Acórdão nº 605/08.1TBFAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Julho de 2013

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução11 de Julho de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: *** I – Relatório; Apelantes e apelados: - Albino ..., Deolinda ..., Emília ... e Ermelinda ... (AA.); - José ... e Margarida ... (RR.); Albino ..., Deolinda ..., Emília ... e Ermelinda ... intentaram contra José e Margarida autos de acção ordinária nos seguintes termos: Pedido: - que se condenem os RR. a pagar-lhes a quantia de €21.437,50, acrescida de juros à taxa de 4%, a contar da citação até pagamento.

Causa de pedir: Entre autores e réus foi celebrado um contrato de arrendamento da “Quinta da Mourisca”, composta de casa de habitação e de lavoura, eira, lagares, dependências agrícolas, logradouro, terras de lavradio e montados, o qual os réus denunciaram, tendo entrado na posse da “Quinta” em 10 de Abril de 2000.

Após a denúncia e entrada na posse do locado, os réus não o exploraram, tendo deixado os terrenos por cultivar (não mais cultivando milho, feijão, batatas, erva), bem como deixado de podar as vinhas e vindimar as uvas, igualmente não habitaram a casa, deixando-a num estado de ruína, não roçara, o mato ou esgalharam a lenha nos prédios incultos.

A “Quinta da Mourisca” produzia anualmente vinho, batatas, feijão, milho e centeio, sendo a renda metade da respectiva produção, razão por que os autores têm direito à indemnização em função do valor da renda.

Na sua contestação os réus invocaram a caducidade do arrendamento por os autores não terem efectuado a comunicação da transmissão do mesmo por morte dos anteriores arrendatários.

No mais, aceitando que abandonaram parte das culturas anteriormente existentes na “Quinta”, por não serem rentáveis, deduziram reconvenção com base na falta de pagamento das rendas dos últimos cinco anos, concluindo com o pedido de improcedência da acção ou, no caso de procedência, condenarem-se os autores a pagar-lhes a quantia de €21.437,50.

Os autores replicaram, impugnando as excepções invocadas e concluindo como na p.i..

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença na qual se decidiu: - julgar a acção procedente e condenar os réus a pagarem aos autores o montante em dinheiro a liquidar no competente incidente, correspondente ao quíntuplo de metade da produção de vinho, milho, feijão e batatas que a “Quinta da Mourisca” podia, se explorada, ter produzido nos anos de 2001 a 2005 (inclusive).

- julgar a reconvenção parcialmente procedente e condenar os autores a pagarem aos réus a renda (metade da produção de vinho, milho, feijão e batatas) correspondente aos anos de 1995, 1996, 1997 e 1998, em quantia a liquidar no competente incidente.

Desta decisão foi interposto recurso independente de apelação pelos RR. e recurso subordinado pelos AA., em cuja alegação apresentam as seguintes conclusões: A – Apelação dos RR.: 1ª- Tendo a sentença produzida considerado que os RR. ocuparam e usaram a casa de habitação da Quinta e cultivaram 1/3 da parte rústica, não podia ter considerado - sob pena de comissão de nulidade prevista pelo artº. 668º nº 1, alínea c) do CPC - totalmente incumprido o pretenso dever de os RR. explorarem directamente a Quinta antes locada e daí condená-los ao pagamento aos AA. de uma indemnização equivalente à renda total que seria devida em 5 anos, mas antes a essa indemnização deduzida do que à renda correspondente à casa fosse de considerar e de que ao 1/3 dos prédios efectivamente ocupados fosse atribuído.

  1. - Os AA., porém, não têm o direito que pedem que se lhes reconheça, pois denúncia para “exploração directa” facultada pelo artigo 20º da Lei do Arrendamento Rural (Decreto Lei nº 385/88 de 25 de Outubro) é uma forma especial de denúncia do contrato em relação à forma geral prevista no artigo 18º da mesma lei, e tem que ver, não com o tipo e modo de exploração, mas antes com o facto de os prédios serem ou não utilizados para novo arrendamento, a pessoa diversa do anterior arrendatário.

  2. - Com efeito a denúncia pura e simples tal como se prevê pelo artigo 18º não precisa de ser motivada, enquanto a denúncia especial, motivada, prevista pelo artigo 20º deve ser expressamente motivada, por o senhorio dever expressamente comunicar ao arrendatário, por escrito, que pretende passar ele próprio - ou filhos seus que satisfaçam as condições de jovem agricultor estipuladas na lei - a explorar directamente o prédio ou prédios arrendados; 4ª- Por isso se compreende e explica a diversidade de regime entre as duas formas de denúncia, pois à denúncia prevista pelo artº. 18º pode o arrendatário opôr-se, nos termos do artigo 19º da lei, enquanto à denúncia motivada prevista pelo artº. 20º o arrendatário não pode opôr-se, porque lho não consente o nº 1 desse artº. 20º.

