Acórdão nº 5843/15.8T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelFERNANDO FERNANDES FREITAS
Data da Resolução18 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

  1. RELATÓRIO I.- JOSÉ e MARIA, residentes na …, freguesia de …, município de Braga, intentaram a presente acção declarativa, sob a forma comum contra “X – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.”, com sede em Lisboa, pedindo a condenação desta a: a) pagar ao Banco A, na qualidade de tomadora do seguro e beneficiária, do capital em dívida dos empréstimos contraídos por eles, Autores, junto desta, a que foram atribuídos os números 017102646...; 017102646...; e 017102646..., os quais, à data da propositura da acção, ascendiam à importância de € 91.103,77, por forma a extingui-los; b) pagar-lhes, a eles Autores, a totalidade dos valores por estes liquidados ao Banco A, a partir da data da declaração de invalidez do Autor – 31 de Março de 2011 – que totalizam € 43.711,71; c) a pagar-lhes, a eles Autores, os valores das prestações que se forem vencendo na pendência da acção e que paguem ao credor Banco A; d) mais pediram que sobre as quantias que lhes sejam devidas acresçam juros de mora contados desde a citação até integral pagamento.

    Fundamentam a sua pretensão no contrato de seguro do ramo vida que celebraram com a Ré, que garante a situação de invalidez que o Autor padece desde 2011.

    Contestou a Ré alegando que o Autor não lhe remeteu os elementos clínicos de que necessitava para tomar posição sobre a situação participada, e arguiu a anulabilidade do contrato de seguro por o Autor ter omitido, de forma consciente, informações determinantes para a avaliação do risco, pois que à data da celebração do contrato padecia já da doença que lhe veio a determinar a incapacidade alegada. Acrescenta que caso, à data do preenchimento da proposta de seguro, tivesse tomado conhecimento da real situação clínica do Autor, teria recusado celebrar o contrato ou tê-lo-ia aceite com outro conteúdo.

    Conclui, assim, que tendo o Autor prestado falsas declarações aquando da elaboração da proposta de seguro, se deve considerar o contrato anulado.

    E com estes fundamentos pede seja julgada a acção improcedente com a sua absolvição do pedido.

    Os autos prosseguiram os seus termos vindo a proceder-se ao julgamento que culminou com a prolação de douta sentença que, julgando a acção totalmente procedente por provada, condenou a Ré a pagar:

  2. Ao Banco A, na qualidade de tomadora do seguro e beneficiária, do capital em dívida dos empréstimos números de 017102646..., 017102646... e 017102646... que, na data da propositura da ação ascendem a € 91.103,77 (noventa e um mil cento e três euros e setenta e sete cêntimos), por forma a extinguir os empréstimos concedidos; B) Aos autores a totalidade dos valores por estes liquidados ao Banco A, a partir da data da declaração de invalidez - 31 de Março de 2011- que na data da propositura da ação totalizam € 43.711,71 (quarenta e três mil setecentos e onze euros e setenta e um cêntimos) bem como o valor das prestações que se forem vencendo na pendência da ação e que sejam pagas pelos Autores ao credor Banco A, acrescida dos juros de mora contados desde a citação até integral pagamento.

    Inconformada, traz a Ré o presente recurso pretendendo que seja revogada a sobredita decisão, e ela, Ré, absolvida.

    Contra-alegaram os Autores propugnando para que se mantenha o decidido.

    O recurso foi recebido como de apelação com efeito devolutivo.

    Colhidos que foram os vistos legais, cumpre decidir.

    **II.- A Apelante/Ré funda o recurso nas seguintes conclusões (omissis quanto às que são transcrições de meios de prova e simples repetições de argumentos já enunciados)(1): 3. Entende a R. que a matéria de facto dada como não provada merece resposta positiva por diversas razões uma delas (ponto 1 e 2) porque tais factos foram objeto de confissão por parte do A., já que constam dos relatórios médicos juntos ao autos pelo próprio (Doc. 5, informação médica sem numeração, Doc. 4-1, Doc. 4 -2 Doc. 4 -3 Doc. 4, Doc 5 e Doc. 6 todos parte integrante do boletim de informação médica junto aos autos pelo A.) pelo que nem este nem o tribunal podem negar o respetivo conteúdo nem teor.

    5. Ou seja, analisados todos os documentos constantes do boletim de informação médica, conclui-se que, pelo menos, desde 1995, o A. padece de problemas de saúde graves e que fruto de uma personalidade ansiosa, somatogênica, acabou por ser internado por sintomas psicossomáticos nomeadamente por uma colite ulcerosa infeciosa.

    6. Mais se conclui que essa personalidade ansiosa/depressiva foi agravada em 1999, fruto do acidente que o filho sofreu.

    7. À matéria constante dos relatórios respondeu o Dr. M. M., psiquiatra que assistiu o A. desde 2007, que apesar das nítidas dificuldades de comunicação fruto de um AVC de que foi vítima, lembrava-se do paciente, de o ter acompanhado e de que o mesmo sofria de depressão desde 95, confirmou, ainda ter escrito e assinado o relatório constante do verso do supra referido boletim de informação médica, 8. Também o Dr. JF médico de família do A. desde 1987, até se reformar em Maio de 2013, confirmou que o A. teve uma colite ulcerosa infeciosa, e que na sequência do acidente do filho este ficou triste e deprimido e que um quadro depressivo pode dar origem a muitos sintomas diversos, inclusive ficamos com as defesas diminuídas o que pode originar um processo inflamatório.

