Acórdão nº 463/15.0T8MDL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães * 1 – RELATÓRIO O M, com sede na Praça do Município, Mirandela, instaurou a presente acção (1) declarativa contra F, residente no Lugar de Casarões, Vila Flor, pedindo, que o tribunal, na procedência da acção:

  1. Declare que o terreno sito na Av. das Comunidades Europeias, destinado a espaços verdes, Lote "C", com a área de 7674m2 de extensão, descrito na Conservatória do Registo Predial de Mirandela sob o n.º … e inscrito na matriz predial do Serviço de Finanças de Mirandela sob o artigo matricial …, pertence ao domínio público; b) Declare o A. dono e legítimo proprietário do prédio urbano referido em a); c) Julgue nula e sem qualquer efeito a venda realizada através de escritura pública celebrada em 03 de Novembro de 2006 no Cartório Notarial de Mirandela que vendeu o lote "C", e a subsequente inscrição matricial do prédio urbano inscrito em nome do Réu; d) Julgue nulo e de nenhum efeito esse mesmo registo de justificação matricial, com base na venda de bem alheio assim como por se tratar de bem fora do comércio jurídico.

    Em ordem a sustentar a sua pretensão invocou, em suma, que em 05-07-1996 a Câmara Municipal deliberou por unanimidade aprovar um loteamento em face da proposta do requerente de ceder um lote, designado por Lote "C" e com a área de 7674 m2, o qual se destinava a arborização e, uma vez emitido o respectivo Alvará n.º … considera-se cedido o lote à Câmara Municipal. No entanto o loteador registou abusivamente o lote "C" em seu nome e no âmbito de um processo executivo que correu termos no Tribunal Judicial de Abrantes foi aquele indevidamente vendido ao R., apesar de o A. ter oferecido oportuna informação aos autos quanto à natureza e titularidade do direito de propriedade sobre o mesmo.

    Entende, assim, que a venda executiva é nula por ter incidido sobre bens alheios, para além de ter recaído sobre um bem que integra o domínio público e, nessa medida, fora do comércio jurídico.

    Regularmente citado o R. ofereceu contestação, tendo alegado, em síntese, que a integração do lote no domínio público é de legalidade duvidosa, sendo que, em qualquer caso, adquiriu-o de boa-fé, estando legalmente protegido e, outrossim, aludiu à aquisição originária do direito de propriedade sobre o prédio através da figura jurídica da usucapião.

    Concluiu pela improcedência da acção e peticionou a condenação do A. numa indemnização ao R. não inferior a € 2.000,00 por litigar com má-fé.

    A fls. 61 e ss. foi proferido despacho pela Instância Local de Mirandela do Tribunal da Comarca de Bragança, através do qual foi fixado o valor da acção em € 74.133,03 e julgado competente para o conhecimento da causa a respectiva Instância Central do Tribunal da Comarca de Bragança, com a subsequente remessa dos autos à distribuição.

    Realizou-se a audiência prévia, no âmbito da qual foi proferido despacho saneador e foram fixados o objecto e os temas de prova.

    Por fim realizou-se a audiência de julgamento, com observância do pertinente formalismo legal.

    No final, foi proferida decisão que julgou a acção totalmente procedente e, nessa decorrência:

  2. Declara o A. dono e legítimo proprietário do Lote designado pela letra "C", correspondente ao prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Mirandela sob o n.º …, inscrito na matriz predial do Serviço de Finanças de Mirandela sob o artigo matricial …, sito na Av. das Comunidades Europeias, destinado a zona de arborização, o qual integra o domínio público.

  3. Julga verificada a invocada nulidade da venda executiva do prédio referido em a), realizada através de escritura pública celebrada em 03 de Novembro de 2006, no Cartório de Margarida Isabel Pimenta Ferreira de Oliveira, sito na Rua D. Manuel I, Edifício Império, freguesia e concelho de Mirandela, e determina o cancelamento do registo da aquisição e da inscrição matricial a favor do R. Fernando Bento Hortelão Bonifácio com base na mesma.

    * Inconformado com essa sentença, apresentou o réu recurso de apelação contra a mesma, cujas alegações finalizou com a apresentação das seguintes conclusões: 1.

    Salvo o devido respeito pelo Meritíssimo Juiz "A Quo", que é muito, existiu uma errada e omissiva apreciação da prova, que levaria obrigatoriamente a que fosse dado como provado que, a A. foi notificada para deduzir embargos de terceiro no Processo de Execução nº 343-8/1999 J1 do Tribunal Judicial de Abrantes, não o tendo feito.

    1. Tal resulta do Documento 9, junto com a petição inicial, constante de notificação realizada pelo 2° Juízo do Tribunal Judicial de Mirandela, datada de 09.06.2005, no âmbito do Processo de carta precatória (Distribuída), que correu termos sob o nº 1249/04.2TBMDL, à Camara Municipal de Mirandela para se pronunciar sobre o requerimento anexo, do qual resulta evidentemente a pretensão de que o Município se pronuncie, sobre a intenção de proceder à aquisição do terreno no âmbito da execução, ou em alternativa ter que proceder à expropriação a quem o adquirisse no referido processo de Execução.

