Acórdão nº 4093/11.7TBGMR-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Fevereiro de 2013

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Por sentença datada de 16.11.2011, já transitada em julgado, foi declarada a insolvência de J.. e de C.., na sequência do requerimento apresentado pelos próprios em 08.11.2011.

A Administradora da Insolvência e o Ministério Público apresentaram os pareceres previstos no art. 188.º, nº 2 do C.I.R.E., qualificando, inicialmente, a insolvência dos devedores como fortuita, tendo, contudo, na sequência dos esclarecimentos solicitados pelo Tribunal a quo, acabado por concluir pela qualificação da respectiva insolvência como culposa, com fundamento no incumprimento do dever de apresentação à insolvência.

Notificados, os devedores deduziram oposição, arguindo a nulidade do despacho consubstanciador dos pedidos de esclarecimentos efectuados à Srª Administradora da Insolvência e ao Ministério Público, com fundamento em que a Mmª Juíza a quo encontrava-se vinculada à qualificação da insolvência como fortuita inicialmente proposta por estes, nos termos do disposto no art. 188.º, nº4 do CIRE.

Mais alegaram inexistir fundamento para a qualificação da sua insolvência como culposa.

Proferido despacho saneador, nele foi indeferida a invocada nulidade.

Foram elaborados os factos assentes e a base instrutória.

Realizou-se audiência de julgamento, tendo sido proferida decisão sobre a matéria de facto.

Foi, então, proferida decisão que, nos termos do disposto no art.º 189.º, n.º 1 do CIRE: - qualificou as insolvências de J.. e C.. como culposas; - decretou a inibição de J.. e C.. para o exercício do comércio, para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa durante um período de 2 (dois) anos.

As custas ficaram a cargo dos requeridos.

Não se conformando com esta decisão, dela apelaram os requeridos, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que se transcrevem: “1ª No presente Incidente de qualificação de insolvência, a Exma. Sra. Administradora de Insolvência emitiu parecer, a 29/03/2012, sobre a qualificação da insolvência, considerando que as Insolvências deveriam ser qualificadas como fortuitas por entender que os Insolventes não se colocaram, voluntariamente, na situação em que se encontram; não praticaram quaisquer factos dolosos que tivesse causado ou contribuísse para a sua insolvência enquanto pessoas singulares; e não existe um nexo de causalidade entre a apresentação tardia e a sua situação de insolvência e por não resultou um agravamento do passivo, em virtude desta apresentação tardia, uma vez que os insolventes não contraíram outros débitos para seu proveito pessoal.

  1. A 10/04/2012, o Ministério Público emitiu parecer pugnando, igualmente, para que as Insolvências fossem qualificadas como fortuitas, visto que dos autos nada consta que permita concluir pela verificação de factos que indiciem que a situação de insolvência foi criada ou agravada em consequência da acção dolosa ou com culpa grave dos insolventes, bem como não se verifica nenhuma situação que se subsuma a alguma alínea prevista no n.º 2, do art. 186º, do C.I.R.E., tudo conforme documento junto aos autos a fls.-.

  2. Face a tais pareceres, o tribunal a quo ordenou a notificação da Exma. Sra. Administradora para esclarecer os motivos pelos quais entendia serem fortuitas as insolvências em causa, bem como ordenou que fossem os autos ao M. P. para os mesmos fins, uma vez que o Tribunal entendia estarem preenchidos os requisitos previstos no art. 186.º/3 e 1 do C.I.R.E., 4ª o que determinou que, tanto a Exma. Sra. Administradora, como o M.P., alterassem os seus pareceres quanto à qualificação das insolvências dos ora Recorrentes, considerando-as, agora, como culposas, por incumprimento do dever de se apresentar, atempadamente, à Insolvência.

  3. A 26 de Outubro de 2012 foi proferida a decisão de qualificação das insolvências dos aqui Recorrentes como culposas, ao abrigo do disposto no artigo 186º, n.º 1 e 3, al. a), do C.I.R.E., por considerar o tribunal recorrido que os Insolventes incumpriram o dever de se apresentarem à insolvência, tendo resultado dessa omissão“ …um claro prejuízo para os credores…, retirando-se da acumulação de dívidas à Fazenda Nacional…” 6ª Foi, ainda, decretada a inibição dos Recorrentes para o exercício do comércio, para ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa durante um período de 2 anos.

