Acórdão nº 1508/09.8TAGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelPAULO FERNANDES SILVA
Data da Resolução06 de Maio de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

I.

RELATÓRIO.

--- No âmbito dos presente autos de processo comum, findo o inquérito, o Ministério Público deduziu acusação contra, entre outros, José C...

Cf. volume I, fls. 630 a 637. ---. --- Notificado daquela acusação, veio aquele Arguido requerer a abertura de instrução Cf. volume I, fls. 657 a 665. ---, sem intervenção do respectivo defensor, muito embora o tenha constituído Cf. volume I, fls. 580: por procuração datada de 31.07.2012, o Arguido constituiu seu defensor, entre outros, o Exm.º Sr.º Dr.º Ricardo C..., Ilustre Advogado da Comarca de Braga. ---. --- Relativamente àquele requerimento do Arguido, o 3.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Guimarães proferiu, em 24.01.2013, o seguinte despacho: (transcrição) --- «A fls. 657 e ss., veio o arguido José C... apresentar o requerimento de abertura de instrução por si subscrito, não obstante já lhe ter sido nomeado defensor oficioso - cf. fls. 539 Comecemos por analisar da admissibilidade do requerimento de abertura de instrução apresentado, na medida em que o mesmo foi elaborado e subscrito pelo próprio arguido que pretende seja declarada aberta a fase processual de instrução.

Estabelece o disposto no art. 64º, n.° 3 do CPP, que é obrigatória a nomeação de defensor ao arguido, quando contra ele for deduzida acusação devendo, inclusivamente, a identificação do defensor nomeado constar do despacho de encerramento do inquérito.

A obrigatoriedade de nomeação de defensor legalmente estabelecida prende-se com a necessidade de defesa do arguido, o qual, caso assim entenda pode requerer a abertura de instrução para se defender da acusação que contra si foi deduzida pelo Ministério Público, ou para se defender do eventual requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente que reage a um despacho de arquivamento dos autos, requerimento de abertura de instrução esse que para ser admitido tem que obrigatoriamente integrar uma acusação.

A conformidade constitucional deste entendimento e solução legislativa tem sido reiteradamente afirmada pelo Tribunal Constitucional, nomeadamente, Acórdãos n.° 497/89, 252/97, 578/2001 e 960/06.

A escolha do defensor, é pois um direito constitucional do arguido.

Trata-se de emanação do direito constitucional à escolha de defensor (art. 32°, n.° 3, da Constituição da Republica Portuguesa), garantia directamente aplicável e cuja limitação, nos termos da Lei Fundamental, apenas pode ocorrer na medida do necessário para tutela de outros direitos análogos salvaguardados na Constituição (art. 181, n°s 1 e 2).

O direito consagrado na Constituição da República Portuguesa não comporta excepções.

No entanto, uma tem sido admitida, pelos Tribunais Superiores, inclusivamente pelo Tribunal Constitucional, no sentido de ser aceitável à luz da Lei Fundamental que, em lugar de escolher-se a si próprio, o arguido que seja advogado seja assistido por outro causídico (cf. acs. do T. C. n.° 578/2001, in D. R., II Série, n.° 50, de 28 de Fevereiro de 2002, e do S. T. J., de 19 de Março de 1998, B. M. J., n.° 475, pág. 498; e, na doutrina, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, tomo I, 4ª ed., p. 316).

O primordial fundamento de tal excepção radica, no essencial, na circunstância de os poderes que por lei são atribuídos ao defensor não serem em muitas situações conciliáveis com a sua posição de arguido, embora também se saliente a existência de respeitáveis interesses do próprio advogado, no sentido de beneficiar de uma defesa conduzida de forma desapaixonada.

E essa incompatibilidade de posições entre defensor e arguido aplica-se inteiramente ao caso em apreciação, pelo menos na fase da audiência, bastando pensar na hipótese de o tribunal determinar, caso se realize o julgamento, a audição separada dos arguidos, nos termos do art. 343º, n.° 4, do C. de Processo Penal, pois em tal situação o defensor da arguida não assistiria às declarações por ela prestadas.

A corroborar a versão exposta, e em consonância com o mesmo, estabelece o art.° 1º n.º 10 da Lei n.° 49/2004 de 2004-08-24 [Lei que define o sentido e o alcance dos actos próprios dos advogados e dos solicitadores], que nos casos em que o processo penal determinar que o arguido seja assistido por defensor, essa função é obrigatoriamente exercida por advogado, nos termos da lei.

Esta solução legislativa, de proibição da auto-representação em processo penal, é também a única que se compagina com o actual EOA - Lei n.° 15/2005, de 26 de Janeiro -, que consagra, entre o mais, que o advogado exercita a defesa e interesses que lhe são confiados com plena autonomia técnica e de forma isenta, independente e responsável, art.° 76º n.º 1. E não se restringe aos advogados arguidos, abrange também os advogados ofendidos, acórdão do TC n° 325/2006 e n.° 338/2006 e Acórdão do TRC de 30-03-2011, e os magistrados, na qualidade de arguidos ou ofendidos, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1-07-2009 [Armindo Monteiro].

A admitida excepção radica, face à forma como está estruturado o processo penal, numa restrição inevitável, para a realização do julgamento e dos direitos de defesa do arguido que ao mesmo está sujeito, ou em caso de se encontrar ainda em fase de instrução, de defesa dos seus direitos face aos meios de prova carreados para a fase de inquérito e que determinaram a acusação contra si deduzida, à livre escolha do defensor, estando por isso materialmente justificada como indispensável, e na medida necessária, à tutela da realização da justiça, elemento inerente ao conceito de Estado de direito em que se baseia a Constituição (art. 180, n.° 2).

Por...

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