Acórdão nº 112509/15.0YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelANABELA TENREIRO
Data da Resolução09 de Março de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Sumário I-Quando for manifestamente excessiva, ainda que por causa superveniente, ou se a obrigação tiver sido parcialmente cumprida, a cláusula penal pode ser reduzida pelo tribunal, de acordo com a equidade-cfr. art. 812.º, n.º 1 e 2 do C.Civil.

II-Nos termos do artigo 19.º, al. c) do Dec.-Lei n.º 446/85 de 25.10. alterado pelos Dec.-Leis n.ºs 220/95 de 31.10 e 249/99 de 07.07 são relativamente proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, as cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir, inseridas nos designados contratos de adesão.

III-A cláusula penal inserta previamente no conteúdo do contrato de locação, com duração de cinco anos, que não foi objecto de negociação, imposta ao aderente, prevendo uma indemnização, para a hipótese de cessação do contrato, correspondente ao pagamento das mensalidades estipuladas até ao respectivo termo, faz incidir sobre o aderente uma vinculação manifestamente não coincidente com os seus interesses de utilização dos bens alugados contra o pagamento de um preço, libertando a locadora, predisponente, de qualquer risco de incumprimento, ficando ainda com a possibilidade de vender ou novamente alugar os bens que o aderente foi obrigado a devolver.

III-A desproporção que se verifica neste tipo de cláusula, face ao quadro negocial padronizado, por impôr ao aderente consequências patrimoniais gravosas, deve ser considerada relativamente proibida à luz do citado normativo legal.

* Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I—RELATÓRIO “G” intentou a presente acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias contra “S”, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 5.982,37 de capital, acrescido de juros, outras quantias e taxa de justiça.

Alega, para o efeito, ter alugado à Ré os bens que identifica, mediante o pagamento de uma renda, tendo esta deixado de fazer o pagamento da renda, o que levou à resolução do contrato pela Autora.

Citada a Ré, contestou, nos termos constantes da oposição junta aos autos.

* Proferiu-se sentença que julgou a presente acção totalmente procedente e, consequentemente, condenou a Ré a pagar à Autora a quantia de 5.982,37 €, acrescida do montante de 89,28€, a título de juros de mora vencidos à data da apresentação do requerimento de injunção, mais juros de mora contados desde 11 de Agosto de 2015, até integral pagamento, às taxas convencionadas de 15,05%, sobre a quantia de 5.842,76 € e de 12% sobre a quantia de 139,61 €.

* Inconformada com a sentença, a Ré interpôs recurso, terminando com as seguintes CONCLUSÕES I.

A Requerente, G, deu entrada de requerimento de injunção peticionando o pagamento de quantias emergentes de contrato de locação que terá celebrado com a Requerida/Recorrente (o mesmo teria por objecto o aluguer de 4 fotocopiadoras/impressoras multifunções), que veio a resultar nos presentes autos de processo.

  1. Em sede de oposição, a requerida declarou, em síntese, nunca ter celebrado qualquer contrato com a Requerente, nem nunca pretendeu celebrar qualquer contrato de locação com aquela, directa ou por interposta pessoa; III. Ainda, declarou que todos os contratos das fotocopiadoras/impressoras foram celebrados com Q, na modalidade pagamento à cópia, relativos a a sociedade.

  2. Foi realizada audiência de julgamento e produzida prova documental e testemunhal por ambas as partes.

  3. O tribunal "a quo" decidiu julgar totalmente procedente a acção, por provada, e, consequentemente, condenar a Requerida a pagar à Requerente a quantia de 5982,37€, acrescida do montante de 89,28€, a título de juros de mora vencidos à data da apresentação do requerimento de injunção, mais juros de mora contados desde 11 de Agosto de 2015, até integral pagamento, às taxas convencionadas de 15,05%, sobre a quantia de 5842,76 € e de 12% sobre a quantia de 139,61€.

  4. Fundamentou a sua decisão no seguinte sentido: "O tribunal fundou a sua convicção no conjunto da prova produzida em julgamento.

    Atendeu-se aos documentos juntos aos autos que, apesar da versão da Requerida, que afirma na oposição que não conhece, nunca negociou e desconhece o ramo da actividade da Requerente, demonstram que a Requerida celebrou com a Requerente o contrato de locação dos bens móveis constantes da lista anexa ao contrato. O contrato encontra-se assinado pela Requerente, enquanto locadora, e pela Requerida, enquanto locatária, surgindo a sociedade Quatronica enquanto vendedora/fornecedora. A assinatura da legal representante da Requerida não foi impugnada.

    Resulta também da correspondência trocada entre a Requerente e a Requerida, nomeadamente da resolução do contrato realizada pela Requerida, que esta reconheceu o contrato celebrado com aquela.

