Acórdão nº 1163/13.0TBPTL-G.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelRAQUEL BAPTISTA TAVARES
Data da Resolução28 de Setembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I.

Relatório V. A., divorciada, residente no Caminho de …, Ponte de Lima, veio intentar contra P. C., residente no Lugar …, Ponte de Lima, por apenso à acção de divórcio que correu termos com o nº 1163/13.0TBPTL, os presentes autos que denominou de “Incidente de fixação de compensação nos termos do artigo 1793º do Código Civil”, pedindo a condenação do Requerido no pagamento de uma compensação à Requerente do valor mensal de pelo menos €350,00 pelo uso e fruição plenos da casa de morada de família, bem comum do ex-casal até à partilha.

Alega em síntese que por sentença proferida nos autos principais, de que estes são apenso, foi decretado o divórcio entre Requerente e Requerido e que nos termos da sentença a casa de morada de família do ex-casal foi atribuída ao Requerido, até à partilha dos bens comuns do casal.

Alega ainda que aufere o salário mínimo nacional e tem a seu cargo dos filhos menores, que se viu obrigada a arrendar uma casa para si e para os seus filhos, pagando uma renda de €250,00 mensais e que o Requerido usufrui da casa sem que tenha sido fixada qualquer compensação à Requerente em virtude dessa utilização.

O Requerido pugnou pelo indeferimento da pretensão da Requerente defendendo que o disposto no artigo 1793º do Código Civil invocado pela Requerente não tem aplicação à situação concreta pois não parece ser pretensão daquela tomar de arrendamento a casa em questão.

Foi proferida decisão que decidindo pela improcedência da acção absolveu o Requerido do pedido.

Inconformada com a decisão a requerente interpôs o presente recurso, em cuja alegação formulou as seguintes conclusões: “(…) 3) Salvo melhor opinião, a decisão recorrida carece de fundamento legal.

4) Com efeito, com a publicação da Lei n.º 61/2008, de 31/1, a qual, entre outras alterações, veio aditar ao artigo 1793° do Cód. Civil o n.º 3, a diversidade de opiniões quanto à possibilidade de alteração do acordo sobre o destino da casa de morada de família deixou fazer sentido e, por isso, de existir.

5) Nesse sentido, refere o seguinte o ac. STJ nº 4162/09.3TBSTB.E1.S1, de 7/06/2011 : “Várias decisões judiciais se pronunciaram no sentido da inalterabilidade do acordo homologado por sentença judicial (…). Esta questão foi resolvida na recente alteração do Código Civil introduzida pela Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro que aditou ao artigo 1793° do Código Civil com a epígrafe "Casa de Morada de Família" o n° 3 com a seguinte redacção: "o regime fixado, quer por homologação do acordo dos cônjuges, quer por decisão do tribunal, pode ser alterado nos termos gerais da jurisdição voluntária”.

6) Ou seja, pelo menos, desde a publicação da referida lei que o acordo sobre o destino da casa de morada de família pode ser alterado e, consequentemente, pode e deve ser tramitada como incidente a alteração que venha a ser requerida.

7) No mesmo sentido, refere o Ac. TRP nº 201302252891/11.0T8VNG.P1: “A atribuição da casa de morada de família é um processo (ou incidente) de jurisdição voluntária, pelo que as suas resoluções podem ser alteradas com base em circunstâncias supervenientes que justifiquem a alteração, o que ocorre sempre que o acordo realizado ou a decisão judicial não acautelarem, devidamente, os interesses de um dos ex-cônjuges”.

8) Transcrevendo ainda este acórdão um excerto do manual do Prof. Salter Cid defendendo a possibilidade de alteração do antes acordado pelos cônjuges ou decidido judicialmente desde que tenha ocorrido alteração substancial e anormal das circunstâncias tidas em consideração para o acordo inicial que se pretende alterar.

9) Ora, no caso vertente, foi exactamente isso que sucedeu, conforme resulta inequivocamente do requerimento do ora recorrente, no qual, em síntese, alega e demonstra a alteração substancial e anormal das circunstâncias que foram tidas em consideração no acordo sobre a atribuição da casa de morada de família que foi homologado por sentença.

10) Com esta alteração superveniente das circunstâncias deixaram de estar acautelados os interesses do ex-cônjuge mulher, ora recorrente, e dos filhos.

11) Fica, pois, evidente que a decisão carece de fundamento legal quanto à questão da tramitação da requerida alteração como incidente e quanto à possibilidade de alteração do acordo sobre a atribuição da casa de morada de família.

12) Por conseguinte, pode e deve a requerida alteração ser classificada e tramitada como incidente e é o acordo inicial, não obstante o divórcio ter transitado em julgado, passível de ser alterado desde que ocorra uma alteração substancial, superveniente, das circunstâncias que estiveram na base do mesmo.

13) Seguiremos neste particular o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, datado de 5 de Fevereiro de 2007, disponível em ww.dgsi.pt, e cujo sumário se transcreve: “Tendo sido celebrado na pendência de divórcio acordo nos termos do qual o cônjuge marido ficaria a residir na casa de morada de família – bem comum do casal – até à partilha dos bens – sem a contrapartida de qualquer pagamento, pode a mulher requerer que o tribunal fixe em seu benefício uma quantia mensal por aquela ocupação se, entretanto, se alteraram em seu desfavor, as circunstâncias que estiveram na base da gratuitidade daquela consentida ocupação.” 14) As partes deste processo haviam acordado, para que fosse decretado o divórcio por mútuo consentimento, que a casa de morada de família, bem comum de ambos os cônjuges, fosse atribuída ao cônjuge marido e até à realização da partilha.

15) Este acordo fora homologado por sentença que decretou o divórcio.

16) A questão essencial a decidir é averiguar se este acordo, mesmo homologado por sentença, não mais poderá ser alterado, em incidente de jurisdição voluntária, quanto ao destino dado à casa de morada de família.

17) Quotidianamente os ex casais portugueses e os tribunais são confrontados com este tipo de situação. Assim, vemos que desde alterações do uso da casa de morada de família a quem inicialmente fora atribuída, ora por abandono intencional e querido ou por se retirar para outro local, ora por aquisição de outra morada, de modificação e alteração da guarda e cuidados dos filhos, da mãe para o pai e deste para aquela e que justificaram e pesaram mesmo a entrega da casa de morada de família, ora por alteração imprevisível dos rendimentos até então auferidos ou mesmo ainda por dificuldades económicas não previstas anteriormente, vários casos reais têm sido e são...

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