Acórdão nº 131/14.0GBVNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelFERNANDO PINA
Data da Resolução06 de Novembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÂO DE GUIMARÃES: I. RELATÓRIO A – Nos presentes autos de Processo Comum Colectivo, com o nº 131/14.0GBVNF, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo Central Criminal de Guimarães – Juiz 3, o Ministério Público requereu o julgamento dos arguidos: - A. G.

, solteiro, reformado, nascido a .., na freguesia e concelho de Vila Nova de Famalicão, filho de C. G. e de J. G., residente na Rua da …, Vila Nova de Famalicão e, actualmente, em cumprimento de medida de segurança de internamento no âmbito do Processo Comum Colectivo nº 269/09.5 GCVNF, que correu termos no extinto 1º Juízo Criminal de Vila Nova de Famalicão, medida essa que cumpre na Ala Psiquiátrica do Estabelecimento Prisional de Santa Cruz do Bispo; - J. M.

, reformado, nascido a …, na freguesia de …, concelho de Guimarães, filho de M. M. e de M. A. e com residência na Travessa das …, Guimarães e; - A. A.

, divorciado, vendedor, nascido a …, na freguesia de …, filho de M. R. e de I. B. e com residência na Rua …, Guimarães.

Imputando, aos três arguidos, em co-autoria material e na forma consumada, um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo disposto nos artigos 203º, nº 1 e, 204º, nº 2, alínea e), por referência ao disposto no artigo 202º, alíneas d) e, e), do Código Penal; E imputando ao arguido A. G., em concurso real de infracções, como autor material e na forma consumada, mais dois crimes de furto qualificado, previstos e punidos pelo disposto nos artigos 203º, nº 1 e, 204º, nº 2, alínea e), por referência ao disposto no artigo 202º, alíneas d) e, e), do Código Penal.

O arguido A. A. ofereceu contestação negando a prática dos factos.

Realizado o julgamento, veio a ser proferido pertinente Acórdão, no qual se decidiu: - Condenar o arguido A. G., pela prática, em concurso efectivo, de três crimes de furto qualificado, previstos e punidos pelos artigos 203º, nº 1 e, 204º, nº 2, alínea e), do Código Penal, um dos quais em co-autoria com os arguidos A. A. e J. M., nas penas parcelares de 2 (anos) e 8 (oito) meses de prisão, por cada um dos crimes; - Em cúmulo, condenar o arguido A. G., na pena única de 4 (quatro) anos de prisão; - Condenar o arguido J. M., pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203º, nº 1 e, 204º, nº 2, alínea e), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de prisão; - Condenar o arguido A. A., pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203º, nº 1 e, 204º, nº 2, alínea e), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de prisão.

Inconformado com esta decisão condenatória, o arguido J. M. interpôs recurso, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões: I. O Recorrente não se conforma com os termos da decisão de condenação proferida, uma vez que entende que, por um lado foi pelo Tribunal a quo valorada prova proibida e, por outro lado, que quer a prova recolhida nos autos, quer a produzida em sede de audiência de julgamento é manifestamente insuficiente para fundamentar a sua condenação.

  1. A condenação do ora Recorrente foi sustentada essencialmente, podendo mesmo dizer-se, exclusivamente, nas declaração prestadas pelo Arguido A. G., perante o Magistrado do Ministério Público, na fase de inquérito e na presença do seu defensor, Resultando do teor de tais declarações a confissão da autoria dos crimes que de que vinha acusado e, no que respeita ao episódio ocorrido em 28-04-2014 (Pontos 8, 9, 14 e 15 da matéria provada), a participação dos restantes Arguidos nos autos.

  2. Conforme resulta expressamente da sentença proferida “Concretamente, quanto à autoria dos assaltos, foi absolutamente determinante o teor das declarações prestadas em sede de primeiro interrogatório de arguido detido, nos termos do art. 141º/4 b) do CPP, que foram objecto de reprodução, o qual confessou a sua participação nos três assaltos e o envolvimento dos co-arguidos J. M. e A. A. no assaltado ocorrido em 28/04/2014”.

  3. Atenta a alteração efectuada ao Código de Processo Penal, introduzida pela Lei nº 20/2013, de 21 de Fevereiro, mormente no que respeita ao artigo 141º, nº 4, alínea b), prestando o arguido declarações em sede de inquérito, em primeiro interrogatório judicial de arguido detido, poderão as mesmas ser utilizadas no processo, mesmo que o arguido seja julgado na ausência ou não preste declarações em audiência de julgamento, estando sujeitas a livre apreciação de prova.

  4. O disposto no artigo 141º, nº4, alínea b), do Código de Processo Penal, deve ser interpretado precisamente no sentido de tais declarações poderem ser oportunamente valoradas, como o seriam caso fossem prestadas em audiência de julgamento, ou seja, livremente apreciadas pelo julgador.

  5. Sucede, porém, que, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 345º do Código do Processo Penal, “Não podem valer como meio de prova as declarações de um co-arguido em prejuízo de outro co-arguido quando o declarante se recusar a responder às perguntas formuladas nos termos do nº 1 e nº 2.”.

