Acórdão nº 2109/16.0T9BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelALDA CASIMIRO
Data da Resolução18 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães, Relatório No âmbito da Instrução com o nº 2109/16.0T9BRG, que corre termos no Juízo de Instrução Criminal de Braga (J1) do Tribunal da Comarca de Braga, vem o assistente A. P.

recorrer do despacho que rejeitou o seu requerimento de abertura de instrução, pedindo que seja admitido tal requerimento, nos termos e para os efeitos previstos no art. 287º do Cód. Proc. Penal.

Para tanto, formula as conclusões que se transcrevem: A. Notificado da recusa de Requerimento de Abertura de Instrução (RAI), por despacho recebido em 04-07-2017, e não se podendo conformar com o conteúdo do mesmo, vem a ora Recorrente interpor competente recurso de jurisdicional.

B. A interposição do presente recurso legitima-se ainda, porquanto a discussão que se envida levar ao Juiz de Instrução importa debater em sede adequada (em tribunal), para que se possa abrir um caminho para a procura de uma solução de salvaguarda do direito que cada um tem à sua imagem, reputação e bom nome, o que parece não existir em redes sociais e meios semelhantes.

C. Não se conformando com os fundamentos do Digm.º Magistrado do MP para justificar despacho de arquivamento, o Recorrente apresentou RAI fundamentando a manutenção da pertinência da investigação e adequação do meio, todos como melhor constam nos autos, a saber: (i) a insuficiência dos actos praticados no inquérito, (ii) manutenção das condutas criminosas, (iii) a imprescindibilidade de realização de diligências tendentes à descoberta da verdade material, (iv) proteção dos bens jurídicos em causa, (v) indícios de prova dos factos narrados.

D. Com a participação criminal materializada nos autos e através da qual se instaurou o inquérito, após o qual foi proferido despacho de arquivamento e, na sequência do qual, após apresentação de RAI pelo Assistente, o Exmo. Senhor Juiz de Instrução o recusou, pretendeu o cidadão e Presidente da Câmara A. P. recorrer aos órgãos de polícia criminal competentes no sentido de (i) fazer cessar de imediato contra si actos deliberados praticados por terceiros, (ii) públicos e notórios, com repercussões globais, porquanto praticados através de meios informáticos e redes sociais, e (iii) danosos para a sua imagem, reputação e bom nome, bem como vexatórios a todos os níveis.

E. Os actos foram e continuam a ser perpetrados (i) nos blogs intitulados “ESP" e "ESP ii", acessíveis publicamente nos endereços que indicou e, (ii) da construção, manutenção em funcionamento e divulgação de conteúdos da página de facebook intitulada "ESP", acessível através dos endereços eletrónicos que também indicou.

F. Evidências e indícios não faltam dos conteúdos colhidos e que instruíram a participação criminal, que o Assistente foi e ainda é alvo de uma campanha destinada a denegrir publicamente a sua imagem.

G. O Assistente-Ofendido, ora Recorrente defende e fundamenta em detalhe a sua não conformação com a quantidade e qualidade das diligências levadas a cabo em sede de inquérito, as quais reputa de insuficientes e impróprias para a realização das finalidades do inquérito.

H. No despacho de arquivamento pelo MP é referido que não foi possível identificar os autores dos conteúdos vexatórios à pessoa do Assistente, no entanto, tal impossibilidade advém de (i) uma inação do MP na própria investigação, (ii) de uma limitação das competências do MP, que poderão ser supridas pela intervenção do JIC, nomeadamente através da emissão de ordens judiciais a certas entidades.

I. Em relação ao ponto (i) – a inacção do MP – sugeriu o Assistente as seguintes formas de actuar: a. No tocante ao crime de violação de segredo, i. não foi praticada a diligência sugerida pelo Assistente, ou seja, fosse solicitado à Polícia Judiciária que, através da sua divisão efectuasse perícia aos sistemas informáticos (redes, servidores e postos) do Município de Esposende no sentido de proceder ao apuramento de eventual fuga de informação (ara efeitos de apuramento de violação de segredo de funcionário), ou outros diligências que se mostrem igualmente pertinentes para os efeitos referidos, por motivos que não se vislumbram; ii. não ordenou o MP a audição, em sede de declarações, das pessoas funcionalmente mais relacionadas com os documentos especificadamente identificados na participação, e/ou responsabilidades na sua produção e transmissão, com vista ao apuramento de factos que possam permitir a descoberta dos factos e da verdade material; b. No tocante aos restantes factos suscetíveis de preenchimento dos restantes tipos criminais melhor descritos nos autos, negou o MP. ao Recorrido: i. a prática de todas as diligências solicitadas e adequadas para proceder ao apuramento da identidade do administrador da página de facebook e do blog ESP, e a sua inquirição e responsabilização por eventual cumplicidade ou prática dos factos ilícitos e criminosos; ii. a análise dos comentários das páginas de internet e blog (leia-se o antigo, à data do conhecimento dos factos pelo Recorrente e o renovado, fundado já em 2017 e em clara contravenção e confronto com as instâncias investigatórias e penais) e a competente rede de “amigos” destes instrumentos de comunicação em massa, designadamente apurar aqueles mais ativos e/ou com comentários mais “informados”, procedendo dessa forma à respetiva inquirição para assim lograr chegar a uma maior e mais efetiva possibilidade de apurar os autores dos factos ilícitos, criminosos e altamente lesivos para o ora Recorrente.

