Acórdão nº 1255/12.3TBBGC-G.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução11 de Julho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães * 1 – RELATÓRIO Nos autos (1) de Insolvência em que é insolvente “ R - Aquecimentos Soc. Unipessoal, Ldª”, o Sr. Administrador da Insolvência apresentou o seu parecer no sentido de que a insolvência fosse considerada culposa e que deveria ser abrangido por tal juízo qualificativo T. Fernandes.

O Ministério Público manifestou a sua discordância com o parecer do Administrador, por não estar indiciado que a insolvência tenha sido devida a uma conduta dolosa por parte dela, mas ao facto de ter existido um sobreendividamento que o insolvente, por incapacidade e falhas de pagamento, não soube estancar. Não podendo o A.I. basear a qualificação somente nos requisitos legais, sem fundamentar com factos concretos.

Devidamente citado, o visado T. Fernandes deduziu oposição, refutando o entendimento do Sr. Administrador, considerando que a insolvência deve ser qualificada de fortuita e subscrevendo inteiramente a pronúncia do Ministério Público a tal propósito.

Foi proferido despacho saneador e porque o estado dos autos permitia desde logo apreciar os fundamentos da acção, foi elaborada decisão que qualificou a insolvência como culposa, tendo sido afectado pela qualificação da insolvência como culposa T. Fernandes.

Inconformado com essa decisão, apresentou o insolvente T. Fernandes recurso de apelação contra a mesma, cujas alegações finalizou com a apresentação das seguintes conclusões: 1ª.

A douta sentença em recurso qualificou a insolvência como culposa com fundamento no disposto na al. a), do nº 3, do artº 186º, do CIRE, qualificação esta que, em face dos factos dados como provados, o recorrente considera totalmente indevida.

  1. Da conjugação dos disposto nos nºs 1 e 3, al. a), do artº 186º do CIRE resulta que se presume a existência de culpa grave quando os administradores, de direito ou de facto, tenham incumprido o dever de requerer a declaração de insolvência, MAS A INSOLVÊNCIA SÓ PODE SER CONSIDERADA CULPOSA quando a situação tiver sido criada ou agravada em consequência da atuação, dolosa ou com culpa grave, do devedor, ou dos seus administradores.

  2. Assim, apesar das situações previstas no nº 3 do artº 186º do CIRE presumirem a existência de culpa grave, as mesmas não dispensam a necessária demonstração do nexo causal entre o comportamento, que a lei presume como gravemente culposo, e a criação ou agravamento da situação de insolvência, ou seja, para que o incumprimento a que alude o nº 3 possa determinar a qualificação da insolvência como culposa é necessário ainda que se demonstre que o incumprimento desse dever criou ou agravou a situação de insolvência.

  3. ORA, em face dos factos dados como provados, não se encontra minimamente demonstrado e provado que o incumprimento do dever de requerer a declaração de insolvência foi causa necessária e direta para a criação ou agravamento da situação de insolvência.

  4. MAIS: Mesmo não lhe estando acometido o ónus da prova, ao recorrente também não foi permitido exercer o direito de contraprova aos factos invocados pelo Administrador de Insolvência, ou seja, de provar os factos que, na sua perspetiva, afastariam a presunção da existência de culpa grave, prevista no nº 3 do artº 186º, CIRE e que também lhe permitiriam provar que a situação de insolvência não foi criada ou agravada por qualquer conduta praticada com culpa grave ou dolo, nos termos do nº 1 do artº 186º, CIRE.

  5. E isto porque, apesar de ter arrolado testemunhas na sua oposição ao requerimento do AI, apresentada em 18-01-2017 (na qual, em consonância com a douta pronúncia do Ministério Publico, pugnou pela qualificação da insolvência como fortuita), a douta sentença foi proferida sem que tal prova testemunhal tivesse sido ouvida pelo Ilustre Tribunal recorrido, em clara violação do princípio do contraditório e de defesa e dos artºs 3º, nº 3, 411º, 413º e 515º, CPC.

  6. Nestes pressupostos, considera-se que a insolvência foi indevidamente qualificada de culposa e, de outro modo, a douta sentença deveria tê-la qualificada como meramente fortuita.

