Acórdão nº 4042/12.5TJVNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelSANDRA MELO
Data da Resolução19 de Outubro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

I.

Relatório V. I.

, com o NIF … e mulher, S. I.

, com o NIF …, ambos de nacionalidade ucraniana, casados em comunhão de adquiridos, residentes na Rua … Vila Nova De Famalicão intentaram a presente ação declarativa de condenação, com processo comum contra: 1 – Empresa A – Imobiliária, Ujnipessoal, Ldª, matriculada na Conservatória do Registo Comercial com o número único e NIPC …, com sede na Avenida Padre Manuel da Costa Rego, nº 366, freguesia de Vale S. Martinho, 4760-000 Vila Nova de Famalicão, e 2 – Predial X – Sociedade De Mediação Imobiliária, S.

A., matriculada na Conservatória do Registo Comercial com o número único e NIPC …, com sede na Rua …, freguesia de Vila Nova de Famalicão, 4760 Vila Nova de Famalicão.

Pedem a condenação das Rés a pagar-lhe: a) A quantia de € 2.750,00 (dois mil setecentos e cinquenta euros), que resulta da diferença entre o valor da garagem que os autores pensavam estar a comprar e o valor da garagem que efetivamente foi adquirida pelos autores, bem como juros vencidos e vincendos sobre a aludida quantia, desde a data em que esse dinheiro integrou a conta da ré, até efetivo e integral pagamento; b) A quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros), que resulta da diferença entre o valor da garagem para dois carros e o valor da garagem com capacidade para um carro.

Alegaram em súmula, que: celebraram com a 1ª Ré um contrato de compra e venda tendo por objeto uma fração habitacional e uma garagem, sendo que nesse negócio interveio a 2ª Ré na qualidade de mediadora imobiliária.

A 2ª Ré, nas negociações levadas a cabo, mostrou-lhes uma garagem que permitia o estacionamento de dois veículos automóveis e referiu que esta era a que a 1ª Ré pretendia vender.

Após a celebração do contrato, os Autores vieram a constatar que a garagem que haviam adquirido não só não correspondia àquela que lhes foi mostrada, como apenas permitia o estacionamento de um veículo.

Fundaram-se na responsabilidade “in contrahendo” das Rés, por não os terem informado devidamente da concreta garagem objeto do contrato.

A 1ª Ré contestou, invocando em síntese, que a quantia paga pelos Autores foi adequada ao valor que a fração autónoma tinha à data da compra, pelo que não sofreram qualquer prejuízo; incumbiu a 2ª Ré a tarefa de vender as frações autónomas e entregou-lhe as chaves de duas frações autónomas para que esta as exibisse aos interessados. A contestante nunca negociou com quem quer que fosse.

A instância foi extinta quanto à 2ª Ré, por inutilidade superveniente da lide, originada pela declaração de insolvência de que foi objeto.

Elaborou-se despacho saneador, procedeu-se à produção de prova, realizou-se a audiência final e proferiu-se sentença.

Por esta, julgou-se a ação parcialmente procedente e condenou-se a ré “Empresa A, Lda.” a pagar aos AA. V. I. e S. I. a quantia de 2.750,00 € (dois mil, setecentos e cinquenta euros), acrescida de juros de mora à taxa legal civil contados desde a citação até integral pagamento.

A 1ª Ré apelou, pedindo a sua total absolvição e formulando as seguintes conclusões: “.

  1. Cumprindo o disposto no art.º 640º do CPC, importa desde já consignar que a resposta constante da matéria de facto dada como não provada no artigo 4º devia ter sido “provada”, por isso mesmo resultar do depoimento de parte prestado pelo próprio autor, em 15/12/16, concretamente das seguintes passagens (12:21m até 13:02m e 14:27m até 16:17m).

  2. Impõe-se assim a alteração da matéria de facto acima referida ou, pelo menos, dar-se como provado que as chaves correspondentes à garagem n.º 6 foram entregues aos autores, pela ré Predial X, aquando da entrega das demais chaves.

  3. Além disso, os autores alegaram factos tendentes a demonstrar, não uma venda defeituosa, mas antes um cumprimento defeituoso (a prestação realizada pelo devedor não corresponde, pela falta de qualidades ou requisitos dela, ao objecto da obrigação a que ele estava adstrito), pelo que a assistir-lhes algum direito seria sempre pela via do cumprimento defeituoso da obrigação/incumprimento das obrigações em geral (art.º 798º e 799º CC), e nunca pelas regras do regime da venda dos bens onerados ou defeituosos – neste sentido Calvão da Silva, in “Compra e Venda de Coisas Defeituosas (Conformidade e Segurança)”, Almedina, 5ª Edição, págs. 78 e segs; Pedro Romano Martinez, in Cumprimento Defeituoso – Em Especial na Compra e Venda e na Empreitada, Almedina, pág. 413; e Acs. do STJ, de 13.2.2014 (proc. nº1115/05.4TCGMR.G1.S1), de 6.11.2007 (proc. nº 07A3440) e de 16.03.2011 (proc. nº 558/03.2TVPRT.P1.S1); e o Ac. do TRP de 11.9.2014 (proc. nº 6637/13.0TBMAI-A.P1), todos disponíveis em www.dgsi.pt.

