Acórdão nº 275/16.3GBVNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelJORGE BISPO
Data da Resolução25 de Setembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I.

RELATÓRIO 1.

No processo comum, com intervenção de juiz singular, com o NUIPC 275/16.3GBVNF, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga - Juízo Local Criminal de Vila Nova de Famalicão - J1, foi proferida sentença, datada e depositada a 25-05-2017, com o seguinte dispositivo (transcrição[1]): «V. - Decisão Pelo exposto, e ao abrigo dos citados normativos, julgo a acusação totalmente procedente e, em consequência, decido:

  1. Condenar o arguido B. O. como reincidente pela prática, como autor material e na forma consumada, de um crime violência doméstica, p. e p. pelos arts. 75º, 76º, n.º 1, e 152º, n.ºs 1, al. b), e 2, do Código Penal na pessoa da ofendida C. C., na pena de 3 (três) anos e 8 (oito) meses de prisão.

  2. Condenar o arguido B. O. na pena acessória de proibição de qualquer contacto, incluindo via telefónica ou via internet, com a ofendida C. C., com afastamento da residência desta, sita na Rua (…), Famalicão.

  3. Determino que o arguido continue sujeito à medida de coação imposta - prisão preventiva, nos termos dos arts. 213º, nº1, al. b), 202, nº1, al. b), 204, al. b) e c), e 1º, al. j), todos do CPP e 152º, nº1, al. b), e 2, do CP.

  4. Condenar o arguido nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC (três unidades de conta), nos termos do artigo 8.º, n.º 9 do Regulamento das Custas Processuais e tabela III anexa ao mesmo.

  5. Declarar cessada, após trânsito, qualquer medida de coação imposta ao arguido, à exceção do termo de identidade e residência que só se extinguirá com a extinção da pena (artigo 214.º, n.º 1, al. e), do Código de Processo Penal).

  6. Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pela demandante C. C., contra o demandado B. O. e, consequentemente, condenar este a pagar a quantia de 5000,00€ (cinco mil euros), acrescidos de juros de mora legais, contados desde o trânsito em julgado até integral pagamento, a título de danos não patrimoniais, absolvendo-o do resto peticionado.

  7. Custas pelo demandado, na proporção do decaimento, sem prejuízo do art. 4º, nº 1, al. n), do R.C.P. ou do apoio judiciário concedido. Atendendo que à ofendida foi atribuído o estatuto de vítimas de crime de violência doméstica, a mesma está isenta de custas, nos termos do art. 4º, nº1, al. z), do R.C.P.» 2.

    Mostrando-se inconformado com a medida da pena de prisão aplicada, o arguido interpôs o presente recurso, formulando conclusões que, pela sua excessiva extensão, se afastam claramente do que é legalmente previsto e desejável (um resumo das razões do pedido), mas que, ainda assim, se opta por transcrever integralmente: «CONCLUSÕES: A.

    O Arguido foi condenado em 03 (três) anos e 08 (oito) meses de prisão, pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelos artigos 152º, n.º 1, b) e n.º 2 do Código Penal; B.

    O limite máximo e mínimo do crime pelo qual o Arguido vem acusado é de 02 anos e 08 meses e 05 anos de prisão, uma vez que foi o Arguido considerado reincidente nos termos do artigo 75º do Código Penal.

    C.

    Entende o Arguido que atentos os factos da Douta Sentença, a condenação não poderia ter dado lugar ao período de condenação tão grave como deu.

    D.

    Ao fixar a medida da pena, é necessário considerar a culpa do agente, bem como critérios de prevenção geral e de prevenção especial.

    E.

    Assim, a graduação far-se-á atendendo aos critérios fornecidos pelos artigos 40º e 71º do C.P.

    F.

    De acordo com o artigo 40º do Código Penal, a aplicação de penas visa proteger os bens jurídicos, mas igualmente a reintegração do agente na sociedade, referindo também que, em caso algum, a pena pode ultrapassar a medida da culpa.

    G.

    Na determinação concreta da pena, o Tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando, nomeadamente, as indicadas no n.º 2 do artigo 71º do C.P.

    H.

    Analisando o procedimento do Tribunal A Quo não parecem ter sido seguidas, com o devido rigor, as disposições que os dois artigos acima referidos contêm.

    I.

    Aplicar ao Arguido uma pena superior a mais de metade da moldura penal aplicável ao crime afigura-se manifestamente excessivo.

    J.

    Acresce também que todas as doutrinas sobre prevenção têm como fim último a reinserção social do agente (ressocialização).

    K.

    E, se não se pode ignorar que, em certa medida, o tempo de reclusão pode contribuir para a reinserção social do Arguido, L.

    também não se podem ignorar, nem desprezar, os efeitos criminógenos da pena não privativa da liberdade, bem como as dificuldades de promover a reinserção social do condenado recluso, particularmente sentidos quando o tempo de reclusão é longo.

    M.

    A própria cadeia é em si mesma uma verdadeira “escola do crime”, podendo, em casos de maior debilidade social e económica, agravar significativamente as possibilidades de reinserção do Arguido.

    N.

