não se verificar, pelo menos um dos requisitos referidos no artigo 204.° do Código de Processo Penal: a) fuga ou perigo de fuga; b) perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e, nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova; ou c) perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de que este continue a actividade criminosa ou perturbe gravemente a ordem ou tranquilidade públicas.

    A medida de coacção aplicada deve, em concreto, ser adequada às exigências cautelares e proporcional à gravidade do crime e sanção que previsivelmente venha a ser aplicada (artigo 193.°, n.° 1 do Código de Processo Penal.

    Cumpre, assim, apreciar qual ou quais as medidas a que o arguido deverá ficar sujeito.

    A factualidade indiciariamente apurada reveste-se de elevada gravidade, sendo de molde a incutir no julgador a necessidade de aplicação ao arguido de uma medida de coacção para além do termo de identidade e residência (já prestado) uma vez que, ainda que sejam desconhecidas as condições de vida do arguido, a quantidade que o arguido detinha de produto estupefaciente com o inerente beneficio patrimonial que acarretaria, bem com o a forma como vinha acondicionada e escondida, fazem antever que o mesmo venha a persistir na prática de crime de natureza análoga àquele que se encontra em investigação. De facto, ao arguido não é conhecida actividade profissional com carácter de permanência.

    Face a tal circunstancialismo e ainda à natureza do crime em causa, propiciador de avultados rendimentos ao seu agente, existe sério perigo de continuação da actividade criminosa.

    A danosidade social associada a este tipo de crime é perturbadora da ordem e tranquilidade pública, não sendo alheia, mais uma vez, a elevadíssima quantidade de produto estupefaciente transportado pelo arguido.

    Por outro lado, é de realçar que existe, a nosso ver, perigo de fuga, pois trata-se de um arguido com residência em Espanha, ao qual não se conhece nenhuma ligação a Portugal. Não obstante a inexistência de antecedentes criminais conhecidos temos que levar em consideração a natureza e as circunstâncias do crime atendendo sobretudo ao seu modo de execução e a facilidade demostrada em deslocar-se entre Portugal e Espanha, sendo certo que o acidente ocorrido foi com polícias do CNP de Espanha que o estavam no seu encalce. Apesar de se tratar de haxixe, a quantidade apreendida 94,270KG assume grande expressão, tendo em conta o número de doses possíveis e o elevadíssimo lucro susceptível de ser obtido. A isto acresce a natureza do crime em causa e a moldura abstracta aplicável que, tendo em conta as possíveis sanções susceptíveis de virem a ser aplicadas, tomam ainda mais premente esse perigo de fuga.

    Ora, tais situações são susceptíveis de enquadrar as previstas no art. 204.°, alins. a) e c) do CPP.

    Vejamos, então, quais as medidas de coacção que se revelam adequadas às exigências cautelares.

    As medidas de coacção são “meios processuais” que limitam ou restringem a liberdade pessoal do arguido com o fim de acautelar a eficácia do procedimento criminal, tendo em vista a boa administração da justiça, a descoberta da verdade e o restabelecimento da própria paz jurídica abalada pela prática do crime. Tratando-se de restrições a um direito fundamental, estão condicionadas pelas regras definidas nos n°s 2 e 3 do art. 180 da Constituição da República Portuguesa. Ao julgador cabe fazer uma ponderação dos interesses em conflito em ordem a determinar a respectiva prevalência e grau de restrição. Em tal tarefa, deverá o julgador nortear-se pelos princípios da legalidade, da necessidade, adequação, da proporcionalidade, da subsidiariedade e da precaridade, corolários do princípio da presunção de inocência do arguido.

    Conforme já supra se referiu, o arguido está indiciado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo art. 21°, no i do Decreto-Lei n° 15/93, de 22/01, crime esse punível com pena de prisão de 4 a 12 anos.

    Tendo presente a moldura abstracta do crime de tráfico, é susceptível de ser aplicada ao arguido qualquer medida de coacção, incluindo a prisão preventiva, contanto que tal medida se mostre necessária e adequada às necessidades cautelares e proporcional à sanção que concretamente venha a ser aplicada ao arguido. Contudo, para a aplicação, quer da prisão preventiva, quer ainda da obrigação de permanência da obrigação, exige-se a existência de “fortes indícios de prática de crime doloso”, punível com pena de prisão de máximo superior a cinco anos (cfr. ai. a) do n° 1 do art. 202° do CPP).

    No tocante à existência de “fortes indícios”, não obstante a fase precoce em que nos encontramos, podemos com segurança afirmar, como já o expusemos em sede de motivação, que os elementos probatórios já adquiridos nos autos nos permitem relacionar, de forma idónea e suficiente, o arguido com a prática do crime de tráfico de estupefacientes.

    Por outro lado, tendo presentes os perigos que se pretendem acautelar (perigo de continuação da actividade criminosa, perturbação da ordem e tranquilidade pública e perigo de fuga), entendemos que só medida detentiva de liberdade, a prisão preventiva, se mostra suficiente para salvaguardar as exigências cautelares do processo, sendo ainda aquelas que se mostram proporcionais à gravidade do crime em causa e às sanções que previsivelmente lhe virão a ser aplicadas, atenta a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT