Acórdão nº 557/08.8TBPVL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Novembro de 2013

Magistrado ResponsávelHEITOR GON
Data da Resolução14 de Novembro de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I 1.A sociedade comercial B…, Lda, intentou esta acção ordinária contra C…, Lda, D… e E…, pedindo a condenação dos demandados a pagar a quantia de 290.500€, acrescida de IVA (montante global de 348.600€), tendo alegado que, nos termos do contrato escrito por ambas celebrado em 1 de Outubro de 2006 cedeu à ré a exploração dum estabelecimento industrial de lavandaria (instalado num prédio tomado de arrendamento pela autora em 01.10.2002), pelo prazo de 2 anos, renováveis por iguais e sucessivos períodos, não sendo com a antecedência mínima de 6 meses com referência ao termo do prazo, mediante o preço de 303.000€, a pagar em 24 prestações mensais.

Sem que tenha resolvido ou denunciado o contrato, a ré encerrou o estabelecimento e mudou de instalações em 03.10.2008, e não pagou a prestação vencida nesse mês, do montante de 12.500,00, acrescido de IVA, pelo que nos termos da cláusula 13ª se venceram todas as correspondentes ao período de duração do contrato.

  1. Os Réus contestaram, alegando ter resolvido o contrato com justa causa com efeitos a partir do fim do mês de Outubro de 2008, radicada no facto de os pavilhões onde se encontra instalado o estabelecimento terem sido objecto de obras não licenciadas, antes da celebração do contrato, sendo a existência de licença de utilização imprescindível para obter a necessária licença de exploração, daí a impossibilidade do objecto, e a perda de interesse na prestação por parte da ré. E, com fundamento nas despesas, nos danos causados à imagem da 1ª Ré e no stress causado aos demais, decorrentes da situação que conduziu à resolução, e de irregularidades e avarias de equipamento do estabelecimento, deduziram reconvenção pedindo a condenação da A. a pagar 141.455,81 €, a título de danos patrimoniais, e por danos não patrimoniais a quantia de 10.000 € à 1ª Ré, e igual montante ao 2º e 3º Réus, acrescidas de juros legais desde a citação.

  2. Replicando, a Autora sustentou que a Ré, na carta enviada e recebida em 06.10.2008, solicitava a entrega de licenças de utilização dos pavilhões em causa, dando o prazo de 8 dias sob pena de resolver o contrato, quando ela própria já tinha ajustado outro contrato de cessão de exploração, e invocou subsidiariamente a verificação de abuso de direito.

  3. Na tréplica, os Réus mantiveram a posição já assumida nos autos.

    * 5. Realizado a audiência de julgamento, foi proferida sentença a condenar a ré C… a pagar à Autora a quantia de 290.500 €, acrescida do respectivo IVA, no montante global de 348.600 €, e os Réus D… e E…, na qualidade de fiadores, a pagarem à Autora a aludida quantia de 290.500 €, acrescida de IVA, no montante global de 348.600€, e absolutória da Autora da totalidade do pedido reconvencional.

    II Apelaram os RR e a autora contra-alegou.

    Sendo distribuído o processo nesta Relação, foram os apelantes convidados pelo relator a aperfeiçoarem as 80 conclusões de recurso, expondo de forma organizada e concisa as questões a apreciar (alertando-se então que deveriam evitar, designadamente, transcrições de depoimentos, considerações genéricas e de natureza argumentativa, e dedução difusa de questões de facto e de direito).

    Conclui agora nos seguintes termos: 1 - Na Sentença proferida o Tribunal a quo fez uma errada apreciação da prova produzida, julgando provados factos que não ficaram demonstrados e julgando não provados factos que se encontram provados, impondo-se seja a mesma revogada e substituída por outra que (i) absolva os Réus do Pedido, e (ii) condene a Autora no Pedido Reconvencional.

    2 - As questões submetidas à apreciação do Tribunal, foram, são, um lado, saber se a resolução do contrato de cessão de exploração celebrado com a Autora, operada pela Ré " ... se mostra legitima ... ", e se o contrato de cessão de exploração está ferido de nulidade, verificando-se a impossibilidade originária do seu objeto.

    3 - Na Sentença ora em crise, as duas questões mereceram resposta negativa, com o que os Recorrentes não se conformam, atenta designadamente toda a prova documental e testemunhal produzida nos Autos, assentando a Decisão proferida em conclusões meramente silogísticas, tomadas com base em pressupostos errados e circunstâncias erradamente presumidas, porque tem por base juízos preconcebidos, induzidos pela incorreta apreciação de toda a prova produzida, designadamente a prova testemunhal.

    4 - Com efeito o Tribunal sustentou a Decisão proferida numa interpretação manifestamente errada interpretação das obrigações assumidas por cada uma das partes no contrato celebrado (cessão de exploração), sem qualquer sustentação no texto do contrato e/ou no comportamento das partes, decidindo que era da exclusiva responsabilidade da Ré não só a obtenção da licença de exploração da atividade exercida, como também a obrigação de diligenciar pela regularização da licença de utilização do prédio onde está localizado o estabelecimento industrial, do qual a mesma não era sequer arrendatária, conclusão que é manifestamente excessiva, porque contrária ao texto do contrato, e violadora do princípio da boa-fé contratual, pois desonera em absoluto a Autora de obrigações que necessariamente impenderiam sobre a mesma, atento o contrato celebrado.

