Acórdão nº 2936/15.5T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Novembro de 2017
Magistrado Responsável | HELENA MELO |
Data da Resolução | 02 de Novembro de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório A. F.
intentou contra Seguros A, S.A. (inicialmente o A. demandou ainda o Banque X - Sucursal em Portugal- locadora do bem, tendo vindo posteriormente a desistir dos pedidos relativos a esta R.) ação declarativa, com processo comum, pedindo a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de 48.565,98 €, alegando que celebrou com a R. um contrato de seguro por danos próprios tendo por objecto o veículo automóvel que identifica e que foi furtado, sendo a R. responsável pelo pagamento do capital seguro e extras, por força do contrato de seguro e ainda pelo pagamento de uma indemnização pela privação do uso do veículo.
A R., devidamente citada, contestou, impugnando os factos alegados pelo A., e excepcionando a ineptidão da petição inicial.
Foi proferido despacho a convidar o A. ao aperfeiçoamento da petição inicial.
O A. juntou novo articulado, aperfeiçoado, tendo a R. exercido o contraditório.
Foi realizada audiência prévia, indeferindo-se a invocada ineptidão da petição inicial, fixando-se o objecto do litígio e enunciando-se os temas da prova.
Realizou-se a audiência final e a final foi proferida sentença que julgou a ação improcedente e, consequentemente, absolveu a R.
O A. não se conformou e interpôs o presente recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: I. Vem o presente recurso interposto da decisão proferida pela Meritíssima Juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo Local Cível de Braga - Juiz 1, a qual julgou “a presente acção improcedente, por não provada, e, consequentemente, absolve a R. do pedido.
” II. Tendo sempre o respeito devido por opinião em contrária, consideramos que a sentença em crise, não fez uma correta interpretação da prova produzida nos autos, pelo que, no nosso modesto entendimento, carece de revisão a sentença proferida sobre a matéria de facto e, consequentemente, considera-se ainda incorreto o direito aplicável aos factos e à situação sub judicie.
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Assim, constitui matéria de apelação dar-se como provado o furto e a consequente obrigação de indemnizar da Ré Recorrida, devendo a decisão sobre a matéria de facto ser revista, designadamente a que deu determinados factos como não provados, que estão em contradição com a prova produzida nos autos e contra as regras da experiência, do senso comum e da normalidade do acontecer.
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Deve o ponto 1 da factualidade não provada, alterar-se para provado, passando a constar dos factos assentes a seguinte factualidade: “O veículo do A. desapareceu do local onde foi deixado estacionado no dia 02 de dezembro de 2014, tendo o A. constatado o desaparecimento no dia 3.
” V. Os elementos probatórios que, conjugados entre si e que justificam dar-se esse facto como não provado são o contrato de financiamento junto como documento 1 com a petição inicial, informação prestada pela Concessionário Automóvel (cfr. fls. 120); informação prestada pela Via Verde (cfr. fls. 137), auto de denúncia junto como doc.3 com a petição inicial e doc. 1 da contestação da recorrida; despacho de arquivamento proferido no processo de inquérito n.º 1198/14.6GBBCL, que correu termos no DIAP de Barcelos junto como doc.4 com a petição inicial; e a seguinte prova testemunhal: Ficheiro: 20170123101726_4945902_2870569, de 23.01.2017, gravação das 10:18:11 e fim às 11:48:11, início às 26m:59s e fim 55m:02s: Testemunha N. P.; Ficheiro: 2017012350040_4945902_2870569, de 23.01.2017, inicio às 15:01:28 e fim às 15:29:31: Testemunha J. G.; Ficheiro: 20170123101726_4945902_2870569, de 23.01.2017, gravação das 10:18:11 e fim às 11:48:11, com início às 01h:11m:50s e fim às 01h:21m:10s: Testemunha C. P.; VI. A sentença recorrida considerou estranho o Autor continuar a cumprir com as suas obrigações, designadamente o contrato de financiamento junto como doc.1, porém, incorre em erro a sentença, contrariando, de forma absoluta as regras da experiência, do senso comum, da normalidade do acontecer e a lei, porquanto se trata de uma obrigação contratual! VII. A cláusula décima sétima, n.º4 do referido doc. 1, estabelece que em caso de perda, o locatário, nos presentes autos o autor, pagará ao locador Banque X, uma indemnização de montante igual à soma (i) valor de aquisição do equipamento ainda não amortizado pelas rendas já pagas (ii) dos impostos na data exigíeis e (iii) 20% dos juros reflectidos nas rendas que se vencerem, até final do contrato, calculados através da aplicação da taxa nominal de locação do referido valor inicial ainda não amortizado.
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Assim, o Autor, caso deixa-se de cumprir com o contrato teria de pagar na mesma o veículo, impostos e 20% dos juros! IX. Ou poderia optar como optou, por cumprir o mesmo, adquirindo a possibilidade de ser ressarcido pela aqui Ré, com quem contratou o seguro de danos próprios.
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Não restava outra alternativa ao Autor, ou a qualquer outra pessoa medianamente sagaz e cumpridora das suas obrigações, que não a de cumprir e honrar os seus compromissos.
