Acórdão nº 183/15.5T8CBT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelFERNANDA VENTURA
Data da Resolução16 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães (1ª Secção): I – RELATÓRIO Nos presentes autos de acção declarativa sob a forma de processo comum veio a A.

Anabela Costa Ramos pedir contra a R.

GNB – Companhia de Seguros, S.A a sua condenação a pagar-lhe a quantia de €10.800,00, acrescida de juros vincendos a contar da citação até efectivo e integral pagamento bem como na quantia diária de €40,00, contados desde a data do sinistro, a título da privação do uso do veículo até efectiva reparação ou pagamento da quantia devida, acrescida de juros vincendos a contar da citação até efectivo e integral pagamento.

Para tanto alega – em suma – que é dona e legítima proprietária de um veículo automóvel de marca Renault, modelo Clio, matrícula LU; celebrou com a ré um contrato de seguro onde estava incluída a responsabilidade civil obrigatória e os danos da própria viatura, entre outras, a cobertura de choque, colisão e capotamento, titulado pela apólice n.º 200, com o capital de €10.800,00, valor do veículo atribuído pela ré; no dia 14/06/2015, às 22h30, o veículo referido sofreu um sinistro do qual resultou a sua perda total.

A Ré aceitou o acidente de dispôs-se a pagar o valor de €4600,00 que entende ser o valor venal do veículo à data do acidente.

Como referido a aceitou a participação do sinistro impugnado a restante matéria de facto já que entende que o contrato de seguro celebrado quanto à cobertura «choque, colisão e capotamento», garante os danos no veículo resultantes do embate com qualquer outro corpo em movimento, tem uma franquia de €295,00, a cargo da autora e por limite máximo de indemnização o «valor venal do veículo»; mais alega que o valor do veículo, em caso de perda total, será calculado de acordo com as regras constantes nas condições particulares, as quais estipulam que o valor do mesmo será o correspondente a 100% da cotação Eurotax para o veículo, no ano da sua matrícula; tendo o perito considerado que a reparação do veículo não era económica e mecanicamente viável, a cotação Eurotax para o veículo é de €4600,00; Mais, após o leilão online promovido pela UON Salvados, o salvado teve como melhor licitação o montante de €1210,00, pelo que o montante da indemnização a atribuir à autora consiste em €3390,00 Já que o valor de €10.800,00 consignado no contrato de seguro era meramente um valor indicativo, à data da celebração do contrato e não foi celebrado qualquer cobertura que abranja o dano da privação do uso ou da disponibilização de um veículo de substituição, o qual se encontra mesmo excluído das garantias e exclusões gerais do contrato (art. 2.2.al.f).

A A. entende ser-lhe devida a indemnização correspondente ao valor contratado €10.800,00, acrescida dos danos causados com a privação do uso do seu veículo (40€ diários) devidos desde o acidente até ao pagamento da indemnização devida.

Oportunamente realizada audiência de discussão e julgamento veio a ser proferida sentença decidindo: “Julgo a presente acção parcialmente procedente e: 1. Condeno a ré a pagar à autora uma indemnização no valor de €10.800,00, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

  1. Absolvo a ré dos demais pedidos contra si formulados.” 2. Inconformada, veio o R.. apelar de tal decisão, formulando as seguintes CONCLUSÕES: II.

    A Recorrente considera incorrectamente julgados os factos considerados provados nos pontos 14 e 15 da alínea a.2) da sentença (p. 4).

    Facto 14 III.

    Os elementos de prova que deveriam ter levado o Tribunal a dar resposta distinta ao ponto 14 da matéria de facto são as Condições Particulares do contrato de seguro juntas aos autos como Doc. n.º 2 com a Petição Inicial (fls. 13/17) e o depoimento da testemunha X, gravado no sistema de gravação do Tribunal, no dia 05.05.2016, com início de gravação às 15:55:08 e fim de gravação às 16:12:23.

    IV.

    O Tribunal a quo considerou ter ficado provado, no ponto 14, que a Recorrida e a Recorrente celebraram um contrato de seguro, titulado pela apólice n.º 200, com o capital de 10.800,00 €, o que sugere que as partes estipularam que, em caso de sinistro com perda total, seria aquele o valor a pagar pela Recorrente (foi, pelo menos, assim que o Tribunal veio a interpretar o contrato na fundamentação jurídica da sentença).

    V.

    Contrariamente ao que resulta da redacção dada pelo Tribunal ao ponto 14 da matéria de facto, a testemunha X, nos minutos 06:32 a 07:02 e 16:09 a 16:35 do seu depoimento, explicou devidamente que o valor indicado nas Condições Particulares da Apólice, apurado de acordo com a cotação Eurotax, é meramente informativo e não o valor a receber em caso de sinistro e, nas Condições Particulares da Apólice, na rúbrica Características do Veículo a Segurar, consta expressamente a seguinte indicação: “Valor Venal (Informativo): 10.800,00EUR em 07-2014 (Cotação Eurotax) ”.

    VI.

