Acórdão nº 1752/13.3TBGMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelRITA ROMEIRA
Data da Resolução14 de Junho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Recorrentes: AA e BB Recorrido: CC Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO Por apenso ao processo de execução nº 1752/13.3TBGMR em que é exequente CC, com sede em Lisboa, vieram as executadas, BB e AA, deduzir oposição pedindo que, em consequência, da procedência desta, se deve declarar a ilegitimidade do exequente ou, caso assim se não entenda, declarar-se que o preenchimento da livrança foi abusivo uma vez que a dívida avalizada não tem o valor aposto na livrança, abusivamente determinado pelo portador da livrança, ordenando-se a extinção da execução.

Fundamentam o seu pedido alegando, em síntese, que o exequente não tem legitimidade para a execução, por a livrança que foi dada à execução ter sido entregue em branco ao CC, S.A., o qual não a endossou ao exequente, nem para este ocorreu qualquer incorporação ou transferência de activos do CC, S.A..

Mais, alegam que a sociedade subscritora da livrança foi declarada insolvente e, que na respectiva assembleia para apreciação do relatório, o administrador da insolvência decidiu, ilicitamente, não cumprir o contrato de locação subjacente à emissão da livrança dada à execução e entregou ao locador o veículo automóvel, sendo que o eventual crédito da locadora terá de ser apurado no processo de insolvência.

Alegam, por fim, que a livrança foi preenchida por valor superior ao devido.

Admitidos os embargos e notificado o exequente apresentou contestação, nos termos que constam a fls. 57 e ss., defendendo a falta de fundamento dos mesmos.

Alega que o beneficiário da livrança, CC, S.A., foi incorporado no CC Europe GMBH que constituiu, sucursal em Portugal, com o que, através de Contrato de Cisão e Transferência, cedeu ao exequente, todos os passivos e activos, passando este a ser o titular dos direitos e obrigações em causa nos autos.

Mais, impugna o alegado pelas executadas/embargantes, alegando que a livrança foi preenchida pelo valor efectivamente devido, pois o crédito que lhe foi reconhecido no processo de insolvência da subscritora da livrança foi de € 86.232,93 e o veículo locado foi vendido pelo valor de € 43.000,00, quantia que foi deduzida ao crédito.

Conclui que os embargos devem ser considerados improcedentes, seguindo a execução os seus termos. Mais, requer que seja indeferido o pedido das executadas no que se refere à excepção de ilegitimidade activa e indeferido o pedido no que se refere à suspensão da execução ou, caso assim não se entenda, requer que seja ordenada a prestação de caução.

Em 7.10.2015, foi proferido o despacho que consta de fls. 242 a 244, que além de indeferir a requerida suspensão da instância, por a considerar pertinente designou data para a realização da audiência prévia.

Onde, nos termos que constam da acta de fls. 251 a 257, foi proferido despacho saneador no qual se decidiu, quanto à arguida excepção da ilegitimidade do exequente, relegar o seu conhecimento para final.

Conheceu-se e foram julgadas improcedentes as excepções, invocadas pelas executadas, que a insolvência do subscritor da livrança obsta ao prosseguimento da execução contra os seus avalistas e que o incumprimento do contrato de locação subjacente à emissão da livrança se deveu a comportamento ilícito do administrador da insolvência.

Foi fixado o valor da causa em € 43 664,09.

E, proferido despacho a identificar o objecto do litígio e enunciação dos temas da prova.

Realizado o julgamento, em 18.05.2016, nos termos que constam a fls. 282 e ss., foi proferida sentença que terminou com a seguinte decisão: “Nestes termos, e face ao exposto, julgo totalmente improcedentes, por não provados, os presentes embargos de executado e, consequentemente, determino o normal prosseguimento da execução.

Custas pelas embargantes/executadas (artigo 527º do CPC).”.

*Inconformadas as embargantes interpuseram recurso, cujas alegações terminaram com as seguintes CONCLUSÕES: 1.

A livrança dos autos foi assinada em branco e entregue ao CC SA e não ao Exequente.

  1. O CC SA foi incorporado no CC EUROPE que por sua vez celebrou com o Exequente um contrato de cisão e absorção, nos termos do qual que cedeu alguns activos e passivos, conforme resulta do contrato junto a fls.

  2. A livrança que viria a ser preenchida pelo Exequente foi entregue ao Locador, totalmente em branco, para garantir a dívida que surgisse por eventual incumprimento de um contrato de leasing, que as Apelantes avalizaram.

  3. Para fundamentar a sua legitimidade, o Exequente invocou ter adquirido todos os activos e passivos do Loicador CC (Portugal SA.).

  4. Sucede que este facto não se encontra documentalmente provado, uma vez que do contrato de cisão e transferência juntos aos autos não resulta terem sido transferidos todos os activos e passivos mas apenas parte deles, designadamente os que foram relacionados no anexo 4.2.1., documento que não foi apresentado pelo Exequente.

  5. Ao contrário do teor desse contrato, a decisão recorrida considerou o Exequente parte legítima, suportando-se nos factos constantes dos pontos 5, 6 e 7 dos factos provados, nomeadamente no ponto 7 que transcreveu de forma errada: 7.

    Em 10.10.2011, entre o CC Europe GMBH (DB Europe) e o CC Aktiengeselschaft (CC AG), foi celebrado o contrato de cisão e transferência constante de fls. 82 a 94 dos autos, cujo conteúdo se considera aqui por reproduzido, nos termos do qual todos os activos e passivos transferidos para o CC Europe GMBH, na sequência da fusão transfronteiriça referida em 5., foram transferidos para o CC Aktiengeselschaft (CC AG).

  6. Considerou também, desta vez bem, que não se provou que a sociedade CC Europe GMBH tivesse sido incorporada na Exequente, representação permanente CC Aktiengellschaft – Sucursal Portugal SA.

  7. Conclui-se que o Tribunal interpretou de forma errada o documento nº 2 junto com a contestação de Embargos, pois no seu §4 Carteira da Cisão-Portugal ponto 2 desse § 4 refere-se quais os activos e passivos que foram transferidos e quais os que não foram, remetendo-se a identificação dos mesmos para os respectivos anexos ao contrato, anexos esses que não foram juntos aos autos.

  8. Importa, assim, alterar a matéria de facto dada como provada, nomeadamente o ponto nº 7, uma vez que não está provado nos autos, por falta de junção dos anexos ao contrato, que tenham sido cedidos todos os activos e passivos ao Exequente mas apenas os que foram descritos em tais anexos.

  9. Conclui-se que a decisão de legitimidade é nula, por contradição entre os fundamentos e a decisão, nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC, devendo como tal ser anulada e substituída por outra que julgando procedente a exceção de ilegitimidade do Exequente.

  10. Deve, assim, o Exequente ser considerado parte ilegítima já que a junção aos autos do referido anexo a ele incumbia, nos termos do artigo 342º do C.C..

  11. A decisão recorrida violou assim, entre outros, os artigos 53º e 54º do CPC, devendo como tal ser revogada.

  12. Sem prescindir, ficou demonstrado que o CC Portugal foi extinto (cfr. certidão permanente de fls.) e ainda que quem preencheu o título foi o Exequente.

  13. No momento da fusão, seguida de cisão, que determinou a extinção da entidade autorizada a preencher a livrança, o título dos autos não configurava ainda verdadeiro título de crédito.

  14. Os poderes para preencher aquele documento apenas foram conferidos ao Banco Locador que foi incorporado noutro Banco que por sua vez se viria a cindir com o Exequente.

  15. Pelo que esses poderes não foram transferidos para o Exequente que assim não estava autorizado a preencher a livrança, pelo menos sem que antes as avalistas lhe conferissem novos poderes para o efeito, após a fusão e a cisão que determinou a extinção do Banco Locador portador do título.

  16. Atento o conteúdo totalmente indeterminado e lato dos poderes constantes num pacto de preenchimento de um título assinado em branco, o negócio em causa integra natureza intuitu personae, no sentido de que quem confere tais poderes a uma determinada pessoa/instituição, os confere porque tem motivo para nela confiar, por isso a escolheu para contratar este tipo de negócio.

  17. Não tendo havido preenchimento do título até à data da fusão/cisão, a entidade autorizada ao preenchimento não detinha nessa data na “sua esfera jurídica patrimonial um título de crédito mas um simples documento contendo assinaturas tendentes a tornarem-se vinculações cartulares com o preenchimento.” 19. Os direitos do Locador à data da fusão/cisão resultam do pacto de preenchimento, e só com o preenchimento se obteria a transformação daquele documento em título de crédito.

  18. A dimensão pessoal deste tipo de negócio (assinatura de título em branco com pacto de preenchimento) só se concebe a favor e pessoas de grande honorabilidade” e tem por base uma delegação de confiança de carácter “estritamente pessoal.

  19. Nesta conformidade, por força do carácter fortemente pessoal dos poderes de que o banco incorporado pode ser detentor, entende-se que essa sua posição não se transmite para a entidade incorporante, não cabendo esta transmissão na previsão da alínea a) do nº 1 artigo 112º do CSC.

  20. A livrança em branco, e sobretudo, a autorização de preenchimento estão fora do âmbito de aplicação do artigo 122º nº 1 alínea a) do CSC.

  21. Conclui-se- pois que pela natureza intuito personae dum negócio deste tipo, extinguindo-se o Banco titular do pacto de preenchimento, por fusão ou cisão, o pacto extingue-se por caducidade, por aplicação analógica, dos preceitos que preveem a caducidade das relações que assentam numa dimensão pessoal, como o contrato de empreitada ou o contrato de agência, respectivamente no caso de morte (artigo 1230º in fine do Código Civil) ou no caso de morte ou de extinção de pessoa colectiva (artigo 26º do DL 178/86 de 3 de Julho).

  22. Acresce que, a caducidade do pacto de preenchimento integra um mandato e está ainda expressamente prevista no caso concreto no artigo 110º do CIRE face à declaração de insolvência da subscritora do título, em momento anterior...

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