  1. Fossem tomadas todas as medidas necessárias para interromper de imediato a actuação lesiva da acção dos Participados, e proteger os bens jurídicos sistematicamente violados, pelo menos à semelhança do que exemplificativamente vem sido feito pelas autoridades administrativas (IGAC) e pelas respetivas operadoras relativamente aos seguintes sites de alegada pirataria informática.

    J. Não só foi negado o acesso à fase de instrução, como nenhuma das diligências requeridas realizar foi acolhida pelo MP., a qualquer nível.

    Qualquer uma destas diligências poderia e teria seguramente alcançado resultados práticos.

    K. Apesar de o inquérito ser da exclusiva titularidade do MP, conforme a letra do acórdão do STJ, processo n.º 06P1403, em que foi relator o Ilmo. Juiz Conselheiro Pereira Madeira, “II – encerrado o inquérito e aberta a instrução, abre-se uma fase autónoma do processado cuja direcção radica doravante no juiz de instrução, que, com total autonomia ordena as diligências que tenha por necessárias ao fim dessa fase eventual: proferir decisão instrutória.

    ” L. Ora, o que se pretendeu com o RAI, foi discutir, de forma legítima, adequada e fundamentada, a inação do MP. durante a fase de inquérito, realizando exatamente as finalidades dessa fase. Conforme nos demonstra Paulo Pinto de Albuquerque, in "Comentário do Código de Processo Penal", 2ª ed., “(...) a instrução visa discutir a decisão de arquivamento apenas no que respeita ao juízo do M.P. de inexistência de indícios suficientes”.

    M. É claro que existem indícios mais do que suficientes da prática de vários crimes. O MP não discorda com essa questão, no entanto, escusa-se da responsabilidade de continuar a investigar a questão de forma mais profunda, com o objectivo de poder identificar o(s) perpetrador(es) dos referidos e identificados crimes.

    N. O Recorrente elaborou uma queixa-crime extremamente completa e minuciosa, tendo requerido ao MP., dentro da posição processual que ocupa e deve ser respeitada, diversas diligências, segundo as quais as chances de realização da tutela jurídico-penal efetiva resultariam grandemente aumentadas. Mas ao invés de divisar a realização de diligências intrincadas e/ou extremamente dispendiosas do ponto de vista da investigação ou cooperação judiciária, na realidade nem a diligência requerida de abrir a página do facebook “ESP” ou “ESP II” e procurar eventuais associações entre utilizadores que pudessem aparecer nas caixas de comentários das publicações e alguma posição – profissional ou pessoal – que pudesse demonstrar algum especial conhecimento dos factos mereceu qualquer acolhimento.

    O. Os ilícitos continuaram a ser praticados impunemente, designadamente renovando os meios em 2017 (já o inquérito estava francamente lançado), pelo que a investigação deveria ter sido mais minuciosa, vigorosa e sobretudo mais abrangente, o que se pretende seja repristinado através da atuação dos Venerandos Desembargadores e do presente recurso.

    P. A título de exemplo de situações análogas merecedoras de tutela idêntica, cumpre recordar o caso do blog “PON”, que tal como o “ESP” se dedicava a publicar “artigos de opinião” em que os autores criticavam aqueles que à altura eram Presidente e Vice-Presidente da Câmara Municipal da ….

    Q. Este caso mereceu acompanhamento e tutela efetiva por parte dos OPC e do MP., e através das instâncias investigatórias que o MP. bem conhece foi encerrado na sequência de queixa judicial contra o mesmo, tendo as Varas Cíveis de Lisboa determinado que a “Google” impedisse de imediato o acesso ao blogue.

    R. O tribunal considerou que (i) o PON não se bastava com “artigos de opinião” em que se criticavam os queixosos como autarcas, mas também como “cidadãos, pais, familiares e amigos.” (ii) considerou que os referidos artigos não eram feitos como uma “crítica construtiva, baseada em factos provados, concretos e objectivos, mas com o objectivo de difundir, junto do público, de forma gratuita, a ideia de que os requerentes são corruptos e corruptíveis.” S. Para além do principal resultado pretendido alcançar com o pedido de intervenção judicial – encerrar de imediato o blog, terminando com a lesão dos bens jurídico-penais lesados – ter sido atingido, ainda se conseguiu identificar dois sujeitos, constituídos arguidos, por suspeita de serem os autores dos referidos textos, resultado apenas possível através de uma ordem judicial emitida pelo tribunal e dirigida à Google.

    T. Também o presidente da Câmara...

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