Acórdão nº 635/10.3GEGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2013
Magistrado Responsável | JO |
Data da Resolução | 17 de Dezembro de 2013 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, os juízes da secção penal do Tribunal da Relação de Guimarães, 1. Por sentença proferida nestes autos de processo comum n.º 635/10.3GEGMR por tribunal singular no 3.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Guimarães, o arguido Bruno S...
foi condenado pela prática, em autoria material e concurso real, de três crimes de ameaça, p. e p. pelos art.os 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal na pena de 140 (cento e quarenta) dias de multa por cada um dos crimes, pela prática, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples p. e p. pelo art.º 143.º, n.º 1 do Código Penal na pena de 150 (cento e cinquenta)dias de multa, pela prática, em autoria material, de um crime de injúria p. e p. pelo art.º 181.º do Código Penal na pena de 80 (oitenta) dias de multa, e, em cúmulo jurídico, na pena única de 430 (quatrocentos e trinta) dias de multa à razão diária de € 9,00 (nove euros), o que perfaz a pena de multa de € 3.870,00.
Na parcial procedência do pedido de indemnização civil, foi o arguido demandado condenado no pagamento, a título de danos não patrimoniais, , a quantia de € 500,00 (quinhentos euros) à demandante Maria M... e a quantia de € 800,00 (oitocentos euros) a cada um dos demandantes José M... e Ana M..., acrescidas de juros a contar da notificação do pedido até efectivo pagamento.
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Inconformado, o arguido interpôs recurso pedindo a revogação da sentença condenatória com a consequente absolvição do recorrente.
O Ministério Público, representado pela magistrada no Tribunal Judicial de Guimarães, apresentou resposta concluindo que o recurso não merece provimento.
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Neste Tribunal da Relação de Guimarães onde o processo deu entrada em 30 de Outubro de 2013, o Exm.º. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Recolhidos os vistos do juiz presidente da secção e do juiz adjunto e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.
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Questões a decidir Como tem sido entendimento unânime, o objecto do recurso e os poderes de cognição do tribunal da relação definem-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, onde deve sintetizar as razões da discordância do decidido e resumir as razões do pedido - artigos 402º, 403.º e 412.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, naturalmente que sem prejuízo das matérias de conhecimento oficioso (cfr. Silva, Germano Marques da, Curso de Processo Penal, Vol. III, 1994, p. 320; Albuquerque, Pinto de, Comentário do Código de Processo Penal, 3ª ed. 2009, pag 1027 e 1122, Santos, Simas, Recursos em Processo Penal, 7.ª ed., 2008, p. 103; entre outros os Acs. do S.T.J., de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242; de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271; de 28.04.1999, CJ/STJ, Ano VII, Tomo II, p. 196).
As questões a apreciar, são as seguintes, pela ordem lógica de conhecimento: a) Vícios decisórios de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova b) Impugnação da decisão em matéria de facto ( aqui se incluindo além do mais a violação do princ. in dubio pro reo); d) Preenchimento do tipo de crime de injúria e) Medida da pena.
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Matéria de facto Para a fundamentação da presente decisão, torna-se imprescindível transcrever parcialmente a sentença objecto de recurso.
O tribunal recorrido julgou provada a seguinte matéria de facto (transcrição): 1) No dia 08 de Outubro de 2010, pelas 19h30m, o arguido deslocou-se à residência da sua ex-mulher, Ana M..., e dos pais desta, José M... e Maria M..., sita no F..., Vizela, para visitar a sua filha menor; 2) Quando aí se encontrava, o arguido, revoltado com a Ana M... e com os pais desta, José e Maria, com quem se encontra incompatibilizado desde o divórcio do casal começou a discutir com eles e, em tom alto e intimidatório, disse-lhes: “o vosso fim está próximo, vou-te matar a ti, ao teu pai e à tua mãe”; 3) Com tais expressões, quis o arguido causar medo e receio na Ana M..., no José M... e na Maria M..., fazendo-os crer que atentaria contra a sua integridade física e a sua vida; 4) Devido ao conflito existente com o arguido Bruno S... e à agressividade por ele demonstrada, a Ana M..., o José e a Maria, convencidos de que aquele a qualquer momento, na concretização destes propósitos anunciados, os viesse a agredir corpo-ralmente, passaram a recear pela sua integridade física e pela sua vida; 5) Com a conduta acima descrita, o arguido actuou com o propósito, concretizado, de provocar na Ana M..., no José e na Maria, receio e temor pela sua integridade física e pela sua vida, bem sabendo que o seu comportamento era susceptível de provocar medo e inquietação nos visados e de prejudicar a sua liberdade de determinação; 6) Posteriormente, no dia 19 de Maio de 2011, pelas 14h30m, junto do Café “F...”, sito em Vizela e próxima da residência dos assistentes, quando a Ana M...
se encontrava a conversar com um amigo, surgiu o arguido Bruno S... que, de imediato se aproximou dela e, sem que nada o fizesse prever, agarrou-a pelo braço, apertando-o com força, ao mesmo tempo que lhe dizia que queria falar com ela; 6) O comportamento do arguido Bruno S... foi ainda causa directa e necessária de dores para a Ana M... no braço, para além de nervosismo e ansiedade de consequências não apuradas.
