Acórdão nº 12/14.7T8PRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução28 de Setembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães IA. R. e sua mulher M. J. instauraram a presente acção declarativa, que corre termos no Juízo de Competência Genérica do Peso da Régua, contra A. M., A. I., M. C. e A. A. e sua mulher R. S., formulando os pedidos de: "Deve a presente acção ser julgada procedente, por provada e, em consequência do reconhecimento do direito de propriedade dos AA sobre a fracção X correspondente ao 2.º andar esquerdo destinado à habitação, com a área coberta de 65 m2 e um terraço com a área de 330 m2, do prédio urbano inscrito na matriz predial respectiva sob o art.º 1111.º e descrito na Conservatória do Registo Predial do Peso da Régua sob o n.º 2222,

  1. Seja ordenado a alteração da fracção X no sentido de a mesma passar a constar que é composta por Habitação de tipologia tipo T2 com área bruta de 65.00 m2 e um terraço com a área de 62.00 m2, situada na Avenida …, Constituída por hall de entrada, cozinha, sala comum, um quarto de banho e dois quartos. Corresponde a esta fracção 13.30% do valor total do prédio.

  2. E ordenando-se a rectificação do registo da inscrição predial do mesmo e se proceda à alteração da mesma por usucapião, inscrevendo-se mais duas novas fracções autónomas designadas pelas letras "Y e K", a favor dos AA nos termos constantes do documento n.º 6; C) Condenar os RR a reconhecer o direito de propriedade dos AA sobre as referidas fracções e por consequência, procedendo-se à alteração da escritura de constituição de propriedade horizontal do prédio urbano em causa; D) E as duas restantes fracções passem a ter a composição e permilagem referida no art. 53.º desta PI." Alegaram, em síntese, que, na sequência da compra realizada em 1983, são donos e da fracção X, correspondente ao 2.º andar esquerdo, destinado a habitação, com a área coberta de 65 m2 e um terraço com a área de 330 m2, do prédio urbano inscrito na matriz predial respectiva sob o art.º 1111.º e descrito na Conservatória do Registo Predial do Peso da Régua sob o n.º 2222, sita na Av. …, Peso da Régua.

Por sua vez, as rés A. M., A. I. e M. C. são proprietárias da fracção T, correspondente ao 2.º andar direito, e os réus A. A. e R. S. são proprietários da fracção H, correspondente ao rés-do-chão.

Nos dois terraços da sua fracção, em 1988 e 1989, procederam à construção de duas habitações, tendo adquirido o direito de propriedade sobre essas habitações por usucapião. Pretendem, por isso, alterar a propriedade horizontal no sentido de a adequar à realidade física existente.

Tendo contactado a "1ª R no sentido de assinarem o requerimento da requerida alteração da propriedade horizontal", esta "recusou-se a assinar", o que se traduz numa "situação de abuso do direito".

Os réus A. A. e R. S. contestaram, sustentando a improcedência da acção e deduziram reconvenção em que pedem a condenação dos autores "no pagamento do preço do assento das casas que construíram na cobertura do prédio e em indemnização pelos prejuízos causados pela sua construção na estrutura do prédio e na parte da fracção dos RR que fica por baixo, sendo estas indemnizações a liquidar nos termos do artº 358º e ss. do CPC." Procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença em que se decidiu: "Em face do exposto:

  1. Julgar a acção inteiramente improcedente, absolvendo os réus dos pedidos formulados.

  2. Julgar a reconvenção inteiramente improcedente, absolvendo os autores reconvindos dos pedidos formulados.

  3. Condenar os autores e os quartos réus no pagamento das custas processuais na proporção de metade para os autores e metade para os quartos réus, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do Código de Processo Civil." Inconformados com esta decisão, os autores dela interpuseram recurso, que foi recebido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo, findando a respectiva motivação, com as seguintes conclusões: 1. São três as questões submetidas à d. apreciação deste Tribunal.

    1. Desde logo requer-se a reapreciação da matéria de facto com vista a dar como provado a al. a) da matéria dada como não provada e que resulta da transcrição dos art.º 3.º a 8.º da PI.

    2. Entende a Recorrente que da conjugação dos documentos constantes dos autos (Descrição predial, actualização de caderneta predial; alvará de construção e escritura de compra e venda) e dos depoimentos das testemunhas A. C.; M. R. e A. P., tais factos haverias de se julgar como provados.

    3. Com efeito se se atentar à própria descrição predial da qual consta a titularidade da fracção em causa por parte dos AA., à compra e venda da qual consta como comprador da fracção em causa os AA.; do Alvará de licenciamento para obras emitido a favor do A. e bem assim ao depoimento das diversas testemunhas inquiridas verificamos que todas elas aludem ao A. como proprietário da fracção e como dono da obra relativamente à construção das duas fracções sobre os terraços em causa nos autos.

