Acórdão nº 283/16.4T9MDL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelAUSENDA GON
Data da Resolução19 de Junho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Penal, do Tribunal da Relação de Guimarães: No processo comum singular nº 283/16.4T9MDL da Instância Local, Secção de Competência Genérica de Mirandela, da Comarca de Bragança, foi proferida sentença, em 25/01/2017, depositada na mesma data, condenando a arguida R. M.

, como autora material de um crime de ameaça agravada, p. e p., pelos arts. 153º, nº 1 e 155º, nº 1, al. a) e c), com referência ao art.132º, nº 2, alínea l), de um crime de injúria agravado, p. e p. pelos arts. 181º, nº 1 e 184º, com referência ao art. 132, nº 2, al. l) e de um crime de introdução em lugar vedado ao público, p. e p. pelo art. 191º, todos do CP, nas penas de, respectivamente, 100, 90 e 30 dias de multa, à taxa diária de € 20, e, em cúmulo jurídico de tais penas, foi a arguida condenada na pena única de 180 dias de multa, à mesma taxa, no montante global de € 3.600 (três mil e seiscentos euros).

Foi ainda a arguida condenada a pagar à demandante cível P. C. o montante de € 4.000 a título de indemnização pelos não patrimoniais advindos da sua conduta, acrescida dos juros de mora vencidos, à taxa legal, desde a data da decisão, a título de reparação dos danos causados.

*Não se conformando com o decidido, a arguida interpôs recurso, sustentando a sua absolvição pelos crimes de ameaça agravada e de introdução de lugar vedado ao público e subsidiariamente defendeu a excessividade das penas que lhe foram aplicadas, bem como do pedido de indemnização cível em que foi condenada, com a motivação que rematou com as seguintes conclusões: «A. Não cremos que haja praticado factos consentâneos com o perpetrar de crime de ameaça agravada, porquanto, a expressão proferida não poderia ser interpretada restritivamente como o foi por parte do Tribunal, no sentido que lhe foi dado, de que tal representaria uma ameaça de morte ou que viesse futuramente a atentar gravemente contra a sua integridade física; B. Mas de forma lata tais expressões poderiam determinar a intenção de socialmente ou pessoalmente a vexar, ou de diminuir a sua consideração social, da sua vida pública, social; C. Ora, neste sentido cremos, no que ao crime de ameaça diz respeito, que deveria ter sido aplicado o princípio de in dubio pro reo, o qual constitui uma imposição dirigida ao julgador no sentido de se pronunciar de forma favorável ao arguido, quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a decisão da causa, tal como resulta do caso em concreto; D. Não existindo um ónus de prova que recaia sobre os intervenientes processuais e devendo o tribunal investigar autonomamente a verdade, deverá este não desfavorecer o arguido sempre que não logre a prova do facto; E. Isto porque o princípio in dubio pro reo, uma das vertentes que o princípio constitucional da presunção de inocência (art. 32.º, n.º 2, 1.ª parte, da CRP) contempla, impõe uma orientação vinculativa dirigida ao juiz no caso da persistência de uma dúvida sobre os factos e, em tal situação, o tribunal tem de decidir pro reo.

  1. E essa dúvida teria que ter existido pois é legítima e válida, pois em nenhum momento concretiza a forma de que vai acabar com a vida, se por morte, se por contar um segredo, etc, que indubitavelmente nos manifestasse o intento de tal expressão como sendo dirigida à sua pessoa física ou à sua pessoa social; G. Pelo que pugnamos, em face o expedido, que seja absolvido a arguida do crime de ameaça, previsto e punido no artigo 153º, nº 1 e correspondentemente do agravamento que resulta dos artigos 155º n.º 1, alíneas a) e c), com referência ao art. 132º, n.º 2, al. l), todos do Código Penal.

  2. No que toca ao crime de introdução em lugar vedado ao público, previsto e punido pelo art. 191º, do Código Penal não cremos que esteja cumprido o tipo legal de crime; I. Dos factos dados como provados resulta que a ofendida após lhe ter sido dito pela arguida que com ele pretendia falar ela pediu-lhe apenas para esperar – facto dado como provado nº 7 – pelo que foi, assim, assentida a sua permanência no local, não tendo sido convidada a sair; J. Pelo que, daqui não resulta a prática do crime do qual vem acusada a arguida e quando muito, em face deste consentimento à permanência, dado como provado, dever-se-ia ter aplicado o princípio do in dubio pro reo; K. Desta feita, no que ao crime de introdução em lugar vedado ao público, previsto e punido pelo art. 191º deverá igualmente ser a arguida absolvida do mesmo; L. Por sua vez e ademais, cremos e à cautela de patrocínio que a medida da pena que foi nos presentes autos aplicada é manifestamente excessiva.

  3. É na fixação concreta da medida de uma pena estabelecida no âmbito de uma moldura abstracta que se evidencia a tarefa mais importante do juiz, obedecendo no entanto a um rigoroso cumprimento da Lei, seja das normas estabelecidas no Código Penal (artigos 40º, 70º e 71º) seja dos princípios constitucionais que se evidenciam como orientadores primários da interpretação jurídico-penal.

