Acórdão nº 190/16.0T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Julho de 2017
Magistrado Responsável | LINA CASTRO BAPTISTA |
Data da Resolução | 11 de Julho de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO PAULA e marido JOSÉ, residentes na Rua do R., Barcelos, intentaram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra ANA, residente na Rua da Estrada, Barcelos, pedindo que se condene a Ré a pagar-lhes a quantia de € 11 107,91, acrescida de juros de mora vencidos, no valor de € 2 484,55, e dos vincendos, até integral pagamento.
Alegam – em síntese – que, em 27 de julho de 2010, outorgaram escritura de doação, nos termos da qual a Ré lhes doou o prédio misto, composto por casa de habitação de rés-do-chão e andar, dependência e coberto ao nascente e junto terreno de cultura e ramada, com a área de 22 600 m2, situado na Rua Estrada, concelho de Barcelos, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo XXX e na matriz predial rústica sob o artigo YYY, com reserva de usufruto para a doadora e com a obrigação de os donatários a tratarem e acompanharem na saúde e na doença.
Dizem que, na sequência de tal escritura, a Autora passou a viver em casa da Ré, prestando-lhe todos os cuidados, fazendo a limpeza da casa, fazendo as compras para a casa, acompanhando-o ao médico e levando-a a passear. Afirmam que, por essa altura e por indicações do advogado da Ré, foi aberta uma conta bancária conjunta da Autora e da Ré, para aquela ir pagando as despesas da casa e quaisquer outras que a Ré determinasse.
Relatam que, em 25 de novembro de 2010, a Ré impediu a Autora de continuar a residir em tal habitação.
Alegam que, em setembro de 2010, altura em que a Autora ainda vivia com a Ré, a Ré solicitou ao Autor que lhe emprestasse a quantia de € 2 000,00, com vista ao pagamento de um imposto de selo, tendo este, aceitando tal pedido, depositado essa quantia na conta bancária acima aludida.
Mais alegam que, em outubro de 2010, a Ré recebeu a notificação fiscal para pagamento do imposto de selo em causa, no valor de € 9 107,91, a pagar até 31 de dezembro de 2010. Acrescentam que, nessa altura, a dita conta bancária dispunha apenas de saldo € 3 219,02.
Dizem que, a pedido da Ré, a Autora pediu emprestado a A. Lopes, o valor do imposto de selo a pagar, depositando tal montante na conta bancária indicada. Bem como que, em 23 de novembro de 2010, a Autora emitiu a favor do IGCP um cheque, no valor de € 9 107,91, para pagamento do dito imposto de selo.
Acrescentam que, no dia 25 de novembro de 2010, data em que a Autora foi impedida de continuar a viver com a Ré, lhe solicitou a devolução dos indicados valores de € 2 000.00 e € 9 201,91, sem sucesso.
A Ré veio contestar, impugnando a totalidade da matéria de facto da Petição Inicial, com exceção da celebração da referida escritura de doação.
Contrapõe, com particular relevo, que, relativamente à quantia de € 2 000,00, a mesma diz respeito ao subsídio por morte, no montante de € 2 500,00, que a Ré recebeu da Segurança Social, através de vale, e que o Autor se prontificou a depositar na conta bancária acima referida, apropriando-se, todavia, do remanescente de € 500,00.
Mais afirma que, relativamente ao depósito no valor de € 9 107,91, este teve por causa a circunstância de os Autores saberem que a Ré teria que pagar uma quantia de igual valor nos Serviços de Finanças, relativa ao imposto devido pela herança que recebeu do seu irmão, e por fundamento a ocultação desta da inexistência de saldo na conta, por força de levantamento de várias quantias da sua parte.
Em sede de reconvenção, alega que, apesar das obrigações contraídas e exaradas na doação, os Autores deixaram de lhe prestar os cuidados de higiene, limpeza, tratamento de roupas e fornecimento de refeições e se apropriaram de valores em dinheiro existentes em contas suas e de objectos em ouro e valores que encontraram na sua casa.
Especifica que os Autores passaram a efectuar pagamentos, com cheques e cartão multibanco associados à conta bancária acima referida, para pagamentos de despesas próprias e sem o seu consentimento, no valor global de € 32 371,06.
Alega que as obrigações assumidas pelos Autores na doação correspondiam à prestação de serviços através de trabalhos pessoais ou de terceiros, em valor nunca inferior ao valor do salário mínimo nacional. Entende que, desde 25/11/2010, tem acumulado um dano não inferior a € 31 500,00, a que acrescerão os vincendos, em valor não inferior, até que cesse o incumprimento dos Autores.
Mais alega que, por força das obrigações assumidas na doação, os Autores têm obrigação de pagar as despesas de saúde e com a habitabilidade do imóvel, designadamente as despesas de saúde suportadas por si, no valor de € 863,56; os pagamentos dos consumos e alugueres de contadores da electricidade, no valor de € 4 001,07.
Alega, por outro lado, que o seu estado de saúde foi agravado pelo descrito comportamento dos Autores e que o mesmo lhe vem provocando humilhação, ansiedade, nervosismo e preocupações. Reclama para compensação deste dano uma indemnização no valor de € 9 450,00.
