Acórdão nº 2/13.7TBMLG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelHIGINA ORVALHO CASTELO
Data da Resolução18 de Maio de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães*: I. Relatório AA, Lda.

, Ré no processo indicado à margem que lhe foi movido por BBe marido, CC, DD, solteiro, maior, e EEe marido, FF e GG, notificada da sentença proferida em 12 de setembro de 2016, que julgou a ação procedente, e com ela não se conformando, interpôs o presente recurso.

Os Autores intentaram a ação pedindo que se declare (i) que são legítimos comproprietários de certo prédio rústico; (ii) que uma dada faixa de terreno está onerada em proveito do prédio dos autores com o direito de servidão de passagem; (iii) que a Ré os esbulhou violentamente da sua posse sobre tal caminho de servidão de passagem; e, ainda, que a Ré seja condenada (iv) a reconhecer o alinhado em (i) a (iii); (v) a restituir aos autores a posse sobre o caminho de servidão; (vi) a, no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da sentença que venha a ser proferida, reconstruir os muros e paredes em pedra, delimitadores, até 7 de abril de 2012, da faixa de terreno a que se alude, mantendo-se a largura de tal faixa de terreno em, pelo menos, 1,40 metros; (vii) a pagar-lhes a quantia de € 1.340,70, a título de ressarcimento da quantia despendida com os trabalhos de execução da decisão que deferiu o procedimento cautelar; e (viii) no pagamento das custas.

Alegaram para tanto, em suma, entre o mais, e para o que ora ainda releva, que são comproprietários e compossuidores do prédio rústico denominado “HH”, também conhecido por “HH”, composto de pinhal e mato, a confrontar do norte e nascente com Duartina, do sul com Manuel e do poente com Adelino, sito em Melgaço, inscrito na matriz sob o artigo XXX e descrito na Conservatória do Registo Predial de Melgaço sob o n.º XXXXX, prédio que não confina por nenhum dos lados com via pública, pelo que o acesso a ele sempre se fez por uma caneja que a Ré destruiu em 2012.

Citada, a Ré contestou a ação, alegando, entre o mais e para o que ora releva, que os Autores não usam a caneja há mais de 20 anos nem têm dela necessidade, uma vez que em 1960, por escritura, foi constituída a favor do prédio dos Autores uma servidão de passagem de carro sobre os prédios rústicos denominados “HH” e “II”, pertencentes à Ré, caminho que, desde então tem sido utilizado pelos Autores e seus antecessores para acederem ao dito prédio, sendo que desde então não é usada a referida servidão de passagem a pé.

O caminho de servidão assim constituído (pela escritura de 1960) estabelece a ligação entre a via pública e o prédio dos Autores, possibilitando a comunicação entre ambos de carro, tração animal ou trator, a pé, em qualquer hora do dia e da noite, durante todo o ano, todos os anos, com ou sem gado. Trata-se de um caminho mais largo e menos inclinado que o caminho de servidão a pé cuja posse os Autores querem ver restituída, que garante, como tem garantido, uma acessibilidade normal e regular ao terreno dos Autores, fazendo-o em melhores condições e comodidade.

Termina a Ré reconvindo no sentido de se declarar a extinção da servidão sobre a caneja, por não uso ou por desnecessidade.

Houve réplica, audiência prévia, articulado superveniente e procedeu-se a julgamento sendo, a final, proferida a sentença ora sindicada. Nela, apesar de se julgar provado que o prédio dos Autores beneficia de acesso à via pública por uma servidão de passagem (incluindo veículos automóveis e outros carros) constituída por escritura pública em 1960, julgou-se improcedente o pedido reconvencional de extinção, por desnecessidade, da servidão de passagem a pé pela caneja por se considerar que não estava provado que a dita caneja se situe em terreno da ré.

O dispositivo dasentençarecorridatem o seguinte teor: «1. Julgo a presente ação procedente e, em consequência: a) Declaro que os autores BB, CC, DD e EE adquiriram, por doação, o direito de propriedade sobre o prédio rústico, sito no concelho de Melgaço, denominado “HH”, também conhecido por “HH”, de pinhal e mato, a confrontar do norte e nascente com Duartina, do sul com Manuel, e do poente com Adelino, descrito na Conservatória do Registo Predial de Melgaço, sob o n.º XXXXXX, da freguesia de Vila, Melgaço, e inscrito na respetiva matriz, na atual matriz rústica em vigor, sob o artigo XXX; b) Declaro que a faixa de terreno identificada em 7 dos factos provados (com, pelo menos, 1,20 metros de largura, que até ao mês de abril do ano de 2012 se apresentou sempre em terra batida, assentando o seu leito sobre uma faixa/parcela de terreno inteiramente delimitada e demarcada dos prédios rústicos com que confina, tanto a sul como a norte, através de muros em pedra, de suporte de terras, e paredes, também em pedra, que existiam há, pelo menos, 86 anos), está onerada com servidão de passagem (a pé, com ou sem carga, com gado solto, ao longo de todo o ano, todos os anos, a qualquer hora do dia ou noite) constituída por usucapião, em benefício do prédio dos autores identificado na alínea precedente; c) Declaro que a ré AA, Lda. esbulhou violentamente os autores BB, CC, DD e EE da sua posse sobre o caminho de servidão a que se alude na alínea precedente; d) Condeno a ré AA, Lda. a reconhecer o declarado nas alíneas a) a c) deste dispositivo e a restituir os autores BB, CC, DD e EE à posse sobre o caminho de servidão que ali se alude, repondo o caminho no estado em que se encontrava antes de abril de 2012, seja reconstruindo os muros e paredes que delimitavam a faixa de terreno identificada em 7 dos factos provados e assegurando uma largura mínima de 1,20 metros, no prazo de 30 dias.

