Acórdão nº 364/12.3TCGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelHIGINA CASTELO
Data da Resolução16 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório Objeto do recurso II. Fundamentação de facto III. Apreciação do mérito do recurso A. Da prescrição B. Da alteração da matéria de facto pretendida pelo Recorrido (Autor) C. Da alteração da matéria de facto pretendida pelo Recorrente (Réu) D. Dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual 1. Do ato ilícito (e culposo) ou, de outro ângulo, do direito violado 1.1. Liberdade de expressão 1.2. Liberdade de imprensa 1.3. Direito ao bom nome de pessoa coletiva 1.4. Cont. – Bom nome da pessoa coletiva pública «município» 1.5. Regressando ao facto do caso 1.6. Cont. – O facto como exercício da liberdade de expressão 2. Dos danos causados (danos não patrimoniais e personalidade coletiva) Sumário (art. 663, n.º 7, do CPC): IV. Decisão Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães[*]: I. Relatório AA, Réu na ação que lhe é movida pelo Município de Guimarães, notificado da sentença de 15/06/2015 que o condenou a pagar ao Autor a quantia de € 10.000 a título de compensação pelos danos não patrimoniais causados, acrescida de juros à taxa legal de 4% desde então até integral e efetivo pagamento, e com ela não se conformando, interpõe o presente recurso.

Nas suas alegações de recurso, conclui: «1. Da própria sentença constam factos e afirmações que contribuem para a absolvição do réu, donde há contradição entre a sentença e os factos provados e sua fundamentação.

  1. Quando o réu foi citado já tinham decorrido, mais de 3 anos da data de publicação do jornal. Portanto, verificava-se a prescrição.

  2. É verdade tudo o que o réu escreveu.

  3. Na audiência de julgamento foi junta uma planta da própria Câmara, donde consta um projeto para urbanizar a área que pertence ao arquiteto e sua família.

  4. Essa planta é a reprodução da folha 4 do jornal e vice-versa.

  5. O réu contribuiu com a publicação do jornal para evitar um escândalo de especulação imobiliária com proporções inimagináveis.

  6. A Câmara e seu arquiteto pretendiam enriquecer dessa forma, não se sabendo ao certo em que valor, mas era muito, pois como está provado e foi dito pelo mesmo arquiteto, à volta do Santuário é, praticamente, tudo dele e da sua família.

  7. O tribunal não leu a PI reproduzida nos autos e dada como provada a sua existência.

  8. Os factos dados como provados e a fundamentação e os depoimentos atrás transcritos do Presidente da Câmara e arquiteto mostram que o réu estava de boa-fé, convencido e com a certeza de que o que relatara era verdadeiro.

  9. Ninguém perseguiu o réu por denúncia criminosa ou injúria ou difamação.

  10. a) Tendo em conta o que consta da sentença já transcrito e conclusões anteriores e depoimentos atrás transcritos, do arquiteto BB e do ex-Presidente CC, que se dão aqui integralmente integrados e reproduzidos para todos os efeitos legais, b) Quer na sua fundamentação de facto, c) Quer na sua fundamentação de direito, d) Quer pelo que disseram as testemunhas e o réu, nos termos transcritos na sentença e agora também transcritos, e) Tendo em conta o texto, o pretexto e o contexto… 12. … Deve dar-se como provado: 13. …Que as imputações não eram nem são aptas a denegrir a imagem, credibilidade, prestígio, bom nome e confiança no autor/Município; 14. …Que o réu tinha e tem fundamento para, na sua boa-fé, reputar como verdadeiros os factos que afirmou, pois as condutas aí relatadas existiram.

  11. … Que foi afetado o património da Irmandade de S. Torcato, de que o réu foi membro e Juiz Presidente entre 1980 e 1995; 16. …Que tal facto continua impune e o grupo ou a minoria que dele tirou proveito encontra-se cada vez mais distante de ser responsabilizada e de responder, penal e civilmente, perante a justiça.

  12. …Que as expressões “roubo de milhões” ou “roubo do século” foram, normalmente escritas entre aspas, e dentro de um contexto jornalístico sem especulação que permite a ironia, o exagero e a provocação.

  13. …Que da Mesa da Irmandade, após a saída do réu, passou a fazer parte o Arquiteto BB e seus irmãos de sangue Eng. DD, funcionário da autarquia, e um terceiro irmão Eng. EE.

  14. …Que o Boletim não teve nenhuma repercussão no interior da Câmara nem no concelho.

  15. É irrelevante a prova do valor do terreno perdido pela obra do S. Torcato, sendo relevante que a obra de S. Torcato perdeu os terrenos à volta do Santuário.

  16. Está provado com a planta junta na audiência de julgamento, que reproduz a página 4 do jornal, e com o depoimento do arquiteto, que este e família são donos da maioria dos terrenos vizinhos, ele e família que eram da confraria de S. Torcato, e que os procedimentos dele e da Câmara não eram regulares e geravam desconfiança e parcialidade.

  17. A parcialidade resulta também na “guerra” que o Arquiteto BB e a Câmara fizeram ao réu, que cedeu, entre aspas, terrenos à Câmara e esta se vingou não aprovando o que prometera nem lhe pagando um cêntimo até agora, conforme ação no TAF de Braga, facto provado, violando todas as regras de um Estado que se intitula de Direito.