    No caso, o Tribunal a quo parece ter não ter valorizado na justa medida todos estes aspetos.

    O.

    Verdade que o Arguido tem já outras condenações anteriores.

    P.

    Verdade também, que o Arguido sofre de problemas de foro psiquiátrico para os quais agora se mantém medicado.

    Q.

    Conforme consta da matéria de facto provada (ponto 22), o Arguido situa sensivelmente no ano de 2009 o seu internamento de cerca de 15 dias no Hospital Magalhães Lemos onde esteve submetido a tratamento psiquiátrico com medicação antidepressiva e ansiolítica.

    R.

    A construção da individualidade empreendida pelo Arguido decorreu no agregado de origem, composto pela díade parental e pela prole de quatro da qual é o terceiro, em ambiente familiar que foi sendo sucessivamente conturbado pela toxicodependência de cada um dos descendentes, faseado por momentos de adequação aos diversos contextos de desenvolvimento da personalidade com outros de desagregação social. (ponto 20) S.

    Habilitado com o 2º ciclo do ensino, precocemente integrou o mundo laboral pelos treze anos de idade tendo, num igual período de tempo, exercido funções profissionais nas áreas da carpintaria, da estamparia e da panificação, trajeto entretanto assolado pelo advento do transtorno de uso de substâncias estupefacientes, pela instabilidade pessoal e pela frustração das diversas tentativas de resolução daquela problemática. (ponto 22) T.

    O Arguido não consegue perceber a exiguidade das estratégias empreendidas na resolução dos problemas, satisfazendo-se unicamente com o acompanhamento médico no Centro de Saúde e a toma da medicação psiquiátrica prescrita para controlo das alterações de humor, nem entender a necessidade de submissão a acompanhamento psicoterapêutico facilitador da compreensão dos motivos da conduta antissocial, da impulsividade assim como das ambivalências das decisões tomadas. (ponto 26) U.

    No período de liberdade decorrido entre os dias 21-07-2016 e 07-12-2016, ou seja após libertado do cumprimento de pena de prisão, realizou alguns biscates tendo trabalhado como embalador de carnes cerca de quinze dias na empresa C. … . (ponto 28) V.

    Desprovido de qualquer acompanhamento psicoterapêutico complementar o Arguido assume que mantinha a medicação ansiolítica e antidepressiva prescrita concomitante com momentos de abuso do consumo de bebidas alcoólicas, tendo ocorrido diversos momentos em que perdeu o controlo da impulsividade.

    W.

    O Arguido detém enquadramento familiar e habitacional no agregado paterno, composto pelo seu irmão, padecente de doença de foro psiquiátrico, domiciliado em …, Guimarães, onde residem há cerca de quatro anos, correspondente a uma habitação de tipologia 2, arrendada por €100 mensais a qual, ainda que pequena apresenta condições de conforto. (ponto 30) X.

    Este agregado apresenta condição financeira precária decorrente da exiguidade das pensões mensais auferidas de €262 cada, correspondentes à invalidez do irmão e à reforma do progenitor o qual, por vezes efetua alguns biscates na agricultura.

    Este ascendente parental impõe que o suporte familiar a prestar ao Arguido tem que ser acompanhado da sua inserção laboral.

    (Ponto 31) Y.

    O Arguido dispõe do apoio incondicional da família para que concretize o processo de ressocialização com sucesso.

    Z.

    O período de reclusão aplicado ao Arguido é excessivo, pois implica demasiado tempo de inatividade para si, com consequências demasiado gravosas para toda a sua família.

    AA.

    Aliás, a viabilidade económica do seu agregado familiar pode ficar prejudicada, já que nos dias de hoje os custos são avultados e a crise financeira do País em nada ajuda, com tal período de inatividade.

    BB.

    Logo, também este especto, se devidamente considerado, justificaria uma redução substancial da pena aplicada.

    CC.

    O Arguido projeta-se em meio livre possivelmente em processo emigratório para o Principado do Liechtenstein, onde se encontra desde 2013 o seu irmão mais velho, operário hoteleiro e conseguir junto deste idêntica ocupação profissional. (Ponto 32) DD.

    No meio prisional, (Ponto 35) a conduta assumida pelo Arguido tem sido adequada ao disciplinado exigido mantendo acompanhamento da especialidade de psiquiatria aguardando pela definição da situação jurídica, alentado pela possibilidade de beneficiar de nova medida não privativa da liberdade concretizável em Comunidade Terapêutica.

    EE.

    Assim, não poderá deixar de se tomar em atenção a forma como a opção do Recorrente pelo comportamento ilícito, ou desvalioso, terá sido condicionada por um prévio problema de foro psiquiátrico que não estava a ser devidamente tratado.

    FF.

    E que após tratamento no estabelecimento prisional, o Recorrente voltou a ter uma postura adaptada e um comportamento adequado.

    GG.

    Já sabemos que a prática deste crime está, no caso em apreço, associada à doença do Arguido.

    HH.

    Ora, considerar que tão longa estadia num Estabelecimento Prisional o vai impedir de cometer outros crimes no futuro, quando o que realmente poderá impedir é um tratamento médico à sua doença, não garante qualquer...

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