Acórdão nº 6132/08.0TBBRG-E.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução30 de Maio de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO Por apenso aos autos de insolvência de J…, veio a sociedade “A…, Lda.” reclamar créditos no montante de € 25.380,00, relativos a um contrato promessa que celebrou com o insolvente, em que este e a mulher prometeram vender-lhe um armazém sito em Braga, tendo a credora reclamante pago a título de sinal e princípio de pagamento a quantia de € 10.000,00, e foi posteriormente autorizada a entrar na posse daquele imóvel e aí fazer as obras necessárias para a instalação da sua actividade, nas quais despendeu € 15.380,00.

Tal crédito, no valor de € 25.380,00, foi reconhecido pelo administrador da insolvência como estando garantido por direito de retenção.

A credora reclamante C… impugnou tal crédito.

Saneado e instruído o processo, teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida a sentença a julgar verificado o crédito de “A…, Lda.”, no montante de € 25.380,00, como crédito comum.

Inconformada com o assim decidido, interpôs aquela sociedade recurso de apelação, juntando as respectivas alegações (cfr. fls. 690 a 703).

Já depois de proferida a sentença a julgar verificado o crédito da “A…, Lda.”, veio o Sr. administrador da insolvência juntar nova lista de créditos reconhecidos, actualizada com o acordo obtido entre os credores, com os créditos reconhecidos nos apensos da verificação ulterior de créditos e com aquela decisão (cfr. fls. 674 e ss.).

Tal lista foi objecto de novas impugnações e foram reclamados novos créditos.

Notificado para o efeito, o administrador da insolvência apresentou nova lista de créditos rectificada (cfr. fls. 777 a 784).

Foi então proferida sentença de verificação e graduação de créditos na qual se decidiu, além do mais, relativamente à verba n.º 3, graduar o crédito reconhecido da “A…, Lda.” em 6.º lugar, como crédito comum.

De novo inconformada com a sentença proferida, dela interpôs recurso a “A…, Lda.”, rematando a respectiva alegação com as seguintes conclusões: «1. A sentença proferida pelo Tribunal a quo e de ora se recorre é nula e de nenhum efeito.

  1. A Recorrente, em devido tempo, interpôs recurso da sentença proferida nos presentes autos em 22.12.2011 que considerou o seu crédito como comum, pelo que, tal decisão não transitou ainda em julgado.

  2. Não se encontrando ainda decidida a questão da qualificação do crédito da Recorrente o Tribunal a quo não está em condições de proferir sentença de graduação de créditos, pelo que, a presente decisão deve ser declarada nula e de nenhum efeito e consequência deve o presente apenso de Reclamação de Créditos ser suspenso até que seja proferida decisão final e transitada em julgado sobre a qualificação do crédito da Recorrente.

  3. O crédito do Recorrente, reconhecido e verificado, no montante de €: 25.380,00, encontra-se - ao abrigo do disposto alínea f) do nº1 do artº 755º do Código Civil - garantido pelo direito de retenção relativamente ao imóvel apreendido a favor da Massa Insolvente e descrito na verba 3 do auto de apreensão, nos termos do disposto na alínea f) do nº1 do artº 755º do Código Civil, devendo pois, ser graduado em 2º lugar.

  4. O direito de retenção da recorrente advém-lhe de duas vias, uma do princípio geral consagrado no artº 754 do C.Civil, atentas as benfeitorias/despesas realizadas no imóvel para a adaptação do mesmo à actividade comercial da recorrente, bem como, da qualidade de beneficiário da promessa de transmissão do bem imóvel acompanhada da traditio da coisa nos termos do artº 755, al. f) do C.Civil.

  5. O contrato promessa de compra e venda celebrado entre Insolvente e Recorrente não foi atribuída eficácia real, mas a sua celebração foi acompanhada da respectiva entrega à recorrente, tendo havido a traditio da coisa.

  6. Dispõe a alínea f) do nº 1 do art. 755º do C.C., que o beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de direito real que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, goza de direito de retenção sobre essa coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do art. 442º.

  7. O direito de retenção é um direito real de garantia que confere ao seu titular a faculdade de reter ou não restituir a coisa que possui ou detém, enquanto o devedor não cumprir, bem como, lhe assiste o direito de se fazer pagar pelo valor da coisa, com preferência sobre os demais credores.

  8. No caso vertente, não tendo o contrato promessa de compra e venda eficácia real, sendo meramente obrigacional é-lhe aplicável o regime do art. 102º do CIRE.

  9. O regime geral disposto no artº 102º do CIRE aplicável ao caso vertente, nada refere acerca das garantias dos créditos, pelo que, daí não se pode inferir que as mesmas deixam de existir quando estamos no âmbito de processos de Insolvência, aliás, tal interpretação é abusiva, pois “ Nada se diz sobre garantias desses créditos. E seria incompreensível e um verdadeiro contra-senso que essas garantias cessassem, ou não produzissem efeitos, para efeito da Insolvência – para além de se tornar espúrio todo o regime de graduação de créditos de acordo com as garantias que acompanham os respectivos créditos” – neste sentido cfr. Ac. da RL do Porto, Apelação 708/07.0TBPRD-G.P1-2ª Secção, de 31.03.2009.

  10. O regime geral estabelecido pelos artº 755º, nº1 alínea f) e 759º do Código Civil não é alterado pelo regime previsto no CIRE, razão pela qual, o beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de um direito real que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, goza de direito de retenção pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do art. 442 do C.C.

  11. O facto de a coisa ter sido logo entregue ao promitente comprador, aqui recorrente “antes, portanto, da celebração do contrato definitivo, é-lhe criada uma mais forte expectativa na concretização do negócio, pelo que se justifica, postulado pela boa-fé, que lhe corresponda uma segurança acrescida.

  12. O direito de retenção previsto na alínea f) do nº 1 do artº 755º do C.C. assenta em três pressupostos: i) existência de promessa de transmissão ou de constituição de...

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