Acórdão nº 1389/15.2T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução22 de Junho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I JP, MD, FF, AF, AP, MP e JA instauraram a presente acção declarativa, que corre termos no Juízo Local Cível de Braga, contra MC, formulando os pedidos de condenar o réu a: "- Declarar-se a inexistência de contrato de arrendamento ou qualquer outro título que justifique a detenção pela R. do prédio sito na no lugar de Grácia Pires ou Penouços, situado na freguesia de Nogueira, concelho de Braga.

- Condenar a Ré a entregar o imóvel acima referido, propriedade da herança ilíquida e indivisa de MF e MA, aos seus herdeiros e aqui Autores devoluto de pessoas e bens.

- Condenar a Ré no pagamento aos autores da quantia de € 3 895,00 (três mil oitocentos e noventa e cinco euros), em face da fruição ilegítima do imóvel e contra a vontade dos Autores, acrescida de todas as mensalidades vincendas após a presente data e até sua efectiva entrega aos autores".

Alegaram, em síntese, que a ré é filha de MG e MN, falecidos, respectivamente, a 28 de Março de 2010 e a 26 de Outubro de 2011. Os pais da ré eram arrendatários da fracção autónoma correspondente ao prédio sito no n.º 26 da Rua de Abril, da freguesia de Nogueira, concelho de Braga, onde esta vivia com aqueles. Após a morte da mãe da ré, esta continuou a fruir do imóvel para a sua habitação permanente, o que aconteceu por "mera conivência" dos autores. Mais alegam que esse imóvel integra as heranças abertas por morte de MA e MP, das quais são herdeiros.

A ré contestou afirmando, em suma, que, após o falecimento dos seus pais, os autores sempre a trataram como arrendatária, havendo "total concordância com tal facto" e existindo "consentimento para que a R. permanecesse no imóvel".

Procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença em que se decidiu: "Pelo exposto, decido julgar a acção totalmente improcedente e, em consequência, absolver a ré dos pedidos.

" Inconformados com esta decisão, os autores dela interpuseram recurso, que foi recebido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo, findando a respectiva motivação, com as seguintes conclusões: I - A sentença recorrida padece de uma errada valoração da matéria factual, o que culmina em factos incorrectamente valorados, ignorando a prova documental e testemunhal produzida nos autos, bem como há uma errónea subsunção da matéria de facto à matéria de direito aplicável.

II - Ao dar como provado que a renda vigente após a morte da primitiva arrendatária era de € 5,00 (cinco euros) remetendo para o artigo 17.º da petição inicial dos Recorrentes, quebrou-se o sentido do facto dado como provado n.º 14 porquanto olvida o raciocínio que antecedia ao artigo 17.º da petição inicial, operando uma verdadeira e ilegítima descontextualização da afirmação constante do artigo.

III - Ao indicar que a renda vigente após a morte da primitiva arrendatária era de € 5,00 (cinco euros), queriam os Recorrentes indicar, conforme o expõe exaustivamente nos artigos 12.º a 18.º da sua petição inicial, que essa já era a renda paga pela única e primitiva arrendatária, progenitora da Ré, no ano de 2011.

IV - Facto esse que leva a que deveria ser alterada a redacção do facto n.º 14 dado como provado para: "Vigorando, já em vida dos arrendatários pais da Ré, a renda para fracção sub iudice de €5,00 (cinco euros) mensais (artigo l7.º da pi.)" V - O Tribunal a quo deu como não provado, erroneamente, a mera conivência da detenção material do imóvel por parte da Ré e Recorrida, olvidando a prova documental e testemunhal produzida nos autos, designadamente o testemunho da sobrinha da Recorrida a minutos 00:03:55 a 00:04:32 do seu depoimento, que indicou e reiterou a relação próxima que existia entre Recorrentes e Recorrida, que levaram, compreensivelmente, a um hiato temporal de luto que interrompeu toda a vontade de resolução efectiva do objecto do presente processo.

VI - O facto de que desde o falecimento dos progenitores da Recorrente, datado de 2011, data onde o contrato de arrendamento caducou, até ao ano de 2013 os Recorrentes terem aceite a recepção, através da consignação em depósito, de um montante simbólico de € 5,00 (cinco euros) em contrapartida da permanência da Recorrida no imóvel, não pode significar uma aceitação ou reconhecimento de qualquer arrendamento.