  4. Como se sabe, é na culpa do agente e nas razões preventivas gerais e especiais que se encontram as guias fundamentais para fixar a pena devida em determinado caso, sendo que o Código Penal estabelece um limite inequívoco e inultrapassável onde tem que assentar a medida da pena: a culpa do agente, nomeadamente a sua medida.

  5. É este o limite que nenhuma razão de prevenção pode ultrapassar, de acordo com a imposição normativa estabelecida no artigo 40º n.º 2 do Código Penal, não há pena sem culpa nem a pena pode, na sua dimensão concreta, ultrapassar a medida da culpa; P. É certo que nas finalidades da pena surge, inequivocamente, a necessidade de proteger bens jurídicos como elemento fundamental, o que impõe que na fixação da pena concreta se leve em consideração a dimensão da prevenção, geral e especial, como aliás decorre do artigo 71º n.º 1.

  6. A arguida é pessoa sem antecedentes criminais, que não tem conexão comportamental e sistemática com este tipo de crimes ou com quaisquer outros, familiarmente e socialmente integrada, bem reputada, médica de profissão e que não atuou com intenção de aplicar à ofendida lesão demasiado gravosas; R. Resulta, para nós, então, que a factualidade que subjaz à aplicação das medidas das penas, que estão concretamente aplicadas, não se mostram adequadas por ultrapassar o necessário para a estrita reintegração das normas afetadas pelo comportamento da arguida e cremos que são ultrapassados não apenas os limites da prevenção, geral e especial, como também o grau de culpa da arguida e da medida da pena, o que nos leva a peticionar a reapreciação das medidas das penas.

  7. Por sua vez e no que toca ao quantum indemnizatório que foi à ofendida atribuído na douta sentença, manifestar igualmente a nossa discorrência, pois consideramos o mesmo manifestamente excessivo, já que os factos dados como provados são exíguos e não conseguem justificar o montante de 4000 € que foi arbitrado; T. Ora, os factos apenas foram presenciados por uma única pessoa, a funcionária do escritório da ofendida L. P., dentro do escritório da ofendida - onde aliás funciona igualmente uma sociedade comercial que se dedica à gestão de condomínios - o que nos demonstra que inexistiu vexame público e, por sua vez, os crimes em causa apenas geraram, como provado, 5 dias de irritabilidade e de noites mal dormidas; U. E com exceção do marido da ofendida, todos os demais que depuseram - Manuel Monteiro e Hernâni Moutinho - que descreveram o estado de espírito da ofendida nos momentos imediatamente depois e dias depois dos factos, apenas o souberam pois com toda a certeza lhes foi contado pela ofendida, tendo ela apenas e exclusivamente por iniciativa própria rememorado e transmitido a terceiros; V. E por fim, no que a esta parte diz respeito remetemo-nos para os ensinamentos dos Venerandos Desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa nos dizem em acórdão datado de 20/10/2005: “Só são indemnizáveis os danos que afectam profundamente os valores ou interesses da personalidade jurídica ou moral; Os meros transtornos, incómodos, desgostos e preocupações, cuja gravidade e consequências se desconhecem, não podem constituir danos não patrimoniais ressarcíveis” W. Pelo que nesta matéria deve igualmente naufragar o pedido de indemnização de 4000 € (quatro mil euros) ou pelo menos nesta sua extensão, devendo ser reduzido.

Normas jurídicas violadas: Foram, pelo menos, violadas as normas, 40º, 70º, 71º, 153º n.º 1 e 155º n.º 1, alíneas a) e c), com referência ao art. 132º, n.º 2, al. l), 191º, todos do Código Penal, 32.º, n.º 2, 1.ª parte, da CRP e 483º e 496º do Código Civil.

Termina dizendo que o recurso deve ser julgado procedente e, por via disso, ser a arguida: I - absolvida do crime de ameaça agravada previsto e punido 153º n.º 1 e 155º n.º 1, alíneas a) e c), com referência ao art. 132º, n.º 2, al. l), todos do Código Penal; II - absolvida do crime do crime de introdução em lugar vedado ao público, previsto e punido pelo art. 191º do Código Penal; III - Reapreciadas as medidas das penas aplicadas à arguida; IV – Ser reapreciado o montante atribuído a título de indemnização civil pugnando-se pela sua redução.».

A assistente/demandante cível também se insurgiu contra a decisão proferida na parte respeitante ao pedido de indemnização alegando que o mesmo deve ser fixado no montante que peticionou (€ 7500), terminando com as seguintes conclusões: «1ª Devido à natureza dos danos e às dificuldades da sua concretização em dinheiro, não determinou o Tribunal a justa medida da gravidade desses danos e não fixou de forma equitativa o ressarcimento da lesada recorrente; 2ª Tendo em conta os parâmetros legais e as circunstâncias do caso, entende a recorrente que a indemnização justa e equitativa deverá ser fixada em 7.500,00 euros.

  1. Foram violadas, por errada aplicação, as disposições dos artºs. 496º nºs. 1 e 3, 562º e 566º do Cód. Civil.

Dizendo que deverá ser concedido provimento ao presente recurso, alterando-se, em conformidade, a...

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