Acórdão nº 425/08.3TBCHV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução16 de Março de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO Os autores AA instauraram, em 10-05-2008, no Tribunal de Chaves, acção declarativa de condenação (então, sumária) contra os réus: 1ºs – BB; 2ºs – CC; 3ºs – DD; 4ºs – EE; e 5ª – FF.

Formularam uma dezena de pedidos(1), a saber: “Deve a presente acção proceder por provada e, em consequência: a) Declarar-se que GG foi, até à sua morte, ocorrida em 29/05/2000, dona com exclusão de outrem do prédio urbano identificado nos itens 6 e 7 da petição inicial [desde Janeiro de 1958 inscrito sob o artº 3º da Matriz, composto de casa de rés do chão, com 36 m2, sita na Rua T, Chaves, descrito sob o nº 00, e inscrito a seu favor pela AP.12, condenando-se os réus a isso reconhecer; b) Declarar-se que tal prédio, com o óbito da dita GG, passou a integrar o património autónomo constituído pela herança ilíquida e indivisa aberta pelo seu decesso, condenando-se os réus a isso reconhecer; c) Declarar-se que a autora é herdeira e cabeça de casal na herança aberta por óbito da sua identificada mãe (GG), condenando-se os réus a isso reconhecer; d) Declarar-se a nulidade da escritura de rectificação e constituição da propriedade horizontal outorgada no Cartório Notarial de Chaves em 6 de Abril de 2004, constante do livro para escrituras diversas nº 4, a fls. X; e) Ordenar-se o cancelamento dos seguintes registos: - Constituição da propriedade horizontal (Ap.03; Averb. 3) do prédio urbano inscrito na Conservatória do Registo Predial de Chaves sob o n.º 00 – Valdanta; - Alteração da área e confrontação do lado poente (Ap.03 Av.2) do prédio urbano inscrito na Conservatória do Registo Predial de Chaves sob o n.º 00 – Valdanta; - Registo das fracções A a D do prédio urbano inscrito na Conservatória do Registo Predial de Chaves sob o n.º 00 – Valdanta; f) Declarar-se a nulidade da escritura de compra [pelos 1ºs réus] e venda [pelos 2ºs, àqueles] outorgada no Cartório Notarial de Montalegre, em 11/07/2005, constante do livro de escrituras diversas nº 9, a fls. X e ss; g) Declarar-se a nulidade da escritura de doação [pelos 2ºs réus aos 3ºs réus] outorgada no Cartório Notarial de Valpaços, em 18/05/2005, constante do livro para escrituras diversas nº 1, a fls. X e ss; h) Condenar-se os réus a respeitarem e não perturbarem, por qualquer forma, o direito de propriedade da herança ilíquida aberta por óbito de Etelinda Chaves sobre o prédio referido em a); i) Condenar-se os réus a reconhecerem o peticionado nas alíneas d) a h) e a desfazerem todas as obras efectuadas naquele imóvel (referido em a), repondo-o ao seu anterior estado; j) Condenar-se os réus a desocuparem imediatamente o imóvel, entregando-o à autora, para que, no uso dos poderes conferidos pelo artº 2088º, do CC, o possa administrar.” Alegaram, para tanto, na petição inicial, que, em 29-05-2000, faleceu, sem deixar testamento ou qualquer outra disposição de última vontade, GG, casada com HH, no regime da separação de bens. Este, por sua vez, faleceu em 04-03-2001.

A autora AA é filha de GG, competindo-lhe o cargo de cabeça de casal da herança deixada por esta, por com ela ter vivido (artº 2080º, CC).

Desde Janeiro de 1958, está inscrito na Matriz Predial de Valdanta, Chaves, sob o art. 0,º o prédio composto de casa de habitação, de rés-do-chão, com a superfície coberta de 36 m2, sito na Rua x, que confronta de norte com A, do nascente com P, do sul com caminho público e do poente com J. Tal prédio encontra-se descrito na CR Predial de Chaves, sob o n.º 00.

A GG adquiriu-o, por compra, em contrato celebrado por escritura pública de 26-05-1986, a J, estando a propriedade inscrita a seu favor por Ap.12 de 07/07/1986.

Desde esta data, a inscrição matricial e a descrição predial permaneceram sem qualquer modificação.

Primeiro um e depois outro, foram praticando sobre tal prédio, durante mais de 40 anos seguidos, actos de posse em termos que conduziram também à sua aquisição originária, pela Etelinda, por usucapião.

Sucedeu que, no início da última década de 90, GG fez um acordo verbal com JJ, empreiteiro de Valdanta, segundo o qual este se comprometeu a construir, sobre tal prédio, um outro piso, 1º andar, para habitação e aquela, em contrapartida, se comprometeu a, logo que concluída tal construção, ceder a este o rés-do-chão do imóvel.

O dito JJ ainda chegou a iniciar as obras, tendo executado a estrutura porticada do 1º andar, em pilares e vigas, o telhado e as paredes exteriores.

Porém, abandonou-a de seguida, sem a concluir e sem cumprir o acordo.

Em 1997/1998, face a tal abandono, o marido da aqui autora e um seu cunhado, a mando de GG, concluíram a obra: revestiram as paredes exteriores, construíram as paredes interiores, aplicaram a instalação eléctrica e as canalizações, assentaram os mosaicos e as loiças no quarto de banho e colocaram portas e janelas (só faltando as pinturas).