  4. Ora, os Recorrentes não se conformam com tal decisão, desde logo porque, face aos primeiros pareceres da A. I. e do M. P., deveria ter sido proferida de imediato decisão a qualificar as insolvências como fortuitas, nos termos do disposto no artigo 188.º, n.º 4 do C.I.R.E. (na redação aplicável, anterior ao Dec. Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril).

  5. Ao invés, após a notificação (mencionada na conclusão 3ª), a Exma. Sra. Administradora alterou o seu parecer, considerando que “atendendo aos fundamentos do douto despacho de fls. 5/6, deverá a insolvência ser considerada culposa, por incumprimento do dever de se apresentar, atempadamente, à Insolvência.” 9ª Atenta a última posição tomada pela Administradora de Insolvência, o Ministério Público alterou, igualmente, o seu parecer, qualificando, agora, as Insolvências como culposas, por entender que tal alteração se baseia no incumprimento por parte dos devedores do dever de apresentação atempadamente à Insolvência, ou seja, no prazo previsto no artigo 18º do C.I.R.E., configurando-se o preenchimento da situação prevista no artigo 186º, n.º 3, alínea a) do C.I.R.E.

  6. Havendo entendimento, entre a Administradora e do M. P., quanto á qualificação da insolvência como fortuita, o prosseguimento normal dos autos seria uma decisão no sentido dos primeiros pareceres emitidos por ambos, ou seja, a da qualificação das insolvências como fortuitas, pois que o impulsionamento do processo na promoção e na proposta da qualificação da insolvência compete ao administrador da insolvência e ao Ministério Público, o que não sucedeu.

  7. E, ainda que o tribunal “use mão” da prerrogativa, outorgada pelo art. 11º do C.I.R.E., do princípio inquisitório, uma coisa é a livre indagação dos factos (admitida ao julgador), outra coisa é a promoção do incidente (não admitida ao julgador), havendo que distinguir entre estas duas iniciativas.

  8. O artigo 11º do CIRE que prescreve o princípio do inquisitório permite ao Juiz do processo, que na decisão declaratória dos incidentes de qualificação, se sirva de outros factos para além dos alegados pelas partes para fundamentar as decisões que profira, mas o exercício dos poderes inquisitórios não pode servir como pretexto para o Juiz do processo suprimir as faltas e corrigir ou emitir o parecer a que alude o artigo 188º, nº 2 do C.I.R.E.

  9. Ao não decidir em conformidade com o disposto no artigo 188.º, n.º 4 do C.I.R.E. (na redacção aplicável, anterior ao Dec. Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril), o tribunal a quo violou a referida disposição legal, bem como violou, por errada interpretação e aplicação, o preceituado no artigo 11º do C.I.R.E.

  10. Sem prescindir, a questão fulcral consiste em saber se estão ou não reunidos os pressupostos para que a insolvência possa ser qualificada como culposa, desde logo por se verificarem, de facto e de direito, os pressupostos legais contidos no n.º 1 do artigo 186º do C.I.R.E. e na al. a) do n.º 3 desse mesmo artigo, que fundamentaram a qualificação das insolvências dos recorrentes como culposas.

  11. Entendemos que não, desde logo porque, in casu, sendo os insolventes pessoas singulares, não lhes é aplicável o disposto no art.º 18.º, n.º 1 do C.I.R.E. (de acordo com o n.º 2 da mesma norma), pelo que não estavam sujeitos ao dever de apresentação à insolvência, tanto mais que estes não eram titulares de uma empresa na data em que incorreram em situação de insolvência.

  12. Da sentença ora recorrida consta que desde Maio de 2007 (data da constituição da sociedade) que ambos são os sócios-gerentes da A.., Lda., sociedade comercial que explora um talho. Como tal, e ante o disposto no art. 5.º CIRE (e sendo eles os únicos sócio-gerentes), entendo que se pode afirmar que os insolventes são titulares de uma empresa e que, como tal, se não encontravam desonerados de se apresentarem à insolvência.

    Ora, “Quando o devedor seja titular de uma empresa, presume-se de forma inilidível o...

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