Acórdão nº 697/16.0T8VVD.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelFERNANDO FERNANDES FREITAS
Data da Resolução07 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

  1. RELATÓRIO I.- C. A. intentou contra C. F. o presente procedimento cautelar comum, pedindo que se ordene a esta que retire todos os “artefactos” e animais que colocou no caminho público, e se abstenha de praticar actos que impeçam ou dificultem o acesso dele, Requerente, a pé, de carro ou com animais, ao prédio que lhe pertence.

Alega, para tanto, e em síntese, que é dono e legítimo proprietário do imóvel sito no Lugar P., Vila Verde, inscrito com o actual artigo matricial n. o .. e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Verde sob o n° …, constituído por casa de dois pavimentos e um logradouro, que adquiriu por via de inventário encontrando-se registado a seu favor, imóvel esse que confronta, a nascente, com um prédio urbano semelhante pertencente à Requerida.

O acesso a ambos os prédios é assegurado por um caminho público, com o qual os prédios confrontam a Norte, Sul e Poente, sendo que a porta de acesso à habitação desemboca no referido caminho público, que ladeia aquele seu prédio, e assegura o único acesso a ele, sendo a largura do caminho variável, entre os 2 e os 3 metros.

O Requerente e os antepossuidores do prédio sempre usaram aquele caminho para aceder à habitação e logradouro a pé, em tempos idos de carro de bois, e mais recentemente com veículos motorizados, o que vêm fazendo desde tempos imemoriais, de forma continuada e permanente, à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém, com convicção de exercerem um direito próprio, no entendimento de que se trata de um caminho público.

Entretanto, desde meados do ano de 2013 que a Requerida colocou nesse caminho uma casota constituída por uma pequena vedação de arame e madeira, despejou nele alguns detritos e artefactos de variada natureza, nomeadamente pedras, lixo e até cães, que acorrenta no curso do aludido trilho, inviabilizando a livre passagem de qualquer veículo, e dificultando inclusive a circulação pedonal. Estes elementos que bloqueiam o caminho são obstáculos passíveis de criar situações de perigo, nomeadamente episódios de queda, sobretudo durante a noite.

Acresce que o Requerente é um septuagenário que para além das dificuldades de locomoção naturais da sua avançada idade tem ainda uma deficiência visual de cerca de 70%, pelo que os obstáculos constantemente colocados pela Requerida no referido trilho representam verdadeiras armadilhas que, não raras vezes, provocam a queda do Requerente para gaudio da Requerida.

A insuficiência de acesso acima descrita, decorrente da actuação livre e consciente da Requerida, é causa de inúmeros constrangimentos diariamente vivenciados pelo requerente, sendo que o acesso de automóvel assume especial preponderância, já que só assim estará assegurada uma comunicação suficiente para as necessidades normais do prédio do Requerente, como sejam as de descargas de mercearias ou outro tipo de carga.

Ora, não só é perigoso para o Requerente aceder à sua propriedade, como também o é para qualquer outra pessoa que pretenda passar por aquele caminho, como sejam, por exemplo, quaisquer visitantes, nomeadamente familiares ou amigos, que a todo o momento são surpreendidos, quer por obstáculos, quer pelas ameaças dos cães.

Para além disso, alega ainda o Requerente, pretende realizar obras na sua habitação para a instalação de um quarto de banho, uma vez que a sua casa já é antiga e carece de urgente remodelação, tencionando passar a residir ali de forma permanente, sendo que as obras requerem o transporte de vários materiais de construção para o interior da habitação. Assim, devido ao facto de o caminho estar parcialmente bloqueado, não consegue realizar as obras que pretende por lhe ser impossível transportar os materiais para o interior da sua habitação.

A Requerida deduziu oposição, impugnando os fundamentos da providência requerida e alegando, em síntese, que o acesso às portas das habitações em apreço não desemboca em caminho público, mas em logradouro, logradouro esse que por sua vez desemboca em caminho de servidão, e que se lhes pode aceder por, pelo menos, duas vias, sendo que pela Travessa J. o acesso é pedonal, por umas escadas de betão (construídas aliás, por ela, Requerida), e a outra pela Avenida PR, lado nascente, é feita por um caminho de servidão.

Esta servidão existe desde tempos imemoriais, há mais de 30 e 40 anos, sendo que os antepassados do Requerente e dela, Requerida, fizeram uso do referido caminho, para acederem a pé, nunca com carros de bois ou veículos motorizados, às habitações em apreço. É verdade que em tempos idos passavam sim, de longe a longe, carros de bois, mas apenas para aceder aos campos situados na outra extrema do prédio de que a Requerida é comproprietária, e nunca para aceder às habitações.

A cerca de 4/5 metros das habitações, o referido caminho de servidão tinha, em tempos antigos, uma cancela, cujos sinais ainda existem no muro de um outro prédio, a qual se encontrava sempre fechada e era apenas utilizada pela Requerida e antepassados do Requerente para aceder aos campos (com carros de bois) e habitações (a pé).

O prédio do Requerente confronta directamente com a via pública, designadamente com a denominada Travessa J., pelo que, querendo ele realizar obras no seu prédio, como alega, o modo de acesso adequado e mais fácil para o fazer é pela via pública e não pelo logradouro, onde nunca passaram carros de bois e menos ainda veículos motorizados, que de resto, nem cabem, atendendo às características e largura do referido logradouro; Alega ainda que desde há mais de 30 e 40 anos que ela, Requerida, faz uso duma pequena parcela do solo, junto ao seu logradouro e encostada a um muro, para arrumação de lenha, que lhe serve de aquecimento no Inverno, o que sempre fez à vista e com conhecimento de toda a gente, sem a oposição de ninguém, e com a convicção de exercer um direito próprio, lenha essa que não dificulta, de maneira nenhuma, o acesso aos prédios, caso contrário, estaria ela, Requerida, "em maus lençóis", porque é uma idosa, com 80 anos, que vive sozinha, e sozinha se sustenta, com todas as dificuldades que o peso da idade lhe trouxe. O acesso pedonal às habitações em apreço está livre e desimpedido, quer pelas escadas em betão, quer pelo logradouro, e está como sempre esteve.

Procedeu-se à audiência final, tendo sido julgado improcedente o procedimento cautelar e indeferida a providência requerida.

Inconformado, traz o Requerente o presente recurso pretendendo que, revogada a decisão referida, se julgue procedente o procedimento cautelar e se decrete a providência cautelar requerida, “no sentido da Requerida/Recorrida retirar os obstáculos, designadamente, casota do cão e artefactos contidos no caminho de acesso à casa do Requerente/recorrente”.

Contra-alegou a Requerida propugnando para que se mantenha a decisão.

O recurso foi recebido como de apelação, com efeito suspensivo.

Foram...

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