  18. Em geral e em abstrato, é verdade que Portugal é dos países com menor transparência na administração pública, só ultrapassado pela África e América Latina, é dos países onde há mais corrupção.

  19. Em geral e em abstrato, também é verdade que essa falta de transparência se situa mais na administração local e é difícil de provar.

  20. E as vítimas, ou seja os contribuintes, pagam várias vezes essa praga com impostos, IMIS, e depois se abrem a boca como neste caso, ainda pagam indemnizações.

  21. Em geral e em abstrato, em Portugal a administração local não tem, por isso, merecido a credibilidade que se exigia.

  22. Há prova de que houve um acordo entre amigos da Irmandade e da Câmara e o funcionário da Câmara que também fazia parte da gestão da obra de S. Torcato.

  23. Ficou provado nos depoimentos que o Arquiteto BB, desde 1994 até Novembro de 2009, era Chefe de Divisão do Planeamento Urbanístico da Câmara Municipal de Guimarães, um dos principais responsáveis pela elaboração do Estudo do PDM e do Plano de Pormenor de S. Torcato, como se demonstra na pág. 4 do Boletim, e simultaneamente continuou e continua a acumular um dos cargos diretivos na Irmandade de S. Torcato.

  24. Há prova de que se verificou grande promiscuidade entre Câmara, o seu alto funcionário e arquiteto e a Irmandade de S. Torcato, de que este funcionário da Câmara fazia parte. Estava tudo entre amigos.

  25. A afirmação Câmara passou a utilizar processos cada vez mais provocatórios de utilização.” (…) “Só agora, para dar ideia de uma firmeza que é justo confundir com falta de carácter e instintos fascistas, os dirigentes políticos talvez por que tinham “costas quentes” com o apoio de interesses materialistas ou da população da Corredoura, decidiram atuar com pulso de ferro.” (…) “A autarquia nunca se preocupou com questões de direito, praticando uma autêntica “política do quero posso e mando””. [artigo 11º da contestação], é uma afirmação política, não ofensiva que se pode dizer em quaisquer circunstâncias, e muito mais nas circunstâncias que rodearam a publicação do jornal.

  26. O tribunal de primeira instância só leu o texto, esquecendo o pretexto e o contexto.

  27. As palavras “roubo”, “ladrões”, “assalto”, e sempre entre aspas não foram usadas em sentido técnico. É um “roubo” receber sem nada dar ou dar sem nada receber. O Mosteiro foi “roubado”, entre aspas. Foi prejudicada a obra e o património de S. Torcato.

  28. Foi utilizada linguagem popular: como os políticos “roubam”, são uns “ladrões”, o Povo é “roubado”, trabalhamos e pagamos impostos para “ladrões”, tudo entre aspas, etc.

  29. O arquiteto esclareceu que se demitiu por razões pessoais e não por causa do BOLETIM. Então a publicação quanto a ele foi inócua.

  30. Os factos provam que havia associação entre o arquiteto, a Câmara e a Mesa do Santuário para entregar terrenos do Santuário à Câmara a troco de nada. E que foi um “roubo” essa entrega, isto é doação/ocupação a troco de nada.

  31. Constava do artigo 57 da contestação uma PI contra o Município que o tribunal não teve em conta.

  32. O texto ou conteúdo do blogue ou blogues não está nos autos. O blog não consta dos autos. Nem o réu nem o seu mandatário viram algo sobre isso.

  33. Sobre isso nada pode ser dado como provado ou tido em conta.

  34. Num blog cada um que lá vai escreve o que lhe apetece sem controlo do réu e de ninguém.

  35. O blog Juan Papali citado pelo tribunal não é do réu.

  36. O tribunal condenou o réu por comentários num blogue desconhecido, anónimo, que nem sequer constam dos autos, violando o direito ao contraditório.

  37. O tribunal cita depoimentos segundo os quais a Câmara fez construções nos terrenos do réu, mas não tirou as consequências.

  38. Os factos mostram que o Santuário perdeu terrenos para a Câmara.

  39. Os factos provam que havia rivalidade política pelo meio.

  40. Provam que havia muita política à mistura.

  41. O tribunal decidiu contra a matéria provada.

  42. Tirou ilações erradas.

  43. O Tribunal admite que o Santuário ficou sem o que era dele a troco de nada ao afirmar: “decidiu ceder gratuitamente e integrar no domínio público do Município de Guimarães, todos os arruamentos pintados em tom laranja retratados na planta de fls. 92”.

  44. É ilícito ao tribunal tratar o réu como criminoso, assacando-lhe a prática de um crime, quando ninguém dele participou, nunca tendo sido julgado.

  45. E com o objetivo de declarar que não houve prescrição.

  46. Por isso, houve violação do artigo 6, nº 2º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

  47. O tribunal ignorou o artigo 6º nº 2 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e a jurisprudência do TEDH ao utilizar as frases respetivas que põem em causa o princípio da presunção da inocência.

  48. O tribunal partiu do princípio que o réu era culpado, apesar de não ter sido julgado.

  49. Há violação do artigo 10º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem que garante a liberdade de expressão.

  50. A liberdade de expressão e o interesse público prevalecem sobre a honra ou reputação.

  51. O interesse público em manter o público informado sobre assuntos de interesse...

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