Acórdão nº 1520/15.8T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelHELENA MELO
Data da Resolução19 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Tribunal da Relação de Guimarães 1ª Secção Cível Largo João Franco - 4810-269 Guimarães Telef: 253439900 Fax: 253439999 Mail: guimaraes.tr@tribunais.org.pt 27 Processo 1520/15.8T8VRL.G1 Acordam em conferência no Tribunal de Relação de Guimarães: I – Relatório AAinstaurou contra BB e mulher CC, ação declarativa de condenação, com processo comum, formulando a seguinte pretensão: Que os réus sejam condenados: A) a reconhecer que a autora é a única titular, dona e legítima possuidora do estabelecimento comercial denominado “DD”, destinado a restaurante, casa de pasto e salão de jogos, e que funciona, assim se devendo manter, no prédio urbano sito no Lugar LL, freguesia de Peso da Régua, inscrito na matriz respetiva sob o artigo xxx; B) a reconhecer que para a autora se transferiu a posição de locadora no contrato de “locação temporária de estabelecimento” celebrado com o réu em 23.05.2013; C) a reconhecer que para a autora se transferiu o direito de continuar a usar, fruir e deter o prédio urbano referido em a) para continuação da exploração do estabelecimento comercial identificado em a); D) a pagar à autora todas as prestações mensais vencidas desde Fevereiro de 2015 até ao presente, que contabiliza em € 6.400,00, e ainda as vincendas até efetivo e integral pagamento, e a pagar ainda a indemnização referida no artigo 107º, que contabiliza em € 3.200,00, sem prejuízo dos valores que se forem vencendo sucessivamente a esse respeito, tudo acrescido dos respetivos juros de mora à taxa legal desde o momento de vencimento de cada prestação mensal e respetiva indemnização, que ascendem, na data, ao valor de € 80,05, sem prejuízo dos juros de mora legais vincendos até efetivo e integral pagamento.

Alegaram, em síntese: - que é dona e legítima possuidora de um estabelecimento comercial que veio ao seu domínio através de herança de sua tia que, por sua vez, o possuía há mais de vinte anos, com todas as características de uma posse pública, pacífica e de boa fé, na convicção de ser a sua exclusiva dona; - que entre a tia da autora e o réu foi celebrado um contrato de locação temporária de estabelecimento em relação ao estabelecimento comercial referido, mediante a contrapartida pela cessão do pagamento de € 800,00 mensais por parte do réu; - que o réu tem vindo a explorar esse estabelecimento, recebendo os proventos e lucros da atividade e pagando as prestações mensais devidas, mesmo após o óbito da tia da autora; - que, contudo, desde fevereiro de 2015, o réu não paga à autora as prestações convencionadas pela cessão de exploração do estabelecimento comercial, apesar de continuar a explorá-lo.

Regularmente citados, os réus contestaram, negando ser a autora titular do estabelecimento comercial em causa, por o imóvel onde o estabelecimento funcionar, ser propriedade do EE e ter sido cedido gratuitamente à tia da autora, tendo cessado o direito de uso e fruição do imóvel com a sua morte.

Invocaram, ainda, que o contrato celebrado com a tia da autora tem subjacente um contrato de trespasse, pelo que ocorreu também a transmissão da posição do arrendatário.

Concluiram pela improcedência da ação.

Procedeu-se à realização de audiência prévia.

Por se entender que os autos forneciam todos os elementos para ser proferida decisão sem prévia realização de audiência de discussão e julgamento, foi proferido sanador/sentença com o seguinte segmento decisório: “Por tudo o exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente e, consequentemente, condeno os réus: “a) a reconhecerem que a autora é a única titular, dona e legítima possuidora do estabelecimento comercial denominado “DD”, destinado a restaurante, casa de pasto e salão de jogos, e que funciona, assim se devendo manter, no prédio urbano sito no Lugar LL, freguesia de Peso da Régua, inscrito na matriz respetiva sob o artigo xxx; b) a reconhecerem que para a autora se transferiu a posição de locadora no contrato de “locação temporária de estabelecimento” celebrado com o réu em 23.05.2013; c) a pagarem à autora todas as prestações mensais vencidas desde Fevereiro de 2015 até ao presente, no valor mensal de € 800,00 (oitocentos euros), e ainda as vincendas até efetivo e integral pagamento, e a pagar ainda a indemnização prevista na cláusula 8ª do contrato, sobre cada uma das prestações vencidas e vincendas até efetivo pagamento, tudo acrescido de juros de mora à taxa legal desde o momento de vencimento de cada prestação mensal e respetiva indemnização, até integral pagamento.

  1. Absolvo os réus do demais peticionado.

  2. Custas a cargo de autora e réus na proporção de 1/5 e 4/5 respetivamente.

  3. Registe e notifique.” Os RR. não se conformaram e interpuseram o presente recurso de apelação, concluindo nos seguintes termos: 1.º O presente recurso visa não só a alteração da matéria de facto como também a reapreciação da matéria de direito.