VII - Não impede à mera conivência a espera pela passagem de um período de luto e doença que os Recorrentes, proprietários de um prédio indiviso, recebam o valor da renda vigente à luz do extinto contrato de arrendamento enquanto a resolução efectiva da situação de gozo sem título de um imóvel não opere, sem que tal signifique a aceitação das mesmas condições contratuais equivalentes à de um (extinto) contrato que perdurou 50 anos.

VIII - A luz do homem médio é compreensível que tendo os proprietários do imóvel conhecimento directo de que a filha dos primitivos e únicos arrendatários tendo perdido os seus progenitores e estando doente não está em capacidade psicológica, nem física, de enfrentar o despejo por força da caducidade do arrendamento.

IX - Caso existisse a celebração de um novo contrato de arrendamento, após a caducidade do contrato primitivo, o mesmo deveria ser formalmente celebrado com todos os seus elementos essenciais.

X - Infirma necessariamente a ideia e convicção de celebração de um contrato de arrendamento o facto da continuação de pagamento de uma renda não negociada ou aceite pelos recorrentes e o facto de a recorrida proceder à consignação de montantes pecuniários em depósito, os quais são equivalentes aos pagos na constância do contrato de arrendamento celebrado há 50 anos atrás.

XI - Como tal, os Recorrentes nunca reconheceram a recorrida como arrendatária, ainda que estando na disponibilidade de celebrar um contrato de arrendamento consigo, ou com qualquer outra pessoa, erroneamente e meramente coloquialmente a tenha o cabeça-de-casal a apelidado com tal epíteto.

XII - A mera conivência deveria ter sido considerada facto dado como provado, dado que é a própria sobrinha da Recorrida que expressa a inexistência de qualquer acordo entre Recorrentes e Recorrida, desde logo a minutos 00:03:18 a 00:03:55 do seu depoimento, pelo que deveria ter sido dado como provado que "o uso do imóvel pela Ré decorreu, somente, da mera conivênciados herdeiros, ora Autores, muito em face da proximidade que estes tinham com a Ré".

XIII - O Tribunal a quo tem o dever de apreciar devidamente a prova documental e testemunhal produzida nos autos, sendo que os factos dados como provados por si são meramente expositivos e em nada demonstram a existência de qualquer acordo entre Recorrentes e Recorrida, aliando-se tal ao facto de considerar provada a caducidade do arrendamento primitivo e, ainda, à inexistência de qualquer contrato de arrendamento formal entre Recorrentes e Recorrida é suficiente para promover a procedência do pedido peticionado pelos Recorrentes.

XIV - O facto de a sobrinha da Ré e Recorrida dizer expressamente que não existiu acordo entre Recorrentes e Recorrida, aliando-se à versão dos recorrentes, da prova documenta existente e até a própria confissão da recorrida, é suficiente para comprovar a veracidade dos factos expostos pelos Autores e Recorrentes.

XV - Os meios probatórios constantes nos autos ditariam, em qualquer circunstância, a procedência do peticionado pelos Autores.

XVI - O Tribunal a quo tentou contornar a insuficiência da matéria factual dada como provada para a improcedência da petição dos Autores, com base na teoria geral do direito civil, designadamente com uma suposta aceitação tácita do contrato de arrendamento.

XVII - O contrato de arrendamento celebrado antes da vigência do Regime de Arrendamento Urbano caducou, sendo que por aplicação do artigo 54.º do NRAU, a Recorrida teria possibilidade de ver para si transmitida a posição de arrendatária, com base no preenchimento de pressupostos que aquela não preenche, conforme o Tribunal a quo deu como provado.

XVIII - o facto de o primitivo contrato de arrendamento ter caducado não consiste pressuposto nem título para que a filha dos primitivos, e únicos, arrendatários permaneça no imóvel.

XIX - Tendo os Recorrentes aceite que relegariam para momento ulterior a resolução da situação da Recorrida e do imóvel, em face do momento de luto e das dificuldades da Recorrida, não significa que seja suficiente para se derrogar o regime legal do arrendamento que, nos termos do artigo 1069.º do Código Civil impõe...

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