Acórdão nº 493/14.9TBFAF.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelJORGE TEIXEIRA
Data da Resolução16 de Novembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

I – RELATÓRIO.

Recorrente: Freguesia de X, representada pela Junta de Freguesia de X.

Recorrido: M. A..

Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Juízo Local Cível de Fafe.

M. A.

, com residência na Rua …, Fafe, intentou a presente acção de processo comum, contra Freguesia de X, NIPC …, representada pela Junta de Freguesia de X, com sede no Bairro de X, X, Fafe, e actualmente União de Freguesias de X e Y, que agregou a Freguesia de X, pedindo a condenação desta a: a) ver declarado incumprido pela Ré o contrato-promessa celebrado entre A. e Ré; b) ver declarado o incumprimento definitivo do contrato-promessa pela Ré e, consequentemente, declarada a resolução do contrato-promessa celebrado; c) ver a Ré condenada a restituir ao A. a quantia de € 24.186,71, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos desde 18-12-2000, data da verificação do incumprimento, até efectiva entrega do valor em causa; Para tanto, alega ter celebrado, na qualidade de promitente comprador, com a Ré, um contrato-promessa de compra e venda, cujo preço pagou em duas prestações, na totalidade, ficando a Ré incumbida de marcar a escritura.

A Ré procedeu à celebração de um contrato de compra e venda com outrem, que identifica, assim tornando impossível o cumprimento.

Procedeu-se a citação da Ré, que apresentou contestação escrita a fls. 37 e ss., cujo teor se dá por reproduzido, na qualidade de actual União de Freguesias de X e Y.

Alega, em primeiro lugar, enquanto União de Freguesias de X e Y, refere, no mais, que o A. celebrou um contrato-promessa do mesmo terreno com C. G., ou a quem este entendesse nomear, com as características que descreve.

Que após, o promitente comprador tomou posse do lote a comprar.

Refere que o A. nunca disse à Junta de Freguesia que o preço do contrato-promessa não tinha sido integralmente pago.

Nessa sequência, C. G. indicou um terceiro, F. A., para celebrar o contrato definitivo, tendo sido o ex-Presidente da Junta de Freguesia quem outorgou o contrato em nome da Junta de Freguesia.

O A. teve conhecimento do contrato definitivo celebrado na altura, na altura, concordando com o mesmo.

O ex-Presidente da Junta foi julgado e condenado pela prática de crime de usurpação de funções, devido à outorga da escritura definitiva.

O A. intentou uma acção contra C. G. e esposa, tendo a Junta de Freguesia sido admitida a intervir, sendo que o A. desistiu da instância.

O C. G. encontra-se insolvente.

Refere que pode celebrar o contrato prometido logo que seja removida da ordem jurídica a escritura pública de compra e venda.

Acrescenta que, de todo o modo, não está em mora, porque não foi convencionado prazo, nem houve interpelação admonitória.

Por último, refere que a conduta do A. viola a boa fé, porquanto o mesmo pretendia ver restituído o dinheiro que pagou, sem restituir à massa insolvente o valor recebido pelo contrato promessa celebrado com C. G.

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Termina pugnando pela improcedência da acção.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença em que, respondendo à matéria de facto controvertida, se decidiu nos seguintes termos: “Julgar a procedente a presente acção declarativa de condenação, sob a forma sumária, que M. A. intentou contra a actual União de Freguesias de X e Y e, em consequência: i) Declaro válido e eficaz o contrato-promessa de compra e venda celebrado em 2 de Maio de 1997, entre A. e Ré; ii) Julgo verificada a impossibilidade superveniente subjectiva da Ré quanto ao cumprimento do contrato, na sequência da outorga do contrato aludido em 6); iii) Na sequência do atrás referido, julgo extinto o contrato-promessa celebrado entre A. e Ré e, consequentemente, condeno a Ré a restituir ao A. a quantia de € 24.186,71 prestada pelo A. à Ré no âmbito do acordo referido em i); iv) Condeno a Ré a pagar ao A. juros de mora devidos desde 4-4-2009, calculados à taxa legal aplicável em cada momento em que forem devidos e até efectivo e integral pagamento, porquanto os devidos desde 18-12-2000 até então se encontram prescritos, nos termos do artigo 310.º, d) do C.C.”.

Inconformados com esta decisão, dela interpôs recurso a Ré, sendo que, das respectivas alegações desses recursos extraiu, em suma, as seguintes conclusões: I. Com o presente recurso a Ré pretende a reapreciação da matéria de facto, na medida em que matéria factual constante do ponto 7 dos factos provados e da al. d) dos factos não provados continuam incorrectamente julgados; II. Tal factualidade não resulta dos documentos juntos aos autos, designadamente da réplica do Autor, junta com a contestação, relativa ao processo 2042/05.0TBFAF e, muito menos, dos depoimentos prestados em audiência de julgamento, não valorados pela sentença recorrida; III. O tribunal não fundamentou a resposta dada à al. d) dos factos não provados, o que por si só consubstancia violação do preceituado no artigo 607.º, n.º 4 do C.P.C., sendo, por isso, a sentença recorrida nula, nos termos da al. c) do n.º 1 do artigo 615.º do C.P.C, nulidade que se vem arguir, para os devidos e legais efeitos; IV. A matéria factual constante da al. d) dos factos não provados já se encontra, em parte, implícita no ponto 25 dos factos provados.