Defende que, nesta data, detém um crédito sobre os Autores de € 78 185,69, a que haverá que deduzir-se, por efeito de compensação, o valor indicado na Petição de € 9 107,91.
Conclui pedindo que a ação seja julgada não provada e improcedente, com a sua absolvição do pedido, e que a reconvenção seja julgada provada e procedente, sendo os Autores condenados a pagar-lhe a quantia de € 78 185,69 ou, deduzida por compensação a quantia de € 9 107,91, a quantia de € 69 077,78, acrescida de juros de mora, à taxa anual e legal, contados desde a data da notificação para contestar e até integral pagamento, bem como as demais quantias que se vencerem, a partir desta data e até que cesse o incumprimento dos Autores, a liquidar em execução de sentença.
Os Autores vieram apresentar Réplica, impugnando a totalidade dos factos constantes da Contestação/reconvenção.
Alegam ainda que tais factos já foram alegados e discutidos na Ação Ordinária n.º 461/13.8TBBCL, do Tribunal da Comarca de Braga e no Processo-Crime n.º 372/11.1TABCL, do então Juízo Criminal do Tribunal de Barcelos.
Rematam pedindo que se decida pela inadmissibilidade da reconvenção quanto aos factos já discutidos e julgados na ação ordinária anterior e que se decida pela inadmissibilidade da reconvenção quanto aos novos factos invocados pela Ré, uma vez que os mesmos derivam e estão directamente relacionados com aqueles outros.
Proferiu-se despacho a admitir a reconvenção e, em sede despacho saneador, julgou-se improcedente a exceção de caso julgado invocada pelos Autores. Definiu-se o objeto do litígio e fixaram-se os temas da prova.
Sequencialmente, os Autores vieram apresentar requerimento nos autos, pedindo que, em obediência à autoridade do caso julgado, fossem eliminados os Pontos 3 a 7 dos temas da prova fixados, requerimento que, por despacho, foi relegado para apreciação na sentença.
Realizou-se julgamento de acordo com o legal formalismo e foi proferida sentença, que julgou a ação totalmente improcedente e, em consequência, absolveu a Ré dos pedidos formulados nos autos pelos Autores. Por outro lado, julgou a reconvenção parcialmente procedente e, em consequência, condenou os Autores a pagarem à Ré a quantia de € 31 500,00, devida até ao momento da apresentação da reconvenção, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4 %, a contar da notificação da reconvenção e até efectivo e integral pagamento, e a quantia mensal de € 500,00 a partir dessa data e até que cesso o incumprimento dos Autores. Mais condenou os Autores a pagarem à Ré a quantia por esta gasta a título de despesas de saúde desde 25 de novembro de 2010 e até que cesse o incumprimento dos Autores, cujo montante se relega para liquidação.
Inconformados com o julgado, os Autores recorreram, terminando com as seguintes Conclusões: 1.
Na ação anterior n.º 461/13.8TBBCL resultaram “não provados” os factos nos quais a recorrida fundamenta o pedido reconvencional da presente ação, não podendo, por isso, o tribunal “a quo” voltar a apreciar e decidir de forma diferente tais factos – cf. fls. 78v. a 79v. (art.º 580.º do CPC).
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Formou-se, pois, a autoridade do caso julgado quanto aos factos dos pontos 1º a 15º, 19º, 20º, 43º a 45º e 52º a 58º da contestação, não podendo o tribunal “a quo” basear a sentença num suposto “incumprimento das condições da doação pelos recorrentes, “apropriação de objectos de ouro”, “abandono da casa da recorrida” e “dependência da recorrida do apoio da família” – Vd. N.º 2 do art.º 580.º do CPC e fls. 189v. da sentença.
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Face à autoridade do caso julgado, os pontos 27 a 30, dados como provados não podiam ser novamente apreciados, nem, pois, incluídos nos temas de prova, devendo, por isso, ser eliminados.
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Dos depoimentos dos recorrentes resulta que o relógio em ouro que a Recorrente em sua posse, foi-lhe oferecido pelo falecido irmão da Ré e, quanto às argolas em ouro, não foi feita qualquer prova nesta ação, devendo, por isso, o ponto 27 ter a seguinte redação: “A Autora tem na sua posse um relógio em ouro, com corrente, que lhe foi oferecido pelo irmão da Ré.” – cf. concretas passagens dos depoimentos dos Recorrentes, transcritas a fls. 16 a 18 destas alegações.
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Dos depoimentos dos Recorrentes e da testemunha Maria R., resulta que os Recorrentes, a partir de 25.11.2010, não mais voltaram à casa da Recorrida porque esta os pôs de lá para fora, impedindo-os de lhe prestarem cuidados, devendo, por isso, o ponto 28 ter a seguinte redação: “Desde a data referida em 6. que os autores não voltaram a casa da Ré porque esta os pôs de lá para fora, dizendo que a partir de então seria o irmão a cuidar dela.” – cf. concretas passagens dos depoimentos dos Recorrentes e da testemunha Maria R., transcritos a fls. 16 a 20 destas alegações e doc. de fls. 160 a 163.
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Dos depoimentos da Recorrente e da testemunha José R. resulta que a Recorrida aufere uma reforma mensal de € 316,00 e que tem proventos com a venda de animais e ovos, devendo, por isso, o ponto 29 ter a seguinte redação: “O bem doado é o único...
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