    Torna-se necessário precisar, no facto 14, que a quantia de 10.800,00 € é meramente informativa e que constitui o valor venal (adiante se verá que o valor venal de um veículo de marca e modelo idênticos ao LU mas com matrícula de 2011 e não de 2007) em Julho de 2014 e não o valor a pagar em caso de sinistro.

    VII.

    A redacção do ponto 14 dos factos provados deve ser alterada e passar a ter os seguintes termos: A autora celebrou com a ré um acordo escrito intitulado contrato de seguro, titulado pela apólice n.º 200, onde consta a indicação, a título informativo, de que o valor venal em Julho de 2014 é de € 10.800,00 e onde estava incluída a responsabilidade civil obrigatória, a cobertura de choque, colisão e capotamento, entre outros.

    Facto 15 VIII.

    Os elementos de prova que deveriam ter levado o Tribunal a dar resposta distinta ao ponto 15 da matéria de facto são as Condições Particulares do contrato de seguro juntas aos autos como Doc. n.º 2 com a Petição Inicial (fls. 13/17), as Condições Especiais e Gerais aplicáveis juntas como Doc. n.º 1 com a Contestação (fls. 64/88), o Documento Único Automóvel do veículo com matrícula LU, junto aos autos como Doc. n.º 1 com a Petição Inicial, e o depoimento da testemunha Elisabete Sílvia Macedo Basto, gravado no sistema de gravação do Tribunal, no dia 05.05.2016, com início de gravação às 15:55:08 e fim de gravação às 16:12:23.

    IX.

    No ponto 15 dos factos provados, pode ler-se que “[o] capital seguro de € 10.800,00, correspondente ao valor venal do veículo, foi atribuído pela ré”, redacção que não faz jus à prova produzida, da qual resultou que aquele valor não é exactamente o valor venal do LU mas sim o de um veículo de marca e modelo idênticos mas quatro anos mais recente do que aquele.

    X.

    A testemunha X afirmou claramente, entre os minutos 07:20 e 13:35 do seu depoimento, que no caso em apreço houve um lapso da sua parte no preenchimento da apólice de seguro, dado que calculou a cotação Eurotax do veículo como se este tivesse a sua primeira matrícula em Junho de 2011 (data da matrícula a que refere o DUA) mas, por ser um veículo importado, a data correcta da primeira matrícula é de maio de 2007; e que, em consequência, o valor venal do veículo LU, em 2014, não era de € 10.800,00.

    XI.

    Nas Condições Particulares da Apólice, na rúbrica Características do Veículo a Segurar, consta como data da 1.ª matrícula a data de 14.06.2011, ao passo que no DUA do veículo está indicada como data da primeira matrícula a de 25.05.2007 e como data a que se refere o DUA a de 14.06.2011, pelo que a versão apresentada pela testemunha na audiência de julgamento é totalmente consonante com o conteúdo destes documentos.

    XII.

    O próprio Tribunal apercebeu-se deste lapso e fez-lhe referência na fundamentação da decisão da matéria de facto mas não o tomou em consideração na redacção do facto 15, o que deveria ter sucedido, dado que esta matéria permite esclarecer que efectivamente o veículo não conheceu uma desvalorização de 10.800,00 € para 4.600,00 € no período de um ano (entre a data da contratação do seguro e a data do sinistro).

    XIII.

    A redacção do ponto 15 dos factos provados deve ser alterada e passar a ter os seguintes termos: Por lapso da funcionária que preencheu as condições particulares da apólice, o capital seguro de € 10.800,00, atribuído pela ré, corresponde ao valor venal de um veículo de marca e modelo idênticos ao LU mas com primeira matrícula em Junho de 2011.

    Matéria de direito XIV.

    O Tribunal a quo decidiu a presente causa com base nos artigos 41.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto (adiante RSORCA - Regime do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel) e 562.º do Código Civil e, por isso, desconsiderou o valor da cotação Eurotax para um veículo idêntico ao LU na data do sinistro, entendendo dever atender ao valor peticionado, assim incorrendo numa menos correcta interpretação jurídica da questão sub iudice e, em especial, errando na determinação das normas jurídicas aplicáveis.

    XV.

    O Tribunal apoiou-se, ainda, em diversos acórdãos que versam sobre situações em que está em causa a responsabilidade civil extracontratual por danos provocados a terceiros (danos provocados por veículo seguro num veículo terceiro), quando no caso dos autos está em causa a responsabilidade civil contratual da Recorrente (danos provocados no próprio veículo seguro).

    XVI.

    Por estar em causa nos autos uma cobertura do contrato de seguro que garante os danos sofridos pelo veículo seguro em caso de choque, colisão e capotamento e ter sido esse o sinistro em que a Recorrida funda a sua pretensão, não têm aplicação ao caso quer o artigo 41.º do RSORCA, quer o artigo 562.º do Código Civil.

    XVII.

    O artigo 41.º do RSORCA apenas se aplica no âmbito do seguro de responsabilidade civil automóvel, como resulta do artigo 31.º e do artigo 92.º daquele diploma.

    XVIII.

    O artigo 562.º do Código Civil não é aplicável à situação sub iudice, dado que, quanto à cobertura accionada pelo sinistro em apreço, não existe uma obrigação de indemnizar em sentido próprio mas sim uma a obrigação assumida...

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