Acórdão nº 24/15.3T9AVV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Setembro de 2017
Magistrado Responsável | F |
Data da Resolução | 25 de Setembro de 2017 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, na Secção Penal, do Tribunal da Relação de Guimarães: 1 - RELATÓRIO Neste processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, nº 24/15.3T9AVV.G1, do Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo – Juízo Local Criminal de Ponte de Lima, foi submetida a julgamento a arguida Hortênsia, melhor identificada nos autos, acusada da prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso real, de quatro crimes de dano p. e p. pelo artigo 212º, nº. 1, do Código Penal.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença, em 09/02/2017, depositada nessa mesma data, com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, e ao abrigo dos citados normativos, julgo a acusação procedente e, em consequência, decido: Quanto à instância criminal:
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Condenar a arguida Hortênsia pela prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso real, de 4 (quatro) crimes de dano, p. e p. pelo artigo 212.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa por cada um dos 4 (quatro) crimes; B) Em cúmulo jurídico, nos termos do artigo 77.º, n.
os 1 e 2 do Código Penal, condeno a arguida Hortênsia na pena única de 300 (trezentos) de multa, à taxa diária de 7 € (sete euros), o que perfaz o montante global de 2100 € (dois mil e cem euros), ao que corresponde 200 (duzentos) dias de prisão subsidiária, nos termos do artigo 49.º, n.º 1 do Código Penal, caso a arguida não proceda ao pagamento da pena de multa ou esta não seja substituída por trabalho a favor da comunidade a pedido da arguida.
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Condenar a arguida nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC (três unidades de conta), nos termos do artigo 8.º, n.º 9 do Regulamento das Custas Processuais e tabela III anexa ao mesmo.
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Declarar cessada, após trânsito, qualquer medida de coação imposta à arguida, à exceção do termo de identidade e residência que só se extinguirá com a extinção da pena (artigo 214.º, n.º 1, al. e), do Código de Processo Penal).
Quanto à instância cível conexa:
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Julgo procedente o pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante Manuel contra a demandada Hortênsia e, em consequência: 1.- condeno a demandada no pagamento da quantia de 1575 € (mil e quinhentos e setenta e cinco euros) a título de indemnização por danos patrimoniais; 2.- condeno a demandada no pagamento da quantia de 1500 € (mil e quinhentos euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais.
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Custas da instância cível conexa a cargo da demandada – cfr. artigo 527.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 523.º do Código de Processo Penal e artigo 4.º, n.º 1, al. n), a contrário, do Regulamento das Custas Processuais.
(…)» Inconformado com o assim decidido, recorreu a arguida para este Tribunal da Relação, extraindo da motivação de recurso apresentada as conclusões que seguidamente se transcrevem: 1. No final de 2014 Manuel vedou o prédio (…).
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a arguida Hortência não obstante saber que as redes lhes não pertenciam e que haviam sido colocadas pelo assistente Manuel (…), por volta das 18:15/18:30 e munida de um objeto cortante efetuou vários cortes em número não concretamente apurado (mas não inferior a três) na vedação (…) cortando malha sol e rede sombra de cima para baixo, numa extensão de 32,55 metros; no dia 19 de Fevereiro de 2015 entre as 16:00 e as 17:00 horas, a arguida cortou a malha sol e rede sombra de cima para baixo, numa extensão de 13,95 metros; no dia 24 de Abril de 2015, entre as 17:00 e as 18:00 horas, a arguida cortou a malha sol e rede sombra de cima para baixo, numa extensão de 08,06 metros; no dia 16 de Junho de 2015, entre as 21:00 e as 21:45 horas, a arguida cortou a malha sol e rede sombra de cima para baixo, numa extensão de 4,94 metros; 3. A arguida confessou integralmente e sem reservas os factos que lhe são imputados pelo Ministério Público 4. Como se extrai da motivação da douta sentença, os factos provados no número anterior, tiveram como suporte o depoimento da arguida dado que quase ou nenhuma prova foi feita pelo assistente e pelas testemunhas de acusação que apenas presenciaram em dois momentos.
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Quanto aos documentos particulares de fls 507 e 508, nenhuma prova foi produzida quanto à veracidade dos mesmos e à reparação da empresa V…, Ldª e, por isso não deveriam criar qualquer convicção quanto á sua veracidade.
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Um orçamento apenas pode corresponder a um pedido e a um valor para esse pedido e nunca demonstram qualquer prejuízo suportado ou a suportar.
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Na confissão integral da totalidade dos factos, a arguida, tal como veio plasmado na douta sentença de que recorre, “a arguida tal como claramente demonstrou em julgamento não ter interiorizado a gravidade da conduta que empreendeu” o que é mesmo assim a arguida cortou a rede, tal como referiu, na extrema do seu prédio na parte em que confina com o assistente por entender que o poderia fazer por estar a ser vedada parte da sua propriedade. Nessa conformidade, agiu sem o conhecimento da gravidade dos factos e da ilicitude da sua conduta.
