Acórdão nº 6919/16.0T8PRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelALCIDES RODRIGUES
Data da Resolução07 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório Na presente ação, a Autora (ora Recorrente), Empresa A – Fios Têxteis, S.A., apresentou Requerimento de Injunção Europeia (Reg. CE 1896/2006) contra a Ré (ora Recorrida), Empresa X, SPA , pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 83.062,62 de capital.

Para fundamentar a sua pretensão a Recorrente alegou, em síntese, que no âmbito da sua atividade profissional forneceu à Requerida diversos produtos do seu fabrico, designadamente os contantes nas faturas juntas aos autos com o Requerimento Injuntivo, as quais foram devidamente enviadas à Recorrida e que esta não pagou, mantendo-se devedora da quantia de € 83.062,62.

*A Ré contestou, invocando, desde logo, a exceção de incompetência internacional dos tribunais portugueses, alegando ser uma pessoa coletiva de direito italiano e que foi estipulado que a entrega dos bens ocorreria nas suas instalações em Perugia, Itália (cfr. fls. 39 a 49).

Defende ser aplicável aos autos o Regulamento n.º 1215/2012 do Parlamento e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012 relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial.

*Em resposta às exceções (cfr. fls. 205 a 236), a Autora pronunciou-se, aduzindo, em resumo, que o artigo 7º, n.º 1, alínea a) do Regulamento nº 1215/2012 precede e impõe-se à alínea b) que deverá ser usada apenas quando a matéria controvertida respeite à entrega de bens e não, como é o caso, o incumprimento do pagamento através de transferência bancária para conta domiciliada em Portugal.

Acrescenta que a Ré sabia que em caso de conflito judicial o Tribunal competente seria a Instância Central Secção Cível de Guimarães, já que aceitou as suas condições contratuais definidas nas notas de confirmação de encomenda que lhe enviou, pelo que considera celebrado um pacto de jurisdição.

*Findos os articulados, por despacho datado de 24 de março de 2017 foi decidido (cfr. fls. 319 a 322): - julgar procedente a exceção de incompetência absoluta invocada; - absolver a Ré Empresa X, SPA da instância; - julgar prejudicada a apreciação do pedido reconvencional deduzido a título subsidiário.

*Inconformada com esta decisão, dela interpôs recurso a autora, pedindo que seja dado provimento à apelação com a consequência de ser revogada a sentença recorrida, ou, se assim se não entender, determinando-se a suspensão da presente instância e pedindo-se, de seguida, ao TJUE que decida, a título prejudicial, sobre a interpretação do mencionado Regulamento, mais se declarando a revogação da sentença recorrida e a respetiva substituição por outra que determine a improcedência da exceção de incompetência absoluta invocada (cfr. fls. 328 a 340).

A terminar as respetivas alegações formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem Todas as transcrições efetuadas respeitam o respetivo original, salvo gralhas evidentes e a ortografia utilizada.

): «1ª - Foi celebrado um pacto de jurisdição que atribuiu competência a Tribunal de Guimarães para conhecer de qualquer litigio existente entre a aqui Recorrente Empresa A – Fios Têxteis, S.A. e a Recorrida Empresa X, SPA e este é válido porque proposto pela recorrente e aceite pela recorrida, nunca tendo existido qualquer comunicação que comprovasse a existência de qualquer desacordo com as condições fixadas no contrato celebrado, mormente no que dissesse respeito às cláusulas contidas no mesmo, entre elas a cláusula atributiva de foro.

  1. – Todas as faturas em dívida foram precedidas de uma nota de confirmação de encomenda prévia, enviada pela recorrente à recorrida e não reclamada nem refutada por esta, definido como foro para qualquer litígio o Tribunal Judicial de Guimarães.

  2. - Da cláusula 15ª das confirmações de encomenda resultava que “Esta confirmação de encomenda é um contrato de compra e venda com as condições aqui expressas. Se os vendedores não receberem uma cópia devidamente carimbada e assinada, no prazo máximo de 8 dias após a respetiva data, considerar-se-á aceite pelo comprador em todos os termos do contrato.”, pelo que deverá considerar-se que houve expressa ou pelo menos tácita aceitação do pacto de jurisdição por inexistência de oposição da recorrida a tal cláusula.

  3. – A exigência de forma escrita para a aceitação das cláusulas propostas à Ré implicaria que nenhum pacto quanto ao foro alguma vez seria celebrado, porquanto na tradicional compra e venda comercial de mercadorias, à qual subjazem regras de informalidade e celeridade no tráfego, nunca há uma troca formal de contratos escritos assinados pelos legais representantes de ambas as partes.