    9. O mesmo médico lembra-se que na sequência do acidente do filho o A. ficou doente, mais triste e que foi acompanhado por um psiquiatra já em 1999.

    10. O A. foi ainda assistido por um médico gastroenterologista que o acompanhou desde 1992 até 1997 que afirmou que assistiu o A. em episódios relacionados com as seguintes doenças: 1992 Esofagite de refluxo, 1995 episódio de colite infeciosa com internamento de 8 dias, 1997 fissura anal, não tendo sido capaz de afirmar de forma clara que o A. ficou curado. Tendo afirmado que a esofagite pode recorrer.

    11. A propósito da cura das patologias de que padeceu, nomeadamente da colite ulcerosa infeciosa cumpre remeter para o relatório de alta do internamento, assinadas pelo gastroentologista JB, onde se verifica que o A. teve alta por “melhorado “ com indicação para medicação e acompanhamento médico, ou seja efetivamente após o internamento o A. não ficou curado, sendo certo que após estas consultas o A. desaparecia, pressupondo o médico que se ficaria bem … 14. Ou seja, aquando a celebração das apólices o A. omitiu que desde 1992 sofria de diversas patologias do foro gastrointestinal, algumas das quais só foram conhecidas pela R. na sequência da prova produzida nos presentes autos, das quais segundo os relatórios médios que o A. juntou aos autos nunca mais se curou.

    15. Acresce dizer que, quer a esofagite de refluxo, quer a colite ulcerosa são doenças crónicas que relacionadas com o sistema nervoso e como doenças crónicas que não se curam, apenas se controlam, com medicação conforme resulta dos depoimentos das testemunhas JB e da Dra. Joaquina acima transcritos.

    17. Demonstrado ficou ainda pelos depoimentos prestados pela Dra. Joaquina e pelo Dr. M. que se a R. tivesse tido conhecimento de todas estas patologias, (…) a cobertura de invalidez por doença não seria aceite.

    20. Quanto à questão do conhecimento por parte do A. das patologias de que sofria também os depoimentos da Dra. Joaquina e do gastroenterologista Dr. JB, foram demonstrativos de que o doente na altura, teve conhecimento de que teve estas doenças 25. Ora, o que está em causa na presente apelação é saber se o A., ao responder ao questionário da proposta de seguro, produziu declarações inexatas ou reticentes.

    26. As declarações inexatas consistem em declarar factos que não correspondem à realidade e a reticência em calar o que se sabe e se tem o dever de declarar para a exata avaliação do risco.

    27. O A. preencheu o questionário clínico cuja cópia está junta aos autos, sendo que este questionário é um instrumento, a prestar pela pessoa segura, imprescindível para a R., tendo em vista a avaliação do risco seguro importante até por questões de resseguro 28. No referido questionário clínico, bem como no questionário formulado pela médica aquando da entrevista clínica, o A. declarou, respondendo negativamente a todas as questões que lhe foram feitas sobre antecedentes pessoais.

    30. Sendo certo que se a R. tivesse tido conhecimentos das patologias trazidas à luz do dia no decurso do presente processo judicial, teria agido de outra forma, teria solicitado relatórios dos médicos e face às patologias detetadas, não aceitaria a cobertura de invalidez permanente, 40. Recai sobre o segurado o ónus de não encobrir qualquer fator que possa contribuir para a apreciação do risco por parte da seguradora e se o fizer, tendo conhecimento de tais factos que de alguma maneira possam influir sobre a formação do contrato e as condições do mesmo, perde o direito à contraprestação da seguradora, não sendo necessário que tenha agido com dolo (cfr. CJ, CCII, V, 99 e José Vasques “O contrato de seguro”, pag. 211.235, Ac. RP, 06/11/2007 (JTRP 00040736), Ac. RP de 12/02/2008 (JTRP 000 41 107), Ac. TP de 06/11/2006 (JTRP 00039 687), Ac. RP de 20/12/2005 (JTRP 000 38 644), Ac. RP de 15/06/2004 (JTRP 000 37 009), ac. RL de 13/03/2007, Ac. RL de 08/02/2007, Ac. RL de 17/02/2005, Ac. do STJ de Julho de 2006, CJ XIV, II, 151, Ac. do STJ de 27/05/2008, CJ XVI, II, 81.

    42. A caracterização do seguro como contrato de boa fé não pretende apenas reforçar a ideia de que nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé (artº. 227º, n.º 1 CC), mas sublinhar a necessidade absoluta de lealdade do segurado para manter a equidade da relação contratual, uma vez que a seguradora é normalmente obrigada a confiar nas suas declarações, sem poder verificá-las aquando da subscrição. Na formação do contrato, a declaração do risco, no sentido da declaração do proponente que permitirá à seguradora avaliar o risco e calcular o prémio, integra a formação do contrato de seguro.

    43. Basta que a proponente do seguro omita...

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