7) O arguido Bruno S... sabia que não podia atingir o corpo da Ana M... e que, agindo da forma como o fez, lhe causava as dores acima descritas; 8) Nas circunstâncias de tempo e lugar referias em 1), quando o assistente José M... entrou em casa, onde o arguido se encontrava, este, virado para a sua filha, que tinha ao colo, referindo-se ao assistente, disse "Olha filha! Chegou o abutre"; 9) Tal expressão foi proferida em voz alta, sendo ouvida pelas pessoas que ali se encontravam, visando o arguido ofender o assistente na sua honra, bom-nome e dignidade pessoal e social; 10) Agiu de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei; 11) O assistente José M... sentiu-se triste e muito ofendido com a expressão que o arguido lhe dirigiu, o que aconteceu na sua residência e na presença da sua família; 12) De tal forma que passou a evitar, inclusive frequentar determinados locais, como o fazia, com receio de se vir a confrontar com o arguido e que este venha novamente a atentar contra a sua honra e consideração; 13) O assistente José M... sentiu ainda medo e inquietação pela ameaça proferida pelo arguido, exacerbada pela sua frágil saúde, dado que padece de problemas do foro cardíaco que o tornam especialmente vulnerável; 14) Desde então evita deslocar-se a determinados locais, como anteriormente fazia, de forma a não se ver confrontado com o arguido; 15) Tendo, inclusive, deixado de frequentar, como anteriormente fazia, a casa de férias que detém na localidade de A..., freguesia B..., concelho de Viana do Castelo, com receio de aí poder encontrar o arguido, que aí tem fixada residência; 16) O assistente evita andar sozinho na rua, o que anteriormente fazia, amedrontado com a ideia de poder ser agredido pelo arguido; 17) A assistente Maria M... sentiu medo e inquietação pela ameaça proferida pelo arguido; 18) Desde então evita deslocar-se a determinados locais, como anteriormente fazia, de forma a não se ver confrontado com o arguido; 19) Tendo, inclusive, deixado de frequentar, como anteriormente fazia, a casa de férias que detém na localidade de A..., freguesia B..., concelho vê Viana do Castelo, com receio de aí poder encontrar o arguido, que aí tem fixada residência; 20) A assistente evita andar sozinha na rua, amedrontada com a ideia de poder ser agredida pelo arguido; 21) A assistente Ana M... sentiu medo e inquietação pela ameaça proferida pelo arguido, agravados na medida em que o arguido veio posteriormente à mesma a atentar contra a sua integridade física; 22) Agressão que ocorreu próximo da sua residência, em local público, causando-lhe dores e sentindo-se humilhada por ter sido agredida na presença de um amigo; 23) Desde então tem receio de que o arguido venha a concretizar a ameaça que fez; 24) A assistente ficou num profundo estado de constante tristeza e ansiedade, vivendo em constante medo de que o arguido venha a qualquer momento a concretizar a ameaça que fez; 25) O arguido vive com a mãe, em casa própria, pagando de prestação ao banco € 300,00 mensais; 26) É médico dentista, ganha € 1.100,00 e paga de pensão de alimentos à filha com 3 anos € 125,00 mensais mais € 105,00, correspondente a metade da mensalidade da creche; 27) Não tem antecedentes criminais” Quanto à matéria de facto não provada, consta na sentença recorrida: “Não se provou: a) Que o assistente José M... passou a sofrer crises de ansiedade e de pânico em consequência da conduta do arguido; b) Que o assistente José M... praticamente deixou de circular a pé; c) Que o assistente José M... se tornou uma pessoa triste, perdendo a boa disposição e jovialidade que sempre o caracterizaram e que por todos era enaltecida, tornando-se uma pessoa introvertida, tendo-se votado ao isolamento; d) Que a assistente Maria M... passou a sofrer crises de ansiedade e de pânico em consequência da conduta do arguido; e) Que a assistente Maria M... se tornou uma pessoa inquieta, nervosa e reservada, tendo-se votado ao isolamento; f) Que a conduta do arguido criou na assistente Ana M... recorrentes e graves episódios de ansiedade e de pânico, vivendo profundamente aterroriza-la; g) Que a assistente Ana M... deixou ter qualquer vida social, evitando sair e restringindo as suas deslocações ao mínimo indispensável e que se tenha votado ao isolamento.
Não resultaram provados, com relevância para a decisão, quaisquer outros factos, invocados nas peças processuais ou alegados em audiência, que não estejam em oposição ou não tenham ficado prejudicados pelos que foram dados como provados e não provados.” Na motivação da decisão do tribunal recorrido sobre a matéria de facto, consta o seguinte: “A convicção do...
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