Acórdão nº 1559/13.8TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução26 de Outubro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I- Relatório 1- Hotéis S., Ldª, intentou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinária, contra Hotéis P., Ldª, A. C.

, e esposa, A. L.

, alegando, em breve resumo, que é dona de um edifício, situado na freguesia de …, concelho do Porto, no qual está instalada uma unidade hoteleira.

Nessa qualidade, no dia 01/09/2010, celebrou com a 1ª Ré um Contrato de Arrendamento Comercial e Pacto de Preferência, tendo por objeto o referido edifício (com exceção de 3 lojas). Os 2° Réus, por sua vez, enquanto sócios gerentes da 1ª Ré, intervieram também como fiadores da mesma.

A Administração Fiscal, porém, não considerou esse contrato, para efeitos fiscais, como um “Contrato de Arrendamento Comercial”, mas, sim, como um “Contrato de Cessão de Exploração de Estabelecimento Comercial”. E, por isso, acordaram A. e RR., no dia 01/10/2011, converter o contrato primeiramente referido num Contrato de Cessão de Exploração e Pacto de Preferência, no qual os 2° Réus intervieram, igualmente, como fiadores da 1ª Ré, continuando esta a explorar o já referenciado estabelecimento nos moldes em que o vinha fazendo desde 01/09/2010.

Antes da assinatura do último contrato, no entanto, ou seja, no dia 01/10/2011, a A. e a 1ª Ré, acordaram ainda que esta pagaria àquela o valor do IVA referente às rendas dos meses de Setembro de 2010 a Setembro de 2011, nos mesmos moldes que viessem a ser estipulados pela Administração Fiscal, acordo este que, para si, era essencial, como na altura fez saber à referida Ré.

A mesma, no entanto, recusou-se não só a assinar tal convénio, como a pagar as suas obrigações em atraso, o que motivou a resolução de tal contrato, pela sua parte, com efeitos a partir do dia 29/01/2013.

Apesar dessa resolução, no entanto, a 1ª Ré recusa-se a entregar o objeto do contrato e a pagar-lhe a quantia que tem em dívida para consigo e que discrimina. Isto, para já não falar do valor relativo à prestação variável, pois que não sabe se é credora, em virtude de ignorar a faturação bruta mensal da 1ª Ré.

Por isso mesmo, pede que os RR. sejam condenados a reconhecer e declarar como válida a resolução do Contrato de Cessão de Exploração com efeitos a partir de 29/01/2013, por incumprimento definitivo e culposo por parte da lª Ré das respetivas obrigações; a 1ª Ré seja condenada a reconhecer essa resolução do contrato e a entregar, de imediato, o objeto do mesmo à A., livre e desembaraçado de pessoas e bens; a 1ª Ré e os 2°s RR. sejam condenados solidariamente a pagar-lhe a quantia de 111.299,20€; a lª Ré seja condenada a comunicar aos autos a faturação mensal bruta da exploração que fez do estabelecimento comercial entre 30/09/2011 e 29/01/2013 e que a 1ª Ré e os 2°s RR. sejam condenados, solidariamente, a pagar-lhe o saldo entretanto resultante da diferença entre a prestação mensal fixa de cada um desses meses e 25% da faturação mensal bruta de cada um dos mesmos meses.

2- Contestaram os RR, refutando estas pretensões, porquanto, do seu ponto de vista, é a A. que se encontra em situação de incumprimento, conforme descrevem pormenorizadamente. E daí que tenham reduzido proporcionalmente a sua contraprestação e não lhe reconheçam fundamento para a resolução contratual por ela operada.

Por outro lado, não é verdade que a 1ª Ré tenha aceitado pagar a quantia peticionada a título de IVA, sendo certo que à A. sempre têm sido facultados os valores da faturação, valores que nunca ultrapassaram o das prestações fixas.

Quem tem tido prejuízos com toda esta situação tem sido a 1ª Ré, que se viu forçada a encerrar quartos e a cancelar reservas, tudo ascendendo a um valor que estima, atualmente, na ordem dos 204.984,00€. Isto, para além dos demais prejuízos que se propõem liquidar ulteriormente.

Daí que peçam, em sede reconvencional, para ser declarado válido e eficaz o contrato de cessão de exploração celebrado entre a Autora e a Ré; que a A. seja condenada a eliminar e corrigir todos os defeitos elencados e identificados na contestação, dentro do prazo a fixar por sentença, e a pagar à Ré o montante 204.984,00€ por todos os prejuízos sofridos por esta, bem como a indemnização que se vier a liquidar em execução de sentença.

3- A A. também refuta estes pedidos. Seja porque algumas das anomalias invocadas pelos RR. não existem, seja porque outras derivam da má utilização e/ou falta de manutenção do edifício e equipamentos por parte dos RR., seja ainda porque, não obstante algumas se terem realmente verificado, não ocorreram como os RR as descrevem.

4- Terminados os articulados, foi proferido despacho saneador que afirmou a validade e regularidade da instância, fixou o objeto do litígio e os temas da prova.

