Acórdão nº 1526/16.0T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelPEDRO DAMI
Data da Resolução14 de Junho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. RELATÓRIO.

Recorrente(s):- AA; Recorrido(a)(s): - BB;*AA intentou a presente acção de divórcio contra BB, pedindo, além da dissolução do casamento, a atribuição da casa de morada e ainda alimentos, no montante de 150,00 € mensais.

Segundo a A: O R deixou a casa em 24 de Julho de 2015, estando ambos separados desde então.

O R desde então vive com a companheira.

E deixou de suportar as despesas da família, sendo ela quem o faz.

Está de baixa há anos, incapacitada para a actividade profissional e deixou de auferir rendimentos.

Tem dificuldade em encontrar emprego.

Sobrevive com a ajuda dos familiares.

Permanece na casa que foi da família e esta foi partilhada entre ambos, tendo sido adjudicada ao R, enquanto dois prédios lhe foram adjudicados a ela.

O R dá aulas e é maestro e vendeu estabelecimento de comércio.

*Na tentativa de conciliação, coincidiram no sentido da dissolução. Identificaram o património do casal, um automóvel Renault. Não têm filhos menores.

Restaram controvertidas as questões relativas à atribuição da casa e a prestação de alimentos.

Foi de imediato proferida decisão relativamente à casa, nos seguintes termos: "Uma vez que as partes não estão de acordo quanto à atribuição da casa de morada de família, por ter sido requerido pela A. e nos termos do artigo 931º, n.º do CPC, determino que a mesma fique atribuída, provisoriamente, à Autora... que pagará o valor da prestação mensal ... e demais encargos ... " (Cfr. fls. 95).

Foi ainda convidada a A. "a concretizar os fundamentos do pedido de atribuição da casa de morada de família e da prestação de uma pensão de alimentos ao cônjuge devendo também apresentar a respectiva prova".

Correspondeu a A. (fls. 98).

*O R respondeu, tendo concluído pela inviabilidade das pretensões (fls. 133).

*Foi produzida a prova proposta e foram ouvidas as partes.

*Na sequência, foi proferida a seguinte sentença: “Decisão Consideramos improcedentes a solicitada atribuição do arrendamento do 1º andar do nº l06 da Avenida Prior do Crato, identificado supra, e a pretendida condenação do R a prestar alimentos à A.”*É justamente desta decisão que a Autora/Recorrente veio interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “C- Conclusões 1 - A sentença recorrida carece de fundamento factual ou jurídico, padecendo, por isso, do vício de falta de fundamentação sendo, portanto, nula – artigo 615º, n.º 1 al. b) do Código de Processo Civil.

2 - Apesar de ter sido enunciada a factualidade considerada provada e não provada, o M. Mº. Juiz a quo não apresentou fundamentos ou considerações de direito que pudessem justificar a análise de mérito que efectuou, uma vez que não enunciou a verificação ou não dos pressupostos objectivos e subjectivos da atribuição da casa de morada de família e da obrigação de prestar alimentos a cônjuge.

3 - Neste caso, o M. Mº Juiz a quo limitou-se a julgar sem fundamento as pretensões da ora Recorrente, sem que, para tanto, face à matéria de facto que considerou relevante, tenha efectuado a apreciação crítica e racional da prova produzida em que alicerçou a sua convicção, ou da questão sob o ponto de vista jurídico.

4 - A douta sentença recorrida é omissa quanto à apreciação e fundamentação jurídica decorrente dos factos que foram apurados, bem como quanto ao conteúdo do regime aplicável, não permitindo à Recorrente conhecer as premissas em que se baseou para julgar improcedente a acção em causa.

5 - Assim, está a sentença ferida de nulidade por falta de fundamentação de facto e de direito, nos termos do disposto no artigo 615º, n.º 1, al. b) do Código de Processo Civil, sendo certo que o dever de fundamentação está constitucionalmente garantido no artigo 205º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.

6 - De facto, ao contrário do concluído pelo M. Mº Juiz a quo, face ao quadro jurídico vigente e à prova produzida nos autos, deveriam as pretensões da Recorrente ter sido consideradas procedentes.

7 - Efectivamente, quanto à atribuição da casa de morada de família, atento o disposto no artigo 1793º, n.º 1 do Código Civil, a argumentação que sustenta a decisão é inadequada e insuficiente para determinar a improcedência do pedido, pois que da leitura deste normativo resulta que o critério primordial a seguir para a boa decisão é a análise das necessidades de cada um dos cônjuges em residir na casa e o interesse dos filhos, sendo este um critério de razoabilidade e não rígido.

8 - Apurado e comprovado o interesse da filha em manter a sua morada na casa de família – cf. al. j) e k) da matéria comprovada, este interesse concorre para o sustento da pretensão da Recorrente.

9 - Está também apurada e comprovada a necessidade real e actual da Recorrente em habitar a casa – cf. al. j), n), o), p) da matéria de facto.

10 - Está demonstrado pela prova produzida que a Recorrente não dispõe de alternativas para concretizar a satisfação de habitação uma vez que o rés-do-chão do prédio n.º 106 está onerado com usufruto e o apartamento de Viana está arrendado, pelo que esses locais não estão livres, disponíveis ou desocupados.