    5 - Sendo que, para atribuir à Ré aqui Apelante a exclusiva responsabilidade pela eliminação dos vícios da licença de utilização do imóvel onde estava localizada a atividade, o tribunal, presumiu, sem mais que os vícios de que enferma a referida "Licença de utilização", e que ficaram provados nos Autos, eram contemporâneos da celebração do contrato, pelo que a Ré teria conhecimento dos mesmos desde essa data, ou pelo menos desde Novembro de 2007, e, mesmo assim teria aceitado manter-se no estabelecimento a laborar, o que impediria a invocação desses factos, posteriormente, como fundamento da resolução comunicada à A. em Outubro de 2008.

    6 - Ora, toda a prova produzida, quer documental, quer testemunhal, demonstra exatamente o oposto, ou seja que a Ré não tinha conhecimento dos vícios de que enfermava a licença de utilização, e que, concluiu pela impossibilidade de no curto prazo obter a eliminação dos vícios, porque tal implicava a demolição de obras de estrutura do imóvel (do qual repita-se não era proprietária ou sequer arrendatária).

    7 - Pelo que, só porque o Tribunal não atribuiu força probatória a documentos juntos aos Autos que não se demonstram impugnados, e cuja falsidade não foi suscitada, e desconsiderou na totalidade depoimentos que foram prestados de forma isenta e coerente por várias testemunhas, depoimentos esses que, de per si impunham, a final, resposta diversa aos factos constantes da base instrutória, veio a concluir no sentido que consta da Sentença, quando atenta a prova produzida nos Autos se impunha que se concluísse que a Autora não cumpriu com as obrigações contratualmente assumidas perante a Ré, pelo que a resolução foi legitimamente operada pela mesma, mais se verificando a impossibilidade originária do objeto do contrato celebrado entre as partes, pelo que sempre deveria a Ré ter sido absolvida do pedido e a Autora condenada no pedido reconvencional.

    8 - O Tribunal valorou pois de forma errada os documentos juntos aos Autos, designadamente o doe. de fls. 68 dos Autos ao qual foi atribuída uma força probatória que o mesmo não tem nem pode ter, pois trata-se de uma licença de utilização da qual apenas consta genericamente a identificação do prédio e a atividade licenciada para o local, não resultando da análise do mesmo nem podendo resultar que no local licenciado existiam obras não legalizadas, sendo manifestamente excessivo que pelo simples facto de tal licença ter sido entregue à Ré, implicaria que a mesma tinha conhecimento (que não tinha) das obras ilegais existentes.

    9 - Do mesmo modo, concluir que a Ré tinha conhecimento das obras ilegais, extensão das mesmas e impossibilidade de suprir tais vícios desde 2007, apenas porque a Câmara Municipal em despacho datado de Novembro de 2007, certificou que "Para o local foi licenciado o processo de obras n. 230/88, um estabelecimento industrial destinado a indústria de confecção têxtil e acabamentos, verificando-se a existência de alterações ao projeto inicial não licenciadas que carecem de licenciamento." é manifestamente excessivo.

    10 - Impondo-se, atento o teor dos documentos supra, referidos a conclusão oposta à que consta da Sentença ora em crise, ou seja, que os Réus, aqui Recorrentes foram induzidos em ERRO pela Autora, que lhes forneceu copia da licença sem qualquer explicação, fazendo crer que tudo estava regularizado, e criando na Ré a legitima expectativa de vir a obter a Licença de exploração para a atividade que se propunha exercer, facto pelo qual contratou até um Gabinete especializado para o efeito.

    11 - Os Réus não tinham pois, naquelas datas (celebração do contrato e obtenção da certidão camarária) nem podiam ter, conhecimento da dimensão do problema, e muito menos das consequências que do mesmo para eles poderiam advir, até porque a Autora sempre negou que existisse qualquer problema, e manteve tal posição nos presentes Autos, continuando a alegar expressamente e de forma clara que a licença de utilização do imóvel onde está situado o estabelecimento industrial, era válida, não enfermando de qualquer vício, facto a que o Tribunal não deu qualquer relevância na decisão.

    12 - Atento o que, contrariamente ao que consta da Sentença, terá que julgar-se provado que a A. sempre afirmou à Ré que a licença de utilização era válida, e que inexistiria qualquer problema ou vício inerente à mesma, criando na Ré a convicção de que tudo se iria resolver, explicações que a Ré, de boa-fé, aceitou, não só porque necessitava de manter-se a laborar para poder cumprir com os compromissos assumidos, como ainda porque já tinha feito avultados investimentos no estabelecimento industrial, tendo por isso todo o interesse em manter o contrato celebrado com a A., não tendo nunca aceitado...

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