5- A A., deduziu incidentalmente, pedido de despejo imediato, com fundamento na falta de pagamento de rendas devidas na pendência da ação por um período superior a dois meses, incidente que, embora com a oposição dos RR., foi deferido por despacho datado de 30/10/2015, tendo-se ordenado “a desocupação imediata do imóvel, estando a autora autorizada, caso a isso haja oposição dos réus, a entrar no estabelecimento”.

6- Os RR. reagiram contra este despacho, recorrendo do mesmo, mas na instância recorrida foi entendido que a impugnação de tal despacho só poderia ser feita com o recurso da decisão final.

7- Instruída e julgada a causa, foi proferida sentença na qual se decidiu existir, em virtude do despejo imediato do local, “um facto superveniente gerador de inutilidade da causa relativamente ao pedido de entrega do imóvel feito pela Autora e ao pedido de eliminação dos defeitos feito pelos Réus”.

Quanto ao mais, foi julgada parcialmente procedente, por provada, a ação e, em consequência:

  1. Foram os RR. condenados, solidariamente, a pagar à A. a quantia de 111.299,20€; b) Determinado que, no prazo de trinta dias após o trânsito da decisão, a Ré comunique à A. a faturação mensal bruta da exploração que fez do estabelecimento comercial entre 01/10/2011 e 31/10/2015, acompanhada dos elementos contabilísticos, e, caso haja saldo positivo, condenar os RR., solidariamente, a pagar à A. o saldo resultante da diferença entre a prestação mensal fixa de cada um desses meses e 25% da faturação mensal bruta de cada um dos mesmos meses.

    A reconvenção foi julgada improcedente e a A. absolvida dos correspondentes pedidos.

    8- Inconformados com esta sentença e com a decisão de despejo imediato, reagiram os RR. interpondo recurso.

    8.1- Em relação à decisão de despejo imediato, terminam a sua motivação com as seguintes conclusões: “1ª- A Autora Hotéis S., Ldª, deduziu incidentalmente um pedido de despejo imediato contra os aqui Recorrentes, alegando que estes, após a notificação a que alude o artigo 14.° n.º 4 da Lei n.º 6/2006, de 27/02 (NRAU), não procederam ao pagamento das rendas para que foram notificados, mormente as rendas concernentes aos meses de Abril e Maio de 2013.

    1. - Notificados do referido incidente, os aqui recorrentes apresentaram contestação, pugnando pela improcedência do mesmo, com os fundamentos em tal contestação deduzidos.

    2. - Por decisão proferida em 30 de Outubro de 2015, o tribunal a quo julgou procedente o incidente de despejo imediato e ordenou “a desocupação imediata do imóvel, estando a autora autorizada, caso a isso haja oposição dos réus, a entrar no estabelecimento”.

    3. - Acontece que, na presente lide não estamos perante uma acção de despejo mas antes perante um contrato de cessão de exploração de estabelecimento comercial, e sendo verdade que, sendo este um contrato atípico ou inominado, se aplicam ao mesmo as regras do arrendamento, tais regras devem ser aplicadas com as devidas adaptações.

    4. - O estabelecimento comercial pode ser definido como um conjunto de coisas, corpóreas e incorpóreas, devidamente organizado para a prática do comércio, compreendendo, assim, elementos da mais variada natureza que, em comum, têm apenas o facto de se encontrarem interligados para a prática do comércio.

    5. - Nos presentes autos, o imóvel era um dos elementos corpóreos que constituem e integram o estabelecimento comercial de hotelaria, no qual funciona o dito estabelecimento e que por si só não pode ser efectivamente considerado, constituindo apenas um dos elementos que compõem o estabelecimento, sendo o contrato de cessão de exploração de estabelecimento comercial a transmissão, temporária e a título oneroso, do gozo do estabelecimento.

    6. - A decisão recorrida não elenca nem especifica qualquer matéria de facto dada como provada ou não provada, da qual se possa extrair a conclusão que leve à decisão, violando assim o disposto no artigo 607.° n.º 3 e n.º 4 do Código de Processo Civil.

    7. - Padece, pois, a decisão recorrida de uma nulidade, nos termos do disposto no artigo 615.° n.º 1 b) do Código de Processo Civil, por ausência total de especificação e fundamentação da matéria de facto, nulidade essa que se arguiu desde já.

    8. - Acresce a isto que, tendo o tribunal a quo considerado aplicável aos presentes autos o incidente de despejo imediato - o que não se concede ordenando a entrega imediata do imóvel à Autora, aqui Recorrida, destruiu por completo o estabelecimento comercial, retirando-lhe um dos seus principais elementos - o imóvel - impedindo a Ré Hotéis P., Ldª de o continuar a explorar, negando-lhe a possibilidade de ver atendidos os seus argumentos e meios de prova no âmbito da discussão do contrato de cessão de exploração, praticando, assim, um acto que a lei não admite, por influir no exame e decisão da causa, o que constitui uma nulidade nos termos do disposto no artigo 195.° do Código de Processo Civil, bem como uma violação ao vertido no artigo 20.° da Constituição da República Portuguesa, nulidade e inconstitucionalidade que se arguem também desde já.

    9. - O objecto da presente lide é o contrato de cessão de exploração de estabelecimento comercial outorgado entre a Autora e os Réus, aqui Recorrentes.

    10. - O estabelecimento comercial constitui-se como...

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