Acórdão nº 2057/17.6T8VNF-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelEUG
Data da Resolução02 de Novembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães*I.

RELATÓRIO C. P.

, na petição inicial de apresentação à insolvência que deduziu e de que se encontra cópia junta a fls 41 e segs, requereu exoneração do passivo restante, declarando preencher os respetivos requisitos.

O Senhor Administrador de Insolvência, no relatório que apresentou, concluiu pelo indeferimento do pedido de exoneração do passivo restante.

O credor “Banco Y- Instituição Financeira de Crédito, S.A.”, com os fundamentos vertidos a folhas 56 a 57, veio opor-se à concessão da exoneração do passivo restante.

Foi proferida decisão a indeferir liminarmente a concessão da exoneração do passivo restante ao insolvente, por dos factos provados, e alegados pelo próprio requerente na petição inicial de apresentação à insolvência e documentos por ele juntos, se extrair a existência de um acumular de passivo e o contrair de novas dívidas que manifestamente foi prejudicando os anteriores credores, que viram, assim, reduzidas as possibilidades de recuperar os seus créditos.

O Insolvente, notificado de tal decisão, apresentou recurso, pugnando por que a decisão seja revogada, formulando as seguintes CONCLUSÕES: A. Recorre-se do despacho, datado de 24.05.2017, que indeferiu liminarmente a concessão do pedido de exoneração do passivo restante formulado pelo Recorrente.

B. Ao negar o despacho inicial de exoneração do passivo restante violou o Tribunal a quo, por erro de interpretação, o artigo 238.°, nº 1, aI. d) do CIRE, devendo ser revogado e substituído por outro que defira o pedido de exoneração do passivo restante.

C. Não se encontram preenchidos os três requisitos cumulativos previstos na aI. d) do nº 1 do artigo 238. ° do CIRE.

D. O Recorrente cessou a sua atividade enquanto empresário em nome individual em Fevereiro de 2011, o que significa que, quando se apresentou à insolvência, em 24 de Março de 2017, fê-lo na qualidade de pessoa singular.

E. Sempre teve a expetativa de que a sua situação enquanto empresário em nome individual iria melhorar, motivo pelo qual entende que, à data, não se encontrava numa situação de insolvência, não lhe sendo, por isso, aplicável o disposto no artigo 18.°, nº 1 do CIRE.

F. Ainda assim, enquanto pessoa singular, tinha a obrigação de se apresentar à insolvência nos seis meses posteriores à verificação da sua situação de insolvência.

G. E verdade que, durante o período em que o Recorrente exerceu atividade enquanto empresário em nome individual, tinha a firme convicção de que a sua situação económica iria melhorar e permitir-lhe proceder ao pagamento das contribuições que durante esse período se fossem vencendo.

H. Mesmo após cessar atividade, já desempregado, continuava a acreditar que conseguiria arranjar trabalho rapidamente, até porque ainda era novo, o que acabou por acontecer no ano de 2014.

I. Porém, o facto de sempre ter ganho um salário baixo nunca lhe permitiu cumprir tal desiderato na sua plenitude, motivo pelo qual, decidiu, em Agosto de 2016, apresentar-se à insolvência, altura em que constatou que se encontrava impossibilitado de cumprir prontamente com todas as suas obrigações vencidas.

J. A situação de insolvência do Recorrente não decorre da sua atuação dolosa ou de má-fé, mas da conjuntura socioeconómica em que desenvolveu os seus negócios e da consequente situação de desemprego.

K.

Com efeito, não é verdade que o Recorrente se tenha abstido de apresentar à insolvência nos seis meses seguintes à verificação da sua insolvência.

L. Ainda assim, se se entender que, efetivamente, os 6 meses já tinham decorrido, tal não é suficiente para, por si só, ser indeferido liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante.

M. É necessário que, por causa desse atraso, tenha havido prejuízo concreto e efetivo para os credores.

N. Sendo este um requisito cumulativo com os demais, a verdade é que dos autos não resultam factos provados que permitam concluir que o Recorrente, ao se abster de se apresentar à insolvência, prejudicou os seus credores.

O. Quanto ao facto de o insolvente ter acumulado ''passivo durante desde 2002 que nunca conseguiu liquidar até se apresentar à insolvência', tal não corresponde à verdade.

P. Desde que cessou a sua atividade enquanto empresário em nome individual, o Recorrente teve sempre em perspetiva alcançar um emprego que lhe permitisse ir pagando as suas dívidas motivo pelo qual, em Dezembro de 2016, aderiu ao Programa Especial do Endividamento ao Estado (PERES).

Q. Quanto ao facto de o Recorrente, "apesar das dívidas contraídas e vencidas não se absteve de contrair novas dívidas, sem liquidar as primeiras'; sempre se dirá que o que leva a que exista o prejuízo para os credores é o agravamento da situação económica do devedor.

R. Desde que cessou a sua atividade, à exceção da dívida devida à Empresa De Telecomunicações X, o Recorrente não contraiu quaisquer outras dívidas até a presente data, não tendo assim, aumentado o seu passivo.

S. Mesmo que se considerasse que o Recorrente estava obrigado a apresentar-se à insolvência em momento anterior, ainda assim, as dívidas contraídas junto da Segurança Social não deveriam constituir um prejuízo para os seus credores na medida em que os créditos tributários não estão abrangidos pela exoneração do passivo restante.

T. Por outro lado, o prejuízo terá que ser relevante. Ora, tendo em consideração que, à exceção do crédito à Segurança Social, não abrangido pela exoneração do passivo restante, o Recorrente apenas aumentou o seu passivo junto da sociedade comercial Empresa De Telecomunicações X num valor não superior a € 1.000,00, trata-se efetivamente de uma quantia que, a ser considerado prejuízo, atento o seu valor, não se apresenta relevante.

U. Também não se encontra preenchido o terceiro requisito da aI. d) do nº 1 do artigo 238.° do CIRE.

V. Quanto a este requisito legal e por perspetiva de "melhorar a sua situação económica", deve entender-se como tendo perspetivas de melhorar a sua situação económica e não da verificação de tal situação, pois a lei não se refere a melhoria da situação económica mas sim a perspetiva dessa melhoria.

W. Na verdade, o incumprimento do pagamento de determinadas obrigações por parte do Recorrente não gerou neste a certeza de que não havia perspetiva séria de melhoria da situação económica, pelo contrário, a perspetiva de alcançar um emprego, após cessar a sua atividade enquanto empresário em nome individual, mostra que este nunca cruzou os braços, tentando cumprir com as suas obrigações e regularizar as dívidas para com os seus credores, agindo, assim, sempre de acordo com uma perspetiva séria de melhoria da sua situação económica.

X. Perspetivas que existem, pois o Recorrente tem, hoje, após obter emprego no ano de 2014, uma vida mais estável e acredita poder pagar aos credores via incidente de exoneração.

Y. Deste modo, não sendo possível concluir pela verificação da situação complexa descrita na alínea d), do nº 1, do artigo 238°, do CIRE, não deveria ter sido indeferida liminarmente a pretensão deduzida pelo Recorrente.

Z. Ao negar, o despacho de indeferimento do pedido de exoneração violou, pois, por erro de interpretação o artigo 238.°, nº 1, aI. d) do CIRE.

AA. De referir, ainda, que é entendimento da jurisprudência maioritária, que, para que se indefira liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante, nos termos do artº 238.°, nº 1, aI. d), CIRE, é necessário que o tribunal se pronuncie sobre cada um dos requisitos e que os julgue, a todos, verificados.

*Não foram apresentadas contra-alegações.

*Após os vistos, cumpre apreciar e decidir o mérito do recurso interposto.

*II. OBJETO DO RECURSO Apontemos as questões objeto do presente recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações do recorrente, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

Assim, é a seguinte a questão a decidir: – Se se verifica falta de fundamento para o indeferimento liminar do pedido de exoneração do passivo restante.

* III. FUNDAMENTAÇÃO 1.

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Resulta da petição inicial apresentada pelo requerente, ora recorrente, dos documentos juntos pelo mesmo e do relatório apresentado (cfr fls 41 e segs deste apenso), com interesse para a decisão deste incidente que: 1.

O insolvente é trabalhador dependente, exerce as funções de “Carpinteiro ou de Cofragem de 1.ª” na sociedade “W Construtores, S.A.” e aufere a remuneração mensal ilíquida de € 557; 2.

O insolvente reside em casa da sua mãe, comparticipando nas despesas; 3.

O insolvente é casado, mas está separado de facto; 4.

Pelo menos entre 2002 e 2011 o devedor exerceu atividade como trabalhador independente na área da exploração de bares; 5.

Em diversos períodos entre o ano de 2002 e o ano de 2011 o insolvente não entregou à Segurança Social as contribuições a que estava obrigado, acumulando um passivo de, pelo menos, €14.717,45, ao qual acrescem atualmente custas e juros de mora (o valor atualmente em dívida ascende a mais de €19.000,00); 6.

Entre os meses de março e junho de 2009 o insolvente não cumpriu com o contrato celebrado com a sociedade “Empresa de Telecomunicações H, S.A.”, tendo acumulado um passivo junto deste credor que ascende atualmente a cerca de €1.000, resultante da interposição da ação executiva referida nos autos com o nº 3397/09.3TBFAR; 7.

Ainda no ano de 2009 o requerente começou a acumular passivo junto de nova operadora de telecomunicações, desta...

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