V. Assim, existe erro de julgamento da matéria de facto, sendo a sentença em crise nula por violação do artigo 607, n.º 4.º do Código de Processo Civil; VI. Havendo erro de julgamento da matéria de facto, deve o tribunal “ad quem” proceder à modificação da decisão da 1ª instância, fazendo «jus» ao reforço dos poderes que tem enquanto tribunal de instância que garante um efectivo segundo grau de jurisdição; VII. Nos termos do artigo 662.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, deve assim a matéria de facto ser reapreciada, alterando-se a resposta ao artigo 15.º da Petição Inicial (ponto 7 dos factos provados), no sentido de se considerar como não provado, e a resposta ao artigo 62.º da contestação (al. d) dos factos não provados), no sentido de se considerar como provada, ou simplesmente ser eliminada dos factos não provados; VIII. O incumprimento do contrato-promessa é regido pelos preceitos de carácter geral dos arts. 790.º e seguintes do Código Civil, em virtude da equiparação estabelecida pelo nº1 do artigo 410.º do C. Civil, relativamente ao contrato prometido; IX. No contrato-promessa constante dos autos, as partes acordaram que a escritura de compra e venda seria agendada pela Ré, mas não fixaram qualquer prazo, e, não havendo prazo, a obrigação de contratar passa a ser uma obrigação pura, a todo o tempo exercitável, cabendo, por isso, a qualquer uma das partes tomar a iniciativa do seu cabal cumprimento, nos termos do disposto no art. 777º, n.º1 do C. Civil; X. Daí que, para haver mora por parte da Ré, ao Autor caberia interpelar judicial ou extrajudicialmente a Ré para cumprir, para marcar a escritura pública, nos termos do disposto no art. 805º,nº. 1 do C. Civil, e, para operar a conversão da mora em incumprimento, o Autor teria, ainda, por sua iniciativa, de usar o direito conferido pela segunda parte do nº1 do art. 808º do C. Civil e fixar um prazo razoável, dentro do qual a Ré devia celebrar a escritura pública de compra e venda, sob pena de se considerar definitivamente incumprida a obrigação ou, então, teria de alegar e provar a sua perda de interesse na prestação em virtude da mora no cumprimento por parte da Ré; XI. Tendo em conta a matéria de facto constante do ponto 25 dos factos assentes, não se pode concluir pela mora da Ré e muito menos pelo seu incumprimento definitivo ou impossibilidade culposa de cumprimento; XII. O tribunal “a quo”, ao considerar o contrato de compra e venda constante do ponto 6 dos factos provados como um negócio ineficaz relativamente à Ré, não pode, ao mesmo tempo, considerar que a Ré está impossibilitada de concluir o contrato promessa de compra e venda, por o bem ter sido transmitido a terceiros; XIII. Não tendo J. G., à data da celebração da escritura, os poderes necessários e suficientes para representar a Ré, e, exigindo a lei que a pessoa que representasse a Junta de freguesia tivesse tais poderes, a celebração do contrato de compra e venda entre o referido J. G., na alegada qualidade de Presidente da Junta de freguesia de X, e o comprador, F. A., é um negócio jurídico celebrado contra disposição legal imperativa e por isso nulo; XIV. O contrato de compra e venda celebrado consubstancia assim uma venda de bens alheios, que, embora sendo nulo nos termos do art. 892.º do C.C. entre os outorgantes, é ineficaz em relação ao respectivo dono, por a sua vontade não ter integrado a declaração negocial da venda, é res inter alios acta, operando a ineficácia ipso iure, que em sentido lato, no dizer de Mota Pinto, abrange a inexistência; XV. A ineficácia do contrato de compra e venda constante do ponto 6 dos factos provados, relativamente à Ré equivale à sua inexistência, nas relações entre a Ré e o referido F. A. e entre a Ré e o Autor, tudo se passa como se a Ré fosse, como efectivamente é, proprietária do prédio correspondente ao lote de terreno objecto do contrato-promessa; XVI. O tribunal “a quo”, ao decidir como decidiu, cometeu, nesta parte, uma nulidade da sentença, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. c) do Código de Processo civil, por ocorrer oposição entre os fundamentos e decisão propriamente dita; XVII. Sem prescindir, nos termos dos artigos 790.º, n.º 1 e 791.º do Código Civil, a obrigação extingue-se quando a prestação se torna impossível por causa não imputável ao devedor, pelo que, a obrigação da Ré celebrar a escritura definitiva extinguiu-se; XVIII. Atento o teor dos artigos 795º, número 1, e 473º, ambos do C. Civil, a matéria de facto dada como provada, designadamente a matéria dos pontos 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20,21, 22, 23, 24, 25, 26 e 27, o facto de o Autor ter recebido a quantia de 1.800.000$00 por conta do contrato celebrado em 8 e relativo ao mesmo lote de terreno, e ainda o facto de a Ré não ter...

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