    2. À data, e em resposta o Município nada fez, senão alegar a propriedade do terreno em causa para integração do domínio público, decorrente do processo de loteamento nº 4/96, concedido em 12 de Agosto de 1996, a A. (co executado no âmbito do referido processo de Execução).

    3. O Tribunal notificou a Camara Municipal de Mirandela, diversas e variadas vezes, no decurso de todo o processo, para esclarecer e intervir, nomeadamente requerendo que fossem juntos elementos de prova, relativo ao direito de propriedade que arguia sobre o terreno dado à execução, quer no decurso da Venda Mediante Proposta em Carta Fechada, realizada em 14.01.2005, quer posteriormente, quando da decretação da venda por negociação particular, decretada em 03.02.2005 (cfr. fls. 423, da Certidão do processo de Execução nº …, junta aos autos em 18.04.2016, com a refª ….

    4. A Câmara Municipal de Mirandela, foi notificada, na qualidade de Interveniente Acidental, por ofício remetido, datado de 03.03.2006, da decisão de venda (cfr. se verifica de fls. 510 e ss da Certidão do processo de Execução nº …, junta aos autos em 18.04.2016, com a refª CITIUS ….

    5. Não obstante, oficiosamente solicitada certidão integral ao Tribunal de Abrantes, conforme Acta da Audiência Prévia de 30.03.2016, os documentos dela constantes, não foram considerados na decisão proferida, o que desde logo impunha decisão diversa, sendo tal facto dado como provado.

    6. Há ofensa de caso julgado, porquanto a primeira decisão (de venda) transitada em julgado constitui questão prejudicial à ora proferida.

    7. O Recorrente procedeu à aquisição do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Mirandela sob o nº …, inscrito na matriz predial do Serviço de Finanças de Mirandela sob o artigo Matricial …, sito na Av. das Comunidades Europeias, em Mirandela, por escritura pública celebrada em 3 de Novembro de 2006, no Cartório Notarial de Mirandela, em estrito cumprimento de decisão judicial, e conforme ordenado pelo despacho judicial de 10.02.2005, proferido nos autos de Carta Precatória, que correu termos sob o Proc. Nº 1249/04.2, do 2° Juízo do então Tribunal Judicial da Comarca de Mirandela, extraída dos Autos de Execução Sumária, sob processo nº 343-A/1999, do 1° Juízo do Tribunal Judicial de Abrantes; 9.

      E, procedeu ao pagamento do preço de € 40.000,00 (quarenta mil euros), por meio de depósito autónomo, em 04.08.2006, e pagou todos os impostos decorrentes da transmissão, conforme judicialmente ordenado; 10.

      Realizou o depósito do preço, antes da transmissão operada, à ordem do Tribunal, conforme aliás se verifica de fls. 540, 541, 544 e 550, da Certidão do processo de Execução nº 343-B/1999, junta aos autos em 18.04.2016, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Santarém - Núcleo Abrantes - Unidade Central, extraída do 2° Juízo do Extinto Tribunal Judicial de Abrantes, com a refª CITIUS 583421.

    8. A venda operou-se por decisão judicial transitada em julgado em 14 de Dezembro de 2006, cfr. fls 577 da mesma certidão; 12.

      Não fazendo menção ou referência, à decisão de venda, o Meritíssimo Juiz "A Quo", julgou verificada a invocada nulidade da venda executiva do prédio.

    9. A presente decisão, consubstancia no modesto entender do Recorrente a ofensa de caso julgado, porquanto entende que a primeira decisão transitada em julgado constitui questão prejudicial à ora proferida.

    10. Por decisão judicial, transitada em julgado, procedeu o Recorrente à aquisição do referido terreno em 2006, tendo realizado o pagamento dos respectivos impostos, e sendo o imóvel registado em seu nome por certidão e ordem judicial, conforme se verifica de fls. 550 e 577 da referida certidão.

    11. Proferida e transitada em julgado a decisão que ordenou a venda, formou-se caso julgado que obsta a que a mesma seja revogada da forma como aqui foi, (artigos 580°, nº 2 e 619° do C.P.C.), sem prejuízo do disposto nos artigos 696° a 702° do mesmo código, estabelecendo o nº 2, do artigo 697° o prazo máximo de 5 anos, sobre o transito em julgado da decisão, tendo-se assim esgotado o poder jurisdicional relativo a essa parte.

    12. De acordo com a motivação da decisão de facto, e a fundamentação de direito, verifica-se que a douta decisão, considerando de primordial importância o acervo documental junto aos autos, apenas considera e valora a final o processo administrativo de loteamento, junto pela A. aos autos, não obstante referir na fundamentação de direito: ... " Realce-se que não cuidamos aqui de apurar de eventuais vicissitudes do procedimento administrativo que culminou na emissão do referido alvará, desde logo porque não é este o objecto do processo, sendo mesmo que, segundo defendemos, não seria também este o tribunal competente para o efeito.

      " ...

    13. Tendo contudo na motivação da decisão de facto considerado que: ... " No que concerne ao depoimento da testemunha L, este revelou-se essencialmente técnico, envolto em apreciações criticas relativamente ao...

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