  6. No caso sub judice, apenas o Arguido A. A. prestou declarações em audiência de julgamento, o mesmo não tendo sucedido com os Arguidos A. G. e J. M., aqui Recorrente, os quais, socorrendo-se do direito que lhes assiste, nessa qualidade, se remeteram ao silêncio.

  7. De acordo com o disposto no referido normativo legal, não obstante as declarações proferidas pelo Arguido A. G., em sede de inquérito, poderem ser livremente valoradas pelo Tribunal a quo, no que ao mesmo respeitam, como, aliás, o foram, já não o poderiam ser na parte em que prejudicam, na medida em que incriminam, os restantes Arguidos.

  8. Apesar de o Arguido A. G. ter imputado ao Recorrente e ao outro Arguido nos autos a prática, em co-autoria, dos factos ocorridos em 28-04-2017, uma vez que se remeteu ao silêncio em sede de audiência de julgamento, nunca poderia o Tribunal a quo valorar as suas declarações, como o fez, no que respeita aos co-arguidos.

  9. Tendo o referido arguido se remetido ao silêncio em sede de audiência de julgamento, ficaram os restantes Arguidos, mormente o aqui Recorrente, absolutamente coartados do seu direito ao contraditório, pois que no interrogatório de arguido detido apenas estiveram presentes o arguido e o seu defensor e, na audiência de julgamento, atento o silêncio do mesmo, viu-se a defesa do Recorrente impedida de o confrontar com o teor de tais declarações.

  10. Veja-se a este propósito o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-04-2015, o Acórdão proferido pelo Tribunal Relação do Porto em 08-02-2017 e o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, no Acórdão proferido em 09-02-2009, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

  11. Manifesto é que o Tribunal a quo ao fundamentar a condenação do Recorrente na incriminação decorrente das declarações prestadas pelo Arguido A. G., prestadas em inquérito, quando, posteriormente o referido Arguido, em audiência de julgamento, se remeteu ao silêncio, valorou prova proibida, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 345º do Código do Processo Penal.

  12. Conforme resulta inequivocamente da sentença proferida, a condenação do Recorrente pela prática dos factos ocorridos em 28-04-2014 fundamentou-se apenas e tão só nas declarações prestadas pelo Arguido A. G.

    .

  13. De facto, conforme resulta da motivação do Acórdão que ora se recorre “…quanto à autoria dos assaltos, foi absolutamente determinante o teor das declarações prestadas em sede de primeiro interrogatório de arguido detido, nos termos do art. 141º/4 b) do CPP, que foram objecto de reprodução, o qual confessou a sua participação nos três assaltos e o envolvimento dos co-arguidos J. M. e A. A. no assaltado ocorrido em 28/04/2014”.

  14. Não foi efectivamente produzido nos autos qualquer outro meio de prova, no que à alegada participação do Recorrente nos factos ocorridos em 28-04-2014, respeita.

  15. Ora, estando vedado ao Tribunal a quo valorar as declarações prestadas pelo do Arguido A. G., nunca o mesmo poderia considerar provados os factos de que o Recorrente vinha acusado.

  16. Na verdade, no que aos factos imputados ao Recorrente respeita, apenas se logrou apurar que o Recorrente, juntamente com o Arguido A. A., foram abordados por Agentes da GNR, quando se encontravam no interior de um veículo, por ter este idênticas características ao veículo descrito no âmbito de uma chamada telefónica para o posto da GNR de Joane, tido como suspeito.

  17. Pelo guarda da GNR, B. S., foi admitido, em sede de audiência de julgamento, que apenas abordou os referidos Arguidos, atento o teor da referida chamada telefónica e que efectivamente não detectou nada de anormal ou suspeito, mais tendo referido que se recorda dos Arguidos terem prestado explicações para o facto de aí se encontrarem aparcados, explicações essas que se prenderiam com a venda de um veículo, o que, diga-se, vai de encontro com as declarações prestadas pelo Arguido A. A., em audiência de julgamento e que o Tribunal a quo entendeu, sem qualquer justificação, não valorar - Veja-se a este propósito, as declarações prestadas pela testemunha B. S., em 20170502164528_5433782_2870532, do minuto 11.00 ao minuto 12.00.

  18. Pelo que, atenta a prova efectivamente produzida, dúvidas não podem restar que nunca poderiam considerar-se provados os factos constantes dos Pontos 8, 9, 14 e 15 da matéria provada, devendo, ao invés, terem os mesmos sido julgados como não provados.

  19. Não poderá deixar de concluir-se que a condenação do Recorrente se fundamentou, em exclusivo, nas declarações prestadas pelo Arguido, pois que, conforme resulta manifesto, no que ao episódio ocorrido em 28-04-2014 respeita, nenhuma outra prova foi produzida em sede de audiência de julgamento ou resulta dos autos.

  20. Fundamentando-se a condenação do Recorrente, unicamente, na valoração de prova proibida, forçosamente terá que decidir-se pela alteração do Acórdão recorrido, absolvendo-se o Recorrente da prática do crime de que foi...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT