Acórdão nº 2990/13.4TBVCT-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução02 de Novembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

  1. RELATÓRIO.

Recorrente: A. P..

Recorridos: C. C..

Por apenso aos autos de execução para pagamento de quantia certa, que C. C.

instaurou contra A. C., J. B., M. P. e A. M., veio esta deduzir oposição mediante embargos, alegando em síntese, que tomou conhecimento que lhe tinha sido penhorada a sua conta bancária junto do Banco A, tendo ainda, nessa data, tomado conhecimento que tal penhora era relativa a uma dívida de condomínio da fração autónoma designada pela letra “P” do prédio constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Rua da …, Viana do Castelo; A embargante desconhecia ser proprietária daquela fração, pelo que, de imediato, tentou esclarecer junto do seu pai, o que se passava, tendo-lhe o mesmo referido que o prédio estava em nome daquela por ter sido adquirido pelo seu marido; A embargante não foi pedida nem achada na referida aquisição e questionou o seu marido, que se limitou a referir-lhe que se tratou de uma excelente oportunidade de negócio; Esse negócio ocorreu em 08/02/2013, formalizado através de escritura pública de compra e venda junta a fls. 7 a 9 e sobre tal prédio incide uma penhora a favor do aqui exequente/embargado no montante de 69.564,71 euros, facto que o seu marido lhe disse desconhecer uma vez que à data da celebração dessa escritura não foi informado da existência de qualquer ónus sobre o referido imóvel; Invocou a exceção da falta de título executivo, sustentando que ela e o marido não se constituíram nem reconheceram qualquer obrigação para com o exequente; Da escritura de mútuo com hipoteca que serve de título executivo não consta que a referida quantia de 39.000,00 euros lhe tivesse sido emprestada ou ao seu marido; É absolutamente falso que o exequente tivesse contactado a embargante exigindo-lhe o pagamento da quantia mutuada, acrescida de juros à taxa legal; Acresce que foram convencionados juros no título dado à execução para a remuneração do empréstimo à taxa de 8% ao ano, os quais são usurários na medida em que excedem 3% sobre os juros legais, pelo que se impõe a respetiva redução para a taxa de 7% ao ano; Foi convencionado o pagamento da quantia de 25.000,00 euros, a título de despesas judiciais e extrajudiciais, o que configura uma cláusula penal usurária, apenas sendo consentida a fixação de juros, a título de cláusula penal, de 11%, a partir da constituição em mora.

Requereu a suspensão da execução e que a oposição seja julgada procedente com todas as consequências legais.

Recebida liminarmente a oposição, o exequente contestou-os impugnando parte da factualidade alegada pela embargante.

Arguiu e exceção da intempestividade da oposição, alegando que a embargante foi citada para a execução em 13/10/2014 na pessoa do seu marido; Conclui pela improcedência da exceção da inexistência de título executivo contra a embargante sustentando que esta é detentora das garantias dadas àquele respeitantes à quantia exequenda.

Terminou pedindo que se julgue improcedente a oposição por intempestividade e caso assim se não entenda que se julgue aquela improcedente, com o consequente prosseguimento da execução.

Realizou-se audiência prévia, em que se fixou o valor da causa, proferiu-se despacho saneador em que se julgou improcedente a exceção dilatória da falta de título executivo, fixou-se o objeto do litígio e após proferiu-se “sentença”, que consta da seguinte parte decisória: “Em face do exposto, julgo a oposição à execução comum intentada por A. P. contra C. C. parcialmente procedente, por parcialmente provada e, consequentemente, determino que ao valor da quantia exequenda seja deduzido o valor de 5.089,70 euros, e ainda o valor que decorrer da aplicação de uma taxa de juros de 7%, ao invés da taxa de juro convencionada de 8%, sempre contados durante um período de 3 anos a partir do incumprimento, prosseguindo os autos principais para cobrança da quantia remanescente, até integral e efetivo pagamento.

Custas na proporção do decaimento, sem prejuízo do decidido administrativamente quanto ao apoio judiciário”.

Irresignada com esta decisão, a embargante veio dela interpor recurso, apresentando as seguintes conclusões: i. O relatório da sentença não corresponde à matéria vertida na presente oposição, o que certamente se deveu a lapso manifesto ou erro de escrita do tribunal “ a quo”, devendo ser efetuada a devida retificação, nos termos dos artigos 613º n.º 2, 614º, n.º 1 e 2, do CPC.

ii. Salvo o devido e merecido respeito pela posição sufragada na douta sentença ora em crise, entende-se que a mesma não extraiu de forma correta as consequências jurídicas da matéria de facto apurada nos autos, relativamente à Cláusula Penal.

iii. Foi estipulado pelas partes intervenientes no contrato de Hipoteca “Que a presente hipoteca é constituída pelo prazo de seis meses a contar da presente data, e garante o pagamento do referido montante de trinta e nove mil euros, acrescido da quantia de vinte e cinco mil euros de despesas judiciais ou extra judicias, no caso de recorrer a juízo, e, ainda, os juros à taxa legal em vigor que, para o efeito de registo, se fixa em oito por cento ao ano. “ iv. Não podia o tribunal “a quo” decidir, sem mais, que se tratava da cláusula penal prevista no artigo 810º do Código Civil.

  1. Para se ponderar o papel da cláusula penal na economia do contrato de hipoteca aqui em causa, necessário se torna analisar as prestações envolvidas na respetiva execução.

    vi. A Apelante não deu qualquer causa à presente ação ou qualquer outra despesa judicial ou extrajudicial para pagamento da quantia mutuada ao devedor J. B., razão pela qual não pode a mesma ser agora responsabilizada por um ato de terceiro (incumprimento do devedor).

    vii. Mal andou o tribunal “a quo” ao pôr termo à causa no despacho saneador, sem ouvir a prova arrolada pelas partes, prova essa essencial à descoberta da verdade material.

    viii. Só através da prova que se viesse a produzir na audiência de julgamento, nomeadamente através da prova arrolada pelas partes, conseguiria o tribunal perceber o sentido e alcance que exequente e devedor quiseram dar ao referido texto.

    ix. A determinação da vontade real das partes nas declarações negociais constitui matéria de facto e só não sendo possível determinar qual foi essa vontade, se impõe então fixar o sentido juridicamente decisivo dessas declarações, reconduzindo-se a questão de direito, por contender com as regras legais que definem o critério hermenêutico.

  2. A qualificação jurídica dada pelas partes não vincula o tribunal, artigo 5º n.º 3 do CPC.

    xi. Deverá a decisão ora em crise ser revogada, determinando-se a audição da prova arrolada pelas partes para determinação da vontade real das mesmas na referida declaração negocial.

    xii. Mal andou também o tribunal “a quo” na fundamentação da matéria de direito quanto a “cláusula penal”.

    xiii. Tal fundamentação encontra-se pouco clara, e de difícil compreensão, desconhecendo-se se o valor de €19.919,30 (dezanove mil novecentos e dezanove euros e trinta cêntimos) resulta de redução efetuada nos termos do artigo 812º n.º 1 do CCivil e se a executada pode ser responsabilizada pelo seu pagamento.

    xiv. Caso não seja a decisão revogada, deverá determinar-se a fundamentação da sentença de forma a corresponder à exigência constitucional.

    xv. Violou o tribunal “a quo” as normas previstas nos artigos 810º, 236º, 237º do C. Civil, artigo 5º, n.º 3 do CPC, 154º e 607º do CPC e artigo 205, n.º 1 da CRP.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    *Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

    *II- FUNDAMENTOS O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo a Relação conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.

    No seguimento desta orientação, as questões que cumpre apreciar são as seguintes: a- se o relatório vertido na sentença proferida pelo tribunal “a quo” corresponde à matéria da oposição; b- se aquele tribunal incorreu em erro de julgamento ao conhecer, de imediato, em sede de audiência prévia, do mérito da causa sem produção da prova testemunhal arroladas pelas partes; c- se a sentença padece do vício da falta de fundamentação.

    *A- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO O tribunal a quo julgou provados os seguintes factos: A- O exequentes deu à execução a escritura pública de hipoteca celebrada em 23 de janeiro de 2012, outorgada no Cartório Notarial da Maia, perante o notário J. F., celebrado entre A. C., na qualidade de procurador e em representação de J. B., e C. C., e de acordo com a qual o primeiro confessou-se devedor ao segundo da quantia de 39.000,00 euros e constituiu hipoteca voluntária, para garantia do pagamento de tal quantia, incidente sobre a fração autónoma designada pela letra “P”, correspondente a uma habitação no quinto andar direito, com uma varanda e uma garagem privativa na cave e com o uso exclusivo de um terraço, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na Rua da …, concelho de Viana do Castelo, descrito na Conservatória do Registo Predial de Viana do Castelo sob o número …, nos termos que melhor surgem explicitados nos textos cujas cópias constam de fls. 7 a 9 dos autos principais e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

    B- No dia 08 de fevereiro de 2013, no Cartório Notarial de Barcelos, perante o notário J. S., A. C., na qualidade de procurador e em representação de J. B., declarou vender, e M. P., casado com A. M., no regime patrimonial conjugal da comunhão de bens adquiridos, declarou comprar, a fração autónoma identificada na alínea anterior, conforme se retira de fls. 7 a 9 dos presentes autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

    C- A hipoteca foi registada na Conservatória do Registo Predial...

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