Acórdão nº 2983/16.0T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução04 de Maio de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Comarca de Braga - Instância Central de Vila Nova de Famalicão - 2ª Secção de Comércio (J4) I - RELATÓRIO 1.1.

Decisão impugnada 1.1.1. AA, residente no Porto, (aqui Recorrida), propôs a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra BB, Limitada, com sede em Braga, (aqui Recorrente), pedindo que · fossem declaradas nulas e sem efeito as deliberações tomadas na Assembleia Geral da Ré, de 31 de Março de 2016; · fossem declarados nulos e sem efeito os registos de destituição dela própria do cargo de gerente da Ré, bem como de nomeação de CC como gerente da mesma, ou qualquer outro registo das ditas deliberações inválidas; · (subsidiariamente) fossem anuladas as referidas deliberações da Assembleia Geral da Ré, de 31 de Março de 2016.

Alegou para o efeito, em síntese, encontrar-se o capital social a Ré, de € 5.000,00, dividido em duas quotas, uma de € 2.000,00, sendo ela própria a sua titular, e outra de € 3.000,00, antes pertencente a BB e hoje aos seus Herdeiros (por o mesmo ter falecido em 14 de Março de 2015, no estado de casado consigo, no regime de separação de bens).

Mais alegou que, não obstante ser gerente estatutária da Ré e cabeça-de-casal da herança indivisa de BB, viu CC (filho daquele e seu herdeiro), na alegada qualidade de gerente da Sociedade, convocar uma assembleia geral para o dia 31 de Março de 2016; e, realizada esta, na sua ausência, veio outro dos herdeiros de BB, o seu filho DD, arrogar-se a qualidade de representante comum dos contitulares da quota indivisa que pertencera àquele, e assim votar as deliberações aí tomadas.

Defendeu, porém, a Autora que, sendo ela própria a única legal representante comum de tal quota, e não tendo tomado parte na nomeação de DD na mesma pretendida qualidade, seriam as deliberações por ele votadas - e desse modo aprovadas - nulas, por precisamente violarem o regime do representante comum de quota indivisa estabelecido no C.S.Com. (nomeadamente, nos seus arts. 222º e 223º, conjugados com os arts. 2079º e 2080º, ambos do C.C.).

1.1.2.

Regularmente citada, a Ré (BB, Limitada) não contestou, não constituiu mandatário, nem interveio por qualquer outro modo nos autos.

1.1.3.

Foi proferido despacho, julgando confessados os factos articulados na petição inicial (nos termos do art. 567º, nº 1 do C.P.C.); e ordenando que o processo fosse facultado para exame ao Advogado da Autora (nos termos do art. 567º, nº 2 do C.P.C.).

1.1.4.

A Autora veio alegar pro escrito, pedindo singelamente que fossem julgados procedentes os pedidos por si formulados.

1.1.5.

Foi proferida sentença, na qual se julgou a acção procedente, lendo-se nomeadamente na mesma: «(…) Pelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, decido julgar provada e procedente a presente acção e, em consequência, declaro inválidas, por anulabilidade, todas as deliberações tomadas na AG da sociedade R. de 31/03/2016.

(…)»*1.2. Recurso (fundamentos) Inconformada com esta decisão, a Ré (BB, Limitada) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que fosse revogada a sentença recorrida, e proferida decisão julgando a acção totalmente improcedente.

Concluiu as suas alegações da seguinte forma (sintetizada, sem repetições do processado, ou reproduções de textos legais ou jurisprudenciais):1ª - O cabeça-de-casal não é, ope legis, o representante comum dos contitulares de quota indivisa (antes pertença de sócio falecido).

xvii - O cabeça de casal não é o representante ope leqis, designadamente para efeitos de representar os contitulares da quota indivisa.

xxi - Em lado algum se estatui que o cabeça de casal é o representante legal para efeitos representação dos contitulares da quota indivisa.

  1. - Prever o artigo 6º do seu Pacto Social que os herdeiros de sócio falecido nomeiem um entre si, que a todos represente na Sociedade (enquanto se mantiver a indivisão da quota).

    viii - O Pacto Sacia I da R. estabelece que" Por falecimento de qualquer dos sócios a sociedade continuará com o sobrevivo e os herdeiros do sócio falecido, devendo estes nomear um entre si que a todos represente na sociedade enquanto a quota se mantiver indivisa" (art. 6º).

    ix - Nos termos do Pacto Social, impõe-se que a quota indivisa tenha um representante comum nomeado, não se bastando com qualquer tipo de representatividade, designadamente a que resulta do cabeçalato.

    xiv - Não é demais realçar que o pacto social, no seu artigo 6º, determina que os contitulares da quota, falecido um dos sócios, devem nomear representante comum, não que o mesmo resulte nomeado por qualquer outro modo. Pressupõem-se, impõe-se até, que haja um acto expresso de escolha e nomeação do representante comum.