  1. Condeno a ré AA, Lda. a pagar aos autores a quantia de € 1.340,70, a título de indemnização.

  2. Absolvo os autores dos pedidos de extinção da servidão de passagem por não uso e por desnecessidade.» O fundamento da improcedência do pedido reconvencional encontra-se no antepenúltimo e no penúltimo parágrafos antes do dispositivo: «Ora, a ré não logrou fazer prova, pelas razões explicitadas supra, de que é proprietária da faixa de terreno onerada com a servidão de passagem constituída por usucapião, razão pela qual falece, desde logo, a sua legitimidade para requerer a extinção, quer pela falta de uso (que nem sequer ficou demonstrada), quer pela desnecessidade.

Está em causa a ilegitimidade substantiva da ré (…) que determina a absolvição dos autores/reconvindos dos pedidos de extinção da servidão de passagem constituída, sem necessidade de ulteriores considerações.» As «razões explicitadas supra» encontram-se na motivação do facto não provado f) –«f) que a faixa de terreno onde assenta o leito do caminho identificado em 7 dos factos provados seja parte integrante do prédio identificado em 9 dos factos provados» – a saber: «Da documentação junta aos autos resulta que, em termos registais e matriciais, o que outrora eram três prédios distintos, figuram agora como pertencendo a um único prédio, tendo a inscrição ocorrido em 1997, não constando ali qualquer alusão a ónus ou encargos e, designadamente a qualquer servidão.

Mas a verdade é que isto tanto vale para a servidão reclamada pelos autores como para aquela que a ré admite ter sido constituída por JJ a favor do prédio identificado em 1.

Por outro lado, a verdade é que tanto a ré como todas as testemunhas por si arroladas que a tal fizeram alusão, referem que a caneja ficava entre o NN e o II, separando-os. Ora, isto é bem diferente de dizer que a caneja/caminho ocupa qualquer daqueles campos, ou ambos, e sai reforçado pela própria configuração (que o Tribunal pode ver nos extratos de cartografia e ortofotomapas antes da intervenção da ré): porque quereria um proprietário de dois prédios contíguos, manter a caneja que nenhuma utilidade para si tinha e que só implicava os prejuízos a que a ré e as testemunhas por si arroladas aludiram? O Tribunal tem que admitir como possível que estivesse em causa uma servidão constituída em qualquer daqueles campos (e tal seria inócuo já que presentemente ambos são pertença da ré), mas também terá que admitir a possibilidade de pertencer a terceiro - os depoimentos prestados e a configuração ali existente, tornam tal hipótese plausível – sendo até plausíveis outras hipóteses.

Da documentação junta e demais prova produzida não sai esclarecida esta dúvida e não se vislumbra qualquer diligência que o pudesse dilucidar, pelo que se impõe concluir que não cumpriu a ré o ónus probatório que lhe competia, restando julgar não provada tal matéria.» Nas suas alegações de recurso, a Recorrente apresenta as seguintes conclusões: «(…) II) Os pontos 4, 5, 6, 7, 8, 12, 13, 14, 25, 26, 27 e 30, da fundamentação de facto não se encontram de harmonia com as provas que foram produzidas nos autos; III) O descrito na alínea f), dos “Factos Não Provados”, deveria integrar a fundamentação de facto, por ter ficado provado; IV) Provou-se parte dos factos descritos nas alíneas h) e i), dos “Factos Não Provados”, constatação que decorre da reapreciação das provas a respeito dos pontos 12 e 14, da fundamentação de facto; V) A factualidade descrita no ponto 31 da fundamentação de facto deve ser eliminada, uma vez que não foi alegada pelas partes; VI) Deve, ainda, ao abrigo do disposto nas alíneas a), b) e c), 2.ª parte, do n.º 2, do artigo 5.º, do Cód. de Proc. Civil, ser incluída na fundamentação de facto o que de útil para a discussão da causa foi verificado pelo Tribunal na inspeção judicial ao local da questão e que, aliás, foi acordado pelas partes; VII) As alterações aos pontos 4 e 5 são meras precisões, decorrentes da impugnação da matéria de facto vertida no ponto 25; VIII) Atendendo ao depoimento da testemunha KK (…), da testemunha LL(…), à inspeção judicial ao local da questão, realizada em 15/3/2016, e à foto de fls. 362, que retrata o final do caminho/caneja, a Apelante entende que a decisão que deve ser proferida sobre o impugnado ponto 6, da fundamentação de facto é a seguinte: “Do nascente da Rua RR, antes de chegar ao portão com o n.º de polícia XXX (para quem percorra a Rua RR no...

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