Acórdão nº 426/11.4TBPTL-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Junho de 2017
Magistrado Responsável | MARIA JO |
Data da Resolução | 14 de Junho de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sendo Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos; 1ª Adjunta - Rita Maria Pereira Romeira; 2ª Adjunta - Elisabete de Jesus Santos de Oliveira Valente.
I – RELATÓRIO 1.1.
Decisão impugnada 1.1.1. AA, residente na Rua X, concelho de Ponte de Lima, (aqui Recorrente), propôs uns autos de embargos de executado (por apenso a uma acção executiva para prestação de facto, movida contra si), contra BB, residente no Lugar X, em Gaifar, (aqui Recorrido), pedindo que: · se declarasse que já prestou o facto que lhe foi imposto pela sentença dada à execução; · se declarasse que, em relação a qualquer outro facto diferente do que consta do seu dispositivo, a sentença não constitui título executivo, sendo, nessa medida, inexistente e inexequível (com a correlativa consequência da inexigibilidade da obrigação invocada pelo Exequente); · se declarasse, a final, extinta a execução.
Alegou para o efeito, em síntese, que tendo ela própria sido condenada «a demolir o muro divisório dentro do (…) prédio do Autor, numa faixa de 40 cm por 6 metros, entregando ao Autor tal trato de terreno livre de qualquer construção, coisas ou pessoas, repondo o prédio no estado anterior», já o fez.
Mais alegou que, não obstante, o Exequente/Embargado veio intentar contra si a acção executiva que constitui os autos principais, apresentando como título executivo a referida sentença condenatória, pretendendo obter desse modo a demolição de muito mais do que 6 metros de muro, e a entrega de uma faixa muito maior do que a assinalada (de 6 metros por 40 centímetros).
Defendeu, por isso, a Embargante não dispor o Embargado de título executivo bastante para a sua pretensão.
1.1.2.
Foi proferido despacho, admitindo liminarmente a oposição deduzida, e ordenando a notificação do Exequente/Embargado para, querendo e em vinte dias, a contestar (arts. 728º, nº 1 e 732º, nº 1 e nº 2, ambos do C.P.C.).
1.1.3.
Notificado, o Embargado contestou, pedindo que os embargos de executado fossem julgados improcedentes.
Alegou para o efeito, em síntese, ser elemento essencial do decidido na sentença que se executa a «reposição do prédio no estado anterior», conforme se alcança pela sua interpretação, o que necessariamente pressupõe a destruição integral do muro construído pela Executada/Embargante (faltando para o efeito cerca de dois metros).
1.1.4.
Em sede de audiência prévia, e exercido o devido contraditório pelas partes, foi proferida sentença, julgando os embargos improcedentes, e absolvendo-se dos mesmos o Exequente/Embargado, lendo-se nomeadamente na mesma: «(…) Em face do exposto, julgo os presentes embargos de executado improcedentes, por não provados, deles absolvendo o embargado/exequente.
(…)»*1.2. Recurso (fundamentos) Foi precisamente inconformada com esta decisão que a Executada/Embargante (Maria Gonçalves da Silva) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que fosse provido, revogando-se a sentença recorrida.
Concluiu as suas alegações da seguinte forma (sintetizada, sem repetições de processado, ou reproduções de textos legais ou jurisprudenciais): 1ª - A sentença que se executa julgou procedente o pedido formulado pelo Autor, nos seus precisos termos («demolir o muro divisório construído dentro do mesmo prédio do Autor, numa faixa de 40 cm x 6 m, entregando ao Autor tal trato de terreno»), tendo-a ela própria já cumprido.
1 - A douta sentença que serve de título executivo condenou a ora Recorrente a “demolir o muro divisório construído dentro, do mesmo prédio do Autor, numa faixa de 40 cm x 6 m, entregando ao Autor tal trato de terreno [...]”, 2 - julgando procedente o pedido formulado pelo Autor nesses precisos termos.
3 - A Recorrente “demoliu o muro em causa numa exata extensão de 6 m de comprimento por 40 cm de largura”, 4 - e restituiu, por conseguinte, ao Recorrente uma faixa de 40 cm x 6 m.
5 - Cumpriu, desse modo e com inteiro rigor, a ordem contida na douta sentença executada.
-
- A sentença recorrida, atribuindo à que se executa um sentido diferente e contrário aos seus conteúdo e dispositivo, ofendeu o caso julgado que sobre ela se formou.
6 - Ao decidir como decidiu a douta sentença recorrida atribuiu à douta sentença executada um sentido diferente e contrário ao seu conteúdo e dispositivo e, por essa via, ofendeu o caso julgado que sobre ela se formou e o disposto, entre outros, no nº 1 do artº 619º CPC.