  4. - O entendimento sufragado pelo tribunal a quo configura violação ao Direito da União Europeia, em particular, do art. 25º n.º 1 alíneas b) e c) e n.º 2 do Regulamento n.º 1215/2012 relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, razão pela qual se requer que o presente Tribunal remeta a seguinte questão prejudicial para o Tribunal de Justiça da União Europeia: Se é válida a interpretação do art. 25º n.º 1 alíneas b) e c) e n.º 2 do Regulamento n.º 1215/2012 relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, no sentido de rejeitar que seja válido e eficaz um pacto de jurisdição determinado mediante aposição por uma parte nas condições de venda inscritas numa confirmação de ordem de encomenda, condições essas enviadas à contraparte e não refutadas nem rejeitadas pela mesma, expressa ou tacitamente, tendo o negócio sido perfecionado e emitidas as correspondentes faturas, também elas não rejeitadas nem refutadas pela contraparte? 6º - A obrigação em causa – obrigação de pagamento – deveria ter sido cumprida em Portugal porque este é o local onde a recorrente tem a sua sede e onde a sua conta também se encontra domiciliada e para onde o pagamento das quantias em dívida, a final, deveria ter sido feito, ainda que por interposta sociedade (a sociedade financeira) e, assim sendo, os tribunais competentes sempre seriam os Portugueses, mormente o Tribunal de Guimarães, local onde a recorrente possui a sua sede.

  5. - É mal fundada a sentença de 1ª instância que julga incompetente os Tribunais Portugueses – nomeadamente o Tribunal de Guimarães – para conhecer do presente litígio, por violação dos artigos 71º, 94º, nº 1 do Código de Processo Civil, 230º e 774º do Código Civil, arts. 7º n.º 1 e 25º n.º 1 alíneas b) e c) e n.º 2 do Regulamento n.º 1215/2012, pelo que se constata a violação de disposição expressa na lei, verificando-se a violação ou errada aplicação de lei do processo, atendendo ao incumprimento das regras e trâmites processuais definidos».

*Contra-alegou a Ré, pugnando pela manutenção da decisão recorrida e improcedência do recurso (cfr. fls. 342 a 349).

*O recurso foi admitido por despacho de 28 de junho de 2017 como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo (cfr. fls. 354).

*Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

*II. Questões a decidir.

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, a questão que se coloca à apreciação deste tribunal é a de saber se os Tribunais portugueses são competentes para apreciar o litígio em apreço.

*III. Fundamentação de facto Os factos materiais relevantes para a decisão da causa são os que decorrem do relatório supra, a que acrescem os seguintes factos: 1. A autora é uma sociedade comercial que tem sede em Portugal.

  1. A ré é uma sociedade comercial de direito italiano e aí sedeada que se dedica à produção de tecidos.

  2. No exercício da sua atividade a autora forneceu à ré diversos produtos do seu fabrico, designadamente os constantes das faturas cujas cópias constam de fls.

    15 a 22.

  3. Tais faturas especificam como “endereço de entrega” …, em Itália.

  4. A entrega dos bens ocorreu em Itália.

  5. Nas notas de confirmação de encomenda emitidas pela autora e cujas cópias constam de fls. 238 vº/239, 245 vº/246 e 300vº a 307, esta indicou, em língua inglesa, as condições gerais de venda, mormente que qualquer litígio emergente do contrato será submetido, caso não se alcance uma solução amigável, ao Tribunal Judicial de Guimarães (cl.ª 13).

    *IV. Fundamentação de direito Discute-se nos autos a competência internacional dos tribunais portugueses para preparar e julgar a presente ação.

    Sendo a ação instaurada por uma sociedade comercial cuja sede social é em Portugal contra uma sociedade comercial cuja sede social é em Itália e tendo a ação como causa de pedir uma relação contratual celebrada entre essas sociedades no âmbito da qual a autora forneceu/entregou à ré, em Itália, diversos produtos do seu fabrico, designadamente os constantes das faturas cujas cópias constam de fls. 15 a 22, não oferece margem para dúvidas estarmos perante um litígio emergente de uma relação plurilocalizada, transfronteiriça ou transnacional. Essa circunstância coloca o problema da competência internacional para o julgamento da ação que aqui importa decidir.

    No que concerne à competência internacional dos tribunais portugueses, o art.º 59.º do CPC estabelece: “Sem prejuízo do que se encontre estabelecido em regulamentos europeus e em outros instrumentos internacionais...

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