  3. - O arrendatário que viu cessar o arrendamento por força da denúncia prevista pelo artº. 18º, fica com direito de preferência em qualquer arrendamento que se faça nos 5 anos seguintes, nos termos do artº. 27º, enquanto na denúncia para exploração directa, o senhorio não pode arrendar os prédios a outrém, mas apenas explorá-los ele próprio, durante o prazo mínimo de 5 anos, salvo caso de força maior, sob pena de o arrendatário ter direito a uma indemnização igual ao quíntuplo das rendas relativas ao período de tempo em que o arrendatário este ausente e à reocupação, se assim o desejar, iniciando-se outro contrato, conforme prescrito pelo artº. 20º nºs 3, 4 e 5.

  4. - A “exploração directa” dos prédios antes locados não é a que o senhorio faça com o seu próprio trabalho braçal ou executivo, mas a que faça sob sua orientação, e não tem qualquer relação com a exploração efectiva dos prédios, visto que a lei não estabelece qualquer sanção ou consequência para o subaproveitamento total ou parcial dos prédios pelo senhorio (cfr. entre muitos, o Ac. Rel. Lisboa de 26/5/1981 in BMJ 312, 291).

  5. - No conceito de “exploração directa” dos prédios, para efeito da lei, não cabe qualquer obrigação de o senhorio - contra a solução da sentença - exercer no locado o mesmo aproveitamento anterior, ou a mesma actividade ou as mesmas culturas ou até fazê-las na mesma extensão, que o arrendatário, como se se tratasse de transmissão de um “estabelecimento agrícola” quo tale e in integrum do locatário para o senhorio, porque nem a lei o impõe, nem de perto nem de longe, nem, se o impusesse, a solução podia considerar-se conforme com a Constituição, já que decorre do artº. 62º da Constituição a garantia do direito à propriedade privada que seria insuportavelmente constrangido se o proprietário ficasse obrigado a, nos seus prédios, fazer apenas determinadas culturas ou usar apenas certos métodos de aproveitamento, mesmo que desaconselháveis.

  6. - O conceito de “exploração directa” para efeitos da lei coincide com aquele que é feito pelo proprietário, nos termos referidos, e opõe-se à que é feita por terceiros a quem o proprietário a ceda designadamente por arrendamento (e só esta é vedada pelo artº. 20º).

  7. - No caso sub judice os AA. - invocando, como sucessores de pregressos arrendatários, seus pais, falecidos respectivamente em 8/12/1978 e 28/11/1987, a qualidade de agricultores autónomos, cujo arrendamento fora feito cessar pelos RR. por denúncia para “exploração directa” nos termos do indicado artigo 20º, e alegando que os RR. violaram os nºs 3 e 4 do artigo 20º - por não terem explorado, e apenas por isso, os prédios nos 5 anos subsequentes à entrega - pediram a condenação dos RR. a pagar-lhes uma indemnização equivalente à renda de 5 anos que a Quinta produziria, pretensão que não tem enquadramento legal naquele normativo.

  8. - De resto, e sem prescindir, logo da petição inicial se podia e devia ter constatado que os AA. não tinham o direito que se arrogavam e que a acção devia soçobrar por mais do que um motivo. Com efeito: a) os AA. não “sucederam na posição contratual de seus pais e sogros”, pois para sucederem teriam de (artº. 22º nº 5 da Lei 76/77 de 29/9, então em vigor), ter declarado - e agora ter alegado que declararam, para poderem prová-lo - que haviam exercido o direito à transmissão do arrendamento nos 3 meses seguintes à morte desses pais e sogros, o que, não tendo ocorrido, determinou a caducidade do arrendamento, que o tribunal devia ter declarado, mesmo oficiosamente (artº. 333º do Código Civil); b) prescrevendo o nº 5 do artº. 35º do Decreto-Lei nº 365/88 que nenhuma acção judicial pode ser recebida ou prosseguir, sob pena de extinção da instância, se não for acompanhada de um exemplar do contrato de arrendamento, a menos que “logo se alegue que a falta é imputável à parte contrária”, o tribunal não podia considerar cumprido esse ónus de alegação apenas porque os AA. declararam que notificaram os RR. para comparecerem no Cartório Notarial de Fafe para subscreverem o contrato, ao que eles, não acederam porque nem os RR. podiam ser forçados a deslocar-se de Guimarães, onde residem, a Fafe, nem o documento carece de intervenção notarial, nem sequer estava esclarecido o clausulado do contrato, que os AA. não propuseram sequer (e esse clausulado era essencial, visto que, além do mais, a renda praticada não podia ser legalmente fixada - ut - artº. 7º nº 2 da LAR); c) Os AA. não tinham, nem têm, o direito que se arrogam porquanto esse direito dependeria não de os RR...

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