11 - A casa arrendada gera rendimentos que contribuem para uma situação económica menos gravosa quer da Recorrente quer do Recorrido que são responsáveis por crédito bancário ainda não pago – cf. al. f) da matéria comprovada.

12 - Está apurado e comprovado que o Recorrido não tem necessidade em morar na casa de morada de família – cf. al. e), h), i), q) e r) da matéria comprovada.

13 - O facto da casa de morada de família ser um bem próprio de um dos membros do casal (por partilha ainda na vigência do casamento), não impede que esta seja dada em arrendamento ao outro cônjuge desde que a sua necessidade de habitação seja demonstrada (como o está no caso dos autos), nem isso reverte a solução encontrada na partilha pois o Recorrido continua a ser proprietário da casa.

14 - O M. Mº Juiz a quo não fez qualquer exercício para aferir da razoabilidade da atribuição da casa de morada de família à Recorrente, tendo concluído pela falta de fundamento da pretensão sem ter ponderado quer os critérios subjectivos, quer os critérios objectivos legalmente exigidos no artigo 1793º, n.º 1 do Código Civil.

15 - Quanto ao pedido de alimentos formulado pela ora Recorrente, da leitura dos artigos 2003º, 2004º, 2016º, n.º 2 e 2016º-A do Código Civil resulta que são vários os critérios para decidir a atribuição de uma pensão de alimentos, mas que não se podem descurar nenhum para a boa decisão da causa.

16 - E também aqui a decisão do M. Mº Juiz é insuficiente e contrária à matéria de facto provada, carecendo de fundamentação legal pois não tem em conta todos os factos provados – cf. al. u), v) e w) da matéria comprovada, e consequentemente não analisa todos os critérios legais aplicáveis.

17 - Para além disso, existem contradições entre a matéria provada e a fundamentação, uma vez que o Recorrido tem rendimentos num ano de 5.520,00 € enquanto maestro mas tem mais actividades para além dessa – cf. al. s) e ll) da matéria comprovada; e o Recorrido apenas suporta despesas relativas a uma filha – cf. al. ff) da matéria comprovada e não a duas como se afirma na fundamentação da decisão.

18 - Não se pode inferir da matéria provada quanto à venda do recheio do estabelecimento que o produto dessa venda (que não foi apurada) se destinou a acorrer ao pagamento de rendas em atraso, mas sim que e tão só que o produto da venda do recheio reverte e a favor do Recorrido – cf. al. ii) e jj) da matéria comprovada – e que o Recorrido pagou rendas em atraso – cf. al. mm) da matéria comprovada, pelo que outra conclusão se pode retirar quanto à venda por consignação do recheio do estabelecimento, nomeadamente que pode gerar outros rendimentos ao Recorrido que importa considerar.

19 - Quanto aos rendimentos da Recorrente não se considerou na fundamentação da decisão que o seu valor não foi apurado nem se isso seria suficiente para fazer face às despesas provadas que aquela tem.

20 - Assim, ponderados os vários critérios para decidir a atribuição da pensão de alimentos, outra decisão deveria ter sido tomada pelo Tribunal a quo, fixando à Recorrente uma pensão de alimentos proporcional às suas necessidades e às possibilidades do Recorrido para a pagar, tendo em conta a parte disponível dos seus rendimentos.

21 - Deste modo, o M. Mº Juiz a quo não fez qualquer exercício para aferir da proporcionalidade dos alimentos a prestar à Recorrente, tendo concluído pela falta de fundamento da pretensão sem ter ponderado quer os critérios subjectivos, quer os critérios objectivos legalmente exigidos nos mencionados artigos 2004º e 2016º-A.

22 - Pelo que, ao decidir como decidiu pela falta de fundamento das pretensões da Recorrente, o M. Mº Juiz a quo não fez uma correta apreciação dos factos e violou, por errada interpretação e aplicação, o disposto nos artigos 205º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, nos artigos 154º, 615º, n.º 1, al. b) do Código de Processo Civil e nos artigos 1022º, 1439º, 1446º, 1449º, 1793º, n.º 1, 2003º, 2004º, 2016º, n.º 2 2016º-Aº do Código Civil, devendo, a douta sentença ser declarada nula, nos termos do disposto no artigo 615º, nº 1, al. b) do Código de Processo Civil e, consequentemente, substituída por outra que, reapreciando a prova produzida e deduzindo os fundamentos de facto e de direito da mesma, julgue procedente o pedido de atribuição da casa de morada de família e pensão de alimentos a cônjuge, determinando o montante da prestação mensal.

TERMOS EM QUE, e nos mais de direito aplicáveis, que V. Exas. melhor e mais doutamente suprirão, deve a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue provada e procedente as pretensões da Recorrente...”.

*O Réu/Recorrido apresentou contra-alegações, concluindo as mesmas da forma seguinte: “…CONCLUSÕES: 1.- Os presentes autos de divórcio sem consentimento do outro cônjuge prosseguiram aquando da...

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