Aconteceu, porém, que, nos anos de 2002/2003, contra a vontade dos sucessores de GG (falecida antes, em 29-05-2000) e sem o seu conhecimento nem consentimento (todos ausentes, inclusive no estrangeiro), a porta de entrada do imóvel foi derrubada [não alegam os autores por quem], tendo sido efectuadas obras de remodelação ao nível do rés-do-chão e do 1º andar.

Acto contínuo, os 1ºs réus (BB) passaram a utilizar a casa sempre que se deslocam a Portugal, arrogando-se como seus donos, afirmando que compraram o imóvel aos 2ºs réus (CC).

Efectivamente, existe uma escritura pública, outorgada em 11-07-2005, no Cartório Notarial de Montalegre, da qual consta que a 1ª ré (BB) adquiriu aos 2ºs réus (CC) uma fracção autónoma para habitação, inscrita na matriz predial da freguesia de Valdanta sob o art. X e descrita na Conservatória do Registo Predial de Chaves sob o n.º 19.

Contudo, GGs nunca vendera a casa, nem o fizeram os seus sucessores. Jamais qualquer deles teve quaisquer contactos ou conversações com qualquer dos réus, não os conhecendo sequer.

Ainda assim, com base naquela escritura naufragou uma acção de reivindicação que, em 2005, os autores haviam intentado contra os 1ºs réus (apesar de nele ter ficado provado que o prédio urbano em causa era propriedade de Etelinda, integrou a sua herança e que a autora é herdeira).

Foi então que os autores perceberam o enredo.

Com efeito: Os 2ºs réus (CC), em 19-05-1998, registaram a seu favor a aquisição do prédio urbano localizado a nascente da casa de GG, composto de rés-do-chão e 1º andar, com 72 m2, a confrontar do norte e nascente com herdeiros de A, do sul com caminho público, e do poente com J (anterior proprietário da casa de GG), inscrito na matriz predial da freguesia de Valdanta sob o art. X e descrito na Conservatória do Registo Predial de Chaves sob o n.º 001.

Os mesmos 2ºs réus, requereram, junto dos Serviços de Finanças de Chaves, a alteração das confrontações de tal prédio, tendo aí declarado falsamente que, do lado poente, o dito prédio confrontava com AP.

Tal declaração visou facilitar, sem intervenção dos sucessores de GG, a alteração da área do prédio dos 2ºs réus – de 72 m2 para 150,2m2 –, área que estes assim lograram averbar no registo predial em 05-07-2004, na sequência de escritura pública de rectificação, outorgada em 06-04-2004, no Cartório Notarial de Chaves, na qual intervierem os anteriores titulares inscritos daquele prédio, ou seja, os 4ºs réus (EE) e a 5ª ré (FF).

Nessa mesma escritura, os 2ºs réus constituíram aquele prédio em propriedade horizontal tendo-o dividido em 4 fracções designadas pelas letras A a D, assim identificadas: - Fracção A – rés-do-chão e 1º andar esquerdos {objecto de compra e venda celebrada entre os 1ºs (BB) e 2ºs réus (CC) outorgada no Cartório Notarial de Montalegre em 11-07-2005}; - Fracção B – rés-do-chão centro (registada na Conservatória do Registo Predial a favor dos 2ºs réus sob o n.º 19; - Fracção C – 1º andar centro (registada na Conservatória do Registo Predial a favor dos 2ºs réus sob o n.º 15– C; - Fracção D – rés-do-chão e 1º andar direito (registada na Conservatória a favor dos 3ºs réus sob o n.º 19-D, objecto de escritura de doação, em 18-05-2005, dos 2ºs réus aos 3º s).

Assim, na ampliação de área que efectuaram, os 2ºs réus incorporaram, sem o consentimento de GG nem dos seus sucessores, o prédio dela no seu.

Tanto que, no local, a área e a implantação da fracção A coincidem com as do prédio de GG.

Uma vez citados, contestaram: Os 3ºs réus DD (fls. 106 a 114): -Por excepção de ineptidão da petição inicial, alegando que, mesmo que os autores consigam fazer a prova dos factos que alegam na petição inicial, sempre improcederão os pedidos de declaração de nulidade das escrituras de rectificação e constituição da propriedade horizontal, de compra e venda e de doação que formularam, pois, ainda que as declarações prestadas fossem falsas, tal não integra causa de nulidade dos actos notariais previstas nos art.s 70º e 71º, do Cód. do Notariado. Além disso, deveriam ter os autores alegado que o oficial público que elaborou tais documentos não teve qualquer percepção das declarações documentadas ou que não praticou os actos em causa. Assim, o pedido formulado não tem causa de pedir, havendo contradição entre esta e aquele, sendo inepta a petição, com as devidas consequências.

-Por impugnação, dizendo desconhecerem ou ser falsa parte da matéria alegada. Acrescentaram que o acordo verbal aludido pelo autores foi um acordo global celebrado entre JJ (que foi empreiteiro), por um lado, e GG, DD e EE, por outro lado.

É que os contestantes eram donos de uma casa de habitação já bastante degradada, contígua aos imóveis de GG e de EE, também estes bastante degradados, sita na rua X, em Valdanta, sobre que exerceram posse conducente à aquisição do respectivo direito de propriedade por usucapião.

Naquele contexto de degradação física e estrutural das três casas, foi feito o citado acordo entre todos (GG, DD, EE e JJ), no sentido da reconstrução daquele conjunto habitacional e edificação de um piso superior (1º...

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