  7. Invocando-se ainda, em abono desta conclusão, o facto de o Administrador de Insolvência ter referido expressamente nos artºs 3º a 7º do seu parecer que a gerência da insolvente cumpriu integralmente o dever de colaboração decorrente e exigido com a declaração de insolvência.

    SEM PRESCINDIR, daqui decorre: 9ª.

    A douta sentença determinou que – cfr. fls 13 / 3º parágrafo: “Compulsada a certidão de registo comercial da sociedade insolvente (vide fls. 93/94 dos autos principais) constata-se que esta tem o Requerido T. Fernandes como gerente nomeado, devendo por via disso ser-lhe dirigido o juízo de censura – “actuação dolosa e com culpa grave”.

  8. Ora, em face dos factos provados e da não existência e não demonstração do nexo de causalidade que permita concluir que o gerente criou ou agravou a situação de insolvência da insolvente, afigura-se que tal qualificação da sua atuação como “dolosa e com culpa grave “ carece totalmente de fundamentação adequada que a suporte.

  9. No que incorre em violação do disposto nos artºs 189º, nº 2, al. a), parte final, do CIRE e artºs 154º e 607º, nºs 4 e 5 do CPC.

  10. Acresce ainda que a douta sentença decidiu a final “iii) Condenar o Requerido T. Fernandes a INDEMNIZAR, até às forças do respectivo património, os CREDORES melhor identificados na lista de fls. 120-124 do Apenso A no montante dos seus créditos não satisfeitos.” 13ª.

    Salvo o devido respeito, considera-se que a douta sentença não cumpriu o disposto no nº 4, do artº 189º, do CIRE, na medida em que não fixou especificamente o valor das indemnizações devidas, nem definiu os critérios a utilizar para a sua quantificação, a efetuar em liquidação de sentença, para o caso de tal não ser possível em virtude de não dispor dos elementos necessários para calcular o montante dos prejuízos sofridos.

  11. Também neste particular, em face dos factos provados e da não existência e não demonstração do nexo de causalidade que permita concluir que o gerente criou ou agravou a situação de insolvência da insolvente, considera-se que também aqui, ao condenar o recorrente a indemnizar genericamente “…os CREDORES melhor identificados na lista de fls. 120-124 do Apenso A no montante dos seus créditos não satisfeitos”, a douta sentença carece de adequada fundamentação que a suporte.

  12. No que incorre, também nesta parte, em violação do disposto nos artºs 189º, nº 2, al. a), parte final, do CIRE e artºs 154º e 607º, nºs 4 e 5 do CPC.

    Nestes termos e nos demais de direito doutamente supríveis por Vs. Exas, deve ser revogada a douta sentença recorrida com as legais e devidas consequências, por assim ser de devida, merecida e costumada JUSTIÇA.

    * Contra-alegou o Ministério Público, que finalizou com a apresentação das seguintes conclusões: I. O recorrente não se conforma com a sentença proferida pelo Tribunal a quo, que se dá aqui por integralmente reproduzida e onde, em síntese, se decidiu nos termos do disposto no artigo 189.º, n.º 1, do CIRE qualificar a insolvência de R., Aquecimentos, Unipessoal, L.da como culposa e declarar T. Fernandes abrangido por esta qualificação com as demais consequências legalmente previstas.

    1. O recorrente alega que na sentença foi qualificada a insolvência como culposa com fundamento no disposto na al. a), do n.º 3, do art. 186.º, do CIRE, qualificação esta que, em face dos factos dados como provados, considera totalmente indevida, uma vez que não se provou que a situação foi criada ou agravada em consequência da actuação, dolosa ou com culpa grave, do recorrente, ou seja, que o incumprimento do dever de requerer a declaração de insolvência foi causa necessária e directa para a criação ou agravamento da situação de insolvência.

    2. E que a sentença não cumpriu o disposto no n.º 4, do art. 189.º, do CIRE, na medida em que não fixou especificamente o valor das indemnizações devidas, nem definiu os critérios a utilizar para a sua quantificação, a efetuar em liquidação de...

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