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Ora, a verdade é que cortou, na totalidade, 59,50 metros de rede e malha sol (32,55+13,95+8.06+4,94) que se encontrava a vedar a sua propriedade e que por isso entendeu poder cortar, tal como cortou e admitiu.
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Ora, a verdade é que a arguida tem uma condenação por desobediência mas, é uma pessoa ordeira que em 54 anos de vida não teve outras situações semelhantes e, um ato não define a sua personalidade. Foi empresária, mãe, esposa e socialmente aceite. É arrojada e impulsiva e responde pelos atos que comete, confessa-os de livre vontade e quando toma consciência arrepende-se. Hoje não praticaria tais cortes.
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Daí que, considerando os factos, a sentença proferida é excessiva e tem pune excessivamente a conduta da arguida que, danificou bens materiais mas não praticou qualquer crime contra as pessoas nem teve a consciência de que eram de natureza criminosa aqueles atos.
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Ao decidir como decidiu o Tribunal recorrido agiu mal e decidiu mal, também quanto aos danos não patrimoniais que nenhuma prova foi feita quer quanto aos danos materiais. Na verdade, cortar e danificar, na sua totalidade 59,50 metros de rede e malha sol e recolocar das quatro vezes nunca poderia atingir os valores peticionados nem tal deveria ter convencido o Tribunal que, aceitou como verdadeiros os valores peticionados por nenhuma prova ter sido feita e tal constar de meros orçamentos.
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Dado o que ficou exposto, a sentença é desadunada e viola grosseiramente a mais elementares regras do direito penal 13. Há evidentemente coincidências nos depoimentos mas também nas incertezas e nas dúvidas referidas em cada um dos depoimentos, nas incongruências e ainda na superficialidade dos mesmos.
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Salvo melhor opinião, o depoimento da assistente de acordo com a experiência comum, pouco consistentes, superficiais e, em consequência terão que ser considerados não provados os factos que se baseiam nos seus depoimentos 15. O princípio da livre apreciação de prova tem de se basear num raciocínio lógico, motivável com base na experiência e na razão. O Tribunal não pode presumir tem de possuir provas concretas e sérias que fundamentem a sua convicção.
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Decidindo como decidiu violou o Tribunal recorrido o disposto no artigos 17º e 71º do Código Penal.
A arguida/recorrente termina pugnando para que seja concedido provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida substituindo-se a mesma por outra, que absolva a arguida da prática do crime de dano e do pedido de indemnização civil, ou, caso assim se não entenda substituindo-se a pena por outra mais adequada.
O recurso foi admitido, por despacho de fls. 565.
O Ministério Público, junto da 1ª Instância, apresentou resposta ao recurso interposto pela arguida, nos termos constantes de fls. 583 a 587, que aqui se dão por reproduzidos, formulando as seguintes conclusões: 1 – A confissão integral e sem reservas da arguida abarca os elementos objectivos e subjectivos do crime do qual foi acusada pelo Ministério Público, compreendendo, dessa forma, a consciência da ilicitude da sua conduta, pelo que as objecções da mesma relativamente à prova deste elemento não têm qualquer fundamento; 2 – No caso dos autos a sentença recorrida não enferma de um erro de julgamento; 3 – O Tribunal, entidade que decide, considerou de forma diversa daquela que o recorrente entende ser a adequada em função da sua convicção; 4 – Sendo a convicção do Tribunal a que vale e constando da sentença um raciocínio lógico a adequado tendo por referência as regras da experiência comum, nada justifica a sindicância da decisão tanto mais que o Tribunal decidiu tendo por base os princípios da oralidade e da imediação; 5 – Atendendo à moldura penal abstracta do crime de dano e às necessidades de prevenção geral e especial subjacentes à ratio da sanção penal, considera-se que bem andou o Tribunal a quo, ao condenar a recorrente em cem dias de multa, por cada um dos crimes, e em cúmulo jurídico na pena única de 300 dias de multa, pois tal condenação é a que se mostra justa e adequada às finalidades de punição; 6 – Pelo que a sentença não merece qualquer censura.
Termos em que o recurso deve ser julgado improcedente e a sentença recorrida deve ser mantida na íntegra por ter feito uma correcta interpretação dos factos e aplicação do direito.
O assistente/demandante Manuel também respondeu ao recurso, nos termos que constam a fls. 569 a 579, que aqui se dão por reproduzidos, apresentando as seguintes conclusões: 1.
O recorrido entende que a douta decisão do Tribunal recorrido é justa e reflete, fundamentadamente, a prova irrefutável produzida em audiência de julgamento, uma vez que não fossem apenas algumas precisões que se entende necessárias e limitar-se ia, o recorrido a oferecer o merecimento dos autos.
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Salvo o devido respeito e apesar de doutas, as alegações da recorrente não mais refletem do que um novo exercício de interpretação da prova produzida com base num entendimento que não sufragamos e que, de modo nenhum, encontra...
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