    Tais documentos comprovam ainda, e foi aceite pela legal representante da Requerida, quando ouvida em declarações de parte, que os pagamentos eram realizados por débito directo pela Requerida à Requerente, que enviava os respectivos recibos.

    Da correspondência junta aos autos, decorre que a vendedora/fornecedora (Quatronica) falhou no serviço que se comprometeu a prestar à Requerida, o que levou a que esta deixasse de pagar o valor contratado com a Requerente e, posteriormente, resolvesse o contrato celebrado com as duas sociedades.

    No entanto, o contrato de locação é autónomo do contrato de prestação de serviços que a Requerida celebrou com a sociedade que nem sequer é parte nos presentes autos, sociedade que foi escolhida pela Requerida e, quando deixou de satisfazer, a requerida poderia ter trocado enquanto fornecedora de serviços, como lhe foi sugerido em 23 de Fevereiro de 2016 pela Requerente (cfr. email de fls. 63).

    Isto para concluir que a Requerida não tinha fundamentos contratuais ou legais para resolver, com justa causa o contrato de locação que celebrou com a Requerente.

    Tendo deixado de pagar o preço contratualmente fixado pelo aluguer dos bens móveis, apesar dos avisos da Requerente, levou à resolução do contrato pela Requerente, em 15/07/2015.

    Os depoimentos das testemunhas acabaram por confirmar o que já resultava dos documentos, não tendo a testemunha da Requerida nem a sua representante legal logrado convencer o Tribunal que a Requerida agiu em erro quando celebrou o contrato com a Requerente, desconhecendo que estava a contratar com ela.

    Assim, a testemunha M, funcionário da Requerente, explicou que esta não escolhe os vendedores e fornecedores dos equipamentos, que são antes escolha do locatário. No caso em apreço, foi a requerida que escolheu a Quatronica, sendo a relação da Requerente com esta empresa apenas de compradora. A Requerente comprou os equipamentos à Q e alugou-os à Requerida, sendo um aluguer de 60 meses, prazo escolhido pela Requerida. A Q entregou o contrato à Requerida para assinar, depois o contrato foi devolvido à Requerente, que também assinou e, posteriormente, foi enviado um exemplar ao locatário, devidamente assinado. Explicou que as rendas foram pagas até Maio de 2015, tendo sido enviadas cartas pela Requerente à Requerida por causa da interrupção do pagamento. Disse ainda que a Requerente nunca fornece consumíveis nem faz a manutenção dos equipamentos, só alugando os mesmos.

    A testemunha A, administrativa da R., identificou a Q como a empresa que presta serviços à Requerida e que começou a prestar maus serviços, tendo configurado esses serviços como um contrato de manutenção das impressoras. Disse que a requerida devolveu as impressoras, desconhecendo a quem, mas que foi para a morada que foi indicada. Confirmou que os pagamentos eram feitos por débito directo à Requerente, dizendo que pensava que era a empresa que tratava das cobranças da Q. Acabou por admitir que não leu os contratos nem participou nas negociações.

    M, legal representante da requerida, descreveu o contrato celebrado com o fornecedor dos equipamentos, com os consumíveis a cargo deste; confirmou os pagamentos por débito directo e as facturas enviadas pela Requerente; a devolução dos equipamentos à G porque "são da G e não da Requerida".

    Tudo conjugado, provou-se a versão dos factos trazida pela Requerente, não tendo resultado minimamente provado que a Requerida contratou em erro, não sabendo que contratava com a G e que estava a alugar os equipamentos comprados por esta à Q, empresa que além de ter vendido os equipamentos também assegurou a manutenção dos mesmos. Também não resultou provado qualquer facto que fundamentasse a resolução do contrato de locação, por iniciativa da Requerida. Pelo contrário, provou-se que a requerida deixou de pagar à Requerente o preço estipulado pela locação dos equipamentos, o que levou à resolução do contrato por iniciativa da Requerente".

    VII.Salvo o devido respeito, incorre o Tribunal em erro de apreciação da prova, por tudo quanto infra se exporá.

  5. Na verdade deveriam ter sido considerados como não provados os factos 1 (celebrou, sim, contrato com a Q); 3 (não escolheu qualquer equipamento); 4; 5; 6 (após " .. .ficando em dívida" até final); 7 (após " ... As interpelações" até final); 8; 9; 10; 13; 15 dos dados como provados e como provados os factos 2 e 3 dos dados como não provados.

  6. Na verdade, resulta de toda a documentação junta e, especialmente, da prova testemunhal, a veracidade da posição da Recorrente: A Q comprometia-se a...

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