    1. O Tribunal julgou incorretamente os factos dados como assentes sob os pontos 2.º e 7.º omitindo a apreciação de outros factos que em nossa humilde opinião deveriam dar-se como provados, os constantes sob os nºs 9.º e 10.º da Contestação.

    2. Estamos perante uma autorização precária concedida em acta da EE quepermitiu A FF explorar gratuitamente um estabelecimento comercial instalado num imóvel propriedade da mesma autarquia até que a EE precisasse daquelas Instalações e que assumia essa responsabilidade, mas só relativamente à Senhora FF e não para herdeiros ou em situação de trespasse.” 4.º Da referida ata a EE pretendeu conceder o benefício douso e fruição do imóvel e estabelecimento comercial nessa data aí instalado à referida FF, benefício concedido a esta a título pessoal, intransmissível, quer por via da sucessão quer por via contratual e gratuito.

    3. Este estabelecimento comercial não foi transferido por via da sucessão para os Herdeirosda FF, pois se assim não fosse estaria perante uma fraude ao acordo.

    4. Porquanto à data do acordo firmado com a EE estava instalado um estabelecimento comercial, que a FF pretendeu acautelar e mantendo a sua exploração até que a EE dele precisasse limitando logo esse fruição ao período de vida da mesma e impossibilitando a sua transmissão.

    5. . Daí a proibição de trespasse, direito inalienável de qualquer titular de um estabelecimento.

    6. Permitir e considerar que o estabelecimento comercial transmitiu-se para a os AA, pela via sucessória assim como se transmitiu a posição de locadora, constitui uma violação do acordo firmado com a EE.

    7. Não há consentimento para a transmissão da fruição por parte da EE porquanto este era um direito pessoal que se extinguiu com a morte da sua titular.

    8. E a ausência de reacção da EE não é qualquer violação do acordo, uma vez que apenas ocorre um incumprimento do dever de entrega que se impõe à herdeira.!!! 11.º Há assim erro de apreciação do direito quando a sentença considera que ocorreutransmissão.

    9. Com o falecimento da Sr.ª D. FF, ocorrido em 17 de Setembro de 2013, cessou dessa forma o uso e fruição do imóvel onde se mostra instalado o estabelecimento comercial assim como deste mesmo estabelecimento uma vez que estamos perante comodato gratuito cujo prazo ou duração foi expressamente prevista, cessando com o falecimento da tia daA.- a comodatária.

    10. Ocorre ainda uma contradição entre a Absolvição dos RR. do pedido formulado sob a alínea C) e a condenação do pedido formulado na al, B) do mesmo porque o estabelecimento é indissociável com a fruição do imóvel onde se encontra instalado, não estando a A. legitimada pela EE para poder continuar a usufruir e a deter o imóvel não podendo, por isso, suceder na posição de locadora do mesmo estabelecimento.

    11. Podendo adquirir tão só pela via sucessória os equipamentos do estabelecimento comercial.

    12. Diríamos que além de ilegal, é imoral a herdeira da Sr.ª FF, bem sabendo do teor da ata de 02 de Agosto de 1991 e por conseguinte da cessação do uso e fruição do imóvel, virexigir do A. as prestações que diz se encontrarem em falta, quando o que deveria fazer era suscitar a questão ao EE, dando-lhe a conhecer o falecimento da sua Tia e informando quem está na posse do imóvel e a que título.

      Termos em que o presente recurso deve merecerprovimento por existir erro na apreciação da prova e bem assim erro na aplicação do direito, por errada interpretação do disposto no art.º 1022.º,1031.º, 1038.º do Código Civil, devendo revogar-se a sentença recorrida e, em sua substituição, ser proferida outra que julgue a ação totalmente procedente por provada, ou se assim não se entender que se ordene o chamamento do EE, com o prosseguimento dos ulteriores termos do processo, assim fazendo-se JUSTIÇA.

      A parte contrária contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões: I. Os recorrentes, tanto na respetiva alegação como nas conclusões, não cumpriram oónus imposto pela norma do artigo 640º, nº 1, alínea b) do Código de Processo Civil,já que não indicam os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida, pelo que, deve ser rejeitado o recurso respeitante à reapreciação da matéria de facto, em virtude da alegada circunstância obstar ao conhecimento do recurso.

      1. Caso assim se não entenda, cumpre dizer que os concretos pontos da matéria de facto, provada e não provada, impugnados pelos recorrentes, não merecem qualquer censura, designadamente a que lhe é apontada no recurso interposto.

      2. O juízo formulado pelo Tribunal a quo relativamente a tal matéria resulta da correta valoração de todos os meios de prova produzidos nos autos, desde logo, da conjugaçãodos diversos documentos juntos à petição inicial dos mesmos (documento 1 a 13) e da confissão escrita dos réus, em sede de respetivo articulado de contestação.

      3. Todos esses documentos comprovam, sem margem para qualquer dúvida e quando conjugados entre si, a existência do estabelecimento comercial “DD” na esféria jurídica da falecida Sra. FF, que a recorrente é a única e universal herdeira testamentária da dita Senhora, e que recebeu o domínio e posse daquele...

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