    4. A. C. confirma ser arrendatário do A. desde 1990, que foi este que executou o projecto das duas fracções, sendo a este quem paga a renda, 6. Igualmente confirmou que a obra executada levou cerca de um a dois anos, que foi obra de envergadura e que por isso não foi feita à revelia muito menos às escondidas.

    5. Foi feita à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém.

    6. Também M. R., irmão do A. confirma ser arrendatário daquele, desde 1989, igualmente reconhece que se tratou de obra de grande envergadura levantada à vista de todos e sem oposição de ninguém, acabando por dizer que o próprio material era descarregado na rua, o que impedia de a obra não ser do conhecimento de todos.

    7. O mesmo admitiu o construtor das duas fracções - A. P. - que confirmou que foi a mando do A. e segundo projecto que por este lhe foi entregue e devidamente aprovado pela Câmara Municipal quem executou a obra, o que foi avista e com o conhecimento de toda a gente - igualmente aludindo ao facto de os materiais serem descarregados na rua.

    8. Isto posto, procedendo-se à alteração da matéria de facto nos termos aludidos sempre se teria de dar como provada a titularidade dos AA. sobre a fracção X e consequentemente julgar procedente o pedido de reconhecimento de propriedade sobre esta, até porque em causa está a presunção contida no art.º 7.º do Código de Registo predial, não tendo sido trazido aos autos que contrarie a presunção em causa, pelo contrário, como se referiu por este na fracção em causa, da qual faziam parte integrante dois terraços foram construídas duas casas de habitação o que constituem evidentes actos de posse, como tal devendo ser reconhecidos.

    9. Finalmente e no que concerne ao direito dos AA. a obterem a modificação do título constitutivo da propriedade horizontal, com a consequente alteração registral entendem os Recorrentes que atentando à matéria de facto dada como provada sob os pontos 3 a 7, sempre se teria de decidir neste concreto ponto em sentido positivo.

    10. Discordam pois os Recorrentes da posição defendida na d. sentença no que concerne à interpretação da alteração legislativa do Dec. Lei n.º 267/97 de 25 de Outubro.

    11. Isto porque, apesar de o Tribunal a quo atentar à especificidade constante do título e registo de propriedade, da qual consta que os terraços em questão fazem por parte integrante da fracção X, e não que são do uso exclusivo da fracção X., acaba por concluir que "lei de 1994 não é verdadeiramente inovadora, mas sim interpretativa".

    12. Os Recorrentes assim não entendem a lei de 1994 é inovadora - neste sentido veja-se a anotação ao art.º 1421.º n.º 1 al. b) de Aragão Seia em Propriedade Horizontal, pág. 92.

    13. Na senda do que vem dito, os terraços de cobertura intermédios não são comuns.

    14. Pelo que tendo as obras sido realizadas pelos AA. em terraço com a área de 330 m2 e outro de 62 m2 referidos em 3 e 5, os quais fazem parte da fracção X tal como se encontra referido na escritura de propriedade horizontal, tendo para o efeito obtido licença camarária de construção emitida em 4 de Outubro de 1988, mostram-se verificados os requisitos para a aquisição do seu direito de propriedade pela via da usucapião (factos provados dos arts. 6.º a 9.º) deveria o Tribunal ter julgado a acção procedente.

    15. Mas mesmo que assim se não entenda, pode o Tribunal se substituir aos condóminos, modificando o título através de decisão judicial, e condenando estes a fazer a modificação.

    16. Ora, atentando à matéria de facto como provada, da qual resulta além do mais que as obras foram executadas pelos AA. há mais de 20 anos com o conhecimento e sem oposição de ninguém.

    17. E ainda que para a execução e tais obras obtiveram competente licença camarária, a recusa em alterar o título constituiu assim uma situação de abuso de direito - art.º 334.º do Código Civil - em que o exercício por parte de qualquer dos condóminos do direito que estes têm em negar o acordo a essa alteração contraria a finalidade desse direito. (Acórdão do TRL de 28-05-2009).

    18. Nada impede por isso que, não existindo o necessário acordo de todos os condóminos, tal consentimento seja, quando existirem razões ponderosas de justiça que fundamentem a alteração que se pretende obter, seja suprido através dessa acção judicial.

    19. E no caso dos autos, atendendo ao que do título da propriedade horizontal consta que os terraços fazem parte integrante da fracção X, de que foi obtido o devido licenciamento da obra junto da Câmara Municipal, que os demais condóminos tomaram conhecimento imediato das obras em curso, bem como que as fracções em causa há muito que foram arrendadas, e não se mostrando provado qualquer prejuízo decorrente da construção das duas fracções, pode e deve o Tribunal suprir a falta de consentimento e substituir-se aos demais condóminos.

    20. Isto posto deve ser reconhecido aos Recorrentes que são donos e legítimos proprietários da fracção "X", com a área, configuração, afectação referidos no n.º 6.º e 7.º da matéria de facto provada; 23. Devendo ainda ser reconhecida a alteração da...

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