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Considerou ainda estranho a Mm.ª Juiz a quo, o facto de o identificador da via verde daquele veículo só ter sido rescindido em 08/05/2015, mais de cinco meses depois do sinistro.
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Sucede, porém, que, tal facto não merece estranheza ou reparo, qualquer homem, bom pai de família e medianamente sagaz sabe que, ao não cancelar o identificador, poderá consultar eventuais movimentos do veículo, localiza-lo e avisar as Autoridades, a quem apresentou a competente queixa.
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E, ainda que assim não fosse, tal situação – não cancelamento imediato da Via Verde – não merece qualquer estranheza, uma vez que é um facto que facilmente “passa” a qualquer pessoa, até porque, não passando com o identificado nas vias reservadas, não recebe cartas para pagar, logo, não se lembra.
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Quanto à resposta do concessionário citroen e ao facto de o Autor deter as chaves do veículo, também não comporta qualquer estranheza, nem pode ser censurado XV. O que merece censura é a consideração da mm.ª Juiz a quo de que o veículo apenas pode circular com as respetivas chaves, o que equivale a considerar que o mesmo era insusceptível de furto! XVI. Contudo, como é sabido e face à normalidade do acontecer, em quase 100% dos furtos os proprietários ficam com as chaves, só desaparece o veículo! Por norma, não se entregam as chaves aos meliantes! XVII. Não são necessários quaisquer conhecimentos especiais para saber que não existem veículos automóveis insuscetíveis de serem furtados.
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Nem existe qualquer marca automóvel, designadamente a Citroen, que garanta, a 100%, a impossibilidade de furto dos seus veículos.
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O normal é, quando o veículo é estacionado e desaparece, que o proprietário permaneça na posse de todas as chaves! Estranho seria, não ser assim! XX. Vista que está, parte da displicente motivação da sentença recorrida, pretende-se, antes de mais, perceber de que forma é que se prova o furto com o intuito de proceder à alteração da factualidade em causa para provada e assim, obter justiça.
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Como é óbvio e sabido, a prova do furto há-de ser sempre indireta e resultar de circunstancialismos dos quais se possa concluir a existência daquele furto, uma vez que este não foi presenciado.
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Resulta da alegação do recorrente que, na noite do dia 2 para 3, este deixou, por volta das 21:30h, o veículo fechado, trancado e estacionado no parque da pastelaria de que é dono e que, no dia 3, de manhã, o mesmo já lá não se encontrava.
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Tal facto resulta também de forma inabalável e direta do auto de denúncia efetuado pelo Autor aqui recorrente (junto como doc.3 com a petição inicial e doc. 1 da contestação da recorrida).
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Pelo que, a sentença recorrida, não tomou devidamente em consideração esse auto, retirando uma errada perceção do mesmo, pelo que o mesmo foi incorretamente apreciado, uma vez que o teor do mesmo, equivale ao facto que se quer ver como provado.
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Da prova testemunhal, resulta também evidente a veracidade do auto e, por si só, justifica a alteração do facto para provado, designadamente a constante no Ficheiro: 20170123101726_4945902_2870569, De 23.01.2017, gravação das 10:18:11 e fim às 11:48:11, início às 26m:59s e fim 55m:02s da Testemunha N. P.: designadamente dos 31m:08s a 34m:41s e 42m:08s a 46m:59s .
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Resulta evidente da prova produzida que, a última pessoa a ver o veículo foi o Autor, por volta das 21:30 do dia 02-12-2014, que o deixou fechado e trancado no seu parque, apenas se apercebendo do desaparecimento no dia seguinte, quando questionado pelo seu filho.
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Durante este hiato temporal (das 21:30 do dia 02-12 até à denúncia 11:30 do dia 03-12- 2014), e até aos dias de hoje, nunca mais ninguém viu o veículo! XXVIII. Estacionado o veículo em determinado local e, ao pretender recuperá-lo, se constata que o mesmo já lá não se encontra, sem que seja fornecida qualquer explicação para esse facto e sem que o seu proprietário volte a estar na sua posse, acrescendo a correspondente queixa por furto na GNR e a participação do desaparecimento à seguradora - só se pode concluir como provado o furto e, como tal, deve dar-se como provado que: “O veículo do A. desapareceu do local onde foi deixado estacionado no dia 02 de Dezembro de 2014, tendo o A. constatado o desaparecimento no dia 3.
” XXIX. Por outra lado, não podemos ignorar que a recorrida, para justificar a sua recusa em indemnizar o Autor, alega que as circunstâncias do sinistro não foram as retratadas – uma testemunha que nesse mesmo dia e pelas mesmas horas, viu o Sr. N. P. a circular no veículo Citroen DS5 cor branca, com a matrícula NB -e, por isso, não paga o contratualmente estabelecido.
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Alega pois a Recorrida factos impeditivos do direito do autor, motivo pelo qual impedia sobre esta o ónus de prova do que alega, nos termos do disposto no artigo 342.º, n.º 2 do Código Civil, o que não fez.
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A Ré apenas logrou fazer prova de que a testemunha viu o filho do Autor a circular no veículo, por volta das oito horas da noite (Ficheiro...
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