*1.3. Contra-alegações O Exequente/Embargado (BB) contra-alegou, pedindo que o recurso fosse julgado improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.
Concluiu as suas contra-alegações da seguinte forma (sintetizada, sem repetições de processado, ou reproduções de textos legais ou jurisprudenciais): 1 - A decisão do Exmo Senhor Juiz " a quo" que decidiu pela improcedência dos embargos, uma vez que, entre outros, considerou provados os factos em a), b), c), d) e e) da matéria de facto.
2 - A linha divisória dos prédios à data da construção do muro sub judice e da entrada da presente acção, é e sempre foi a mesma.
3 - A condenação constante da douta sentença advém da interpretação dos elementos essenciais do decidido, " repondo o prédio no estado anterior".
4 - Elemento fundamental da douta decisão, decisão transitada da qual resulta a obrigação imposta à Executada/Recorrente.
5 - Necessário se torna demolir o muro divisório construído dentro do prédio do Autor pela Ré, na sua globalidade, constituindo mero elemento acessório ao decidido aquela referência numa faixa de 40 cm por 6 metros.
6 - A Recorrente não ignora a natureza e espécie da obra que executou, da ofensa ao prédio do A. e que o mesmo somente será reposto ao seu estado anterior se demolir a totalidade do muro divisório construído dentro do mesmo prédio do Autor.
7 - A douta sentença não comportará a compressão daquela reposição, designadamente, a não demolição da parte do muro ainda não demolida pela Ré numa extensão aproximada de 2 (dois) metros.
8 - A parte do muro em blocos de cimento, com comprimento de 6 metros por 0,60 cm de largura, ainda existente no solo do prédio do Autor é o remanescente da parte não demolida pela Ré e compreendido entre os dois prédios.
9 - Não se verifica qualquer ofensa do caso julgado, " ... só assim se cumprindo a decisão na sua lógica global, ..." .
*II - QUESTÕES QUE IMPORTA DECIDIR 2.1. Objecto do recurso - EM GERAL O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (arts. 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 2, ambos do C.P.C.), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (arts. 608º, nº 2, in fine, aplicável ex vi do art. 663º, nº 2, in fine, ambos do CPC).
*2.2. QUESTÕES CONCRETAS a apreciar Mercê do exposto, uma única questão foi submetida à apreciação deste Tribunal: · Quais as regras a aplicar quanto à interpretação de uma decisão judicial (por forma a determinar se a prestação de facto pretendida pelo Exequente/Embargado se contem, ou não, no decidido na sentença condenatória que se executa) ? *III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Com interesse para a apreciação da questão enunciada, encontram-se assentes (nestes, e nos autos onde foi proferida a sentença que se executa) - por confissão, acordo das partes e documentos autênticos -, os seguintes factos (aqui considerados nos termos do art. 607º, nº 4 do C.P.C., aplicável ex vi do art. 663º, nº 2, in fine, do mesmo diploma): 1 - BB intentou uma acção declarativa de condenação, então sob a forma de processos ordinário, contra AA (que correu termos na Instância Central de Viana do Castelo, sob o nº XXX/11.4TBPTL), pedindo que a ali Ré fosse condenada: «A) A reconhecer o direito de propriedade do A. sobre o prédio identificado no art. 1 desta petição [prédio urbano sito no Lugar de Lagoas, da freguesia de S. Julião de Freixo, em Ponte de Lima, inscrito na matriz respectiva sob o art. XXX e descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponte de Lima sob o n.º XXX]; B) a demolir o muro divisório construído dentro do prédio do A., entregando ao A. aquele trato de terreno livre de qualquer construção, coisas ou pessoas, repondo o prédio no estado anterior».
2 - Na acção declarativa referida no facto anterior, o respectivo Autor alegou, para caracterizar a sua pretensão, nomeadamente que: .
No passado mês de Junho, a Ré executou a construção de um muro divisório de ambas as propriedades
(nº 11); .
Ocupando com essa construção parte do prédio do Autor
(nº 12); .
A Ré edificou um muro em blocos de cimento com aproximadamente 40 cm de altura e 6 m de comprimento
(nº 13); .
O qual ultrapassa o limite da sua propriedade e, consequentemente, invade a propriedade do Autor, dela ocupando uma faixa de terreno de cerca de 40 cm x 6 m
(nº 14); .
Construiu a Ré, um muro em blocos de cimento, de cerca de 40 cm de altura, numa extensão aproximada de 6 m
(nº 15); .
Pelo que, com tal construção invadiu o prédio do Autor, lesando manifestamente o direito de...
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