  2. - Não exigir a eleição do representante comum unanimidade, mas apenas maioria (tendo a Autora, notificada para manifestar a sua vontade, optado por nada dizer).

    x - Não se exige a unanimidade para eleger o representante comum, apenas se exige a maioria, como foi o caso.

    xi - À A. foi enviada carta registada a pedir que manifestasse a sua posição, tendo esta optado por nada dizer.

  3. - Ainda que o cabeça-de-casal fosse o representante legal para efeitos de representação dos contitulares de quota indivisa, sempre poderia ser destituído pelos demais contitulares (estando a Autora impedida de votar nessa deliberação de destituição, face ao manifesto conflito de interesses que registaria).

    xxvi - Mesmo que o cabeça de casal fosse, legalmente, o representante dos contitulares da quota sempre poderia ser destituído pelos demais contitulares (art. 223º, nº 1, CSC).

    xxvii - Seja porque a vontade da maioria fosse nesse sentido sem necessidade de qualquer fundamentação acrescida a não ser a vontade de o cargo ser exercido por um dos outros contitulares, xxviii - Seja porque o cabeça de casal viola grosseiramente, como é o caso, as regras a que está vinculado no exercício do cargo.

    xxxiii - Tratando-se de uma situação de manifesto conflito de interesses - como é o caso de a sócia gerente - cuja destituição foi objecto de deliberação e constava da Ordem de Trabalhos anexa à Convocatória -, ser também a cabeça de casal que pretende assumir a posição de representante comum da quota indivisa não é aceitável jurídica ou moralmente xxxiv - Para os efeitos da Assembleia Geral de 31.03.2016, todos os herdeiros contitulares da quota indivisa, à excepção da A., decidiram nomear como representante comum o herdeiro e contitular DD, assim se formando a esmagadora maioria dos contitulares da quota indivisa.

    xxxv -Tal maioria sai reforçada porquanto nunca a Herdeira AA poderia - dado o manifesto conflito de interesses face à sua qualidade de sócia e gerente, tendo como ponto da Ordem de Trabalhos da Convocatória a destituição desta - ser considerada para o efeito de "nomeação" de representante comum que zelasse, no caso concreto, pela defesa dos interesses dos herdeiros/contitulares face a actos lesivos daquela gerente da sociedade.

    xxxvi - Além de que lhe foi formalmente perguntado qual a sua posição acerca dos temas a deliberar e esta nada disse.

    xxxvii - No caso dos autos, todos os contitulares intervieram, com excepção da que se encontra em conflito de interesses pelo que nunca a sua posição poderia obstar à nomeação de DD como representante comum.

    *1.3. Contra-alegações A Autora (AA) contra-alegou, pedindo que fosse negado provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.

    Alegou para o efeito, em síntese: 1 - Ter a Ré sustentado as suas alegações em factos que não foram dados como provados (v.g. a existência e o teor do testamento de BB, a existência e o teor do Pacto Social da Ré, e a suposta carta que teria sido enviada a ela própria, a solicitar a sua posição quanto à nomeação do representante comum), não podendo nessa parte ser aqui consideradas.

    2 - Ter a Ré invocado como questão nova o seu alegado «conflito de interesses», sem especificar as circunstâncias e os fundamentos concretos em que se poderia radicar, sendo de resto inexistente, face à sua destituição como gerente, ocorrida por deliberação da Assembleia Geral de 31 de Março de 2016.

    3 - Ter-lhe a Ré imputado a prática de actos lesivos de gerência, e de violar grosseiramente as regras a que está vinculada no exercício do cargo de cabeça-de-casal, o que não resulta dos factos dados como provados na sentença recorrida; e é falso.

    4 - Decorrer directamente da lei, e da interpretação dominante da doutrina e da jurisprudência, que o representante comum de quota indivisa designado directamente por lei é o cabeça-de-casal (sendo que, só no caso em que não o seja, se permite que seja nomeado pelos contitulares de quota indivisa).

    *II - QUESTÕES QUE IMPORTA DECIDIR 2.1. Objecto do recurso - EM GERAL O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (arts. 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 2, ambos do C.P.C.), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (art. 608º, nº 2, in fine, aplicável ex vi do art. 663º, nº 2, in fine, ambos do C.P.C.).

    *2.2. QUESTÕES CONCRETAS a apreciar Mercê do exposto, uma única questão foi submetida à apreciação deste Tribunal: . Questão Única - Perante uma quota social indivisa, parte de herança ainda não partilhada, e em que se encontra já determinado o respectivo cabeça-de-casal...

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