  4. Não foi alegado, nem provado que os autores denunciaram o alegado cumprimento defeituoso, e muito menos que o fizeram à aqui recorrente, sendo que ao contrário do que refere a decisão recorrida, a testemunha D. C. não era auxiliar da 2ª ré, porquanto, não é parte nos autos, mas apenas testemunha, concretamente um consultor imobiliário a exercer funções na “Predial A, SA, ou seja na 1ª ré – cfr. art.º 4º da matéria de facto dada como provada.

  5. Aliás, nem a 1ª ré (Predial X) poderia, alguma vez, ser considerada, nesta situação, como auxiliar da 2ª ré - neste sentido, vide Pais de Vasconcelos, Direito Comercial, Vol. I, 2011, pág. 197. No mesmo sentido, cfr. Pinto Monteiro, Direito Comercial – Contratos de distribuição comercial, 2002, pág. 102, e Menezes Cordeiro, “Do contrato de mediação”, in O Direito, 2007, III, pág. 517); Menezes Cordeiro, “Do Contrato de Mediação”, in O Direiro, 2007, III, pág. 541); Ac. STJ de 15/02/12, (proc. nº 5223/05.3TBOER.L1.S1, www.dgsi.pt); Ac. STJ de 11/02/16 (proc 8727/06.7TBCSC.L1.S1, www.dgsi.pt).

  6. Acresce que, a escritura de compra e venda da fração foi efectuada em 09/02/10, os autores tomaram conhecimento da “alegada troca” três meses depois, ou seja em Maio/Junho de 2010 (cfr art.º 9º e 13º da matéria de facto dada como provada) e a presente acção foi proposta em 13/12/12, ou seja muito depois de decorrido o prazo de 6 meses estabelecido no art.º 917º CC, pelo que o direito dos autores caducou, excepção essa que é do conhecimento oficioso e, como tal, pode e deve ser atendida no presente recurso.

  7. Por outro lado, a obrigação de indemnização ora em apreço, qualquer que seja o facto típico que a justifique, e alem das suas particularidades, depende da produção de um dano e dos demais elementos constitutivos da responsabilidade civil, pelo que aquele que, em caso de ruptura das negociações, a ocasiona, não responde se com isso não cria prejuízo algum à contraparte ou se, ainda que havendo prejuízo, falta outro dos pressupostos do ilícito civil.

  8. A prova do nexo causal, como um dos pressupostos da obrigação de indemnizar e medida da mesma, cabe ao credor da obrigação de indemnizar, independentemente da sua fonte - 563.º e 342.º, nº 1, pelo que o autor tem que provar que o facto ilícito cometido conduziu ao dano alegado, pois, é necessário haver um nexo causal entre a acção e o dano provocado; e não pode ser uma qualquer causa/efeito; é necessário estabelecer uma ligação positiva entre a lesão e o dano, através da previsibilidade deste em face daquela.

    I. Na verdade, ainda que se entenda que a natureza da responsabilidade contratual é obrigacional e, nessa medida, se presume a culpa dos devedores, a verdade é que, ao contrário do que se entendeu na sentença recorrida, a única presunção a ter em consideração será a presunção de culpa, mas esta não é sinónimo de presunção de nexo de causalidade. Ou seja, o facto de o credor estar, numa situação destas, dispensado de provar a culpa do devedor, não significa que não tenha de fazer prova acerca do nexo de causalidade.

  9. Tal constatação decorre expressamente do texto da douta sentença recorrida, quando refere: “Nesta perspectiva, resulta dos autos, designadamente, do art. 38º da petição, que, caso aquela obrigação (....)recusa de informação ao sócio.” K. Ora, do art.º 38º da pi não se extrai a conclusão a que chegou o tribunal, pois em lado algum desse artigo vem alegado que os autores estariam na disposição de pagar 2.750,00€ caso soubessem que a garagem tinha espaço apenas para um veículo! L. Por outro lado, tal matéria de facto nem sequer foi dada como provada, pelo que, também por esta razão, não podia o tribunal recorrido socorrer-se de tal argumento.

  10. Acresce que o acórdão citado na decisão, segundo o qual cabia à ora recorrente a prova de que não teria celebrado o contrato por preço diferente, não tem cabimento nesta situação, pois nesse acórdão discute-se a simulação do preço de um imóvel e consequente redução nos termos do art.º 292º CC, ao passo que nestes autos se discute o objecto do negócio.

  11. A sentença recorrida parte de uma premissa errada, que inquina toda a decisão, pois apesar de ter ficado provado, o certo é que na fundamentação de direito, a sentença recorrida olvida a existência da 1ª ré e consequentemente a existência do contrato de mediação.

    L lendo a sentença fica-se com a sensação de que os únicos intervenientes no negócio foram os autores, a ora recorrente (2ª ré) e a testemunha D. C.! É certo que a 2ª ré foi declarada insolvente na pendência do processo mas isso não significa que o tribunal não tenha de avaliar a sua actuação, por forma a apurar a responsabilidade de todos os intervenientes.

  12. Ora, atendendo à matéria dada como provada, nomeadamente nos artigos 2º, 3º, 4º, 5º, 19º e 22º, nomeadamente ao facto de entre a 1ª e a 2ª ré ter sido celebrado um contrato de mediação imobiliária, através do qual a 2ª angariou, a favor da 1ª, os compradores das frações aqui em causa (os autores), não se compreende como pôde o tribunal recorrido, considerar que houve incumprimento por parte da recorrente e muito menos que esse “lapso” tenha algum nexo de causalidade no que veio a suceder! P. Note-se que, sendo a 2ª ré uma imobiliária, contratada justamente para esse efeito, é inequívoco que estava adstrita aos deveres previstos no regime que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT