Acórdão nº 1146/15.6T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelEVA ALMEIDA
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES SUMÁRIO: I - O art.º 452º do CC permite, que, ao celebrar o contrato, uma das partes reserve o direito de nomear um terceiro, que adquira os direitos e assuma as obrigações provenientes desse contrato.

II - A nomeação efectua-se mediante declaração por escrito do adquirente ao outro contraente, dentro do prazo convencionado ou, na falta de convenção, dentro dos cinco dias posteriores à celebração do contrato, sendo tal declaração de nomeação acompanhada, sob pena de ineficácia, do instrumento de ratificação do contrato ou de procuração anterior à celebração deste (art.º 453º do CC).

III - O art.º 454º do CC, dispondo sobre a forma da ratificação, estabelece que a mesma deve constar de documento escrito, mas se o contrato tiver sido celebrado por meio de documento de maior força probatória, necessita a ratificação de revestir igual forma.

IV - Assim, tendo o contrato sido celebrado por escritura pública e inexistindo procuração anterior à sua celebração, a ratificação, por integrar, na parte subjectiva, um contrato já concluído, deveria revestir igual forma, isto é, escritura pública, não bastando documento particular autenticado, quer porque, ao tempo da sua celebração e da ratificação, o contrato exigia forma mais solene para a sua validade, quer porque, mesmo que a ratificação tivesse ocorrido posteriormente a 2008, em que tal exigência de forma não se colocava para o contrato, essa tinha sido a forma adoptada para o contrato e a ratificação tem de revestir igual forma (nº 2 do art.º 454º do CC).

* I – RELATÓRIO S instaurou acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra M, pedindo que se declare que é proprietária do prédio urbano, sito na união de freguesias de Adoufe e Vilarinho da Samardã, concelho de Vila Real, inscrito na matriz predial sob o artigo ….º e descrito na Conservatória do Registo Predial no n.º …, condenando-se a ré a reconhecê-lo.

Para tanto, alegou, em súmula, que em 19/04/2006 foi outorgada escritura pública no Cartório Notarial de Lamego, na qual F interveio na dupla qualidade de representante voluntário de A e de gerente da sociedade G, tendo declarado vender, em nome da sua representada A, quatro imóveis, entre os quais o indicado prédio urbano, à sociedade que também representava, pelo preço global de €35.000,00, já recebido, tendo, em nome desta última entidade, declarado aceitar a venda nos termos exarados e, bem ainda, que, por esse acto, a adquirente reservava o direito de nomear uma terceira pessoa, que adquirisse os direitos e assumisse as obrigações para ela advenientes do contrato de compra e venda, convencionando-se para tal nomeação o prazo de cinquenta anos, a contar de 01/05/2006, sendo estes factos inscritos no registo em 11/04/2006.

Em 05/08/2006 a sociedade G, declarou ter comunicado a Aa nomeação da autora para ocupar o lugar de compradora no contrato de compra e venda outorgado em 19/04/2006, ratificando a autora essa nomeação em 11/02/2007, embora tais factos somente tenham sido levados a registo em 29/06/2015.

No processo executivo que corre termos na Secção de Execução de Chaves, sob o n.º 571/08.3TBVRL, instaurado, entre outras, contra a sociedade G, foi vendido à ré o prédio descrito sob o n.º …, embora se trate de uma alienação de uma coisa alheia, uma vez que, desde a outorga da ratificação, a autora é proprietária desse imóvel, tendo em 05/06/2015 sido lavrado no processo executivo termo de protesto.

* A ré contestou (cfr. fls. 109-112) excepcionando a sua ilegitimidade, por preterição do litisconsórcio necessário passivo, alegando que deveriam ter sido demandadas M e a Fazenda Nacional, por terem interesse idêntico ao da ré na demanda. Defendeu-se também por impugnação e alegou estar de boa fé na aquisição que realizou no processo executivo, concluindo pela improcedência da acção.

* Proferiu-se despacho saneador, em que se decidiu da validade da instância e do processado, julgando-se improcedente a excepção da ilegitimidade passiva.

Fixou-se o valor da causa em €5.000.01 (cinco mil euros e um cêntimo).

Entendendo-se que os autos continham já todos os elementos fácticos necessários à apreciação do mérito da causa, proferiu-se sentença em que se decidiu: «a) Julgar totalmente improcedentes os pedidos formulados a fls. 15 pela autora S absolvendo-se de tais pretensões a ré M; b) Condenar a autora S no pagamento das custas da acção – cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do C.P.C.» * Inconformada, a autora interpôs o presente recurso, que instruiu com as pertinentes alegações, em que formula as seguintes conclusões: «1ª Oportunamente, a aqui recorrente intentou, como autora, contra, como ré, a aqui recorrida, M, a ação judicial, onde foi interposto o presente recurso, visando a autora, com tal ação judicial, que fosse declarado ser ela a proprietária do imóvel, mais bem identificado no artigo 3.º, da petição inicial de tal ação, e a condenação da ré, a reconhecer tal direito de propriedade da autora (vide a peça processual com a referência …, do dia 06 de junho de 2015, correspondente à referência …, desse mesmo dia 06 de Junho de 2015, do histórico de atos processuais deste processo no sistema Citius).

  1. Fundamentou a autora a sua pretensão, essencialmente, em ter ela autora adquirido a propriedade de tal imóvel, por ter sido nomeada, nos termos dos artigos 452.º a 456.º, todos do CC, para ocupar o lugar de compradora desse imóvel, na escritura de compra e venda do mesmo imóvel, celebrada, no dia 19 de abril de 2016, no Cartório Notarial de Lamego (vide a peça processual com a referência …, do 1 dia 06 de junho de 2015, correspondente à referência …, desse mesmo dia 06 de junho de 2015, do histórico de atos processuais deste processo no sistema Citius, e os documentos números 1 e 3, juntos com a petição inicial).

  2. Contrato de compra e vendaesse que a autora ratificou, conforme previsto nos artigos 453.º e 454.º, ambos do CC, no dia 11 de fevereiro de 2007, e através de documento particular autenticado, nessa data lavrado (vide o documento que, com o número 4, foi junto pela autora com a petição inicial da ação em questão).

  3. Documento esse que, ao contrário do pretendido e decidido, na mui douta sentença sob crítica, é, adiante-se desde já, perfeitamente válido, pois que obedece aos requisitos de forma, exigidos pelo artigo 454.º, do CC.

  4. E isto, na interpretação do número 2, desse artigo 454.º, do CC, segundo a qual, a ratificação, a que tal norma legal alude, não necessita, para ser válida, de revestir uma forma igual à forma do contrato ratificando, bastando que ela ratificação revista uma forma, cuja força probatória seja igual à força probatória da forma que o contrato assumiu, ou seja, igual à força...

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